Petição
EXMO. SR. DR. DESEMBARGADOR $[processo_vara] VICE-PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO $[processo_estado]
RECURSO ESPECIAL Nº $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_qualificacao_completa], diante do v. Acórdão, vem, por suas patronas DRª. $[advogado_nome_completo] e $[advogado_nome_completo], inscritas na OAB sob os nº $[advogado_oab] e $[advogado_oab], respectivamente, com escritório profissional na $[advogado_endereco], com fulcro no artigo 1.042 e seguintes, do NCPC, interpor
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
ao órgão ad quem, com esteio nos fatos e fundamentos que a seguir passa a expor.
Requer, após o exame de admissibilidade, que seja recebido o presente recurso, e que dele se de o devido provimento, nos termos das razões expostas na minuta que abaixo transcreve.
PEDIDO DE GRATUIDADE INCIDENTAL
O Requerente, ab initio, às razões de sua pretensão recursal, vem requerer a Vossa Excelência, a gratuidade de justiça na forma do art. 6º da Lei 1060/50, em razão de não poder arcar com as custas processuais sem prejuízo do próprio sustento e de sua família.
Outrossim, requer seja deferida a gratuidade de justiça e o posterior recebimento do presente recurso, ordenando-se seu processamento e remessa à Superior Instância para julgamento.
Termos em que.
Pede deferimento..
$[advogado_cidade], $[geral_data_extenso].
$[advogado_assinatura]
COLENDA CORTE JULGADORA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL Nº: $[processo_numero_cnj]
AGRAVANTE: $[parte_autor_nome_completo]
AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO $[processo_estado]
Colendo Superior Tribunal de Justiça,
Egrégia Turma,
I- PRELIMINARMENTE
DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL SUBSTITUINDO O INQUÉRITO POLICIAL
A Constituição Federal de 1988 ampliou substancialmente as atribuições do Ministério Público, conferindo-lhe a condição de defensor da sociedade, legitimando-o a promover o inquérito civil e a ajuizar a ação civil pública, recepcionando o art. 8º da Lei de Ação Civil Pública.
No artigo 129 da Constituição Federal de 1.988, onde, porém, estão regulamentadas as funções institucionais do Ministério Público, não consta sua legitimação para instaurar e promover procedimentos investigatórios criminais, que, segundo a própria Constituição, é atribuição privativa da Polícia Judiciária, sendo que a Lei Orgânica do Ministério Público não pode avocá-la.
O Ministério Público é o destinatário das provas colhidas, para, havendo indícios suficientes de autoria e materialidade, propor a ação penal e atuar como parte, órgão acusatório.
Alexandre de Morais, ao comentar o texto constitucional, deixa claro que ao Ministério Público compete promover, dar início, propor a ação penal, mediante queixa ou denúncia. Ressalta que a portaria e o auto de prisão em flagrante não instauram a ação penal. Tais instrumentos dão início à investigação criminal e são atos privativos da autoridade policial. Assim, pode-se concluir que ao Ministério Público compete instaurar a ação penal e à autoridade policial, a investigação criminal.
É que, aplicar a lei é, antes e acima de tudo, respeitar os princípios constitucionais, por isso que descansam eles na Lei das Leis. E um desses princípios é justamente aquele que afirma ser todo ser humano, sem exceção, digno de todo respeito. Sendo a dignidade da pessoa humana é uma das principais preocupações do legislador constituinte, deve o fiscal da lei, ele mesmo, dar exemplo de respeito a tal valor. Quando a violação da lei implica constrangimento individual, é evidente o desserviço prestado pela Instituição ao aperfeiçoamento de nossa Democracia.
Nossos EE. Tribunais vêm trilhando por esse caminho, ao entender inaceitável a substituição da autoridade policial pelos membros do Ministério Público no que diz com a investigação antecedente à ação penal. Não é desejável que uma das futuras partes da ação penal tenha o poder de pré-constituir provas pessoalmente a seu favor (sonegando, naturalmente, aquelas que contrariem seus propósitos), nem foi esse o claro propósito da Constituição Federal.
