Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA CÍVEL DA CIDADE - UF
Processo: Número do Processo
Nome Completo, nacionalidade, estado civil, profissão, Inserir RG, Inserir CPF, residente e domiciliado Inserir Endereço, por seu procurador e advogado signatário da presente [procuração anexa] e requerendo os benefícios da gratuidade judiciária na forma dos artigos 98 e seguintes do Código de Processo Civil, reiterada ao final [declaração junta], vem apresentar
CONTESTAÇÃO e RECONVENÇÃO
ao pedido formulado por Razão Social, pessoa jurídica já identificada e representada, aduzindo os fundamentos de fato e de direito conforme a seguir comentados:
I. DA INICIAL - DOCUMENTOS
Numa síntese dos fatos narrados na prefacial, é certo que as partes firmaram Instrumento Particular de Compra e Venda de Imóvel e Outras Avenças, cujo objeto é a compra e venda de um imóvel urbano constituído por um terreno descrito no item 03 do contrato ora juntado, constituído do lote nº 13, da quadra 12, do loteamento denominado Informação Omitida, com registro no Cartório de Registro de Imóveis de Informação Omitida sob o nº Informação Omitida, cujo preço ajustado foi de R$ 155.126,81, a ser pago da forma seguinte: - R$ 45.107,21 em 02/05/2013; e, - R$ 110.019,60 em 90 parcelas mensais de R$ 1.222,44, com o primeiro vencimento em 10/06/2013, sendo pactuado o dia 1º do mês de maio de 2013 como data base para reajuste, obrigação que o Requerido deixou de cumprir com regularidade a partir da
Aponta as parcelas vencidas e sem pagamento no valor atualizado de R$ 12.504,45, até 15/06/2015 e invoca a Cláusula 8ª, parágrafo 2º, do já referido Instrumento para sustentar a restituição parcial de valores pagos, conforme os percentuais previstos nas letras “a” a “d” do parágrafo 2º, da cláusula 8ª do mesmo instrumento firmado, pedindo a rescisão do negócio jurídico de compra e venda do bem imóvel supramencionado, ordenar a desocupação do imóvel pelo requerido, expedindo-se mandado de reintegração de posse e condenando o Requerido ao pagamento de todos os impostos, taxas e outros tributos que recaem sobre o referido imóvel, valor este a ser apurado mediante arbitramento, através de liquidação de sentença, além dos encargos da lide.
À inicial, vieram coligidos documentos, em especial e no que toca à esta oportunidade, a Notificação do Requerido e as planilhas apontando os valores das parcelas, inclusive das parcelas reconhecidamente pagas.
II. DA AMPLITUDE DA RESPOSTA - FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO – MÉRITO - RECONVENÇÃO
Esta resposta do Requerido, à luz do novo Código de Processo Civil instituído pela Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, disciplinada que vem nos artigos 335 a 343, concentra, na própria contestação, dentre outros, as preliminares, as defesas de méritos e a reconvenção, esta, neste caso, necessária, à vista de fatos substanciais que foram omitidas pelo Requerente, com forte impacto sobre as razões da demanda.
Ademais, o artigo 341 prestigia o denominado princípio da eventualidade, anotando-se, já sob outro enfoque, que, a exemplo do que ocorria no regime do velho CPC de 1939, a reconvenção deve ser deduzida no bojo da própria peça de contestação (artigo 343, parágrafo 6° do mencionado e novel Diploma).
Ante o referido princípio, passa a abordar a matéria de mérito, uma vez que, conforme o art. 336 do prefalado Código de Processo Civil: “Incumbe ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir”.
Conforme ensina Simone Stabel Daudt,
“A contestação é um dos tipos de resposta a ser realizada, no prazo de 15 dias (...) cabe ao réu alegar e, oportunamente, provar o alegado. É o meio de exercício do direito de defesa, representa para o réu o que a petição inicial representa para o autor. Ela responde ao que o autor disse na petição inicial. É a modalidade de resposta do réu consistente na negação da procedência da ação.” (DAUDT, Simone Stabel. Comentários aos arts. 300 a 303 do CPC - Da Contestação. Revista Páginas de Direito, Porto Alegre, ano 7, nº 678, 24 de novembro de 2007).
