Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA$[PROCESSO_VARA] DA FAMÍLIA E SUCESSÕES DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA]$[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo] já qualificados nestes autos de AÇÃO ANULATÓRIA c/c DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL E PARTILHA DE BENS que move em face de $[parte_reu_nome_completo], vem, respeitosamente perante Vossa Excelência, com fulcro nos artigos 1009 e seguintes do Código de Processo Civil, interpor recurso de
APELAÇÃO
em face da Sentença e decisões dos Embargos de Declaração e requer seja recebida e que os autos sejam encaminhados para superior instância, acompanhado das Razões em anexo.
Nestes termos, pede deferimento.
$[advogado_cidade], $[geral_data_extenso].
$[advogado_assinatura]
RAZÕES DE APELAÇÃO
Colenda Câmara,
Eméritos Julgadores.
1. TEMPESTIVIDADE E PREPARO
A leitura intimação da decisão que julgou os embargos de declaração (mov. 203) ocorreu via sistema PROJUDI, no dia 20/02/2020, com início do prazo no dia 21/02/2020 (sexta-feira).
Durante a contagem do prazo recursal, além dos finais de semana, houve suspensão nos dias 24 e 25 de fevereiro (carnaval), finalizando os quinze dias úteis no dia 16 de março de 2020.
Portanto tempestivo o recurso.
Quanto as custas, foram preparadas, conforme mov. 209 do PROJUDI. Portanto, apto para ser recebido o presente recurso.
2. SÍNTESE FÁTICA E PROCESSUAL
Em apertada síntese, trata-se de ação ANULATÓRIA c/c RECONHECIMENTO e DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL e PARTILHA DE BENS em que o Apelante busca a nulidade da cláusula que atribuiu o regime da comunhão universal de bens à união estável, e por consequência, anular os efeitos retroativos do regime adotado, devendo ser aplicado a comunhão parcial de bens.
Isso porque a união estável iniciou sem qualquer registro, impondo o regime da comunhão parcial de bens (legal) e, após alguns anos de união, houve a alteração deste regime o que, de acordo com a melhor doutrina e entendimento jurisprudencial, não pode causar efeitos retroativos no entender do STJ (REsp: $[geral_informacao_generica]MG).
Ainda, tal pedido faz arrimo com o entendimento do TJPR (AC - $[geral_informacao_generica]) que o regime da comunhão universal de bens não é compatível com o instituto da união estável, pois não se confunde com o casamento.
Também, busca o Apelante o reconhecimento e dissolução da união estável, bem como a partilha igualitária de todos os bens adquiridos pelo casal na constância da união, com exceção do imóvel situado nesta Capital à Rua J$[geral_informacao_generica], posto que sub-rogado de herança.
De outro Norte, a Apelada alega que o regime de bens deve ser o anotado na escritura de união estável, ou seja, da comunhão universal de bens, partilhando todos os bens do casal, sem reservas.
Foi saneado o feito (mov. 87) e designada audiência de instrução e julgamento (mov. 133) que teve colhido o depoimento pessoal da ré e a oitiva de testemunhas / informantes, inclusive mediante Carta Precatória (mov. 146).
Após apresentação das Alegações finais, o juízo de primeiro grau proferiu sentença de parcial procedência, mais especificamente julgou a ação nos seguintes termos:
A. Reconhecimento da existência de união estável entre as partes, com início em agosto de 2007 e término em janeiro de 2016;
B. Indeferir a declaração de nulidade da cláusula constante em escritura pública firmada entre as partes quanto ao regime de bens estipulado para a união estável (comunhão universal), e RECONHECER a possibilidade da retroatividade de seus efeitos;
C. Não reconhecer qualquer uma das hipóteses de exclusão da comunhão (art. 1.668) e, por essa razão, DETERMINAR a devida MEAÇÃO DO PATRIMÔNIO. Deixando de estabelecer a meação sobre o veículo Volkswagen -modelo GOL Track;
D. Condeno o litigante Wanderley ao pagamento das custas e das despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, que ora arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa;
Foram opostos embargos de declaração nos movimentos 180 e 200 do PROJUDI e ambos foram acolhidos em parte, ou seja, a decisão dos embargos teve modificação para:
a) determinar a expedição de mandado de inscrição referente ao reconhecimento da união estável com início no ano de agosto de 2007 e término em janeiro de 2016, nos termos da sentença;
b) fixar os honorários sucumbenciais em 15% sobre o valor do proveito econômico obtido.
É o breve resumo da ação.
3. PRELIMINARMENTE – NULIDADE DA SENTENÇA - DA DECISÃO SANEADORA – VINCULAÇÃO DE JULGAMENTO – DECISÃO SURPRESA – LEALDADE PROCESSUAL
No curso do processo o juízo a quo proferiu decisão saneadora (mov. 87), a fim de apreciar preliminar de mérito e fixar os pontos controvertidos das ações.