Em Acórdão relatado pelo ilustre Des. Marco Antonio Marco da Silva, o E. Tribunal de Justiça de São Paulo focou, de modo irrespondível, todos os aspectos de tal abuso: “Não resta dúvida, pois, que, com o não acolhimento, quando da Assembléia Nacional Constituinte de 1988, das pretensões de alguns parlamentares de ver um processo de investigação criminal gerido pelo Ministério Público, não pode este presidir ou realizar um inquérito policial, ou mesmo procedimento administrativo investigatório criminal de mesma natureza e finalidade, vedando-se, também, a inquirição, de forma direta, de pessoas investigadas ou suspeitas da autoria de delito, ficando limitado à requisição de tais providências à autoridade policial competente.
Merece destaque a posição assumida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que manteve o entendimento inaugurado pelo Des. Silvio Teixeira, pois recentemente a Seção Criminal, ao apreciar o HC nº 2458/2000, julgado em 27/09/2000 e publicado no DOERJ de 01/08/2001, fls 319/320, que foi relatado pelo Des. Eduardo Mayr, manteve-se fiel à linha jurisprudencial da Suprema Corte ao reafirmar: “Habeas Corpus. Investigação Penal. Atribuição da Polícia Judiciária. Ordem Concedida. A proteção constitucional abrange não apenas a liberdade, mas também a validade do procedimento do qual possa resultar alguma restrição a este direito. Ao Ministério Público cabe com exclusividade a iniciativa de propor a ação penal pública, mas sua atribuição, in poenalibus, não ultrapassa o poder de requisitar diligências investigatórias, e a instauração de inquéritos policiais e penal militar. Somente quando se cuidar de inquéritos civis é que além da sua instauração compete-lhe à efetivação de diligências investigatórias, com as medidas e procedimentos pertinentes”.
O Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, comentando o chamado “procedimento investigatório”, realizado por Promotor de Justiça e o controle externo da atividade policial pelo Ministério Público, assim se pronunciou: “No que concerne ao inciso VIII do artigo 129 (da Constituição Federal), este dispositivo atribui ao Ministério Público competência para requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial. Nenhum outro dispositivo, portanto, lhe confere atribuições para ele próprio realizar investigações e instaurar inquérito policial – coisas que são bem distintas de requisitar.
“O inquérito policial, como peça informativa munida dos elementos indispensáveis à propositura da Ação Penal Pública, mormente quando se trata de crime contra a Administração Pública, continua sendo atribuição da Polícia Judiciária.”
Em muitas outras oportunidades os Tribunais do País têm se manifestado no mesmo sentido da decisão ora em comento. Podemos citar os seguintes acórdãos: TRF/2.ª Região, HC 1273, rel. Des. Fed. Ney Fonseca, 1.ª T.; TRF/2.ª Região, HC 1137/RJ, rel. Des. Fed. Silvério Cabral, 2.ª T.; TRF/2.ª Região, HC 960209709-4, rel. Des. Fed. Castro Aguiar, 2.ª Turma; Tribunal de Justiça/RJ, HC 615/96, rel. Des. Silvio Teixeira Moreira.
No Recurso em Habeas Corpus nº 4.769-PR, do E. Superior Tribunal de Justiça, relatado pelo Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, o Colendo Superior Tribunal de Justiça assim se pronuncia: “RHC – Constitucional – Processual penal – Magistrado – Ministério Público.
“O magistrado e o membro do Ministério Público, se houverem participado da investigação probatória, não podem atuar no processo. Reclama-se a isenção de ânimo de ambos. Restaram comprometidos (sentido jurídico). Daí a possibilidade de argüição de impedimento, ou suspeição”.
No voto proferido, o Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro assim se pronuncia: “Esta 6ª Turma, relativamente ao membro do Ministério Público, teve a oportunidade de manifestar-se no RESP 10.715-0 PR, cuja ementa esclarece: ‘Processual Penal - Ministério Público - Recurso em favor do réu - Legitimidade.
“O Ministério Público, como instituição, não é acusador, no sentido vulgar do termo. Tecnicamente, por imperativo constitucional, faz a imputação, para averiguar, presentes o contraditório e a defesa plena, o fato, com todas as circunstâncias. Juridicamente, não está jamais contra o réu. Ao contrário, confluem interesses, a fim de evitar o erro judiciário. Busca a verdade real, a decisão justa. Em conseqüência, evidencia-se a legitimidade para recorrer em favor do réu’ (STJ - REsp. 10.715.0- PR - (91.00087299-7) - Rel. Min. Vicente Cernicchiaro, 6.ª Turma, v.u., j. 07.04.92).