No caso, a causa de pedir a rescisão do contrato e, consequentemente, a reintegração na posse do referido imóvel, é o ESBULHO POSSESSÓRIO decorrente da alegada inadimplência do Requerido.
Disto decorrem duas possibilidades:
Improcedência do pleito por não estar presente a inadimplência como condição para a presença do esbulho; ou,
Restituição dos valores pagos durante a regularidade contratual, ante a eventual procedência do pedido rescisório.
Esta resposta, portanto, se limita à exploração desta dupla possibilidade de deslinde.
1. DA RELAÇÃO DE CONSUMO - EFEITOS
A espécie contratual em comento está sujeita ao sistema protetivo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor, que penaliza com a nulidade, dentre outras, a constante no art. 51 da Lei nº 8.078/90, nos artigos 12, 13, 14, 22 e 56 do Decreto nº 2.181/97, e nos articulados números 3º, 5º, 6º, 7º, 10 e 11, da Portaria nº 4/98, da Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça. Esse sistema tutelar proíbe e nulifica, em abstrato, a pactuação de cláusulas que caracterizem abusividade negocial, que resultem em onerosidade excessiva dos encargos financeiros previstos, que deneguem, impeçam ou restrinjam direitos do consumidor, que prevejam a perda total ou desproporcionada das prestações por ele pagas, ou do bem objeto da avença, em benefício do credor, e que estabeleçam sanções somente em desfavor do consumidor, em caso de atraso ou descumprimento de obrigação.
Em consequência, esse sistema também rejeita e declara nulos os efeitos materiais concretos gerados por cláusulas que estabeleçam a negação de direitos públicos indisponíveis conferidos ao consumidor, ou quando ela subtrai do negócio jurídico o seu equilíbrio comutativo, configurando nulidade decorrente do abuso de poder negocial mandatoriamente proibido nas relações de consumo, por força do disposto no art. 47, combinado com o art. 51, caput e incisos I, IV, e IX, § 1º, incisos II e III, e § 2º, e art. 53, do Código de Defesa do Consumidor.
Vele dizer que, sob prisma funcional, é inválida a concreção da cláusula de rescisão contratual, com a perda dos valores pagos, por exemplo, quer em razão de nulidade oriunda das suas causas materiais, quer seja quanto a nulidade concreta dos seus efeitos próprios.
2. DA OMISSÃO DO REQUERENTE – MÁ-FÉ
Em obediência ao dever geral de boa-fé, que ganhou status de norma fundamental no Novo Código de Processo Civil, o art. 77 impõe o dever de probidade e lealdade processual às partes e seus procuradores, públicos ou privados, assim como a todos aqueles que de alguma forma participam do processo, incluído o Ministério Público, o perito, dentre outros.
Em síntese, compete àquele que praticar ato processual agir com lealdade e boa-fé, pautando suas ações no plano da ética e da moralidade. O litigante ímprobo, que vier descumprir tal dever, sofrerá às sanções previstas ao litigante de má-fé, de que tratam os artigos 79 e 80. De modo específico, o Código arrola, dentre os deveres da parte, o de expor os fatos conforme e verdade.
Nesse contexto, considera-se litigante de má-fé, inclusive a parte que altera a verdade dos fatos. E, assim, à luz do art. 81 do diploma, o improbus litigator deve ser condenado pela prática.
É o caso dos autos. A condenação poderá decorrer de pedido da parte lesada ou será decretada de ofício, vez que há interesse público em prevenir e reprimir a prática de abusos no âmbito do processo.
Primeiramente, na Planilha de pgs. 18 e 19, o Requerente aponta o valor pago pelo Requerido em parcelas durante a regularidade contratual, totalizando o valor singelo de R$ 70.954,72.
Todavia, omite valores exigidos e pagos pelo Requerido e que não foram considerados para apurar a alegada inadimplência notificada às pgs. 15 e 16, quando apontou parcelas em atraso totalizando R$ 10.938,85, O QUE INEXISTIA na ocasião.
