Petição
Exmo. Sr. Juiz Federal da Única Vara do JEF Cível Adjunto de CIDADE/UF.
Nome Completo, nacionalidade, estado civil, profissão, CPF. nº Inserir CPF, RG n° Inserir RG, residente e domiciliado na Inserir Endereço, por seu procurador infra-assinado, Dr. Nome do Advogado – OAB/Número da OAB, com escritório na Endereço do Advogado, onde recebe intimações, vem propor a presente
AÇÃO ORDINÁRIA
em desfavor do INSS – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, CNPJ n° Inserir CNPJ, situada na Inserir Endereço, pelos fatos e fundamentos que passa a expor:
Foi apontado pela Gerência Executiva da agência da Previdência Social de Ponte Nova/MG o indício de irregularidade no recebimento do benefício nº Informação Omitida, razão pela qual determinou, em conclusão (Ofício Informação Omitida), pela redução do valor do salário percebido mensalmente bem como devolução do valor recebido devido ao erro administrativo, em importância não informada.
Tal irregularidade teria residido no fato de ter recebido no cálculo da renda mensal (RMI) quando do deferimento do benefício, valor a maior.
Com a vênia que merece a Gerência Executiva desta Autarquia Federal, foi equivocada a conclusão de irregularidade, e ainda, se houve, quem deu causa foi a própria autarquia.
Outrossim, o pagamento supostamente indevido de valores pela Previdência Social ao segurado, pode se dar basicamente em duas ocasiões: por erro administrativo do INSS; ou em função de determinação judicial emanada em sede de antecipação de tutela, isto é, antes da sentença/acórdão transitar em julgado.
Em que pese interessar à presente discussão apenas a ocorrência de pagamento indevido por erro administrativo, para fins de diferenciação, faz-se relevante tecer, em linhas gerais, comentários sobre o caso em que ocorre pagamento indevido de benefícios previdenciários por ordem judicial em sede antecipatória.
O instituto da tutela antecipada está inserido no ordenamento jurídico pátrio, especialmente, no artigo, 273, I e II, do Código de Processo Civil – Lei Federal n. 5.869/73, conforme segue:
“Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II – fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu”.
Depreende-se da leitura do dispositivo legal supra que a tutela antecipada tem o condão de permitir que o julgador entregue ao autor da demanda, total ou parcialmente, a própria pretensão resistida. Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior, a decisão antecipatória:
“[...] concede ao autor (ou ao réu, nas ações dúplices) um provimento imediato que, provisoriamente, lhe assegure o bem jurídico a que se refere a prestação de direito material reclamada como objeto da relação jurídica envolvida no litígio”.
Nesse meandro, colaciona-se lição de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, ao comentarem o artigo 273, do Diploma Processual Civil, in verbis:
“Tutela antecipatória dos efeitos da sentença de mérito, espécie do gênero tutelas de urgência, é providência que tem natureza jurídica mandamental, que se efetiva mediante execução lato sensu, com o objetivo de entregar ao autor, total ou parcialmente, a própria pretensão deduzida em juízo ou seus efeitos. É tutela satisfativa no plano dos fatos”.
Denota-se, desta feita, que o deferimento judicial do pedido de tutela antecipada, que pode se dar a qualquer tempo antes da certidão de trânsito em julgado, implica, verdadeiramente, em antecipar os efeitos da sentença. Dada a importância das consequências de sua concessão, o provimento da antecipação de tutela exige, além da presença da prova inequívoca e verossimilhança do alegado, o preenchimento de um dos requisitos alternativos do artigo 273, I e II, do Código Processual Civil, quais sejam: periculum in mora; ou abuso de direito de defesa ou manifesto protelatório do réu.
Não há o que discutir em relação à devolução da tutela antecipada nas questões previdenciárias, principalmente pelo fato de o benefício se tratar de alimentos.
Como podem cobrar a devolução de valores recebidos de boa-fé?
No âmbito jurisprudencial, atualmente o entendimento acerca do não dever de devolução de valores previdenciários recebidos por força de decisão antecipatória resta sedimentado, conforme se constata da ementa proveniente de acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ.