“Da mesma Sexta Turma, decisão semelhante: ‘Dois promotores, por designação superior, acompanharam o Inquérito Policial; tiveram parte ativa na coleta das provas. Um deles ofereceu a denúncia e arrolou o outro como testemunha. A sentença, por sua vez, acolheu a imputação e condenou o acusado. Pormenor importante: o decreto condenatório considerou relevante o depoimento do Promotor. O acórdão anulou o julgamento; considerou que a testemunha não era isenta, estava comprometida com a prova em cuja produção tivera relevante atividade.
“A mesma conclusão decorre de prova colhida pelo Juiz. Como no caso do Promotor, também fica comprometido. Impõe-se a outro Magistrado presidir a instrução e proferir a sentença. Repita-se a advertência: não basta à mulher de César ser honesta, precisa parecer honesta!”.
O ilustre Ministro consigna em seu voto: “Ministério Público e Magistratura não podem estar comprometidos com o caso sub judice. Daí, a possibilidade de argüição de impedimento, ou suspeição dos respectivos membros.
“Se um ou outro atua na fase da colheita de prova que, por sua vez, mais tarde, será a base do recebimento da denúncia, ou do sustentáculo da sentença, ambos perdem a imparcialidade, no sentido jurídico do termo. Não se confunde com o interesse pessoal de a decisão seguir um caminho, ou outro.
“O comprometimento, insufla-se, reside no interesse de elas serem prestigiadas, exaustivas, bastantes para arrimar sentença de condenação ou absolvição”.
No mesmo sentido, no Recurso Especial nº 76.171-Al, o Relator Ministro William Patterson deixou consignado: “Não vislumbro qualquer ato de desobediência, porque o Delegado da Receita Federal está sujeito à hierarquia administrativa própria, na qual não se insere o órgão do Ministério Público Federal. A requisição de diligências investigatórias de que cuida o art. 129, VIII, CF, deve dirigir-se à autoridade policial, não se compreendendo o poder de investigação do Ministério Público fora da excepcional previsão da ação civil pública (art. 129, III, CF). De outro modo, haveria uma polícia paralela, o que não combina com a regra do art. 129, VIII, CF, segundo a qual o MP deve exercer, conforme lei complementar, o controle externo da atividade policial.
“Também não se compreende como o Ministério Público poderia determinar ao Delegado da Receita Federal a inobservância das determinações das autoridades superiores quanto à centralização das investigações sobre o ‘Caso PC’ e sobre fatos relacionados com o então Presidente da República.
“Pelas mesmas razões, não se pode aventar o cometimento de prevaricação pelo paciente”.
Analisando a decisão proferida apelo Supremo Tribunal Federal no HC nº 34.827, relatada pelo Ministro Nelson Hungria e exaltada pelo Desembargador Romero Jr., denotam-se os seguintes alicerces: “Tenho para mim, Senhor Presidente, que, embora permitida pelo art. 73, VIII, da Constituição de Alagoas, a ‘Comissão Judiciária’, a que se refere o recorrente, não é ela compatível com o Código de Processo Penal, pois este não autoriza, sob qualquer pretexto, semelhante deslocação da competência, ou, seja, a substituição da autoridade policial pela judiciária e membro do M. P. na investigação do crime.” E, mais adiante, concede a ordem, “reconhecendo a nulidade ex radice do processo instaurado contra o paciente”.
Embora esta decisão tenha sido arquitetada sob a égide de Constituições passadas, é atual e condiz com as decisões prolatadas atualmente, após a Constituição Federal de 1.988, que introduziu o art. 129 da atual Carta Magna e o art. 144, § 4º, discriminando as funções do Ministério Público e da Polícia Judiciária. Se antes assim se entendia, nada existe que deva levar a entendimento diverso.
A jurisprudência da Suprema Corte nesse sentido é reiterada nas últimas décadas, inclusive após a Constituição Cidadã de 1988, como se vê na seguinte ementa: “Constitucional. Processual Penal. Ministério Público: atribuições. Inquérito. Requisição de investigações. Crime de desobediência. CF, art. 129, VIII; art. 144, §§ 1º e 4º. Inocorrência de ofensa ao art. 129, VIII, CF, no fato de a autoridade administrativa deixar de atender requisição de membro do Ministério Público no sentido da realização de investigações tendentes à apuração de infrações penais, mesmo porque não cabe ao membro do Ministério Público realizar, diretamente, tais investigações, mas requisitá-las à autoridade policial, competente para tal (CF, art. 144, §§ 1º e 4º)”.