Isto, porque por ocasião da assinatura do contrato, além da parcela prevista no ITEM 05, alínea 1 do QUADRO RESUMO do contrato, de R$ 45.107,21, o Requerente exigiu e recebeu a quantia de R$ 4.892,79 e, por ocasião de uma renegociação realizada em 22/07/2014, também omitida pelo Requerente, exigiu e recebeu este, a título de “prestação de serviços”, comprovadamente não contratados pelo Requerido, a importância de R$ 1.800,00 [comprovantes anexos], valores que foram apropriados, mas que não foram computados.
Atualizados tais valores até a data da Notificação – 30/05/2015, verifica-se que o Requerente era devedor de R$ 9.248,23 em favor do Requerido [memória anexa], donde conclui que, mesmo que não estivesse sujeito à restituição e/ou compensação em dobro, INEXISTIA INADIMPLÊNCIA.
A má fé do Requerente, no caso, é evidente e, portanto, os valores apropriados, mas OMITIDOS e NÃO CONSIDERADOS devem ser restituídos ou compensados em dobro, conforme parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, instituído pela Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990.
"O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável."
A repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, é de cunho punitivo pedagógico e, se assim não aplicado, estaria esvaziando a responsabilidade objetiva do fornecedor de produto ou prestador de serviços, pois do contrário seria ir contra tudo que o Código de Defesa do Consumidor prevê a respeito da inversão do ônus da prova, atribuindo ao consumidor o dever de provar o elemento subjetivo da responsabilidade civil, quando a lei expressamente prevê a ausência de sua necessidade.
A redação do dispositivo, como se vê, é de clareza solar e autoexplicativa. Nota-se que não basta apenas a ocorrência da cobrança indevida por parte do fornecedor para que venha a existir o direito à repetição do indébito, é necessário, também e indispensavelmente, o pagamento indevido pelo consumidor.
Assim, os requisitos para a devolução em dobro estão presentes, quais sejam: a) a existência de cobrança indevida e b) o pagamento em excesso pelo consumidor do valor indevidamente cobrado.
Com a palavra, o Prof. Leonardo de Medeiros Garcia:
Para aferição do "engano justificável" é preciso analisar se não houve culpa por parte do fornecedor. Se ele provar que não houve negligência, imprudência ou imperícia de sua parte, ficará isento de indenizar o consumidor pelo dobro da quantia cobrada. (GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do Consumidor. Código Comentado e Jurisprudência. 5ª ed. Niterói, RJ: Impetus, 2009. p. 260.)
Disto decorre a completa ausência do alegado esbulho, uma das condições exigidas pelo art. 927 do Código Civil:
Incumbe ao autor provar: ...; Il - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; IV - ... a perda da posse, na ação de reintegração. [GRIFO NOSSO]
Desta forma, ficam expressamente impugnadas a Planilha das pgs. 17/19 e a Notificação de pgs. 15 e 16.
Omite, ainda que, posteriormente à data de início da alegada inadimplência, o Requerido realizou pagamentos em 03/10/2014, de R$ 1.462,16; em 02/04/2015, de 1.462,16; e em 05/05/2015, no valor de R$ 1.463,04 [comprovantes anexados], de modo que não é verdade que esteja em mora desde 10/08/2014, como comprovado pelo próprio extrato juntado pelo Requerente.
Esta situação, além da má fé, por si só, afasta a mora, pois o único fundamento para o pedido rescisório do contrato é a alegada INADIMPLÊNCIA. Todavia, esta situação imputada ao Requerido deve ser devidamente esclarecida.
In specie, tais situações ora trazidas a lume repercute na modificação do quantum debeatur, conduzem à iliquidez dos valores tidos como inadimplidos, descaracterizando, assim, a mora do devedor.
De modo que ilíquido o valor apontado como inadimplido, vez que os valores não computados pelo credor, abateria, se não o total, parte substancial das parcelas devidas, circunstância que afasta a mora.
Como deixou salientado o Ministro Ruy Rosado de Aguiar:
“Mora somente existe quando o atraso resultar de fato imputável ao devedor (art. 963 do Código Civil). Se a exigência do credor é abusiva, e portanto ilegítima, o devedor que não paga o que lhe está sendo indevidamente cobrado não incide em mora, pois pode reter o pagamento enquanto não lhe for dada quitação regular. O melhor comportamento do devedor é, em tal caso, promover a ação cabível para definir o valor exato do débito. (…).” (REsp n. 150.099 – MG, DJ de 08.06.98).