O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que, em se tratando de verbas de natureza alimentar, como as decorrentes de benefícios previdenciários, os valores pagos pela Administração Pública, por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, não devem ser restituídos. Incide a Súmula 83/STJ.
Na mesma toada, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU), uniformizou interpretação de que é incabível a devolução de valores indevidos percebidos pelo segurado por força de antecipação de tutela, conforme é possível se vislumbrar da ementa abaixo:
“PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO NACIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE DOS EFEITOS DA TUTELA REVOGADA. DESNECESSIDADE. IRREPETIBILIDADE DE VALORES DE NATUREZA ALIMENTAR RECEBIDOS DE BOA-FÉ. PEDIDO PROVIDO.
1. Valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada em demanda previdenciária são irrepitíveis em razão da natureza alimentar desses valores e da boa-fé no seu recebimento.
2. Pedido Provido”.
Ademais, em última análise, cumpre destacar que, se a decisão final reformou a antecipação de tutela concedida nos autos da ação previdenciária, o pagamento indevido ao segurado partiu de um erro jurisdicional, enquanto o beneficiário litigante apenas exerceu o direito que lhe é assegurado ao livre acesso à Justiça.
Além do caso em que há pagamento indevido ao beneficiário do INSS por força de decisão concessória de antecipação de tutela em ação previdenciária, há o caso em que o pagamento indevido ocorre por erro administrativo da autarquia previdenciária, como ocorre neste caso.
Quando o segurado comparece a uma agência ou posto de atendimento do INSS e dá entrada em seu requerimento de concessão de benefício previdenciário, é instaurado um expediente administrativo. Nos respectivos autos administrativos devem ser juntadas e produzidas, pelo segurado, as provas quanto ao cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício previdenciário então pretendido. Após, o INSS aprecia o conjunto probatório e, ao final, emite decisão de deferimento ou indeferimento do pedido de benefício previdenciário elaborado pelo segurado. Da abertura do processo até essa decisão administrativa, houve a prática de uma série de atos administrativos.
Por seu turno, ato administrativo - em que pese suas diversas perspectivas e formas de definição – pode ser conceituado, como:
“[...] declaração do Estado (ou de quem lhe faça às vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional”.
Porém, por ser menos abrangente, prefere-se adotar a conceituação dada por Maria Sylvia Zanella Di Pietro, no sentido de que ato administrativo é:
“[...] a declaração do Estado ou de quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei, sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle do Poder Judiciário”.
Sob esse prisma, pode-se dizer que o ato administrativo é um ato jurídico, pois através dele o Estado externaliza sua vontade e este produz um determinado efeito abrigado pelo direito. Não obstante, para gerar esse efeito jurídico, não há de se olvidar que o ato administrativo “deve ser perfeito (cumprir todas as etapas de sua formação), válido (não contrastar com o ordenamento) e eficaz (não estar sob qualquer condição que constranja seus imediatos efeitos)”, sob pena de ensejar anulação.
Destarte, conclui-se que, quando um ato administrativo não for perfeito, válido ou eficaz, houve erro administrativo. Portanto, trazendo para o caso em tela, é importante esclarecer que só há pagamento indevido de valores previdenciários por erro administrativo porque a própria Previdência Social, no exercício de suas atividades, praticou algum ato administrativo eivado de vícios.
Nessa senda, faz-se alusão às ementas abaixo, correspondentes a decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ e STF), as quais demonstram o seu entendimento acerca da inviabilidade da restituição de valores previdenciários indevidos ao segurado, conforme se vislumbra:
“AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DO BENEFÍCIO EM URV. VIOLAÇÃO LITERAL A DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 20 DA LEI N° 8.880/94. TERMO "NOMINAL". RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. IMPOSSIBLIDADE. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS. PRECEDENTES.
I - A Terceira Seção já decidiu que a sistemática de conversão dos valores nominais dos benefícios prevista pelo art. 20 da Lei n° 8.880/94 assegura a irredutibilidade e a preservação do valor real dos benefícios previdenciários.
II - É indevida a restituição dos valores recebidos a título de conversão da renda mensal do benefício previdenciário em URV por se tratar de benefício previdenciário, que tem natureza alimentar.