Em resumo, a decisão manteve a competência da Vara de Família de Santa Felicidade e fixou os pontos controvertidos. Ademais, frisou a notória controvérsia sobre o início da união estável e o embate sobre a inclusão ou não de um imóvel sub-rogado de herança datada de 2004.
Por fim, concluiu a linha mestra de todo o julgamento da ação com os seguintes dizeres:
Em sede de cognição sumária, evidente que caso o reconhecimento da união estável abranja o ano de 2002, tal imóvel entrará no mérito que recai sobre a partilha. Noutro vértice, caso seja adotado como parâmetro o ano de 2007, tal imóvel seria excluído do mérito.
Pendente, portanto, de maiores esclarecimentos e maior dilação probatória sobre tal ponto.
Ora Excelências, como bem se sabe, a decisão saneadora é de suma importância ao processo, pois determina como será o julgamento da causa, quais serão os pontos a serem analisados pelo juízo, onde a prova será determinante e qual a linha de raciocínio que será abordada no julgamento do caso.
A obra coletiva Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil afirma:
É nesse momento que o juiz identificará as alegações de fato incontroversas, sobre os quais não é necessária a produção de provas, e aquelas impugnadas pelas partes, pertinentes a causa e relevantes à exata compreensão e solução da lide. (g.n.)
(WAMBIER, Teresa A.A. et.al. Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT. 2016 2Ed. Pag. 693)
Noutras palavras o saneador é crucial para a sequência processual, pois delimita a atuação das partes, inclusive a do magistrado, notadamente quanto as provas a serem produzidas, e aponta as questões que o magistrado entende controvertida, indicando o rumo da ação.
O inciso IV do artigo 357 do CPC indica que a decisão saneadora “delimita as questões de direito relevantes para a decisão do mérito”, ou seja, quais pontos o magistrado irá considerar para decidir o caso.
Na decisão saneadora em espeque, o magistrado determinou: “Noutro vértice, caso seja adotado como parâmetro o ano de 2007, tal imóvel seria excluído do mérito. (g.n.)”
Do acima exposto, restou claro que a questão chave para a inclusão do bem em discussão (Casa situada na Rua $[geral_informacao_generica]) seria o início da união estável.
Se iniciada após 2004, o referido bem estaria excluído da partilha!
Ora Excelências, uma vez que a decisão saneadora estava estabilizada e que o ponto de maior controvérsia nos autos era a partilha da Casa situada no bairro $[geral_informacao_generica], este procurador focou toda a instrução processual em comprovar o início da união estável em 2007, a fim de excluir da partilha o referido bem!
A sentença reconheceu o início da união estável em 2007, mas não excluiu a casa da partilha, em total descompasso da decisão saneadora, surpreendendo a todos.
Não bastasse isso, o principal fundamento do indeferimento da nulidade de cláusula da escritura pública da união estável foi a não comprovação do estado de saúde debilitado do Apelante, na assinatura do documento, conforme abaixo:
A prova dos autos não confirmou a alegação de $[geral_informacao_generica] de que estava em erro quando da assinatura da escritura pública de convivência, por meio da qual as partes escolheram o regime da comunhão universal de bens.
Absurdo! Pois em nenhum momento foi fixado como ponto controvertido ou necessário de prova a condição de saúde o Apelante. Ou seja, o fundamento da sentença não respeitou o limite imposto no próprio saneamento.
Ademais, em nenhum momento o Apelante fundamenta o pedido de nulidade de cláusula com o erro de consentimento, mas sim com a inadequação do regime da comunhão universal com a união estável.
Não houve lealdade processual, Excelências! A bem da verdade, este patrono se sentiu enganado pelo juízo a quo, como se a decisão saneadora o tivesse despistado durante a instrução processual.
Dizer que se a união se iniciou após 2004 o bem estaria fora da partilha, induziu em erro toda a instrução processual. Pois, ao final, essa diretriz foi descartada!
Portanto, merece ser anulado o decisum.
O artigo 5º do CPC determina que todos o que participam do processo [inclusive os juízes] devem comportar-se de acordo com a boa-fé.
Na mesma toada, o artigo 489 § 3º afirma:
§ 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé.
Mutatis mutandis, a decisão judicial deve ser proferida em conjugação com todos os elementos do processo, em harmonia com todas as outras decisões do processo, sem surpresas e contemplando a lealdade processual.
O magistrado promoveu uma contradição decisória endoprocessual.
Cumpre destacar que, por força do §1º do artigo 357 do CPC, caso não haja impugnação, a decisão saneadora se torna estável! O que ocorreu nos presentes autos.
