Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA DO JÚRI DA COMARCA DE $[processo_comarca] - $[processo_uf]
Processo número: $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, vem, muito respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, através de sua advogada nomeada através do Convênio firmado entre a Defensoria Pública e a OAB, em atenção ao r. despacho de fls. apresentar
MEMORIAIS
com base nos fatos e fundamentos que passa a expor:
1. DOS FATOS
O acusado foi denunciado pela suposta prática de homicídio qualificado em razão da violência doméstica, nos moldes do que prescreve o artigo 121, §2º, VI, combinado com parágrafo 2º-A, I, do Código Penal.
Isto porque de acordo com a denúncia, o acusado agindo com ânimo homicida, por motivo fútil e contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em contexto de violência doméstica e familiar, matou $[geral_informacao_generica], sua esposa, na presença física de descendente da vítima.
A verdade é que tanto no decorrer da fase administrativa, como na fase processual as provas que instruíram o processo demonstram de forma inequívoca que o réu não teve qualquer intenção de causar qualquer injusto à vítima.
2. DO DIREITO
A) DO ANIMUS NECANDI
Antes de tudo é imperioso esclarecer o animus necandi.
Não há nos autos qualquer prova ou indício de que o réu tinha intenção de matar a vítima. Inclusive há manifestação contrária uma vez que o acusado declarou expressamente que não tinha intenção de sequer machucar a vítima, sendo que, desta forma, age apenas com culpa no resultado.
No mais as próprias testemunhas declararam que o réu buscou socorrê-la tendo sido impedido.
Agir com dolo significa que alguém tem a intenção de atingir um fim exclusivamente criminoso para causar dano a outrem o que não foi o caso do acusado.
Um crime com dolo é cometido por alguém que o comete voluntariamente. Desta forma é possível afirmar que dolo não é simplesmente a prática de um crime, mas é a prática desse crime com o objetivo consciente de praticar o crime, sem que a pessoa em questão tenha sido influenciada ou motivada por terceiros.
Assim, os elementos do dolo são: a finalidade com que o indivíduo executa um determinado ato; a determinação, para apurar se o ato foi gerado pelo praticante ou se foi uma mera resposta a uma prática criminosa anterior que obrigou o primeiro a agir em legítima defesa; conformidade do praticante de acordo com a acusação e respetiva sentença, de acordo com as provas descobertas.
A grande diferença existente entre a lesão corporal e a tentativa de homicídio consiste no elemento subjetivo visto que no crime de lesão corporal o agente tem a intenção de apenas ferir a vítima (animus laedendi), causar-lhe uma lesão corporal, enquanto que na tentativa de homicídio a intenção, ou o elemento subjetivo ou tipo objetivo da conduta, é matar a vítima (animus necandi), mas por circunstâncias alheias a sua vontade não consegue consumar o crime de homicídio, o que não diz respeito ao caso em tela.
B) DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL
Tendo em vista que houve a ausência do animus necandi e que o acusado tentou socorrer a vítima tendo sido impedido por terceiros, a conclusão lógica é que não poderá responder por um homicídio, tendo em vista que o que pode se visualizar no caso em tela é um infeliz acidente tipificado no máximo como uma lesão corporal seguida de morte, tendo em vista que o réu nunca teve a intenção de matar a vítima.
O depoimento dos Policiais Militares corrobora com a tese de que o acusado foi impedido de socorrer a vítima, bem como de que o réu declarou desde o início que tudo se tratou de um acidente e que ele não teve qualquer intenção de golpeá-la.
Até mesmo o depoimento da testemunha $[geral_informacao_generica] (fls. 07) demonstra este fato quando esta diz que “$[geral_informacao_generica] queria muito pegar $[geral_informacao_generica] e colocar em seu carro. Ele dizia que queria socorrê-la. Eu não deixei ele atirar de lá e gritei pedido socorro para as vizinhas.” (sic). E continua:
Eu liguei para $[geral_informacao_generica]. Ele atendeu e só queria saber se o SAMU já havia socorrido $[geral_informacao_generica]. (...) Eu falei com $[geral_informacao_generica] umas três vezes por telefone. Na última vez que eu liguei para ele, informei que $[geral_informacao_generica] já tinha falecido. Eu perguntei para ele: “E agora?”. Ele me respondeu: “Agora nada”. Eu então passei o telefone para os policiais militares que chegaram no local e eles negociaram a rendição de $[geral_informacao_generica]. (sic).
No mesmo sentido em sede de audiência de instrução, Josefa ouvida em juízo (fls. 154-5) afirma que o réu não era violento e que correu em sua direção dizendo que teria feito uma besteira e que queria socorrer a vítima. Desta forma em seu depoimento alega que “foi um furo tão pequeno e aconteceu tudo isso com essa moça. Eu acho que foi um acidente sim. Eu acho que ele não quis fazer isso com ela não”.
Aduz ainda que ouviu a discussão do casal e que em nenhum momento ouviu a voz do réu, mas apenas a da vítima que se utilizava de palavras de baixo calão para dirigir-se ao acusado, apesar de este sempre ter tido muito cuidado com $[geral_informacao_generica], inclusive alega que “nunca imaginaria que um homem cuidaria tão bem da dieta de uma mulher como ele cuidou” quando eles tiveram o filho $[geral_informacao_generica] e continua “ele que deu o primeiro banho no $[geral_informacao_generica]”.
