Decadência
Atualizado 25/03/2025
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A decadência consiste na perda de um direito material em razão da inércia do seu titular durante um prazo determinado pela lei ou estabelecido por contrato.
Esse instituto jurídico visa proteger a segurança das relações jurídicas, evitando que determinados direitos permaneçam indefinidamente sujeitos à possibilidade de exercício tardio.
No caso da decadência, ela se aplica pelo decurso do tempo em uma relação jurídica de direito potestativo.
Neste artigo, abordaremos os prazos decadenciais, destacaremos as diferenças entre decadência e prescrição, além de esclarecer sua distinção em relação a outros institutos jurídicos relevantes, como a perempção e a preclusão.
Qual a diferença entre prescrição e decadência no Direito Civil?
A principal diferença entre prescrição e decadência no Direito Civil está relacionada à natureza do direito envolvido.
A prescrição refere-se à perda do prazo para o exercício de uma pretensão judicial, sem extinguir o direito material propriamente dito. Portanto, mesmo após prescrita uma pretensão, ainda pode ser possível exercer o direito material por outras vias. Por exemplo, na prescrição da cobrança de um cheque, embora não seja mais possível ajuizar uma ação executiva, o credor ainda pode cobrar a dívida por meio de uma ação ordinária.
Já a decadência implica a perda do próprio direito material, impedindo definitivamente seu exercício, seja judicial ou extrajudicialmente. Uma vez decaído o direito, o titular não poderá exigi-lo por nenhum outro meio.
Outra distinção relevante é que, enquanto na prescrição é possível renunciar ao prazo legal já consumado, na decadência estabelecida por lei essa renúncia é vedada expressamente.
Em síntese, enquanto a prescrição extingue a pretensão judicial, a decadência extingue o próprio direito material.
O que é decadência convencional?
Decadência convencional é aquela estabelecida pelas próprias partes em um contrato, fixando um prazo específico dentro do qual um direito deve ser exercido. Caso não haja o exercício desse direito dentro do prazo estipulado, ocorre a extinção definitiva desse direito.
Diferentemente da decadência legal, cujo prazo é previsto diretamente em lei, a decadência convencional surge da vontade dos contratantes, sendo fruto da autonomia privada.
De acordo com o art. 211 do Código Civil, a decadência convencional só pode ser fixada quando não for vedada expressamente por lei, devendo ser estabelecida por escrito, indicando claramente o prazo e o direito sujeito à decadência.
Em resumo, decadência convencional é o prazo acordado entre as partes para exercer determinado direito, que, uma vez esgotado, extingue automaticamente tal direito.
Quais são os direitos imprescritíveis no direito brasileiro?
No Direito Civil brasileiro, alguns direitos são considerados imprescritíveis, ou seja, podem ser exercidos ou exigidos independentemente do decurso do tempo.
Um exemplo clássico são os direitos da personalidade, como os direitos à honra, à imagem e à privacidade, que não se submetem a prazos prescricionais.
Além disso, o Supremo Tribunal Federal consolidou, por meio da Súmula nº 149, o entendimento de que o direito ao reconhecimento da paternidade é imprescritível.
Contudo, fez uma ressalva importante ao afirmar que o direito à herança prescreve normalmente.
Vejamos:
Súmula . 149 - STF: É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança.
Existem ainda outros direitos considerados imprescritíveis, como o direito da Administração Pública sobre seus bens públicos e o direito de buscar ressarcimento ao erário pelos danos causados por particulares.
Ademais, são igualmente imprescritíveis as pretensões penais relativas a crimes contra a humanidade, crimes contra o Estado Democrático de Direito, crimes hediondos e o crime de racismo.
Qual o início e término dos prazos da prescrição e da decadência?
O início dos prazos prescricionais e decadenciais ocorre com a ciência da violação do direito por parte do seu titular, conforme previsto pelo artigo 189 do Código Civil:
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.
Entretanto, é necessário analisar cuidadosamente cada situação para identificar exatamente o momento em que ocorreu a violação do direito e quando seu titular tomou conhecimento dessa violação.
Esses dois aspectos (violação e ciência) são decisivos para determinar o início exato da contagem dos prazos.
Em sua contagem é importante recordar da regra de contagem do prazo estabelecida no Artigo 132 da Lei n. 10.406/2002 (CC), segundo a qual os prazos estabelecidos em meses e anos são computados a partir do dia correspondente ao início do prazo, encerrando-se no dia de igual número nos meses ou anos subsequentes.
Já o termo final dependerá do prazo indicado em cada dispositivo legal, como veremos a seguir.
