Petição
EXCELENTÍSSMO (a) SENHOR (a) DOUTOR (a) JUIZ (a) DA $[processo_vara] VARA DO TRABALHO DE $[processo_comarca] - $[processo_uf]
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], portador do $[parte_autor_rg] e inscrito no $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado na $[parte_autor_endereco_completo], vem perante Vossa Excelência, por seus procuradores, ut instrumento de mandato anexo, propor a presente
RECLAMATÓRIA TRABALHISTA
em face de $[parte_reu_razao_social], pessoa jurídica de direito privado, inscrita no $[parte_reu_cnpj], com sede na $[parte_reu_endereco_completo], pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:
I - DA SÍNTESE DO CONTRATO DE TRABALHO
A reclamante iniciou suas atividades na reclamada em $[geral_data_generica], exercendo o cargo de propagandista. O seu contrato de trabalho permanece em vigor.
A remuneração da autora sempre foi composta por salário-base, acrescido de prêmios e outras parcelas.
A sua zona de trabalho compreendia os municípios de $[geral_informacao_generica].
A Reclamada não observou corretamente os direitos do Autor, razão pela qual se propõe a presente demanda trabalhista.
II – DOS FATOS E DO DIREITO
1. Da rescisão indireta do contrato de trabalho
A continuidade do vínculo de emprego com a reclamada se tornou insustentável, motivo pelo qual vem a autora a postular a esse r. Juízo o reconhecimento da rescisão indireta do seu contrato de trabalho, informando, desde já, que em face dos fatos abaixo narrados deixou de prestar serviços desde o dia $[geral_data_generica].
Pois bem, no caso dos autos, afora os fatos abaixo mencionados, que, por si só, já justificariam o reconhecimento da rescisão indireta por culpa do empregador (artigo 483, “a”, da CLT), cabe ainda ressaltar que a reclamada não está cumprindo todas as suas obrigações contratuais (artigo 483, “c”, da CLT), o que restará devidamente comprovado no decurso processual.
Inicialmente, cabe consignar que a reclamante retornou a poucos dias do seu período de licença-maternidade (dia $[geral_data_generica]), reassumindo plenamente as suas funções, sendo submetida ao setor de viagens que a obriga a rodar cerca de 4.000km por ciclo, o que afasta a mesma, por vários dias, do convívio com o seu filho, $[geral_informacao_generica], nascido em $[geral_data_generica] conta com pouco mais de 06 (seis) meses de idade, a reclamante (lactante ainda), assim que retornou à empresa solicitou permissão a esta para que não fosse obrigada a realizar tantas viagens para os municípios descritos no tópico anterior, a fim de que possa estar perto do filho neste momento em que tanto precisa dos seus indispensáveis (e insubstituíveis) cuidados (até mesmo para amamentar), o que foi negado a mesma.
Especificamente no caso dos autos, padecia a autora de concreta lesão e/ou ameaça de lesão ao seu direito de proteção à maternidade, o que certamente abarcaria o fato de não ser afastada de seu filho recém-nascido (com menos de 01 ano de vida) por conta de constantes viagens a trabalho.
O requerimento da autora, negado pela reclamada, visou tão-somente assegurar os necessários cuidados de que precisa uma criança com poucos meses de vida, o que resta inviabilizado diante da conduta da reclamada em lhe atribuir constantes viagens, as quais demandam, inclusive, pernoite fora de casa.
O que se vislumbra no caso em apreço é o abuso de direito (artigo 187 do CCB) praticado pela empresa em detrimento de direitos sociais fundamentais assegurados na Constituição Federal, os quais, devidamente sopesados com o poder diretivo titularizado pelo empregador, colocam-se de forma prevalente em relação a este.
Destaca-se como direitos constitucionais que resguardam o direito de a autora trabalhar – embora sem a necessidade de realizar constantes viagens (que inevitavelmente a afastariam dos cuidados de que, neste momento, necessita o seu filho) – a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III), os valores sociais do trabalho (artigo 1º, IV), a construção de uma sociedade justa e solidária (artigo 3º, I), a proteção à maternidade e à infância (artigo 6º, caput), a valorização do trabalho humano como princípio geral da atividade econômica (artigo 170, caput), todos insertos na Constituição da República.
Diante do que acabou de ser exposto, torna-se patente que a reclamada incidira nas condutas formalmente descritas no artigo 483, “a”, e “a” da CLT.
