Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA CÍVEL DO FORO REGIONAL DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
TUTELA PROVISÓRIA
GRATUIDADE DE JUSTIÇA
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], $[parte_autor_rg], $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado $[parte_autor_endereco_completo], por seus advogados in fine subscritos – procuração anexa, vem, respeitosamente, perante V. Exa., com fulcro dos artigos 319 et seq, todos do Código de Processo Civil, combinados com o art. 300 do mesmo Código propor a presente:
AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C OBRIGAÇÃO DE ENTREGAR COISA E INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS
Em face de $[parte_reu_razao_social], $[parte_reu_cnpj], pessoa jurídica de direito privado, com sede $[parte_reu_endereco_completo] pelas razões de fato e de direito doravante aduzidas:
I. DOS FATOS
O autor, há alguns anos, celebrou contrato de alienação fiduciária com o Banco $[parte_reu_razao_social], em garantia à aquisição do automóvel Peugeot, placa$[geral_informacao_generica], ano 2012.
Em junho de 2019, porém, em razão das dificuldades que vinha encontrando para manter o pagamento das prestações, o autor celebrou junto ao réu Contrato de Compra e Venda de Veículo Financiado (doc n° 1).
De acordo com as disposições do instrumento, o autor cedia ao veículo ao réu, a quem competia, em 12 meses, renegociar e quitar o financiamento.
Ocorre que, passados 12 meses, o réu nada fez para pagamento da dívida, levando o autor, a fim de evitar restrições decorrentes do débito em aberto, a quitar o contrato com seus próprios recursos (doc n° 2).
Não bastasse, o réu, ao longo do período que esteve com o veículo, acumulou diversas infrações de trânsito, cujas sanções provocaram, inclusive, perda do direito de dirigir do autor.
As tentativas de contato com o réu foram infrutíferas.
Por não divisar solução diversa, vem o autor, perante este D. Juízo, reclamar o que de direito, conforme segue.
II. DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Dispõem os artigos 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor que é consumidor a pessoa física que utilize produto ou serviço como destinatário final, e fornecedor, pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, que desenvolva, entre outras, atividade de comercialização de produtos e prestação de serviços.
E, de fato, in casu, dúvida não há de que devidamente caracterizados o consumidor e o fornecedor, bem como a relação consumerista, fundada na vulnerabilidade, que atrai o microssistema protetivo.
Isso porque, como se denota do incluso contrato, o réu, comprador do carro, explora profissionalmente atividade econômica cujo objeto é a assunção de financiamentos, para quitação e venda, posteriormente, do veículo adquirido.
Fá-lo, inclusive, por meio de empresa de assessoria, mencionada no contrato, que se encarregaria da negociação perante a instituição fiduciante.
Assim, há, de um lado, um fornecedor de serviço e, de outro, aquele que o consome como destinatário final, estrutura que atrai as disposições do CDC.
Em segundo lugar, a teor do art. 4°, I, do CDC, a vulnerabilidade é evidente.
Com efeito, a vulnerabilidade é conceito que, a um só tempo, caracteriza e justifica a relação de consumo, legitimando a aplicação do CDC.
No caso em apreço, nítido é que a relação mantida entre o autor, pessoa física, e a ré não é paritária.
Isso porque é o autor técnica, econômica e juridicamente vulnerável, e disso faz prova os contratos de adesão a que está sujeito, sua reduzida autonomia de vontade na consolidação dos termos contratuais e sua sujeição econômica.
Assim, de rigor o reconhecimento da relação de consumo.
Além disso, em atenção à regra do art. 6, VIII, do CDC, forçoso o reconhecimento da hipossuficiência do requerente e da verossimilhança de suas alegações para efeito de inversão do ônus da prova.
Afinal, não bastasse a vulnerabilidade que caracteriza a própria relação, certo é que a distribuição estática do ônus da prova acarretaria grave prejuízo à defesa dos direitos do requerente, o que, aliás, demanda sua redistribuição à luz do próprio art. 373, §1°, do CPC.
