Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[processo_uf]
Processo número: $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, através de sua advogada e bastante procuradora que esta subscreve, vem, muito respeitosamente à presença de Vossa Excelência, em atenção ao r. despacho de fls. apresentar
MEMORIAIS
pelos motivos de fato e de direito que passa a expor:
1. DOS FATOS
O acusado foi denunciado pela suposta prática de tentativa de homicídio qualificado de acordo com o artigo 121, §2º, incisos I e IV e §2º-A, inciso I, c.c. artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal e foi notificado para oferecer sua resposta à acusação, por escrito, no prazo legal, nos termos do artigo 406 do Código de Processo Penal.
De acordo com a denúncia, o réu agindo com evidente ânimo homicida, por motivo torpe e contra a mulher por razões da condição do sexo feminino, tentou matar a vítima, somente não consumando o delito por circunstâncias alheias à sua vontade.
A verdade é que tanto no decorrer da fase administrativa, como na fase processual sugiram diversas provas (todas testemunhais) e relatos oficiais de Autoridades Policiais que divergem da realidade.
Tais elementos probatórios e convicções elaboradas e formadas por Autoridades Policiais acabaram por influenciar o Ministério Público e, consequentemente, fazer com que a ilustre membra do parquet entendesse, de maneira equivocada, pelo crime descrito na peça acusatória.
Assim, a Defesa de $[geral_informacao_generica] tem por objetivo demonstrar as contradições existentes, com o intuito de colaborar para que haja melhor elucidação da verdade real e, por oportuno, um julgamento baseado na persuasão racional com apoiado em fundamentos concretos e, repita-se, verídicos.
Consta da denúncia que o réu acreditou que a vítima estivesse morta e por isso não teria dado sequencia aos goles, no entanto, a própria vítima afirma à fls. 40 que o acusado deu uma facada perto de seu pescoço e que quando percebeu que este ia pegar outra faca na cozinha saiu correndo e pedindo socorro, ocasião em que o denunciado também saiu correndo, no entanto foi preso em flagrante logo em seguida. Afirma ainda que foi socorrida no PS do Cervezão sendo liberada no mesmo dia.
O que se pode perceber é que esta declaração extraída dos autos e oferecida pela suposta vítima contradiz o que foi alegado inclusive pelos Policiais Miltares que atenderam a ocorrência.
Isto porque, como poderia o réu achar que a vítima estava morta se esta afirma que saiu correndo ao notar que o indiciado ia pegar outra faca na cozinha?
Que a ilustre membra do parquet perdoe a ignorância desta patrona, porém o que se sabe da ciência é que pessoas mortas não conseguem correr! Tendo em vista que a palavra da vítima é de que saiu correndo, como poderia o autor imaginar que ela estivesse morta conforme depoimento dos Policiais Militares oferecidos na delegacia (fls. 06-09).
No mesmo sentido, reitera-se que a vítima disse que foi socorrida no PS do $[geral_informacao_generica] sendo liberada no mesmo dia novamente contrariando o depoimento ofertado no sentido de que a vítima havia sido transferida da UPA do $[geral_informacao_generica] para a UPA do bairro do Estádio e que permaneceria internada. Esta informação consta também do laudo do IML à fls. 62 que afirma que a vítima “recebeu atendimento médico no PS Cervezão desta cidade, medicada e liberada” (sic).
Não obstante, ainda à fls. 40 a vítima afirma ter recebido UMA facada perto do pescoço, sendo que os outros depoimentos falam em diversos golpes.
Inclusive as declarações em juízo acabam caindo em descrédito, tendo em vista que as testemunhas afirmam que a vítima estava caída no portão da residência, no entanto só foi observado sangue no interior do quarto do casal de acordo com fls. 95-100.
Nesse sentido o laudo do IC aponta ainda que o esfaqueamento aconteceu “Em cômodo usado como dormitório, localizado no terço posterior direito do imóvel, foi indicado pelo senhor $[geral_informacao_generica] como sendo o local onde teria ocorrido o esfaqueamento” (sic).
Ainda, o laudo não aponta nenhum vestígio de sangue no portão ou na parte de entrada do imóvel, mas apenas no chão e porta do quarto do casal.
Novamente contrariando as versões trazidas, a testemunha Samara (fls. 200) afirmou “que a vítima e réu tinham uma vida tranquila e sem brigas (...), que nunca presenciou o réu ameaçar a vítima de morte, (...) que quando ela chegou ao local, a vítima estava com a faca na mão” (sic).