Inclusive quando da elaboração do Boletim de Ocorrência (fls. 02-04), a própria autoridade policial também entendeu que tudo não se tratava de um acidente apenas tendo realizado a prisão em flagrante em razão da suposta violência doméstica:
Assim, no caso em apreço frisa-se, no máximo há que se considerar a ocorrência da lesão corporal seguida (infelizmente) do resultado morte, exatamente nos moldes do artigo 129 da legislação penal brasileira que estabelece que:
Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
(...)
§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
Inclusive porque se tratava de uma discussão, em que o acusado estava sendo violentamente agredido com um cabo de vassoura pela suposta vítima - que só se enquadrou nesta situação porque foi vítima fatal do fato - no entanto jamais vítima do denunciado. Ademais este sim foi quem sofreu de fato toda a violência doméstica durante estes anos de relacionamento e estava novamente sendo atacado na data do ocorrido como corroboraram todas as testemunhas!!!!!
Vale ressaltar ainda que o fato ocorreu resultado de uma legitima defesa como será explanado a seguir e por culpa exclusiva da vítima.
A postulação da desclassificação tem como argumentos basilares a natureza da lesão da vítima, além da ausência do animus necandi conforme o já explanado.
Assim, imperioso destacar é que não pode se falar em animus necandi do réu, ou seja, a vontade de matar. Inclusive, este nunca foi condenado por nenhum tipo de ilícito e, em que pese o resultado da lesão corporal ter sido o óbito da vítima, há que se falar na desclassificação do crime de homicídio para a lesão corporal seguida de morte, sendo que ainda é possível se falar na causa de diminuição de pena prevista no §4º do supracitado dispositivo legal que estabelece que “Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço”.
Ora, Excelência, evidentemente que o réu estava sendo injustamente acusado de infidelidade. Diga-se injustamente, por que em seu aparelho celular foram encontrados apenas fotos dele mesmo com a vítima, ou seja, não foram encontrados quaisquer indícios da traição que incitou a discussão do casal. É certo que também foi encontrado o acesso a um site de relacionamentos, no entanto não há qualquer evidência de que o denunciado acessou o site ou estava se utilizando deste para manter contato com outra pessoa. E ainda que tivesse não restava ali qualquer justificativa para tamanha violência, para que a vítima lhe agredisse com o cabo de vassoura ou ainda lhe causasse injúrias.
É certo que o réu tomou as decisões erradas e deve pagar pelo injusto praticado, sendo que inclusive confessa que atingiu a vítima! No entanto é necessário que o acusado responda pelo ato praticado NA MEDIDA DO QUE EFETIVAMENTE FEZ sendo que por isso deve ser condenado, mas tão somente pela lesão corporal que infelizmente resultou na morte de sua companheira, tendo em vista que ele nunca tentou contra a vida de ninguém e não desejou em nenhum momento matar a ofendida!
Para que alguém comungue da obra comum, do delito como um todo, é necessário que haja com dolo, a vontade livre e consciente de participar. E, o dolo com a devida vênia, não foi demonstrado e tampouco comprovado pela acusação EM MOMENTO ALGUM!
Aliás, todo libelo vem a configurar única e tão-somente a CULPA do réu! Restou demonstrado que $[geral_informacao_generica] é uma pessoa do bem, nunca foi bandido, tem bons antecedentes, tem família, filhos.
Ele não é um criminoso, ele confessou que ofendeu a integridade física da vítima, mas NÃO teve a intenção de ferir ou matar alguém! $[geral_informacao_generica] é uma pessoa de boa índole, calma e mansa, o depoimento das testemunhas comprovam isso veementemente! É voltado às atividades da igreja, trabalhador, nunca sequer esteve em uma delegacia.
C) DA AUSÊNCIA DE MOTIVO FÚTIL
A motivação do fato, de acordo inclusive com as testemunhas ouvidas, foi o destempero da vítima de forma que não há que se falar em motivo fútil.
Conforme ficou exaustivamente demonstrado, não houve o animus necandi, tendo em vista que o autor, ao se dar conta que atingiu a vítima buscou socorrê-la tendo sido impedido por terceiros.
Ademais, as provas periciais, os depoimentos das testemunhas, dos policiais, estão em total desacordo com os fatos verdadeiros.
Conforme denúncia do MP, o réu supostamente agiu com intento homicida, por motivo fútil. Ora, Excelência, o réu estava preparando o jantar da família enquanto a sua companheira ora vítima buscava desqualificá-lo, proferia injúrias contra este, o agredia com um cabo de vassoura, com socos. Qual pessoa razoável consegue pensar com razão e não se render a emoção, neste momento surpreendente e desolador, conforme vivenciado pelo réu?
Não há de se pensar, ou sequer falar de torpeza ou futilidade neste momento. Além do mais, ele somente agrediu a vítima, ato este que o réu afirma sim, ter cometido, porém, não agiu com intento homicida, conforme ficara provado nos autos, com todo o conteúdo probatório das testemunhas e perícia.
O que se quer dizer aqui não é que o denunciado pode ter sua conduta justificada, no entanto explica seu destempero devendo assim afastar qualquer acusação por motivo fútil.
D) DO HOMICÍDIO PRIVILEGIADO
Desclassificando-se o motivo fútil há ainda que se falar no homicídio privilegiado, o que se admite apenas para fins de argumentação uma vez não restar provado que o acusado incorre no crime de …