O voto do Min. Carlos Velloso, relator da decisão, um juiz notoriamente conservador, fortalece a linha de raciocínio ora adotada: “Não vislumbro qualquer ato de desobediência, porque o Delegado da Receita Federal está sujeito à hierarquia administrativa própria, na qual não se insere o órgão do Ministério Público Federal. A requisição de diligências investigatórias de que cuida o art. 129, VIII, CF, deve dirigir-se à autoridade policial, não se compreendendo o poder de investigação do Ministério Público fora da excepcional previsão da ação civil pública (art. 129, III, CF). De outro modo, haveria uma polícia paralela, o que não combina com a regra do art. 129, VIII, CF, segundo a qual o MP deve exercer, conforme lei complementar, o controle externo da atividade policial”.
No julgamento do Habeas Corpus nº 83.157 julgado em 1º de julho de 2003 pelo E. Supremo Tribunal Federal, o Ministro Marco Aurélio se pronunciou no sentido de que o Ministério Público não tem poderes para tomar depoimento e conduzir as investigações em matéria criminal, sendo lhe conferido esses poderes tão somente na condução de inquéritos de natureza civil.
O Ministro reportou-se ao posicionamento da 2ª Turma da Suprema Corte, que entende somente competir ao Ministério Público “promover o inquérito civil”. Segundo ele, “Como titular da ação penal pública, acusador, impossível é conferir atividade investigatória, a presidência de audiências para a oitiva de testemunhas. Há de lançar mão, o Ministério Público, do que previsto no inciso VIII do artigo 129 da Constituição Federal, requisitando ‘diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial’, indicados os fundamentos jurídicos de manifestações processuais”.
A ministra ELLEN GRACIE acompanhou o voto do Relator, acrescentando que ao Ministério Público cabe promover a investigação quando se trata de inquérito civil, “não devendo o mesmo acontecer no inquérito penal, onde atuará, mais tarde, como acusador”. Entende a ilustre Ministra que o Ministério Público não pode acumular as funções de inquisidor e acusador.
Recentemente mais uma demonstração da visão sólida de nossa Magna Corte quanto à mantença desse entendimento. O Ministro Marco Aurélio, então Presidente daquela Excelsa Corte, ao ser indagado sobre a função do MP na relação processual, de forma rígida e inflexível disse: “O Ministério Público, em si, é parte e não atua no campo da persecução criminal como fiscal da lei. E, sendo parte, deve ser preservada a postura de parte. É inconcebível que se chegue à conclusão de que o Ministério Público deva, ele próprio, atuar como parte e, também, como órgão investigador das circunstâncias de um possível crime. A Constituição Federal só prevê a titularidade do Ministério Público para o inquérito em uma hipótese, uma única hipótese. É quando se tem um inquérito civil e jamais um inquérito criminal”.
Em Acórdão célebre, relatado pelo eminente Min. Nelson Jobim, o C. Supremo Tribunal Federal, com a autoridade de intérprete máximo da Lei das Leis, deixou claro que não compete ao Ministério Público equiparar-se à autoridade policial, contaminando-se a prova assim obtida pela manifesta ilicitude de sua coleta.
Diz o eminente Ministro relator, com a dupla autoridade de juiz e ex-membro da Assembléia Constituinte de 1988: “Na Assembléia Nacional Constituinte (1988), quando se tratou da questão do controle externo da polícia civil, o processo de instrução presidido pelo Ministério Público voltou a ser debatido. Ao final, manteve-se a tradição. O Constituinte rejeitou as Emendas 945, 424, 1.025, 2.095, 20.524, 24.266 e 30.513, que, de um modo geral, davam ao Ministério Público a supervisão, avocação e o acompanhamento da investigação criminal.”67
O Ministro Carlos Velloso, na ocasião, proferiu voto, no qual reitera suas anteriores manifestações, no sentido de que “não cabe ao Ministério Público realizar diretamente investigações penais, mas requisitá-las à autoridade policial competente, conforme dispõe a Constituição Federal, art° 144, §§ 1° e 4°. Ao Ministério Público incumbe promover a ação penal pública, na forma da lei (CF, art° 129, I) e bem assim o inquérito civil, e a ação civil pública, conforme preconizado no inciso III do mesmo artigo 129. Cabe-lhe ainda exercer o controle externo da atividade policial (CF, art° 129, III), devendo requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art° 129, VIII). Não lhe cabe, pois, fazer as vezes da Polícia Federal ou da Polícia Civil”. O não acolhimento da figura do Promotor de Justiça Investigador está respaldado na Constituição Federal de 1988, que não admite, como se observa no artigo 129 e incisos, onde estão enumeradas as funções institucionais do Ministério Público. Não pode, portanto, o Ministério Público realizar investigações criminais, concluiu o E. Tribunal.