Desse modo, deve ser judicialmente reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho, com a consequente condenação da reclamada ao pagamento do saldo de salário (artigo 459, caput, da CLT), aviso prévio indenizado (artigo 487, §4º, da CLT), férias com 1/3 (Súmula 171 do TST), gratificação natalina (artigo 7º, VIII, da CF e artigo 7º, caput, do Decreto 57.155/65), liberação do FGTS com a multa de 40% (artigo 10, I, do ADCT e artigo 18, §1º, da Lei nº 8.036/90) e das guias para o encaminhamento do seguro-desemprego (artigo 4º, caput, da Lei nº 7.998/90).
Sucessivamente, em não sendo possível à obreira encaminhar o benefício do seguro-desemprego, deve-lhe ser assegurado o pagamento de indenização substitutiva (Súmula 389, II, do TST).
2. Das horas extras
Inicialmente, cumpre demonstrar que havia real possibilidade de controle de jornada por parte da reclamada, tanto que restou comprovado judicialmente – em caso idêntico ao presente, envolvendo ação civil pública proposta pelo MPT em face do laboratório FARMA – que a referida empresa controlava toda a jornada de trabalho desempenhada pelos propagandistas.
A fim de melhor expor a questão, algumas considerações sobre os fatos apurados naquela ACP, por absolutamente pertinentes ao caso narrado nesta reclamação, merecem ser aqui repisadas.
Segundo se depreende dos documentos coligidos aos autos, a Procuradoria Regional do Trabalho da $[geral_informacao_generica]Região (MPT) instaurou inquérito civil (de nº 1379/$[geral_informacao_generica]) em face do LABORATÓRIO FARMA, que culminou no posterior ajuizamento de ação civil pública (ACP) tombada sob o nº $[geral_informacao_generica], que tramitou perante a 11ª Vara do Trabalho de $[geral_informacao_generica] (documentos coligidos aos autos).
O objeto da citada ação civil pública, segundo se depreende de sua exordial, refere-se ao efetivo controle de jornada exercido pela farmacêutica, bem como as fraudes por ela perpetradas no tocante controle existente.
Com efeito, a investigação desencadeada pelo MPT, e que culminou no ajuizamento da sobredita ação judicial apontou para um enorme contrassenso na medida em que a empresa exigia altíssimas metas diárias e, ao mesmo tempo, proibia formalmente a prestação de jornada suplementar, fazendo com que os trabalhadores fizessem o logout no sistema e continuassem trabalhando para cumprir as metas impostas pela empresa.
Outrossim, necessário destacar o teor do acordo firmado entre a FARMA e o MPT na ação civil pública antes referida. Veja-se as obrigações judicialmente fixadas, comprovando cabalmente a possibilidade de efetivo controle de jornada por parte daquela empresa, e, por consequência, de todas as demais farmacêuticas concorrentes (tal como a reclamada), que detêm os mesmos meios de controle.
(...) a) autorizar e possibilitar o registro real da jornada de trabalho, com a efetiva anotação dos horários de início e término do labor, bem como dos intervalos intrajornada e horas extraordinárias, sem necessidade de autorização prévia; b) não aplicar advertência aos empregados por registrarem a real jornada de trabalho no sistema; c) adequar o sistema WDFORMS, de modo a impedir que o software: (i) restrinja a marcação do ponto em qualquer horário, desde que haja comprovação de efetivo trabalho pelo propagandista; (ii) realize anotações automaticamente; (iii) altere ou elimine os dados registrados pelo empregado; d) manter as alterações já feitas no sistema de registro, quais sejam: 1)possibilidade de registro de atividades sem bloqueio do sistema por falta de gozo do intervalo intrajornada e 2)registro de encerramento da jornada, onde o próprio trabalhador vai registrar o encerramento da jornada, mas com a manutenção da política da empresa de evitar a prática da hora extra; e) conceder aos representantes farmacêuticos intervalo intrajornada, para repouso e alimentação, em período não inferior a 15 (quinze) minutos às sextas-feiras; f) Não impedir, por qualquer meio, que seus empregados registrem fielmente as marcações de horário de entrada, saída, intervalos previstos em lei, acordo e convenções coletivas de trabalho e tempo de deslocamento de ida e volta para os empregados que trabalham em setores de viagens; g) Caso prefira a adoção de sistema alternativo de controle de jornada, não deverá ser admitido: restrições à marcação do ponto; marcação automática do ponto; exigência de autorização prévia para marcação de sobrejornada; e a alteração ou eliminação dos dados registrados pelo empregado. h) Para fins de fiscalização, os sistemas alternativos eletrônicos deverão: estar disponíveis no local de trabalho; permitir a identificação de empregador e empregado; e possibilitar, através da central de dados, a extração