É também o entendimento perfilhado pelo STJ e demais tribunais, como exemplificam os acórdãos seguintes:
“MORA. Culpa do devedor. Não há mora do devedor quando inexistente culpa sua, elemento exigido pelo artigo 963 do CC para a sua caracterização. Inexistindo mora, descabe condenar em juros moratórios e em multa. Recurso não conhecido” (STJ, 4ª T., REsp. 82.560-SP, Rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR, j. 11.03.1996)
“Agravo regimental. Recurso especial. (…). Mora do devedor. Descaracterização. Cobrança de encargos ilegais. Multa e juros moratórios indevidos.
1. Segundo orientação adotada pela 2ª Seção, no julgamento do EREsp. Nº 163.884/RS, em 23/05/01, a cobrança de encargos ilegais pelo credor descaracteriza a mora do devedor. O ato do credor causa a sua inadimplência.
2. Agravo regimental desprovido” (STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp. nº 257.836-RS, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJU de 24.09.2001).
É cediço que o processo se subordina a requisitos e condições essenciais à sua própria existência e eficácia e a tutela jurisdicional não é obtida por meio de qualquer manifestação de vontade perante o órgão judicante, devendo obedecer a alguns requisitos básicos previstos na lei processual.
Como bem preleciona Humberto Theodoro Júnior, citando Ada Pellegrini Grinover:
"Por isso mesmo, incumbe ao juiz, antes de entrar no exame do mérito, verificar se a relação processual que se instaurou desenvolveu-se regularmente (pressupostos processuais) e se o direito de ação pode ser validamente exercido, no caso concreto (condições da ação)." (In" Curso de Direito Pro-cessual Civil - Volume I ", Ed. Forense, 20ª edição, 1997, p. 52)
O Código de Processo Civil de 2015 extinguiu, como categoria, as condições da ação, notando-se, contudo, que o instituto foi extinto, mas seus elementos permaneceram intactos, tendo sofrido tão somente um deslocamento. Tomando-se o fato de que o magistrado realiza dois juízos (de admissibilidade e mérito), o novo CPC buscou separar os elementos integrantes das condições da ação alocando-os em pressupostos processuais (relativos ao juízo de admissibilidade da ação) e como questão de mérito.
Informa-nos o artigo 17 do CPC 2015: “Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”. Tem-se, portanto, que o interesse de agir e a legitimidade ad causam passaram a ser tratados como pressupostos processuais e, dessa forma, verificando o juiz, ao receber a inicial, que se encontram ausentes interesse de agir ou legitimidade ad causam, indeferirá a petição inicial. Nesse sentido:
Art. 330. A petição inicial será indeferida quando: (..); II - a parte for manifestamente ilegítima; III - o autor carecer de interesse processual; [GRIFO NOSSO]
Caso for verifique-se a ausência de um desses pressupostos após a fase postulatória, será declarada a carência da ação. Afirma o art. 485. CPC 2015:
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...); VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;
A possibilidade jurídica do pedido, por sua vez, passou a ser considerada questão de mérito, pois quando a parte apresenta demanda de manifesta impossibilidade jurídica, por certo não se trataria de carência da ação, mas sim de uma verdadeira improcedência do pedido, resolvendo-se, assim, o mérito.
Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;
Dentre as condições da ação, inclui-se a possibilidade jurídica do pedido, que se constitui em verificar se o pedido é hábil, em tese, para ser atendido pelo ordenamento jurídico em vigor. Dessa feita, para a análise das condições da ação, o magistrado não deve julgar o mérito da lide, limitando-se a verificar se a mesma está adequada ao provimento pretendido.
Assim é que, no caso específico da ação de reintegração de posse, deve-se constatar a existência da posse do autor e a ocorrência do esbulho que, no caso, decorre da mora, ensejadora do esbulho possessório, quando há impontualidade no pagamento da dívida ou de uma de suas parcelas, sem, no entanto, impedir o adimplemento da obrigação.