Pode-se, portanto, dizer que Roma locuta causa finita, valendo notar que o V. Acórdão concluiu pela imprestabilidade de todos os elementos probatórios decorrentes da ilegal promoção do Ministério Público, adotando, sem a menor dúvida, a teoria dos poisonousfruits, forte em decisões antecedentes.
Dessa forma, no que se refere aos critérios das nulidades no processo penal, a questão da instauração do procedimento investigatório pelo Ministério Público é manifestamente nula, com base no art. 500, IV do CPPM.
DA INVALIDADE DO TERMO DE RECONHECIMENTO POR FOTOGRAFIA
Como visto acima, a própria instauração do Procedimento Investigatório Criminal pelo Ministério Público é nula e, por consequência, os atos lá produzidos também os são.
É relevante mencionar que muitas das fotografias possuíam nomes que possibilitavam a identificação dos personagens, além de não apresentarem um padrão isento de reconhecimento.
Devendo ser lembrado, que naquela oportunidade o Réu, policial militar, se encontrava solto e trabalhando normalmente, o que tornaria inteiramente possível a sua intimação para o reconhecimento presencial, nos moldes do artigo 226, do CPP.
Na atual conjuntura verificada na fase pré-processual do processo penal brasileiro, não raro nos deparamos, na prática, com um procedimento alternativo de reconhecimento de pessoas, o qual se dá a partir da exposição de imagens de suspeitos na tela de um computador, onde a suposta vítima e/ou as testemunhas analisam as figuras dos indivíduos ali expostos.
Ocorre, que é impossível deferir credibilidade a uma visualização meramente fotográfica para a efetivação de um reconhecimento válido, pois, para além de estrondosa irregularidade formal, tal método inviabiliza uma qualificada percepção nocional das testemunhas analistas, prejudicando, assim, a finalidade do ato. Nessa linha, adverte Aury Lopes Júnior (2011, p. 670) que o reconhecimento fotográfico é intoxicado de um latente caráter de inadmissibilidade.
O reconhecimento feito através da averiguação de imagens fotográficas é inoportuno ao processo penal, sendo patente sua integral inadmissibilidade, ante a manifesta lesão que esta prática provoca ao direito de inatividade processual do acusado (nemotenetur se detegere). Com efeito, afora de qualquer tipo de resistência pragmática a uma forma de reconhecimento não previsto na legislação processual penal, consideramos que a imputação formal de um suspeito através de uma simples fotografia compromete a segurança jurídica do ato, ao passo que a exposição de imagem estática do indiciado pode, sem sombra de dúvidas, embaralhar a consciência de uma já traumatizada vítima (ou testemunha) e dar margem à eventual indicação equivocada de um indivíduo quepode não ter concorrido na infração penal apurada.
Neste contexto, no que se refere aos critérios das nulidades no processo penal, a questão do reconhecimento produzido sem a observância dos preceitos impostos pelo art. 226, é manifestamente nulo, com base no art. 500, IV do CPPM.
DA INVALIDADE DO TERMO DE RECONHECIMENTO JUDICIAL
Convém arguir a nulidade do termo de reconhecimento judicial, uma vez que fora realizado em total desacordo com o que reza o Diploma Processual Penal.
Há de ser lembrado que o reconhecimento por fotografia além de nulo, restou por interferir na lisura do reconhecimento judicial, uma vez que as testemunhas reconhecedoras foram contaminadas com a realização daquele ato anterior ilegal.
Dessa forma, no que se refere aos critérios das nulidades no processo penal, a questão do reconhecimento produzido sem a observância dos preceitos impostos pelo art. 226, do CPP é manifestamente nulo, com base no art. 500, IV do CPPM.
II- DOS FATOS
O Ministério Público Militar ofereceu denúncia imputando ao Recorrente a conduta prevista nos artigos 1º, I, “a”, §4º, incisos I e II, da Lei nº 9.455/97 e 242, §2º, II, do CPM, todos c/c artigo 70, inciso II, “g” e “l”, do CPM, na forma do artigo 79, também do Código Penal Castrense.