eletrônica e impressa do registro fiel das marcações realizadas pelo empregado. i) Não firmar acordos individuais de trabalho com cláusulas em desconformidade com o presente acordo; j) pagar multa diária (astreinte) no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em caso de descumprimento de cada uma das obrigações de fazer e não fazer, até a efetiva regularização, cujo pagamento ficará a cargo da ré, devendo esta ser notificada previamente para comprovar o cumprimento do acordo caso haja denúncia de descumprimento. l) o pagamento da quantia de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), a título de indenização por danos morais coletivos, que será feito da seguinte forma: l.1) compra e doação e um veículo novo (0 km) para a Coordenadoria da Pessoa com Deficiência no RN - CORDE/RN, que atenda às suas necessidades, para fiscalização e transporte de pessoas com deficiência; l.2) depósito do valor remanescente em favor da Liga Norte-rio-grandense Contra o Câncer, com a qual a empresa já possui um projeto específico com aportes financeiros periódicos em cursos de capacitação e qualificação profissional de pessoas para atendimento oncológico; m) A empresa acordante terá o prazo de 60 (sessenta) dias para comprovar o cumprimento das obrigações dos itens l.1 e l.2, a contar da homologação do acordo, sob pena de multa correspondente a 100% do valor acordado na cláusula anterior; n) No projeto a que se refere o item l.2, deverá ser incluída recomendação de capacitação e qualificação, preferencialmente, pessoas com deficiência para trabalhar no hospital da Liga, já que este possui cota de pessoas com deficiência a ser preenchida; o) a empresa deverá comprovar nos autos eletrônicos do presente processo e ao Ministério Público do Trabalho (nos autos do PAJ 001118.2015.21.000/7) a existência do projeto a que se refere o item l.2, bem como os aportes financeiros que são feitos periodicamente, esclarecendo-se, desde logo, que o pagamento da quantia referida no item l.2 será feito em uma única parcela; p) O Ministério Público do Trabalho, diretamente ou através da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego e o Sindicato da categoria profissional (SINDPROFARN) velarão pela fiel observância do presente compromisso, notificando a Empresa sobre eventual inadimplemento; q) O presente Termo de acordo possui eficácia nacional; r) Adimplido o acordo, o autor dá total quitação do objeto da presente ação civil pública, na forma da lei (...)
E arrematou a Sua Excelência, a Senhora Procuradora do Trabalho, Dra. XXXXXXXXXXXXXX, que firmou a citada ACP (p. 14):
(...) Ora, impor metas de produção que desaguem no trabalho extraordinário sem a garantia de seu efetivo registro e pagamento constitui burla à principiologia protecionista positivada no ordenamento jurídico nacional; trata-se, sobretudo, de violação às normas constitucionais sociais(...).
Depreende-se de todo o exposto que se faz plenamente possível a TODOS os laboratórios farmacêuticos, inclusive à reclamada, CONTROLAR a jornada de trabalho dos seus empregados, pois, se assim não fosse, certamente a FARMA também não conseguiria fazê-lo.
Logo, havia possibilidade real de controle de jornada por parte da reclamada, não restando dúvidas, portanto, quanto a isso.
3. Do controle indireto de jornada
Para além do já amplamente demonstrado controle direto de jornada ao qual estava exposta a obreira, cabe ressaltar que também havia controle indireto do seu labor através das sincronizações determinadas pela eclamada (no mínimo 02a 03 vezes por dia); dos encontros paraquedas (04 dias de acompanhamento por mês, em média); afora o fato de que o equipamento eletrônico disponibilizado à autora (tablet) continha meios de a reclamada localizá-la facilmente a qualquer horário do dia.
A esse respeito, cumpre ressaltar a entrevista concedida em 03 de maio de 2011 pelo vice-presidente de marketing da reclamada, Sr. $[geral_informacao_generica], publicada no informativo da ABC (documento coligido aos autos) sob o título: “ABC CONCLUI EM MAIO IMPLANTAÇÃO DO IPAD EM 100% DA SUA FORÇA DE VENDAS”. Veja-se:
(...) O vice-presidente da ABC destaca mais um ganho com a implantação desse projeto: agilidade na comunicação entre a empresa e a Força de Vendas. “Futuramente, será possível saber em tempo real onde o representante está”, ressalta. De acordo com ele, os relatórios que esses profissionais devem enviar à empresa também deixarão de ser impressos. Tudo será feito via internet, proporcionando ganho de tempo para os representantes, redução de custos e o rompimento dos limites da comunicação com o médico, com maior liberdade para abordá-lo e mais rapidez para obter novos conteúdos e atualizações (...) (grifou-se).
