Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA DO TRABALHO DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo],$[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], portador do $[parte_autor_rg] e inscrito no $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado na $[parte_autor_endereco_completo], vem, mui respeitosamente perante V. Exa. através dos procuradores in fine assinados, propor a presente
RECLAMAÇÃO TRABALHISTA
em face de $[parte_reu_razao_social], pessoa jurídica de direito privado, inscrita no $[parte_reu_cnpj], com sede na $[parte_reu_endereco_completo], pelas razões de fato e de direito a seguir expostas:
1 - DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA
Inicialmente, afirma a parte autora que não possui condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo do sustento próprio, bem como o de sua família, razão pela qual faz jus ao benefício da gratuidade da justiça, assegurados pela Constituição Federal, artigo 5º, LXXIV e pela Lei 13.105/2015 (CPC), artigo 98 e seguintes.
E ainda com fulcro no art. 790, § 3º E 4º da CLT, tendo em vista que a reclamante percebia salário inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, e que no momento encontra-se sem receber salários, merece ser concedido, de plano, o benefício da Justiça Gratuita, dispensando a mesma do recolhimento de custas, honorários periciais, honorários advocatícios à parte contrária em caso de sucumbência, e emolumentos.
2 – DA EXPOSIÇÃO FÁTICA
A parte reclamante foi contratada pela reclamada em 01 de dezembro de 2014, para exercer a função de AUXILIAR DE COZINHA, cujo último salário era de R$ 954,00 e foi demitida sem justa causa em 26 de agosto de 2019. Ocorre, entretanto, que a reclamante àquele momento estava doente, e ainda está, e por isto não deveria ter sido demitida, tendo em vista que desenvolveu as lesões que hoje possui em razão do trabalho para a reclamada, senão vejamos:
A Reclamante exercia a função de Auxiliar de Cozinha, realizando as atividades no refeitório do supermercado, preparando as refeições para mais de 250 pessoas. Para desenvolver suas tarefas ela trabalhava realizando esforço repetitivo durante toda a jornada de trabalho, pois cortava legumes, verduras, carnes e frango. Trabalho este, minucioso, exaustivo e repetitivo.
Para a realização de sua função a reclamante também era obrigada a pegar peso constante, tendo que carregar caixas de legumes, verduras, frango e carnes, com mais de 20 kg cada. O manuseio das caixas era extremamente desgastante pois incluía além do transporte, o levantamento das mesmas dos paletes na retirada e a colocação nas bancas ou no chão da cozinha.
Esses movimentos eram constantes, e, em decorrência do peso, bem como da falta de treinamento e orientação adequada, inexoravelmente, com o tempo, causam lesões nos membros superiores e coluna lombar e cervical. O trabalho repetitivo de corte dos produtos durante toda a jornada acentuou problema.
Além do exposto, no setor e no horário, havia somente duas pessoas trabalhando, a reclamante e mais uma colega. Ocorre que o serviço era demasiado puxado, era muita gente para fazer as refeições, às vezes passava a jornada inteira sem ir ao banheiro por que não podia sair e deixar de servir as refeições aos trabalhadores.
O horário de trabalho da reclamante ajustado no contrato era das 11h às 19h20 com uma hora de intervalo, no entanto, esse horário raramente era seguido à risca. A reclamante fazia hora extra praticamente todos os dias, pois chegava no trabalho às 5h30 da manhã, o que ocorreu nos primeiros dois anos.
A jornada de trabalho já era extremante exaustiva, e com a realização diária de horas extraordinárias, a situação de saúde da obreira só fez piorar. De 2014 a 2016 as horas extraordinárias eram intensas, pois foram os primeiros dois anos de instalação da empresa na cidade de Jequié.
Após pouco mais de dois anos trabalhando nas condições acima relatadas, a reclamante começou a sentir muitas dores nos membros superiores, ombro, cotovelo, coluna lombar e cervical.