No caso vertente, discute-se a existência da inadimplência do Requerido e, consequentemente, o esbulho por este praticado. Isso porque o esbulho que justificaria a rescisão contratual e a reintegração de posse depende da presença da inadimplência ou mora do devedor, o que pende de liquidação, não havendo liquidez e certeza do crédito e, portanto, ausente a exigibilidade.
A impontualidade do pagamento nas condições vislumbradas nos autos não significa inadimplemento da obrigação, porquanto paira dúvida, em torno do débito atribuído ao Requerido, inviabilizando, desse modo, a procedência do pedido.
Desta maneira, está desfeita a constituição em mora, pretensamente obrada pela Notificação do Requerido, vez que tem esta tão somente a aparência de legitimidade.
Numa análise simplória da TEORIA DA APARÊNCIA, à luz do magistério de Vicente Ráo, colhem-se:
São seus requisitos essenciais objetivos: a) uma situação de fato cercada de circunstâncias tais que manifestamente a apresentem como se fora uma situação de direito; b) situação de fato que assim possa ser considerada segundo a ordem geral e normal das coisas; c) e que, nas mesmas condições acima, apresente o titular aparente como se fora titular legítimo, ou o direito como se realmente existisse.
São seus requisitos subjetivos essenciais: a) a incidência em erro de quem, de boa fé, a mencionada situação de fato como situação de direito considera; b) a escusabilidade desse erro apreciada segundo a situação pessoal de quem nele incorreu. Como se vê, não é apenas a boa fé que caracteriza a proteção dispensada à aparência de direito. Não é, tampouco, o erro escusável, tão somente. São esses dois requisitos subjetivos inseparavelmente conjugados com os objetivos referidos acima, - requisitos sem os quais ou sem algum dos quais a aparência não produz os efeitos que pelo ordenamento lhes são atribuídos.
Efetuando uma síntese dessas idéias, Álvaro Malheiros assim conceitua a aparência de direito:
"Podemos, agora tentar descrever e dar um conceito mais preciso da aparência de direito. Nela, um fenômeno materialmente existente e imediatamente real, manifesta um outro fenômeno - não existente materialmente nem imediatamente real - e o manifesta de modo objetivo, através de sinais, de signos aptos a serem apreendidos pelos que dele se acercarem; não através de símbolos, mas pelos próprios fatos e coisas, com base num comportamento prático, normal. Manifesta-o como real, conquanto não o seja, porque essa base de relações e de ações, abstratamente verificável na generalidade dos casos, vem a falhar no caso concreto".
Abrilhanta essa monografia, o parecer do ilustre jurista Dr. Arnaldo Rizzado Juiz de Direito no Rio Grande do Sul, o qual nos esclarece que:
“As relações sociais se baseiam na confiança legítima das pessoas e na regularidade do direito de cada um. A todos incumbe a obrigação de não iludir os outros, de sorte que, se por sua atividade ou inatividade violarem esta obrigação, deverão suportar as consequências de sua atitude. A presença da boa-fé é requisito indispensável nas relações estabelecidas pelas pessoas para revestir de segurança os compromissos assumidos”.
3. DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL – VALOR DO BEM – PERCENTUAL PAGO
A teoria do adimplemento substancial não fixa critério objetivo para estabelecer o ponto exato a partir do qual se pode entender o contrato substancialmente cumprido de modo a se preferir o emprego de outros meios de execução menos gravosos contra o devedor no lugar da imediata execução da garantia.
O direito privado tem sofrido grandes transformações, preservando a sua essência individualista - liberdade e a autonomia privada -, mas orientando-se, também, para realizar melhor equilíbrio social e buscar novas preocupações éticas, sobrepondo o interesse coletivo (onde se incluiu a harmonia social), aos interesses individuais.
É tarefa do direito corrigir situações injustas a que conduziu, quando imperava na órbita política e econômica somente o liberalismo. Modernamente, o direito tende para a socialização e a moralização, com a inserção de um conteúdo mais humanístico, justo, solidário, social e ético, sem fugir de sua função econômica.
Daí a necessidade de se encarar a teoria do adimplemento substancial contratual na nova ordem jurídica, levando-se em conta a função transformadora e primordial do direito de realização da justiça.
O principal efeito das obrigações é gerar para o credor o direito de exigir do devedor o cumprimento da prestação, e para …