Proferida a decisão de saneamento, a vinculação deve ser uma consequência automática e assim, as partes e os juízes seguirão toda uma estrutura diante das demais fases e no momento de proferir a sentença deverá ser estritamente obedecida pelo juiz, pois não poderá se esquivar de nenhum ponto que foi individualizado na decisão saneadora, sob pena de uma sentença eivada de vícios e nulidade, uma vez que o CPC/2015, no art. 489, § 1º, IV, estabelece que não se considera fundamentada qualquer tipo de decisão judicial que não enfrente os argumentos aduzidos na demanda.
Portanto, o conteúdo definido na decisão saneadora deve ser vinculativo a todos os integrantes da lide, impossibilitando que o juiz, na sentença, se posicione sobre fundamentos diversos do que constam na decisão de saneamento, dado que logo após a decisão saneadora, ou seja, tanto as partes como o juízo, ficam vinculados ao que elencarem como questão de direito.
Este é o entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná:
APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNDIA - INSURGÊNCIA DA EMBARGANTE - NULIDADE DA SENTENÇA - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE EM EVIDENTE DESCOMPASSO COM O ROTEIRO PROCESSUAL TRAÇADO NO DESPACHO SANEADOR - SURPRESA INADMISSÍVEL À PARTE - CERCEAMENTO DE DEFESA - DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE, LEALDADE, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - DESCABIMENTO DO JULGAMENTO ANTECIPADO - MATÉRIA CONTROVERTIDA DEPENDENTE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA - CERCEAMENTO DE DEFESA - OCORRÊNCIA TAMBÉM POR ESTE FUNDAMENTO - CASSAÇÃO DA SENTENÇA - DEMAIS TESES PREJUDICADAS - SENTENÇA CASSADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJ-PR - APL: 13946517 PR 1394651-7 (Acórdão), Relator: José Hipólito Xavier da Silva, Data de Julgamento: 25/11/2015, 14ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 1706 09/12/2015)
Do corpo do acórdão, traz-se mais luz com as sábias palavras do relator:
Inicialmente, é valido destacar que o magistrado é apenas um dos vértices da relação processual básica, que ¬ não se pode esquecer ¬ tem como forma geométrica explicativa ¬ lembrando-se de lições iniciais de Processo Civil - um triângulo equilátero. E é equilátero não à toa; é porque nele todos os vértices possuem o mesmo ângulo de abertura, independentemente do lugar que ocupem.
Isto nada mais representa do que o respeito, equilíbrio, lealdade processual e boa-fé, que devem imperar na relação processual, tanto entre partes, quanto entre juiz e jurisdicionado. Assim, não é dado ao magistrado, para não ser falha sua prestação jurisdicional e, em igual modo, ver ofendidas regras processuais básicas, como o devido processo legal e o direito à ampla defesa e contraditório, pregar jogos às partes, causando-lhes surpresas imprevisíveis, circunstâncias que, se presentes, acarretam o nascimento de vícios não superáveis.
E, com efeito, entre as inúmeras "surpresas processuais", está o apressado julgamento antecipado da lide pelo magistrado singular, desconsiderando roteiro processual traçado por ele próprio no despacho saneador anteriormente proferido no feito.
Excelência, houve uma decisão surpresa, suficiente para a nulidade da sentença, pois a decisão saneadora definiu o rumo da partilha com a comprovação do início da união estável, porém a sentença atuou em contradição ao decidido anteriormente pelo próprio juízo.
Houve tentativa de solução via aclaratórios, porém julgados improcedentes.
Concluindo, a sentença deve ser anulada pois proferida em total descompasso com as outras decisões no curso do processo, principalmente por induzir os procuradores em erro, ao indicar uma linha de julgamento e proferir decisão totalmente contraditória.
Portanto, requer seja anulada a sentença pois proferida em total descompasso com decisão anterior já estabilizada, ou seja, decisão saneadora, proferindo nova sentença por este Egrégio Tribunal, nos termos do inciso IV, §3º do Artigo 1013 do CPC, para excluir da partilha o imóvel situado no bairro $[geral_informacao_generica], posto que a união estável comprovadamente teve início em 2007, após o recebimento da herança.
Alternativamente, quer seja declarada nula a sentença devendo o juízo de primeiro grau proferir novo decisum, em concordância com o saneador.
4. DO REGIME DE BENS
Caso Vossas Excelências não acolham a preliminar acima fundamentada, o que se diz apenas por argumento, requer seja a sentença reformada pelas razões abaixo indicadas.
O juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido de nulidade da cláusula que conferiu o regime da comunhão universal de bens com contrato de união estável, sob o fundamento principal da autonomia da …