Direito Penal

Atualizado 14/03/2024

Excludentes de Culpabilidade

Carlos Stoever

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As excludentes de culpabilidade são conceitos importantes no direito penal brasileiro, sendo motivos para que uma pessoa não seja condenada pelo crime que cometeu.

Estudos mostram que elas estão presentes em boa parte das alegações de defesa dos réus, pois tecnicamente possuem o poder de fulminar com a pretensão punitiva - livrando o cliente de ir preso.

Neste artigo vamos entender os conceitos de cada tipo de excludente de culpabilidade, sua previsão legal e aplicação na prática penal - além de suas diferenças para com as excludentes de ilicitude.

Boa leitura!

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O que é culpabilidade?

A culpabilidade é um dos elementos centrais da teoria penal do crime, e está ligada à capacidade do agente de ser responsabilizado pelo crime cometido.

Ela está ligada à consciência da ilicitude de sua conduta.

A culpabilidade é composta por três elementos principais:

  • Imputabilidade - ideia que está relacionada à capacidade do agente compreender que está cometendo um ato ilícito, moralmente reprovável. Aqui, verifica-se a capacidade mental ou intelectual do agente.

  • Potencial consciência da ilicitude - conceito relacionado ao conhecimento do caráter ilícito da conduta pelo sujeito. Ou seja, se ele sabe que aquilo que está fazendo não é permitido. Neste caso, é o conhecimento legal do autor que é analisado.

  • Exigibilidade de conduta diversa - neste ponto, o agente tem condições mentais de saber que sua conduta é ilegal, tendo conhecimento da ilegalidade, porém, pratica o ato da mesma forma por não ter outra ação a ser praticada, por questões alheias a sua vontade. Ou seja, busca-se saber se o agente poderia ter agido de outra forma ao invés de cometer o crime.

O domínio do conceito de culpabilidade é essencial para compreender cada tipo de excludente de culpabilidade, como veremos já nos próximos tópicos.

O que é a teoria da tipicidade conglobante?

A teoria da tipicidade conglobante tem por base uma visão maior da tipicidade, indo além da exata correspondência entre o tipo penal previsto em lei e a conduta.

Ela busca analisar elementos externos, bem como as causas que originaram a conduta praticada.

Estude-se, então, a potencial consciência da ilicitude, os motivos da prática do delito, a exigência de um comportamento diverso e as circunstâncias em que ele ocorre - para que, então, faz-se um juízo criminal do indivíduo.

Esta teoria é a base para todos os tipos de excludentes existentes no ordenamento jurídico brasileiro.

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O que é a excludente de culpabilidade?

A excludente de culpabilidade ocorre quando o agente não pode ser responsabilizado pelo ato cometido.

No direito penal, as excludentes de culpabilidade são situações que, como o nome sugere, afastam a culpabilidade do agente, por algum motivo que impede que o crime tenha sido praticado de forma deliberada e intencional.

Ou seja: o sujeito não tem capacidade cognitiva plena para ter ciência do ato ilícito que praticou e, por isso, não pode ser responsabilizado.

Quais são as excludentes de culpabilidade?

Atualmente, as excludentes de culpabilidade são: inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou com retardo, erro de proibição, coação moral irresistível e obediência hierárquica.

Vamos conhecer cada hipótese de excludente de culpabilidade.

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Inimputabilidade por Doença Mental ou Desenvolvimento Mental Incompleto ou com Retardo

O agente que, no momento da prática da ação ou da emoção, estiver acometido de doença mental, ou esteja com seu desenvolvimento mental incompleto ou com retardo, é considerado incapaz de compreender a dimensão ilícita de sua atitude, sendo considerado inimputável.

Conforme o grau de seu discernimento, é possível a aplicação de medidas alternativas à prisão, sendo sujeitos a medidas de segurança, como a internação para tratamento psiquiátrico e tratamento ambulatorial.

A previsão legal deste tipo de excludente de culpabilidade está no Art. 26 do Código Penal Brasileiro:

Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Os menores de 18 anos são considerados inimputáveis, ficando sujeitos às normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois serem pessoas com sua mente ainda em formação.

A previsão da menoridade penal está no Art. 27 do Código Penal.