Valores sujeitos ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
Ação rescisória procedente. Pedido de restituição indeferido”. (Grifado)
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. DEPENDENTE DE SEGURADO. FILHA MAIOR DE 21 ANOS DE IDADE. PERDA DA QUALIDADE DE BENEFICIÁRIA. EXTINÇÃO DO BENEFÍCIO. CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.[...]
4. Não há falar, portanto, em restabelecimento da pensão por morte à beneficiária, maior de 21 anos e não-inválida, uma vez que, diante da taxatividade do diploma legal citado, não é dado ao Poder Judiciário legislar positivamente, usurpando função do Parlamento.
5. A Terceira Seção desta Corte, no âmbito da Quinta e da Sexta Turma, firmou entendimento no sentido da impossibilidade da devolução, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidos a título de benefício previdenciário. Aplica-se, in casu, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido”. (Grifado)
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. BOA-FÉ. RECEBIMENTO. REMUNERAÇÃO. REPOSIÇÃO. ERÁRIO. DESCABIMENTO. 1. Segundo a orientação jurisprudencial pacificada no âmbito desta Corte Superior, descabe a reposição dos atrasados percebidos por servidor público que, de boa-fé, recebeu em seus proventos ou remuneração valores advindos de errônea interpretação ou má aplicação da lei pela Administração, mostrando-se injustificado o desconto. 2. Agravo regimental improvido”. (Grifado)
Depreende-se da última ementa, por oportuno, que o caso concreto envolve servidor público. Contudo, ressalva-se que os fundamentos ali postos para a não restituição dos valores pagos indevidamente são plenamente cabíveis nos casos que envolvem o segurado do Regime Geral da Previdência Social (RGPS), pois em ambas as situações, o que importa é que a verba em discussão seja proveniente de proventos/remuneração.
AG.REG. EM MANDADO DE SEGURANÇA 31.259 DISTRITO FEDERAL
RELATOR :MIN. LUIZ FUX AGTE.(S) :UNIÃO PROC.(A/S)(ES) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO AGDO.(A/S) :ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS - ASSEJUS ADV.(A/S) :TATIANE ALVES DA SILVA INTDO.(A/S) :TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO ADV.(A/S) :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR SERVIDORES PÚBLICOS. VALORES REFERENTES À PARCELA DE 10,87% (IPCR) E RELATIVOS A PAGAMENTO PELO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES COMISSIONADAS E CARGOS EM COMISSÃO. A NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Os valores percebidos em razão de decisão administrativa, dispensam a restituição quando auferidas de boa-fé, aliada à ocorrência de errônea interpretação da Lei, ao caráter alimentício das parcelas percebidas e ao pagamento por iniciativa da Administração Pública sem participação dos servidores. 2. Os valores recebidos com base em decisões judiciais, além de não ostentar caráter alimentar, não são restituíveis na forma da jurisprudência desta Corte. (Precedente AI 410.946-AgR, Min. Rel. Ellen Gracie, DJe 07/5/2010) 3. In casu, O TCU determinou a devolução de quantias indevidamente recebidas por servidores do TJDFT, relativas ao pagamento de valores referentes ao percentual de 10,87%, em razão de decisões judiciais, bem como ao pagamento do valor integral de função comissionada ou cargo em comissão cumulado com remuneração de cargo efetivo e VPNI, devido à decisão administrativa. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator, vencido o Senhor Ministro Marco Aurélio. Brasília, 24 de novembro de 2015. LUIZ FUX – RELATOR.
Além de comprovar que a jurisprudência hodierna tem interpretação cediça quanto à inviabilidade da restituição dos valores previdenciários pagos indevidamente pelo INSS ao segurado, a transcrição das ementas acima permite concluir que esse entendimento se dá a partir da análise da existência de: errônea interpretação ou má aplicação da lei por parte da Administração Pública, in casu INSS; bem como da presença da boa-fé do beneficiário. Presentes esses dois requisitos circunstanciais, sob a ótica jurisprudencial, a restituição é indevida em atendimento ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos.