Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA CRIMINAL DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
AUTOS n° $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já devidamente qualificado nos autos da Ação Penal Pública em epígrafe, que lhe move o Ministério Público do Estado de Santa Catarina, por intermédio de seu defensor dativo nomeado, vem, à presença de V. Exa., apresentar as
ALEGAÇÕES FINAIS em homicídio doloso
consubstanciadas nos fatos e fundamentos jurídicos a seguir expostos.
I – BREVE SÍNTESE DO PROCESSO
O acusado vem sendo processado pela prática dos delitos previstos nos artigos 121, parágrafo 2, inciso I, e 155, parágrafo 4, inciso I, ambos do Código Penal.
A denúncia foi recebida à fl. 158.
Às fls. 167/168 o acusado apresentou sua resposta à acusação, requerendo sua absolvição.
Durante a instrução criminal foram ouvidas testemunhas e interrogado o acusado as fls. 247/248.
As Alegações Finais do nobre representante do Ministério Público foram acostadas às fls. 255/264 dos autos.
É a breve síntese dos autos.
II - DA FUNÇÃO DA DECISÃO DE PRONÚNCIA
A função da pronúncia, concessa venia, não pode ser esquecida quando da sentença que Vossa Excelência proferirá no final dessa primeira fase do procedimento dos crimes dolosos contra a vida (judicio acusationis), vez que essa decisão atua como garantia da liberdade, evitando que o acusado venha a ser condenado quando não mereça.
A função da pronúncia é a de impedir que um inocente seja submetido aos riscos do julgamento social irrestrito e incensurável, tendo em vista que o veredito do júri, por ser qualificado pela soberania dos jurados, é irreformável em determinadas circunstâncias, bem como não é fundamentado.
O Tribunal Popular do Júri é o juiz natural dos crimes dolosos contra a vida e isto não se pode negar.
Todavia, nos casos em que a condenação pode significar uma injustiça, deve o Juiz togado, na primeira fase, por meio da triagem que obrigatoriamente é feita, garantir a inocência do acusado.
De mais a mais, a sentença de pronúncia não é mero despacho de expediente, motivo pelo qual não podemos nos esquecer do porquê de tão importante ato processual, vez que a garantia da liberdade também está na decisão de pronúncia.
Desse modo, é na decisão de pronúncia que o Magistrado deve desbastar a pedra embrutecida da acusação, deixando-a enxuta e polida, eliminando seus eventuais excessos e garantindo ao réu uma acusação justa e adequada aos princípios garantistas do direito penal.
Enfim, é aqui, neste momento processual (final da primeira fase do procedimento do júri), sob a égide do contraditório e no interesse da aplicação justa da lei penal, que devem ser eliminados os eventuais excessos constatados na vestibular acusatória, a fim de enxugar o tema da acusação.
III – DA ANALISE DAS PROVAS
Não obstante a exposição nas Alegações Finais de autoria do ilustre representante do Ministério Público, na qual é pedida a pronúncia do acusado, a acusação contida na denúncia é de evidente improcedência, em face dos excessos que contém.
Está narrado, no depoimento policial transcrito,que
“[...] Que relata o interrogado ter desferido as facadas que mataram a vítima GILVANA LEITE [...]” (fl. 130)
No entanto, no video contendo o seu depoimento policial falado e na íntegra, o mesmo deixa bem claro,aos 29:43,que:
“[...] Que minha intenção não era essa [...]” (29:43)
Posteriormente, no seu interrogatório em juízo, o acusado confessa a prática do crime.
No entanto, em que pese a confissão do crime por parte do acusado, a conduta deve ser desclassificada para o delito de homicídio culposo, pelo ausência de intenção de matar, ou ao menos a qualificadora de motivo torpe deve ser afastada, conforme a fundamentação jurídica que será exposta a seguir.
IV – DO DIREITO
IV.I – Do Crime de Homicídio Qualificado
Diante da confissão espontânea do acusado, a defesa postula a desclassificação do crime de tentativa de homicídio qualificado para o crime de homicidio culposo, pois flagrante que o acusado não teve intenção de matar (animus necandi) a vítima.
Nesse sentido, cita-se o disposto no artigo 121, parágrafo terceiro, do Código Penal:
Homicídio culposo
§ 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)
Pena - detenção, de um a três anos.
Segundo Norberto Avena:
[...] a decisão mencionada no art. 419 do CPP é aquela que desclassifica o delito para outro que não seja doloso contra a vida. Trata-se de decisão interlocutória simples, que não faz cessar o andamento do processo, implicando como regra, no encaminhamento dos autos a outro juízo, para que lá seja concluído" (Processo Penal Esquematizado. 7.ed. São Paulo: Método, 2009. p. 731).
Cita-se ainda a Lição de Guilherme de Souza Nucci
O juiz somente desclassifica a infração penal, cuja denúncia foi recebida como delito doloso contra a vida em caso de cristalina certeza quanto à ocorrência de crime diverso daqueles previstos no art. 74, § 1º, do Código de Processo Penal (homicídio doloso, simples ou qualificado; induzimento, instigação ou auxílio a suicídio; infanticídio ou aborto). Outra solução não pode haver, sob pena de ser ferir dois princípios constitucionais: a soberania dos veredictos e a competência do júri para apreciar os delitos dolosos contra a vida (Tribunal do Júri. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 88).
É necessária analisar se existem elementos que permitam admitir que a conduta do acusado guarda relação com o tipo penal do homicídio qualificado, ou seja, o reconhecimento do dolo de matar.
No caso, percebe-se que o acusado não agiu impelido de animus necandi, pois ausente prova a indicar que desejava um resultado gravoso.
A situação fática dos autos, a partir da tomada de depoimentos feita pela magistrada a quo, demonstra no máximo a ação foi perpetrada com imprudência ou negligência, não se enquadrando a conduta entre os crimes que devem ser apreciados nos crimes dolosos, que devem ser julgados pelo Tribunal do Júri.
Os elementos probatórios revelam indícios de que no máximo o agente não pretendia ceifar a vida da vítima.
Nesse passo, o acusado, na delegacia, contou ter desferido golpes de faca contra a vítima para que lhe assustar.
Dessa forma, os elementos contidos nos autos não apontam indícios de que a intenção do acusado era de ceifar a vida da vítima, razão pela qual a imputação do delito de homicídio doloso deve ser desclassificada para o delito de homicídio culposo.
A esse respeito, já decidiu o Egrégio TJSC:
RECURSO CRIMINAL. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO SIMPLES (ART. 121, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL). CRIME PERPETRADO POR POLICIAL MILITAR.RECURSO DA DEFESA.
PRETENSA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. RECONHECIMENTO DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE DO ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL (ART. 23, III, DO CÓDIGO PENAL). INOCORRÊNCIA. VERSÕES DIVERSAS PARA OS FATOS. CAUSA DE EXCLUSÃO DA ILICITUDE QUE DEVE EMERGIR DE FORMA CRISTALINA E ESTREME DE DÚVIDA DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PLEITO AFASTADO.
PRETENDIDA DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO. TESE DE AUSÊNCIA DE DOLO NA AÇÃO. ELEMENTOS PROBATÓRIOS QUE AFASTAM O ANIMUS NECANDI. DISPARO COM ARMA DE FOGO COM PROJÉTIL NÃO LETAL. DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARCIALMENTE (TJSC, Recurso Criminal n. 2014.050208-8, de Balneário Camboriu, rel. Des. José Everaldo Silva, j. 21-10-2014).
Porém, na remota hipótese de Vossa Excelência não desclassificar a conduta para homicídio culoposo, deve ser reconhecido que o homícidio doloso se deu na sua forma simples, e não …