Erro de Proibição

O erro de proibição acontece quando o agente pensa estar agindo de acordo com a lei.

Parte-se aqui da premissa do Art. 21 do Código Penal Brasileiro, que traz a máxima de que ninguém pode se escusar de conhecer a lei penal - vejamos:

Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.

Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

Com isso, se o erro é absoluto e inevitável, a culpabilidade é afastada - porém, se ele poderia ser evitado, não há a exclusão da culpabilidade, mas a redução da pena de 1/6 a 1/3.

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Coação Moral Irresistível

A coação moral irresistível ocorre quando alguém pratica o ato ilícito sob a influência de um agente externo, que o impediria de adotar outra atitude.

Sua previsão legal advém do Artigo 22 do Código Penal:

Art. 22 - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.

A coação, porém, é um conceito que merece atenção, pois ela só é uma excludente de culpabilidade se for inevitável - o que ocorre quando há uma chantagem com arma de fogo, ou pondo em risco algum ente familiar do agente.

Além disso, a coação deve ter sido causa direta para a prática do ato, tendo uma relação de causa e efeito.

Obediência Hierárquica a Ordem Não Manifestamente Ilegal

Também prevista no Art. 22 do Código Penal, a obediência hierárquica está ligada ao cumprimento de uma ordem de um superior para a prática de um ato.

É relevante mencionar que, para ser enquadrada como uma excludente de culpabilidade, esta ordem do superior hierárquico não pode ser manifestamente ilegal, situação esta em que se exige do agente a recusa no cumprimento da ordem.

Qual a consequência da excludente de culpabilidade no Código Penal Brasileiro?

Caso seja aplicada alguma excludente de culpabilidade, reconhece-se que a conduta é típica e ilícita, porém também que aquele que a praticou não tinha condições de compreender sua ilegalidade.

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O que são as excludentes de ilicitude?

As excludentes de ilicitude são as situações em que uma conduta que configuraria um crime não é considerada ilícita por questões específicas ligadas ao caso em concreto.

Elas são bastantes confundidas com as excludentes de culpabilidade, porém possuem uma matriz teórica distintas.

Para começar, vamos primeiro entender cada hipótese de exclusão de ilicitude.

Legítima Defesa

Prevista no Artigo 25 do Código Penal, a legítima defesa ocorre quando alguém usa dos meios necessários, de forma moderada, para repelir uma agressão - que pode ser atual ou estar na iminência de acontecer - e, com isso, acaba cometendo um ato ilícito.

Ela pode ocorrer contra si ou contra terceiros.

O exemplo clássico da legítima defesa ocorre quando, ao tentar se livrar de um assalto a mão armada, a vítima acaba atingindo o agente com um tiro.

Estado de Necessidade

O estado de necessidade é configurado quando alguém busca salvar alguém de um perigo real e iminente, provado por fatores externos à sua vontade.

Ele está previsto no Artigo 24 do Código Penal, e tem um fator de proporcionalidade envolvido - ou seja, não se admite que para salvar alguém de um perigo seja cometido um crime grave, manifestamente desproporcional.

Além disso, a conduta deve ter sido praticada pois não havia qualquer outra possibilidade de comportamento do indivíduo.

Estrito Cumprimento do Dever Legal

Já o estrito cumprimento do dever legal, previsto no Artigo 23 inciso III do Código Penal, está relacionado ao exercício profissional, como ocorre no caso de crimes cometidos por policiais em ação de combate ao crime.

Neste caso, também o fator proporcionalidade é analisado no caso em concreto.

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Exercício Regular de Direito

Também previsto no Artigo 23 inciso III do Código Penal, o exercício regular de direito ocorre quando alguém pratica um ato ilícito dentro de sua esfera de direitos, conhecida, inclusive, pela vítima.

É o caso de lesões decorrentes da prática esportiva, sem excessos e dentro das regras do esporte.

Quais as consequências das excludentes de ilicitude?

Com a ocorrência de alguma excludente de ilicitude, a conduta, mesmo típica, não é considerada ilegal, por ter sido praticada em uma das hipóteses autorizadas em lei.

Ou seja: a lei expressamente afasta a ilicitude da conduta, não podendo o indivíduo ser considerado culpado.