Isso porque os réus mantêm registros de seus serviços e atividade, de sorte que lhes é muito mais fácil fazer prova contra o autor, justamente com uso desses dados, do que esse, que não tem acesso a tais registros ou aos meandros da prestação do serviço, provar os fatos constitutivos de sua pretensão.
Deste modo, requer-se o reconhecimento da relação de consumo e a aplicação da regra da inversão do ônus da prova, forte no art. 6°, VIII, do CDC e art. 373, § 1°, do CPC.
III. DA INEXECUÇÃO VOLUNTÁRIA DO CONTRATO
Embora intitulado “contrato de compra e venda”, o instrumento anexo enfeixa obrigações adicionais à de dar.
A rigor, a obrigação principal do comprador é a assunção do financiamento e QUITAÇÃO do contrato.
Isso porque, em que pese na Cláusula 1ª o objeto do contrato seja definido como a aquisição do veículo, nas Cláusulas 3ª e 5ª compromete-se o comprador a assumir o débito e a quita-lo em 12 meses.
A Cláusula 3ª imputa ao comprador a obrigação de quitar “(...) o saldo devedor de toda a dívida do carro na média de 30/12 à 12 meses”.
A Cláusula 5ª, no mesmo sentido, estabelece que à mesma parte caberá “(...) a responsabilidade de assumir o saldo devedor perante a instituição financeira, de iniciar o processo de negociação bancária bem como tomar todas as medidas judiciais possíveis para quitar o contrato perante a instituição financeira...”.
Como se vê, o contrato delimita, de forma até redundante, uma obrigação a termo, imputada ao comprador, de dar cabo ao financiamento, em troca da aquisição da propriedade do automóvel.
De fato, a parte a obrigação atribuída ao vendedor, ora autor, que era de entregar o veículo no ato da assinatura do termo, foi cumprida a contento, estando o veículo em posse do comprador desde então.
A obrigação do comprador, porém, consistente na quitação do financiamento, em até 12 meses, jamais foi adimplida. Nada foi pago por ele à instituição financeira; sequer assumido, perante o banco, o saldo devedor, que seguiu vinculado ao nome do autor.
Disso se faz evidente a inexecução substancial do contrato, a ensejar sua rescisão.
Em que pese não haja cláusula resolutiva no contrato, certo é que a abstenção do comprador no adimplemento de suas obrigações inviabiliza a execução do contrato.
Afinal, como já se disse, a razão justificadora da celebração do contrato é a assunção do saldo devedor do financiamento; se, porém, teve o autor de quita-lo por conta própria, porque esgotado o prazo ao comprador dado para fazê-lo, evidente é que a prestação se tornou imprestável e o contrato, inócuo.
A teor do art. 397 do Código Civil, o inadimplemento da obrigação em seu termo constitui o devedor em mora. In casu, portanto, encontra-se o devedor em mora desde junho de 2020, termo final para cumprimento da obrigação de assumir e quitar o saldo devedor do financiamento.
Por sua vez, estabelece o art. 395, parágrafo único, que “(...) Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.”
Nada obstante, no que se refere ao inadimplemento, malgrado óbvio, considerando que o contrato não disciplina cláusula resolutiva, cabe ao juiz declara-la (art. 474, CC), assistindo à parte lesada, ainda, o direito de optar pela resolução do contrato ou exigir-lhe o cumprimento, sem prejuízo, em qualquer caso, da indenização de perdas e danos (art. 475, CC).
Daí porque de rigor seja reconhecido o inadimplemento, à luz do art. 474, in fine, do Código Civil, e declarada a resolução contratual por inexecução voluntária, com fundamento no art. 395, parágrafo único, e 475, ambos do mesmo Codex.
DA OBRIGAÇÃO DE ENTREGAR/RESTITUIR COISA
Como já demonstrado, a mora do réu tornou a prestação inútil ao credor, inviabilizando sua execução.
