Petição
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA cível DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_qualificacao_completa], vem, muito respeitosamente, através da procuradora que abaixo assina, à presença de Vossa Excelência, propor
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA
nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, em face de $[parte_reu_qualificacao_completa], pelos motivos fáticos e jurídicos que passa a expor e aduzir:
I - DOS FATOS
Em março de 2020 a autora passou por severa dificuldade financeira em virtude de problemas pessoais, entrando em contrato com o Banco Réu para efetuar um empréstimo na modalidade consignado já que é servidora pública federal.
O empréstimo foi efetivado em abril do ano passado, no valor de R$ 9.740,35, mediante depósito em conta corrente da requerente.
Após um ano de pagamento, a autora entrou em contato com o banco a fim de verificar o valor remanescente da dívida e a possibilidade de antecipação de parcelas no fito de quitação e, para sua ingrata surpresa, o atendente informou que a modalidade contratada era amortização via RMC e não empréstimo pessoal consignado e que, por esta razão, não haveria como antecipar parcelas e alcançar a quitação em uma só vez.
Este serviço jamais foi contratado pela autora da ação, já que contratou empréstimo pessoal consignado, como já fez outras diversas vezes com instituições bancárias diferentes, nunca tendo enfrentado este tipo de situação negativamente surpreendente...
Aliás, não seria crível que a parte autora optasse por contratar empréstimo via cartão de crédito, cujas condições são bem menos favoráveis do que às do contrato de empréstimo consignado, sem que sequer tenha utilizado tal cartão...
O Banco Réu agiu com má-fé, enganou a autora no intuito de lhe aplicar os juros praticados na modalidade de RMC (cartão), posto que muito superiores aos praticados no empréstimo consignado “normal”, o que gera maior lucro ao Réu e desvantagem excessiva a parte Autora, que nunca consegue atingir o pagamento principal, vivendo em uma roda viva extremamente prejudicial à requerente.
Infração descarada do art. 52 do CDC cometida pelo banco réu, absurdamente...
No intuito, então, de tentar pagar a dívida principal, à autora foi oferecido “passar” a dívida para empréstimo pessoal consignado (como ela acreditou ter contratado desde o início), passando, então, a pagar, além do que já havia pago durante um ano (tabela 1), mais 58 parcelas de R$ 456,61 a fim de quitar o débito.
Temos, pois, que abatidos os valores pagos por doze meses (mais de R$ 6.000,00), o saldo devedor atualizado versaria em torno de R$ 6.735,23, mas, segundo o banco réu, é, absurdamente, R$ 26.483,61, a serem usurpados da requerente em parcelas que perdurarão por quase cinco anos.
Pelo banco réu, temos o seguinte e absurdo cenário: Quase o dobro do principal apenas em juros, sem qualquer abatimento das doze parcelas já pagas de quase R$ 500,00 cada.
E isto é comprovado através do e-mail e anexo, juntados com a presente inicial, em que o banco informa a dívida remanescente da autora “a ser renegociada” neste ano, isto é, após mais de um ano de pagamentos mensais, é, pasme, superior ao valor inicial, absurdamente!!
Além disso, nesta absurda renegociação o banco aplicou uma taxa mensal de mais de 6,6% a.m.
Vejamos:
Em comparação à taxa média do Banco Central para operações deste tipo (25467 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas – Crédito pessoal consignado para trabalhadores do setor público) e neste período, balizador, pois, dos negócios bancários, verifica-se indiscutível discrepância entre o valor devido (tabela 2) mensalmente nas 58 parcelas ajustadas (R$ 148,62 – taxa de 1,30% a.m.) e a cobrada pelo banco (R$ 456,61 – taxa de 6,61% a.m.).
Note-se que o banco pratica taxas superiores a 500% em referência à média utilizada pelo BACEN, razão pela qual a Autora vem a juízo postular a revisão judicial dos contratos mencionados e cujos documentos não se possui, restaurando o equilíbrio das partes.
II - DA RELAÇÃO DE CONSUMO
Antes de qualquer consideração, cumpre definir a natureza jurídica da relação existente entre a Autora e o banco requerido. Neste ponto, o Superior Tribunal de Justiça, aliás, consolidou tal entendimento ao editar a Súmula n. 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às Instituições Financeiras”.