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O que são as excludentes de tipicidade?

As excludentes de tipicidade são situações que afastam o viés criminoso do ato.

A seguir, vamos adentrar a cada uma das hipóteses de excludentes de tipicidade presentes no direito penal brasileiro.

Adequação Social

A adequação social significa que o ato praticado, embora previsto como ilícito na legislação, é socialmente tolerado, não sendo criminalizado na doutrina e na jurisprudência.

Ou seja: sua tipicidade existe, porém a sociedade não reprime a conduta.

É o caso da circuncisão feita em um judeu.

Princípio da Insignificância ou Bagatela

O princípio da insignificância ou da bagatela é um tema antigo no direito, e se refere ao fato do bem jurídico lesado pelo autor ser de valor tão ínfimo que não valha a pena movimentar o Poder Judiciário para sua represália.

É o caso do furto de uma galinha ou de bens de pequeno valor.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça enfrentou a aplicação do princípio da insignificância, entendendo que não basta avaliar o valor do bem, mas sua dimensão na vida de quem comete o crime e da vítima.

Com isso, alinhou-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, de que a aplicação do princípio da insignificância deve ser feita diante de quatro aspectos:

  • Mínimo ofensividade da conduta;

  • Ausência de perigo social na ação;

  • Reduzido grau de reprovabilidade da conduta;

  • Inexpressividade da lesão do bem jurídico.

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Consentimento do Ofendido

O consentimento do ofendido ocorre quando a vítima autoriza, tolera e concorda com a prática da ação, esvaziando qualquer possível ofensa ao bem jurídico em questão.

É o caso da realização de uma cirurgia ou tatuagem, que afasta a lesão corporal.

É importante lembrar que alguns crimes tem como base a impossibilidade de discernimento da vítima, como ocorre no caso de estupro de vulnerável ou de menor de idade.

Legítima Defesa Putativa

A legítima defesa putativa ocorre quando o agente imagina que a vítima esteja sofrendo um ato ilícito, porém, na realidade, ela não está.

Há, aqui, um erro legítimo, escusável, sendo impossível que se tivesse certeza de que a situação enfrentada não era criminosa.

É o caso daquele que dispara contra uma sombra em seu jardim, pensando ser um ladrão - mas é seu cachorro.

Quais as consequências da excludente de ilicitude?

Com a aplicação de alguma excludente de ilicitude, a conduta deixa de ser considerada crime, por não se enquadrar adequadamente à descrição do tipo penal.

Qual a diferença entre excludente da culpabilidade, ilicitude e tipicidade?

Embora sejam conceitos similares e comumente confundidos entre si, a excludente de culpabilidade, de ilicitude e de tipicidade possuem diferenças relevantes em suas definições.

Primeiro, a excludente de culpabilidade diz respeito à própria natureza da conduta, ou seja, em um primeiro momento a ação/omissão parece se enquadrar no tipo penal - porém, por algum motivo, ela deixa acaba por ser desenquadrada.

Já a excludente de ilicitude, também chamada de antijuricidade, ocorre quando a conduta é de fato enquadrada em um tipo penal e pode ser considerada ilícita na maioria das situações - porém, a lei permite sua prática em determinadas hipóteses.

Por fim, as excludentes de culpabilidade são casos em a conduta é típica e ilícita, porém, quem a pratica não pode ser responsabilizado por não ser culpável.

Ou seja, ela está ligada não à conduta, mas à capacidade de discernir do indivíduo.

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Conclusão

Como vimos, a culpabilidade é um dos conceitos mais complexos do direito penal, estando intimamente ligado à criação do próprio tipo penal no ordenamento jurídico.

E, em anos de advocacia, acompanhamos diversos processos penais em que teses envolvendo excludentes de culpabilidade foram trazidas de forma exitosa.

Em nossos escritórios, a área penal sempre se desenvolveu buscando um julgamento justo, o que envolve a análise da culpabilidade do sujeito em cada caso.

Também vimos muitos estagiários se depararem com questões sobre o tema, tanto na prova da OAB como em concursos públicos.

Não há dúvida que um tema relevante, e uma das causas mais comuns absolvição criminal.

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Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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