Onde localizar os prazos prescricionais e decadenciais no Código Civil?
Os prazos prescricionais estão localizados nos Art. 205 e Art. 206 do Código Civil.
Sobre a decadência, a Lei n. 10.406/2002 (CC) traz alguns conceitos gerais nos Artigos 207 a 211, vejamos:
Art. 207. Salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.
Art. 208. Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.
Art. 209. É nula a renúncia à decadência fixada em lei.
Art. 210. Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência, quando estabelecida por lei.
Art. 211. Se a decadência for convencional, a parte a quem aproveita pode alegá-la em qualquer grau de jurisdição, mas o juiz não pode suprir a alegação.
Porém, os prazos decadenciais não estão concentrados em um único artigo do Código Civil, estando espalhados ao longo de suas seções.
A título de exemplo, podemos citar os artigos a seguir, que tratam das formas como ocorre a decadência:
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Constituição da Pessoa Jurídica: Art. 45 do CC;
-
Administração da Pessoa Jurídica: Art. 48 do CC;
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Vício Redibitório: Art. 445 do CC;
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Compra e Venda (Direito de Propriedade): Art. 501 do CC;
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Empreitada: Art. 618 do CC;
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Poder Familiar: Art. 1.728 do CC;
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Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90): Art. 26;
-
Constituição de Débitos pelo Estado: Art. 173 do CTN;
Repare, assim, que em todos os casos se está diante de normas de direito civil, que se referem a um direito material a ser exercido por seu titular.
E em que casos a prescrição não ocorre?
A prescrição não ocorre, ou o prazo prescricional não transcorre nos casos específicos previstos no Código Civil.
As hipóteses em que não corre o prazo prescricional estão previstas nos Artigos 197 a 199 do Código Civil, que trazem os casos em que fica suspenso o curso da prescrição:
Art. 197. Não corre a prescrição:
I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;
II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;
III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3 o ;
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:
I - pendendo condição suspensiva;
II - não estando vencido o prazo;
III - pendendo ação de evicção.
Já no Artigo 202 do Código Civil constam as causas de interrupção da prescrição:
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;
III - por protesto cambial;
IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;
V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.
É importante lembrar que a interrupção da prescrição só pode ocorrer uma única vez, e ela é personalíssima - ou seja, havendo mais de um interessado, a prescrição será interrompida de forma individual, para cada um, não aproveitando aos demais.
E, uma vez interrompida, ela volta a correr do início, fluindo integralmente o novo prazo.
Qual a diferença entre prescrição, preclusão e decadência?
Prescrição, preclusão e decadência são institutos jurídicos distintos quanto à natureza e aos efeitos jurídicos produzidos.
Como visto anteriormente, a prescrição refere-se à perda da possibilidade de exigir em juízo um direito material, devido à inércia do titular pelo prazo previsto em lei.
Nesse caso, extingue-se a pretensão judicial, mas o direito material permanece existente, podendo ser exercido por outras vias extrajudiciais.
A decadência, por sua vez, implica a perda definitiva do próprio direito material em razão do transcurso do prazo fixado por lei ou pelas partes. Com ela, extingue-se totalmente o direito, impedindo seu exercício posterior por qualquer meio.
Já a preclusão é um instituto processual ligado à perda da oportunidade de praticar determinado ato no curso de um processo judicial.
Trata-se da perda do prazo legalmente previsto para realizar atos específicos no processo, como, por exemplo, recorrer de uma decisão judicial. Transcorrido esse prazo sem manifestação, opera-se a preclusão, tornando irreversível a situação processual estabelecida.
Observe-se que, enquanto prescrição e decadência buscam assegurar a estabilidade das relações jurídicas materiais, a preclusão visa garantir uma tramitação ordenada e célere do processo judicial.
Qual a diferença entre perempção e decadência?
Perempção e decadência também são conceitos juridicamente distintos.
Como esclarecido anteriormente, a decadência ocorre pela perda do direito material devido ao não exercício dentro do prazo estabelecido pela lei ou contrato.
A perempção, contudo, é um instituto ligado à perda do direito de propor novamente uma ação judicial quando esta mesma ação tenha sido ajuizada e extinta por três vezes consecutivas em razão da negligência do autor quanto ao andamento processual.
No Direito Penal, a perempção representa a perda do direito de promover a queixa-crime em razão da inércia do querelante, de seu falecimento, de sua renúncia expressa ou pela ocorrência de conciliação entre as partes envolvidas.
Quais são os exemplos de direitos potestativos?