Alega para tanto que o Recorrente, no dia 01 de outubro de 2017, na comunidade da Rocinha, auxiliou na subtração de R$ 80,00 (oitenta reais) do nacional Douglas S. F. da Silva, na medida em que o ameaçou com a arma de fogo da Corporação, bem como, por ter agredido o mesmo nacional com um golpe de fuzil, ocasionando ferimento na cabeça do mesmo, com o objetivo de obter informações referentes ao tráfico de drogas na comunidade da Rocinha.
Após a instrução probatória, o Recorrente fora condenado nos termos exatos do petitório ministerial.
Em fase recursal, o D. Juízo da 6ª Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro atendeu, parcialmente, o recurso defensivo, apenas no tocante ao total da pena aplicada, com o afastamento dos agravantes e, conseqüente, redução da pena e modificação do regime de cumprimento.
Contudo, em virtude da existência de violações expressas à Lei Processual Penal, outra opção não encontrou o Recorrente, senão a interposição do presente Recurso.
III- DO CABIMENTO DO RECURSO ESPECIAL
O artigo 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal autoriza a interposição de Recurso Especial sempre que a decisão recorrida, julgada em última instância, contrariar dispositivo de Lei Federal.
No caso específico, o Acórdão ora impugnado contraria as disposições dos artigos 155, 156 e 226, todos do Código de Processo Penal.
IV- DA DECISÃO DE NÃO ADMISSÃO E AS RAZÕES QUE RECLAMAM SUA REFORMA
A decisão ora atacada inadmitiu o processamento do Recurso Especial interposto sob o fundamento de que tal recurso não serviria de instrumento para a revisão de provas.
Ocorre, que contrariamente ao que entendeu o Exm. Dr. Desembargador Terceiro Vice Presidente, o que pleiteia este Agravante é a reforma do v. acórdão, por absoluta violação ao que dispõe o Artigo 155, 156 e 226, todos do Código de Processo Penal Pátrio.
V- DO MÉRITO
DA NEGATIVA QUANTO À INVALIDADE DO TERMO DE RECONHECIMENTO POR FOTOGRAFIA E DO RECONHECIMENTO JUDICIAL
Como podemos observar, o Juízo a quo, em seu Decreto Condenatório, ao analisar a nulidade do Termo de Reconhecimento Fotográfico, que, diga-se de passagem, resta por contaminar a principal prova produzida nestes autos (O irregular reconhecimento judicial), limita-se a afirmar que a vítima alega que todos os policiais do Batalhão de Polícia de Choque estavam sem identificação em suas fardas no dia do fato e que a constância de seus nomes de guerra nas referidas fotografias em nada macula o reconhecimento do Recorrente.
Ocorre, que diferentemente do dito pela referida testemunha, há nos autos uma série de depoimentos de policiais integrantes do Batalhão de Polícia de Choque, inclusive, do Comandante do referido Batalhão há época dos fatos, que detalharam, com clareza e precisão, o modo de atuação do BPChq, sempre pautado na ética e na transparência profissional, como se espera de um Batalhão Especial de Polícia.
Há de ser mencionado que o Reconhecimento Fotográfico, com a apresentação dos nomes dos policiais, é inquestionavelmente irregular e macula sim o Reconhecimento Judicial, haja vista que a vítima pode, naquele primeiro momento, escolher um policial para apontar e outros para excluir. Já sabendo então qual policial deveria reconhecer em sede Judicial.
Então Exas, dizer a D. Juíza que o Reconhecimento Fotográfico com a apresentação dos nomes dos policiais não retira a credibilidade da principal prova produzida nestes autos é, no mínimo, rasgar a Constituição da República, bem como o Código de Processo Penal Militar e Comum, uma vez que, ao contrário do que disse a D. Juíza, tal fato não pode ser considerado um mero erro de formalidade, pois deu ensejo ao Reconhecimento Judicial Irregular do Recorrente, pois não há como separar esse elemento de informação da prova produzida em sede Judicial.
DA EQUIVOCADA ANÁLISE DO CONJUNTO PROBATÓRIO
É importante destacar, que a D. Juíza, em seu Decreto Condenatório, alega que a autoria delitiva imputada ao Recorrente é sustentada pelo depoimento da “vítima”, da testemunha Priscila, sua genitora, e demais familiares.
Contudo, sabe-se, que a “vítima” se encontrava sozinha e o depoimento de sua genitora e demais familiares em nada …