Com as dores cada vez piores, a obreiro precisou de atendimento médico e começou a apresentar atestados médicos à empresa. Em 26/07/2017 foi apresentado um atestado médico de 5 dias, com CID M 19.8, indicando artrose. Depois em 09/08/2017 apresentou outro atestado desta feita de 14 dias com o mesmo CID. Depois em 04/12/2017 M77.1 (epicondilite lateral), que significa dor nos músculos dos braços. E depois disso, durante o ano de 2018 foram apresentados mais de 16 atestados médicos e em 2019 no mínimo 5 atestados foram entregues a empresa. Todos os atestados médicos apresentados tinham relação com dores nos ombros, cotovelos e coluna.
Em 21 de agosto de 2017 a reclamante solicitou auxílio do INSS pois precisou afastar-se do trabalho por mais de 15 dias, tendo sua incapacidade laborativa sido constatada pelo INSS e seu pedido de benefício de auxílio doença acidentário deferido, o qual perdurou até 30/11/2017 com código 91.
Em dezembro de 2017, o médico do trabalho Dr. $[geral_informacao_generica], emitiu relatório médico (anexo) atestando a permanência da incapacidade laborativa da obreira, bem como a relação das lesões com a realização do trabalho para Ré, mas mesmo assim o médico da empresa a considerou apta e determinou seu retorno às mesmas atividades, repetitivas e com muito peso.
Há ainda outros relatórios médicos descrevendo a situação da obreira desde 2017 até 2021, todos anexados a esta inicial. Em 19/09/2017 o ortopedista Dr.$[geral_informacao_generica], relata lesões no cotovelo esquerdo e no ombro esquerdo, emitindo novo relatório em 04/12/2017, nas mesas condições, indicando a pouca melhora.
Em 23/01/2018 e 26/03/2018 o Dr. $[geral_informacao_generica] novamente expõe a continuidade das lesões no cotovelo e ombro esquerdos, indicando pouca melhora, apesar do tratamento medicamentoso. Em 06/01/2018, novo relatório médico do Dr. $[geral_informacao_generica], expondo a mesma situação médica da reclamante.
Em 27/08/2019 o Dr. $[geral_informacao_generica] novamente relata a existência de lesões no cotovelo e ombros esquerdos, informando a situação de dor constante e indicando o afastamento do trabalho.
Em 01/09/2019 o ortopedista e traumatologista Dr. $[geral_informacao_generica], ratifica a existência das lesões, apontadas pelos outros médicos e confirmadas pelos exames médicos realizados pela reclamante.
Em 13/02/2020 o ortopedista Dr. $[geral_informacao_generica]. emite relatório médico onde expõe a permanência das lesões no ombro esquerdo.
Em 19/03/2020, foi emitido relatório fisioterápico.
E em 08/02/2021 o ortopedista Dr. $[geral_informacao_generica] novamente relata a existência das lesões no ombro e cotovelos esquerdos e também na coluna.
Há nos autos ainda inúmeras receitas prescritas à reclamante, as quais demonstram claramente que de 2017 a 2021 a mesma está em tratamento constante por causa das lesões decorrentes do trabalho prestado na empresa Ré.
Quanto aos exames de imagem anexos a esta petição, os mesmos constatam as lesões que acometem a reclamante e que a perturbam desde 2017, impossibilitando a mesma de realizar atividades laborais, sejam elas quais forem, senão vejamos:
03/08/2017 – Ultrassonografia do Ombro Esquerdo: Bursite Sub-Acromial/Sub-Deltoidea.
02/08/2018 – Ressonância Magnética do Ombro Esquerdo: Tendinopatia do supraespinhal e do infraespinhal e espessamento e lamina liquida na Bursa. Bursite.
12/03/2018 – Ressonância Magnética do Cotovelo Esquerdo: Tendinopatia, peritendinite e distensão líquida laminar da Bursa do olecrano.
12/02/2020 – Ultrassonografia do Ombro Esquerdo: Alterações ecográficas no tendão do supra-espinhal sugerindo tendinose.
