Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA CÍVEL DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo],$[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], portador do $[parte_autor_rg] e inscrito no $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado na $[parte_autor_endereco_completo], vem, mui respeitosamente perante V. Exa. através dos procuradores in fine assinados, propor a presente
INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL
contra $[parte_reu_razao_social], pessoa jurídica de direito privado, inscrita no $[parte_reu_cnpj], com sede na $[parte_reu_endereco_completo], pelos motivos e razões que passa e expor:
DOS FATOS
O ora requerente foi contratado pela requerida para exercer a função de operador de telemarketing em 21/02/2018 sendo que foi demitido em 13/04/2021.
Demissão essa feita de forma discriminante, ferindo os mais elementares direitos e garantias fundamentais do cidadão preceituado na própria Constituição Federal.
Tal assertiva de discriminação se faz em função de que a demissão se deu única e exclusivamente pelo fato do requerente ser portador do vírus HIV (Soropositivo).
Afirmação essa que se comprovará através do contido na exordial e nas provas que se produzirão nos autos.
Por determinação da requerida todos os funcionários se submetem periodicamente a uma série de exames médicos. Sendo que em fins de janeiro/2021, o requerente foi submetido a esta bateria de exames.
Ocorre, todavia, que após o resultado destes exames rotineiros, o Médico da requerida, Dr. $[geral_informacao_generica]solicitou que fossem feitos mais três exames de sangue.
Outrossim, após estes exames alertou ao requerente que seu caso era muito sério e o encaminhou à Dra. $[geral_informacao_generica], que determinou novos exames e por fim diagnosticou o resultado positivo vírus do HIV.
Do resultado final dos exames, foram indicados Marcadores Imunológicos de Membrana - que indica que o requerente é portador do vírus HIV. E nos exames de nome - Coringa, expedido pelo laboratório $[geral_informacao_generica], Consta HIV = reagente, que faz de uma forma $[geral_informacao_generica]% segura o diagnóstico do HIV.
No dia 20 de fevereiro de 2021 o requerente foi chamado pelo Dr. $[geral_informacao_generica] no consultório da empresa. Comparecendo, recebeu a informação de que era soropositivo para HIV.
Após o choque inicial da notícia perguntou ao médico qual a posição da empresa a cerca de tal fato e este respondeu que quem decidia era o diretor.
Com a confirmação inconteste do HIV a empresa no dia 13/04/2021 imotivadamente, demitiu o requerente (doc.).
A dispensa imotivada fundamentada na discriminação pode ser confirmada através do advogado da empresa em reclamatória trabalhista onde ele afirma:
"... que o fato do reclamante ser portador do Vírus HIV criou 'clima de apreensão entre os colegas', que haveria perigo para os demais empregados, médicos e dentistas; bem como ocorreria reação negativa entre sua clientela se mantivesse o autor e a notícia fosse veiculada."
Item 4.2 da Contestação:
"... se ainda hoje (meados de $[geral_informacao_generica]) assusta saber-se que alguém próximo é portador do HIV, no início de 1991 a situação era de aterrorizar. Tanto assim era, que foi necessário desencadear campanhas de informação do Tipo 'AIDS', não se contrai pelo cumprimento ..."
A situação entre os empregadores, e o risco, em relação aos clientes não deixaram à reclamada outra alternativa: Precisou Dispensar o Reclamante
Continuando mais adiante, alega:
"O reclamante procura minimizar a importância do HIV, trazendo palavras de médicos e do Ministério da Saúde."
E mais:
"... ainda agora (e pior há dois anos atrás) não se pode desprezar o sentimento de uma comunidade (de empregados) em relação a uma realidade, muito menos o risco real a ela imposto."
Ou seja, além da dispensa arbitrária e ultrajante, pois a empresa do porte da requerida, com convênios médicos e condições de proporcionar aos funcionários a mais completa assistência médica, (como tem feito a $[geral_informacao_generica] em igual situação), faz o contrário, tenta demonstrar que isso não é problema da empresa, alegando que a doença não o obriga a ficar com o funcionário, até porque a Lei assim não o requer.