Em contrapartida o PM $[geral_informacao_generica](fls. 201) afirmou “que o réu dispensou a faca depois dos fatos” (sic).
Assim, Excelência, o que se pode observar é que todos os depoimentos são absolutamente desconexos, inclusive os trazidos pelos Policiais Militares, porém em sede de audiência o acusado afirma que não tinha intenção de machucar a vítima e tão logo percebeu que havia machucado ela se evadiu do local.
Esta é a versão que nos parece mais plausível quando colocado a prova o depoimento da vítima que afirma que o réu lhe deu uma facada no pescoço e ela saiu correndo quando este também fugiu.
Não há nenhuma razão para acreditar em outra versão até mesmo porque não há testemunha ocular do crime em apreço!
2. DO DIREITO
A) DA AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI
Antes de tudo é imperioso esclarecer o animus necandi.
Não há nos autos qualquer prova ou indício de que o réu tinha intenção de matar a suposta vítima. Inclusive há manifestação contrária uma vez que o acusado declarou expressamente que não tinha intenção de sequer machucar a vítima, sendo que, desta forma, age apenas com culpa no resultado.
Agir com dolo significa que alguém tem a intenção de atingir um fim exclusivamente criminoso para causar dano a outrem o que não foi o caso do acusado.
Isto porque já superada a questão acerca da possibilidade do acusado ter se evadido do local acreditando que a vítima estava morta de acordo com o depoimento desta isso é impossível!!!!
Um crime com dolo é cometido por alguém que o comete voluntariamente. Desta forma é possível afirmar que dolo não é simplesmente a prática de um crime, mas é a prática desse crime com o objetivo consciente de praticar o crime, sem que a pessoa em questão tenha sido influenciada ou motivada por terceiros.
Assim, os elementos do dolo são: a finalidade com que o indivíduo executa um determinado ato; a determinação, para apurar se o ato foi gerado pelo praticante ou se foi uma mera resposta a uma prática criminosa anterior que obrigou o primeiro a agir em legítima defesa; conformidade do praticante de acordo com a acusação e respetiva sentença, de acordo com as provas descobertas.
A grande diferença existente entre a lesão corporal e a tentativa de homicídio consiste no elemento subjetivo visto que no crime de lesão corporal o agente tem a intenção de apenas ferir a vitima (animus laedendi), causar-lhe uma lesão corporal, enquanto que na tentativa de homicídio a intenção, ou o elemento subjetivo ou tipo objetivo da conduta, é matar a vítima (animus necandi), mas por circunstâncias alheias a sua vontade não consegue consumar o crime de homicídio, o que não diz respeito ao caso em tela.
B) DA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ
Trata-se o crime em apreço de um suposto homicídio tentado qualificado. Sempre que um crime não se consuma é importante estabelecer se houve o arrependimento eficaz, desistência voluntária ou tentativa, sendo que o animus é o que deve prevalecer.
O importante é a versão que se dá aos fatos e não o fato em si.
Consubstanciando-se NO DEPOIMENTO DA VÍTIMA, deve ser observado o instituto do arrependimento eficaz.
Isto caso seja superada a tese de desclassificação do crime de homicídio tentando para lesão corporal, o que se admite apenas por amor ao debate.
Nesse sentido, o que se pode observar é que o réu logo após o cometimento do injusto DESISTE da prática delitiva e cessa a fase executória.
Assim, admitindo-se que o réu desejava mesmo levar a ofendida a óbito, há que se falar na interrupção da prática delitiva tendo em vista que este correu ao perceber que a ofendida também correu (fls. 40).
Ainda, no mesmo sentido o arrependimento eficaz tendo em vista que o réu havia desferido a facada na vítima, entretanto correu evitando assim que se consumasse o resultado morte.
Desta forma novamente há que se falar que o acusado deve responder apenas pelos atos praticados, ou seja, pela lesão corporal como se verá adiante.
C) DA DESCLASSIFICAÇÃO DO HOMICÍDIO TENTADO
Diante do que já foi exposto, o que se pode observar é que, no máximo, o réu incorreu na prática do crime de lesão corporal leve de acordo com o caput do artigo 129 do CPP.
A postulação da desclassificação tem como argumentos basilares a natureza das lesões das vítimas, além da ausência do animus necandi conforme o já explanado.
Consoante o laudo do IML a gravidade das lesões seria avaliada “(...) através de exame complementar direto em 60 dias, de preferência no mesmo posto do IML que realizou o exame anterior (...)”, no entanto o exame foi realizado em março de 2017 e não houve nenhum tipo de exame complementar.
No mais, apesar das diversas tentativas de …