Em ratificação, temos, ainda, pela improcedência da ADIN 2.591 (''ADIN dos Bancos''), dada pelo STF, onde esse fulminou qualquer dúvida sobre o tema – de forma que os bancos são sujeitos ao CDC.
Logo, o Código de Defesa do Consumidor deve ser aplicado ao caso em exame, inclusive, com a inversão do ônus da prova em favor da Autora face a sua hipossuficiência frente à requerida, o que desde já se requer.
III - DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO PACTO
Ressalte-se que, com o advento do Código de Defesa do Consumidor, surgiu a possibilidade de controle judicial dos contratos visando estabelecer o equilíbrio contratual e reduzindo o rigor do princípio "pacta sunt servanda".
Aliás, o reflexo disso no Direito das Obrigações foi que, acima do pacta sunt servanda, o princípio que começou a mostrar-se, de certa forma, prevalente, foi o rebus sic stantibus – que fala, basicamente, que aquilo que rege o contrato é o momento.
Isso quer dizer que é perfeitamente possível ao cidadão que assume uma obrigação em uma condição de vida/financeira, posteriormente, em um momento distinto, rediscutir aquela dívida. Evita-se, assim, a falência da parte hipossuficiente da relação.
Além disso, o contrato firmado, sendo de adesão, como in casu, desde sua concepção já continha cláusulas abusivas, posto o desrespeito, pelo banco, do limite imposto pelo BACEN no que tange aos juros remuneratórios.
De qualquer sorte, temos o artigo 6º da Lei 8.078/90, que assim dispõe:
“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
V- a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.
Portanto, possível se revela a revisão da contratação para fins de afastamento dos excessos apurados, sob pena de gerar desequilíbrio entre os contratantes, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor (artigos 6º, IV e V, 39, IV e V, e 51, IV), assim como pelo art. 122, segunda parte, do Código Civil.
A intervenção e atuação do Poder Judiciário, neste caso, é imprescindível e dirige-se à declaração de nulidade dos vícios congênitos que geraram o superendividamento e à consequente apresentação de nova regra que permita o reequilíbrio da relação contratual entre os litigantes.
IV - DAS CLÁUSULAS NULAS DE PLENO DIREITO
O legislador pátrio consagrou, no art. 51 da Lei 8.078/90, uma série de hipóteses exemplificativas de cláusulas contratuais abusivas e absolutamente nulas, dentre as quais destacamos as seguintes:
“Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV- estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou estejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; (...)X- permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; (...) XV- estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: I-...II-..III- se, mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso".
Pelo que se pode verificar do até aqui narrado, bem como pelos documentos que acompanham a presente inicial, o Réu vem abusando de sua superioridade econômica, para subtrair mensalmente da Autora quantia muito superior à devida.
Assim, trata-se de uma relação de completo abuso, em que figuram cumulativamente a cobrança indevida de valores com taxas de juros exorbitantes, gerando um desequilíbrio contratual absurdo e inadmissível. Senão vejamos:
- DOS JUROS REMUNERATÓRIOS
Embora a Súmula n. 382, do Superior Tribunal de Justiça tenha estabelecido que “a estipulação de juros remuneratórios superior a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”, bem como a jurisprudência tenha se firmado no sentido de que não incide a Lei de Usura quanto à taxa de juros remuneratórios nas operações realizadas com as instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional (Súmula n.º 596 do Supremo Tribunal Federal), não se pode afastar a possibilidade de limitação da cobrança dos juros pelas instituições financeiras, quando estes se mostrarem abusivos.
Isto porque sabe-se que o STJ já se manifestou a respeito (RESP 1.061.530/RS) do tema, admitindo a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto, como in casu.
Pois bem, a abusividade no caso em comento é gritante: o percentual relativo aos juros remuneratórios foi estipulado pelo Requerido no patamar equivalente a 6,61% ao mês e mais de 115% ao ano enquanto que o BACEN, para operações idênticas e no mesmo período da contratação discutida, ditava juros de 1,30% a.m. e 16,81% a.a.
Mediante simples cálculo aritmético, se for considerado o acumulado do período de vigência do último contrato – dívida remanescente (a ser paga através de 58 …