25/01/2021 – Ressonância Magnética da Coluna Cervical: Protrusões discais difusas comprimindo a face ventral do saco dural.
26/01/2021 – Ultrassonografia d Cotovelo Esquerdo: Tendinopatia de Inserção (Epicondilite Lateral).
Durante todo o lapso contratual, após começar a sentir muitas dores, a obreira tentou incansavelmente mudar de função, relatando ao médico do trabalho da empresa e aos seus superiores hierárquicos sua situação de saúde e sua condição de dor constante, sendo este o motivo de tantos atestados médicos. Mas nada foi feito pela administração, apenas manteve a trabalhadora nas mesmas condições de trabalho, pegando peso constante, trabalho com esforço repetitivo e muita sobrecarga de trabalho.
A empresa se cansou dos problemas de saúde da trabalhadora, os quais a própria reclamada deu causa, e demitiu a trabalhadora, mesmo sabendo que a mesma estava doente.
Os exames demissionais foram realizados, mas em momento algum houve a realização de exame específico para a verificação das lesões comprovadamente existentes na trabalhadora, lesões estas que em 2014, quando ela foi admitida, não existiam.
Assim sendo, o médico do trabalho da empresa, mesmo diante de todo o histórico médico da reclamante, receitas, atestados, relatórios e exames médicos, a considerou apto à demissão.
Importante frisar que quando foi admitida em 2014, a autora não possuía as lesões que hoje a incapacitam, posto que tinha uma vida saudável e tranquila, não sentia dores ou qualquer incomodo na coluna. Ou seja, foi admitida saudável e demitida doente. E ficou doente após exercer por cinco anos as atividades laborativas determinadas pela Ré, em condições precárias de saúde e segurança no trabalho.
Hoje não consegue mais trabalhar eis que sente fortes dores todo o tempo e não tem como sustentar sua família.
Diante do exposto, resta evidente que as lesões que acometem a autora foram desencadeadas pelas atividades realizadas no desenvolvimento de seu trabalho para a Reclamada.
São inúmeras as razões que levam trabalhadores a adquirir doenças ocupacionais, pois a grande maioria das empresas não cumpre as normas de saúde e segurança do trabalho, não oferecem treinamento adequado, não promovem a realização de atividades que minimizam os impactos dos trabalhos repetitivos e desgastantes como por exemplo a ginástica laboral e não oferecem os equipamentos de proteção individuais e coletivos adequados.
Portanto, no caso em tela, temos que as lesões que acometem a obreira, efetivamente foram desencadeadas pela jornada de trabalho exaustiva, MOVIMENTOS REPETITIVOS INTENSOS E CONSTANTES, excessivo esforço físico repetitivo e MUITO PESO.
Resta inequívoco, portanto, que se trata de doença ocupacional, com perda da capacidade laboral, por isso é classificável na situação prevista pelo artigo 86, Lei n. 8.213/91, reconhecendo-se incapacidade laborativa, cujo nexo de causalidade resta evidente e será comprovado nos autos.
Assim sendo, percebe-se aí uma demissão irregular, cujo pivô foi o surgimento e progressão de doença ocupacional visivelmente ocasionada pela execução do trabalho na empresa, e agravada pela inércia da demandada que em nenhum momento procurou amenizar o sofrimento de sua colaboradora ou se quer investigar e modificar as condições de trabalho da mesma, a fim de evitar que tal doença levasse a trabalhador à inatividade, coisa que era de sua obrigação e responsabilidade.
Excelência, a falta das cautelas devidas deve ser traduzida no comportamento negligente da Requerida, que violou e desprezou dispositivos legais e específicos, no sentido de prevenir doenças, requerendo e exigindo esforço físico além da capacidade do empregado.
Foi negligente, na medida que não se deu ao trabalho de analisar as circunstâncias, nem de prever o resultado danoso. A única atitude da Requerida foi de demitir a obreiro quando tomou conhecimento de sua moléstia, vez que não mais seria útil para trabalhar na empresa.