Disso se depreende que o inadimplemento é substancial e induz a resolução do contrato por inexecução voluntária do réu.
Nesse contexto, e considerando as particularidades do contrato, além da indenização dos prejuízos, é forçoso restabelecer o status quo ante, o que implica na devolução do automóvel.
Afinal, a aquisição do automóvel estava CONDICIONADA à quitação do contrato no prazo de 12 meses. E o que se vê é que era essa a principal contraprestação vertida pelo comprador em troca do veículo; muito mais importante, aliás, que os módicos R$ 2.000,00 pagos na assinatura do termo.
Ocorre que, em razão da abstenção do réu no cumprimento de suas obrigações, teve o autor de, por si só, quitar a dívida contratualmente atribuída àquele.
Assim, se a razão que inspira o contrato é a assunção da dívida, em troca do automóvel, óbvio é que, não assumido o débito, faz-se indevida a troca do bem, caracterizando enriquecimento ilícito do réu.
Deste modo, resolvido o contrato, de rigor seja o réu condenado a RESTITUIR o automóvel ao autor, sob pena de busca e apreensão.
DA FIXAÇÃO DA TAXA DE USO/ALUGUEL DO AUTOMÓVEL
Ainda em razão da necessidade de se restabelecer o status quo ante, vê-se que, por força da inexecução contratual, a posse do veículo em poder do também se faz indevida.
Afinal, como já argumentado, o veículo foi cedido em contraprestação à assunção da dívida.
Logo, se a dívida não foi assumida pelo réu no termo fixado no contrato, além da restituição do veículo, é também de rigor a fixação de uma taxa de uso do bem.
Isso porque, naturalmente, o veículo, em razão do uso, acabou sujeito a depreciação e sua mera restituição ao autor, que quitou o financiamento, não será suficiente para recompor o status quo ante, já que o veículo retornará com valor de mercado bem inferior ao que tinha quando da sua cessão.
Além disso, se for o réu condenado a, apenas, restituir o veículo, estará a parte inadimplente se locupletando ilicitamente do período em que manteve o carro consigo, embora sem cumprir a obrigação que lhe competia.
Tratar-se-ia de verdadeiro benefício da própria torpeza, o que não pode ser admitido.
Na mesma medida que ao autor cabe o direito de reaver o veículo no estado em que se encontrava quando da cessão (o que é impossível), o réu, que dá causa à resolução do contrato, não pode ser beneficiado por mais de 1 ano de uso GRATUITO do bem.
Daí porque a forma mais razoável e justa de se reequilibrar a relação e garantir a recomposição plena do status quo ante é a fixação de uma taxa de uso, análoga a uma locação do automóvel, que recomporá a depreciação do bem e remunerará seu uso pelo comprador, à semelhança do que ocorre com alienação de imóveis.
No caso em testilha, o carro que é objeto do contrato é um Peugeot/207SW, 2012, atualmente cotado em R$ 19.877,00, conforme inclusa pesquisa na Tabela Fipe:
Considerando que, em média, o valor mensal do aluguel de um carro corresponde a 5% de seu valor de mercado – patamar, diga-se, bastante razoável para remuneração de seu uso, de rigor seja o réu condenado a pagar ao autor R$ 993,85 por mês, desde a celebração do contrato até sua efetiva devolução.
Para fins de quantificação do pedido, referida taxa de uso, até a distribuição da presente, totaliza R$ 14.742.10.
IV. DOS DANOS
A responsabilidade civil daquele que, no bojo de relação contratual, deixa de prestar o fato a que se obrigou é disciplinada no Código Civil:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor.
Pelo que se depreende dos dispositivos supratranscritos, aquele que, culposamente, deixa de cumprir obrigação contratual responde pelos danos a que der causa, acrescidos dos encargos legais.
Referida responsabilidade é sufragada, inclusive, no caso de mora do devedor, a teor do que dispõe o art. 395:
Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente …