Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE CIDADE - UF
Processo nº Número do Processo
Nome Completo, nacionalidade, estado civil, profissão, portadora do Inserir RG e inscrita no Inserir CPF, residente e domiciliada na Inserir Endereço, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado in fine assinado, com fulcro no art. 336 do NCPC apresentar
CONTESTAÇÃO
à ação proposta pelo MUNICÍPIO DE Razão Social, já qualificados nos autos do processo em epigrafe.
1. DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA
Inicialmente, requer os benefícios da Gratuidade da Justiça, na sua integralidade, nos termos dos arts. 98 e 99 do CPC, por não possuir condições financeiras para arcar com o pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, sem prejuízo do próprio sustento e de sua família, conforme declaração de hipossuficiência em anexo.
2. DA VERDADE DOS FATOS
A assistida reside no imóvel desde que nasceu, ou seja, há 68 anos, recendo a casa de seus falecidos pais. Atualmente a demandada reside no imóvel com seu filho de nome Informação Omitida.
Ao contrário do que aponta a municipalidade, o imóvel não apresenta risco iminente de desabamento, tanto que passados quase quatro anos da propositura da demanda, absolutamente nada aconteceu.
Por outro lado, embora não haja licença do Poder Público para construir, tal fato por si só não justifica e enseja a pretensão demolitória, especialmente porque a toda evidência, depois de décadas no local, operou-se o fato consumado.
Sabe-se que a Administração possui Poder de Polícia para fiscalizar a realização de obras a serem realizadas pelos particulares, podendo para tanto embargar ou aplicar sanção pecuniária na hipótese de descumprimento do Código de Postura. Contudo, após concluídas as obras e estando o particular residindo há décadas, a pretensão autora acaba por ser manifestamente desproporcional e desnecessária. Restaria, outrossim, tão somente a possibilidade de aplicação de multa, caso não haja sido atingida pela prescrição.
Ao se franquear a pretensão autoral, estaria o Judiciário possibilitando que a grande maioria dos imóveis do Município do Razão Social sofra o mesmo destino, o que a toda evidencia é algo inimaginável, a não ser que se pense num cenário de Guerra Mundial ou em alguma operação de caça às pessoas miseráveis e hipossuficientes.
A pretensão da autora, sem oferecer qualquer medida em compensação – inclusão da demanda em programa social de Habitação ou garantia de aluguel social –, viola diretamente a dignidade da pessoa humana e o direito à moradia. Ao se pretender um ato deste porte, a demolição, deve-se analisar, primeiramente, a repercussão que tal conduta terá na vida da promovida e de sua família, bem como as condições de sobrevivência que o afetado terá após a prática desse ato, já que também é dever do Poder Público garantir uma moradia digna aos cidadãos.
3. DO DIREITO
- FATO CONSUMADO – IMÓVEL CONSTRUÍDO HÁ DÉCADAS
Conforme apontado acima, a promovida recebeu o imóvel onde reside de deus falecidos pais, de modo que ela reside ali desde que nasceu, há mais de 60 anos.
Como se sabe, a teoria do fato consumado aplica-se em situações excepcionalíssimas, nas quais a inércia da administração ou a morosidade do Judiciário deram ensejo a que situações precárias se consolidassem pelo decurso do tempo.
Com efeito, a pretensão demolitória apresenta-se completamente desproporcional e descabida, uma vez que não se pode permitir que o Poder Público busque a demolição do único imóvel depois de décadas, inclusive com sucessão legislativa sobre a matéria, como se a Administração possuísse o poder perpétuo de sancionar situações de fato consolidadas.
- DA GARANTIA DO DIREITO À MORADIA – DESPROPORCIONALIDADE DA PRETENSÃO
O Direito à Moradia é direito fundamental social, amparado no art. 6° da Constituição Federal e respaldado em diversas Convenções Internacionais assinadas e ratificadas pelo Estado Brasileiro. É dever do Estado, pois, concretizá-lo, dada a justiciabilidade e a aplicabilidade direta daquele direito.
Nesse cenário, não se pode perder de vista que o Estado de Pernambuco dispõe de legislação específica (Lei 15.211/2013), a qual estabelece a política estadual de regularização fundiária, “autorizando o Poder Executivo, com base nos fundamentos, objetivos e instrumentos disciplinados nesta Lei, e nas Leis Federais nº 10.257/2001 e 11.977/2009, a regularizar as ocupações de imóveis de domínio do Estado de Pernambuco”.
Dois notáveis instrumentos para a regularização fundiária emergem da citada Lei: A concessão do Direito Real de Uso e a Concessão de Direito Real para Fins de Moradia.
A regularização fundiária, nesse contexto, assume caráter de extrema importância, pois se relaciona, de modo direto, à concretização de um direito fundamental. O Direito à Moradia, assim como o direito à saúde e o direito à vida, integra o conceito de mínimo existencial, não se sujeitando, assim, a critérios de conveniência e oportunidade da Administração Pública. De igual forma, no caso concreto, sequer se pode falar em questões orçamentárias – famigerada “reserva do possível” – visto que o pleito não atinge os cofres públicos.
Por estar contido um plexo básico de direitos a ser obrigatoriamente garantido, é certo que os instrumentos de regularização jurídico-fundiária constituem verdadeiro direito subjetivo de quem pretende ver o direito à moradia reconhecido. Não pode a Administração Pública apoiar-se em critérios de discricionariedade para não efetivar direitos básicos já garantidos pelo texto constitucional. Ora, a própria legislação estadual restringe-se à delimitação dos requisitos textualmente apontados para a concessão do Direito Real de Uso ou Concessão Especial do para fins de Moradia, não CRIANDO qualquer outra limitação, nem informando outro aspecto a ser considerado. Inadmitir o pleito com base em critérios não descritos na lei afronta radicalmente a legislação estadual.
Ademais, a fim de assegurar a plena concretude do Direito à Moradia, deve o Município do Razão Social ser intimado, caso sua pretensão seja aceita, com o objetivo de assegurar, em conjunto com o Estado de ESTADO, o plano de regularização fundiária. Frise-se que o Município, de acordo com o Estatuto das Cidades, é incumbido da função precípua de executar a política urbana, a qual deverá ter por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. Tal política urbana deve ser inclusiva, garantindo a todos o direito à cidade e à moradia digna.
Ademais, o direito à moradia, direito fundamental garantido na Constituição Federal, não pode ser tolhido ou afastado sob o argumento de falta de recursos públicos, não havendo como subsistir a conhecida teoria da reserva do possível:
A cláusula da reserva do possível – que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição – encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. (...) A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV). [ARE 639.337 AgR, rel. min. Celso de Mello, j. 23-8-2011, 2ª T, DJE de 15-9-2011.]
Desta feita, inexistindo o alegado risco de desmoronamento, a pretensão autoral, com base na alegada falta de licença para construção, não encontra guarida nas normas constitucionais.
4. DA RECONVENÇÃO
Como apontado, a autora reside a décadas no imóvel onde existe, sendo pessoa absolutamente hipossuficiente e sem qualquer condição de ter outra moradia por conta própria.
Na pior das hipóteses, em sendo julgado procedente o pedido formulado pelo Município, deve este, evidentemente proporcionar meios para que a demandada tenha uma outra moradia.