Neste ensejo, não há como deixar de responsabilizar a reclamada pelo mal ocorrido à autora, uma vez que as lesões físicas decorreram da atividade da trabalhadora na mesma, a incapacitando para realizar atividade laborativa e poder prover sua família.
Nestes termos, a autora não teve alternativa senão recorrer ao Poder Judiciário para ver seus Direitos efetivamente garantidos em nome da Lei e da Justiça.
3 – DOS FUNAMENTOS JURÍDICOS
3.1 - DA DOENÇA OCUPACIONAL E ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA
Considerando a exposição fática, bem como os relatórios médicos, receitas médicas, exames médicos e documento do INSS com código 91, acostados a esta exordial, vê-se tratar-se claramente de acidente de trabalho típico em que as condições de labor, foram preponderantes para o desenvolvimento das lesões que acometem a reclamante, desencadeando doença do trabalho.
Vejamos o disposto no art. 19 da lei 8.213/91:
“Art. 19. Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho”.
Ainda, extrai-se do art. 20 da referida Lei de Benefícios:
“Art. 20. Considera-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
(...)
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função das condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
Com efeito, estamos diante de acidente de trabalho consubstanciado em doença do trabalho/ocupacional desencadeada durante o pacto laboral entre a obreira e a reclamada.
Ao tomar conhecimento das patologias e diante da intensidade das dores, a reclamante conversou com os gestores da reclamada acerca da sua situação de saúde, rogando pela transferência para outro local de trabalho, a fim de evitar o carregamento de peso e o trabalho repetitivo diário e exaustivo.
Entretanto a reclamada por sua vez, quedou-se inerte, quando deveria emitir a CAT nos termos da Lei de Benefícios. Muito pelo contrário, sua atitude seguinte foi demitir a trabalhadora doente.
Ora Excelência, é clara a atitude da reclamada em obstar o direito da reclamante a estabilidade acidentária prevista no art. 118 da lei 8.213/91, para que não fossem preenchidos os requisitos da súmula 378 do C. TST, quais são, o afastamento do trabalho superior a 15 dias e percepção do auxílio doença acidentário perante o INSS.
No entanto, esses requisitos já haviam sido cumpridos, eis que a reclamante ficou sob responsabilidade do INSS por 3 meses, cujo benefício deferido foi o auxílio doença acidentário com código 91.
Além do desrespeito à norma cogente de ordem pública, ou seja, à Constituição Federal, que elenca como direito fundamental o direito à saúde e meio ambiente equilibrado, a atitude da reclamada fere de morte o art. 22 da lei 8.213/91, que versa:
“Art. 22. A empresa deverá comunicar o acidente de trabalho à Previdência Social até o 1º (primeiro) dia útil seguinte da ocorrência e, em caso de morte, imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.”
Nesta linha, a jurisprudência tem decidido no sentido de que mesmo que ausentes os requisitos para percepção da estabilidade acidentária, se o motivo da ausência foi por impedimento malicioso do empregador, considera-se implementada tais condições por aplicação do art. 129 do CC/2002.
Assim é o que dispõe o Relator Juiz Convocado Altino Pedrozo dos Santos, ao julgar Recurso de Revista nº 512927/1998.6 pela 1ª Turma do C. TST, vejamos:
"EMENTA: RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE ACIDENTÁRIA. REQUISITOS. ARTIGO 118 DA LEI N.º 8.213/1991. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO DO ACIDENTE PELA EMPRESA. O afastamento do serviço por período superior a 15 dias e a consequente percepção do auxílio-doença acidentário constituem pressupostos para a aquisição do direito à estabilidade provisória prevista no artigo 118 da Lei n.º8.213/1991. No entanto, se tais exigências não foram atendidas pelo trabalhador por culpa exclusiva do empregador, que deixa de cumprir a obrigação de comunicar o acidente de trabalho à Previdência Social (art. 22, caput, da Lei Nº …