Extrai-se, pois, que a reclamada – em face de sua tecnologia de ponta – tinha e tem pleno conhecimento e controle da rotina de trabalho dos seus funcionários.
4. Das previsões contidas nas normas coletivas acerca da jornada de trabalho
Tanto existe controle de jornada por parte das empresas representadas pelo sindicato patronal que as normas coletivas acostadas aos autos – aplicáveis ao caso em análise – preveem expressamente que as horas extraordinárias serão remuneradas de acordo com o adicional previsto na cláusula 8ª.
Além do mais, a cláusula 36ª dispõe que o comparecimento dos empregados às reuniões – quando ocorridas “fora” da jornada de trabalho – serão remunerados como horas extras.
Para se falar em horas extras, faz-se imprescindível o controle de jornada. Logo, inegável concluir que os próprios sindicatos que representam as partes reconhecem expressamente que há controle de jornada, tanto que estipularam os percentuais aplicáveis às sobrejornadas.
5. Da jornada de trabalho contratada e daquela efetivamente laborada
A jornada contratual da autora é de 8 (oito) horas diárias, 40 (quarenta) horas semanais e 200 (duzentas) horas mensais, de segunda a sexta feira.
Inobstante isso, a reclamante sempre excede em muito a jornada contratual, o que se faz necessário para cumprir a meta de atendimento de 13 médicos e 01 farmácia por dia.
Destaca-se, por oportuno, que o início do labor da reclamante ocorre a partir do exato momento em que sai de sua residência ou do hotel (quando está em viagem) para atender ao primeiro cliente agendado para o dia, porquanto, a partir de tal instante, já se encontra à disposição do empregador executando as suas ordens (artigo 4º da CLT). Com relação ao término da jornada, o cômputo desta, no tocante ao labor “em campo” somente deve encerrar com a chegada do trabalhador em sua residência/hotel. Isso se deve ao fato de que na atividade dos propagandistas, assim como de alguns outros trabalhadores específicos, o tempo de deslocamento (para o atendimento dos clientes) se insere no bojo da própria atividade determinada pela empresa, fazendo parte integrante desta.
Aplicável ao caso, no aspecto, a disposição legal do artigo 4º, caput, da CLT, in verbis:
Artigo 4º da CLT - Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada (grifou-se).
Em sua base de atuação, a reclamante geralmente inicia a sua jornada em torno das 07h30min, encerrando-a por volta das 19h30min.
Quando atua fora de sua base – nas demais localidades descritas no tópico 1 desta exordial – a autora geralmente executa jornada das 06h às 19h. Porém, às vezes, segue trabalhando até as 20/21h.
Eis a jornada executada “em campo” pela obreira (média), sem prejuízo da constatação de jornada superior a ser apurada no decurso processual.
6. Do trabalho burocrático
Depois de chegar a sua residência (ou no hotel, quando está viajando) após um intenso dia de trabalho, cabe à autora realizar, dentre outras, as seguintes atividades burocráticas (que lhe demandam pelo menos mais 01a 02h por dia):
• realizar os relatórios e lançamentos sobre os visitas realizadas no dia; • verificar o itinerário com o roteiro das visitas a serem realizadas no dia seguinte; • enviar e acessar os e-mails recebidos; • fazer os relatórios das viagens; • estudar as estratégias traçadas pela empresa; • fazer o levantamento dos resultados da sua zona de atuação.
Por realizar tantas atividades “em campo” todos os dias não há a possibilidade de a autora executar mencionadas funções burocráticas durante a sua jornada de trabalho.
7. Da sobrejornada em domingos e feriados
Nos domingos e feriados despende, ainda, de pelo menos 01 a 02h para organizar o porta-malas do carro, além de realizar alguns dos trabalhos burocráticos mencionados acima, eis que nas segundas-feiras e nos dias úteis eguintes aos feriados já tem que atuar em “campo”.
De ressaltar, ainda, que a reclamada já atribuiu a reclamante o dever de viajar em alguns domingos.
8. Das convenções e eventos
A reclamada incumbe à autora o dever de participar de convenções e reuniões, geralmente ocorridas fora do Estado do Rio Grande do Sul, cujos deslocamentos comumente ocorrem aos finais de semana.
Em todas as ocasiões acima …