Justiça seja feita, pois no momento mais importante para o requerente, o auxílio não foi dado, aliás muito pelo contrário, sofreu toda a sorte de humilhações e ainda foi dispensado.
O requerente, propôs junto à Justiça do Trabalho reclamatória trabalhista, onde requereu a reintegração no cargo e todas as verbas e salários devidos durante a data da dispensa. Conseguiu pleno sucesso, sendo que da Sentença (em anexo) cumpre destacar alguns pontos quais sejam:
"Em 1959 morria o suposto primeiro aidético, um marinheiro inglês com tantas doenças raras que, na época, o caso chegou a intrigar uma equipe de pesquisadores da Universidade de Londres 25 anos mais tarde, ao reexaminarem as amostras congeladas da biópsia, os cientistas constataram a presença do HIV naquele paciente." (REV. S. I. ano 6, nº 7, julho/92).
A partir de 1980, com a descoberta oficial da doença e a divulgação dos primeiros casos, iniciou o calvário dos seus portadores. Enfermidade que ataca diretamente o sistema imunológico, provocando sua derrocada, impede que ele reaja diante de qualquer ameaça a segurança do corpo humano. O organismo, então, não consegue mais defender-se eficientemente contra vírus, fungos e bactérias, responsáveis pela doenças oportunistas.
Essas vão provocar a morte, e, sem que ainda haja esperanças de cura, embora a sobrevida do doente venha aumentando com o arsenal químico existente para combater essas infecções oportunistas.
Do ponto de vista Médico, não se justificou o receio do réu em manter o autor no mesmo local de trabalho e função.
Continuando e citando o mestre Limongi França:
"Além da obrigação social do homem, o trabalho é objeto de um direito inalienável do ser humano, indispensável à auto realização em todos os setores de sua complexidade. Não pode, assim, o aidético ser discriminado na admissão e no exercício de atividade produtiva, a não ser que, em razão do tipo de trabalho e do estágio da moléstia, não haja possibilidade técnica de impedir o risco de contágio. E acrescenta:
Do mesmo modo, não pode ser a AIDS considerada causa jurídica de despedida do empregado." (RT - 661 - novembro/90, fls. 19)
Juridicamente, portanto, não tem amparo o ato de despedida que deve ser entendido como nulo.
A despedida, do ponto de vista social e humano.
Vista a questão do ponto de vista social e humano, também não há amparo a atitude do réu. Olvidou seu relevante papel social como empresa que é a busca da minimização do conflito entre o capital e o trabalho, a consciência de considerar o trabalhador não como uma peça sujeita a preço de mercado, ou descartável quando não se presta mais à finalidade, mas como pessoa humana, antes de tudo. Solidariedade. E, é ante a influência de sua idéia que se pode pensar em alterar a clássica definição romana de Justiça, de "dar a cada um o que é seu" para "dar a cada um o que deve ser seu". Aliás, João Del Nero em sua interpretação realista do Direito cita que já em 1850, empregadores cristãos reconheciam, na Declaração de Doulfuss, que o patrão deve ao operário mais do que o salário.
Não basta a reforma das leis. É preciso igualmente transformar o espírito do homem, que causa a injustiça e outros males. A mudança pressupõe valores morais e éticos, sem os quais o lado forte da relação empregatícia continuará despreocupado com a miséria, com a assistência social e como o apoio ao carente, que pode ser seu próprio colaborador no processo do lucro.
E por fim conclusões da sentença:
Toda proteção assegurada pelo ordenamento pátrio foi ignorado pelo réu, que movido mais pela desinformação discriminou o autor, expelindo-o de seu quadro funcional. Embora à época da demissão o autor ainda não fosse considerado doente, apenas portador do HIV, o fato é que cedo ou tarde os sintomas e as infecções oportunistas da doença ocorrerão. Em não se assegurando o emprego, estará o autor obstado em seu direito de obter auxílio doença, já que as chances de novo emprego serão remotas. Nulo, portanto, o ato de dispensa, nos termos do art. 9º da CLT, incisos XIII e XLI, do art. 5º e inciso XXXI, do art. 7º, da Constituição Federal de 1988. Conseqüência da Nulidade, será a reintegração ao emprego, nas mesmas funções antes exercidas, já que não apontada …