Os direitos potestativos são aqueles exercidos unilateralmente pelo titular, sem depender do consentimento ou colaboração de terceiros.
Entre os principais exemplos de direitos potestativos estão:
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A rescisão unilateral de contratos;
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A revogação de uma doação;
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A anulação do casamento;
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O desfazimento de um negócio jurídico em razão de erro, dolo ou fraude;
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A renúncia à herança;
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A desconstituição ou dissolução de pessoas jurídicas.
Esses direitos podem ser exercidos diretamente por seus titulares, produzindo efeitos que impactam diretamente a esfera jurídica de terceiros, sem que estes possam impedir ou influenciar sua realização.
O que diz o Artigo 208 do Código Civil?
O Artigo 208 do Código Civil dispõe acerca da responsabilização dos tutores e representantes legais em relação à ocorrência da decadência, perante o incapazes que representam - aplicando as mesmas regras indicadas para a prescrição, previstas nos artigos 195 e 198 inc. I.
Vejamos:
Art. 208. Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.
Agora, os artigos citados:
Art. 195. Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3 o ;
O que são prazos de direito material?
Os prazos de direito material são aqueles relacionados diretamente ao exercício ou exigibilidade de um direito antes do ajuizamento de qualquer ação judicial.
São prazos que estabelecem limites temporais para que o titular exerça direitos específicos, promovendo segurança jurídica e estabilidade nas relações sociais e econômicas.
Esses prazos podem ter natureza decadencial ou prescricional.
O prazo decadencial está ligado diretamente ao direito material, extinguindo-o definitivamente caso não seja exercido dentro do período estipulado em lei ou contrato.
Já o prazo prescricional relaciona-se ao direito de ação, ou seja, à possibilidade de buscar judicialmente a proteção de um direito material. Se o prazo prescricional se esgota sem que o titular tenha proposto ação, ocorre a perda apenas da pretensão judicial, mas não do direito material em si.
Qual o prazo para propor uma ação judicial?
O prazo para propor uma ação judicial é denominado prazo prescricional, regulamentado pelos artigos 205 e 206 do Código Civil (Lei nº 10.406/2002).
Conforme mencionado anteriormente, esse prazo varia conforme a natureza específica do direito material envolvido na demanda.
De maneira geral, o prazo prescricional é de dez anos, salvo exceções expressamente previstas no artigo 206, que estabelece prazos específicos menores, adequados às particularidades de cada situação jurídica.
Quais as súmulas do Superior Tribunal de Justiça sobre decadência?
O Superior Tribunal de Justiça possui as seguintes súmulas sobre decadência no direito civil:
Súmula 106 - STJ: Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência.
Súmula 401 - STJ: O prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível qualquer recurso do último pronunciamento judicial.
Súmula 477 - STJ: A decadência do artigo 26 do CDC não é aplicável à prestação de contas para obter esclarecimentos sobre cobrança de taxas, tarifas e encargos bancários.
Súmula 555 - STJ: Quando não houver declaração do débito, o prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário conta-se exclusivamente na forma do art. 173, I, do CTN, nos casos em que a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa.
Súmula 622 - STJ: A notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação de seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial.
Súmula 633 - STJ: A Lei n. 9.784/1999, especialmente no que diz respeito ao prazo decadencial para a revisão de atos administrativos no âmbito da Administração Pública federal, pode ser aplicada, de forma subsidiária, aos estados e municípios, se inexistente norma local e específica que regule a matéria.
Conclusão
Ao longo de nossos mais de 20 anos de advocacia, já tivemos a oportunidade de contar com centenas de advogados atuando em nossos processos - sendo uma das maiores dificuldades que vimos neles foi justamente a exata compreensão das diferenças existentes entre os conceitos de prescrição e decadência, especialmente no o efeito de cada uma delas na extinção da pretensão.
Neste artigo, pudemos explorar as características de cada um deste institutos, que envolvem o direito subjetivo de exercer determinada ação ou direito, e que, ao final, geram a perda de um direito para seu titular.
E a importância maior do conhecimento acerca de tais institutos é justamente para evitar o ingresso de ações judiciais inócuas, já atingida pela prescrição ou pela decadência legal - gerando um processo que será fatalmente perdido, pois já houve a perda da pretensão.
Além disso, sabemos que, assim como a decadência, a prescrição pode ser alegada como matéria de defesa - sendo fundamental seu domínio para a defesa dos interesses de nossos clientes.
Mais conteúdo jurídico
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Artigo sobre prescrição intercorrente.
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Modelo de contestação em ação por vício redibitório, alegando a decadência.
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