Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ VARA CÍVEL DA COMARCA DE CIDADE - UF
Autos de nº Número do Processo
Nome Completo, qualificado nos autos da ação em epígrafe, que move em face de Razão Social, vem, por seus advogados que abaixo subscrevem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, apresentar
RAZÕES DE APELAÇÃO
requerendo a oportuna remessa das mesmas à instância superior.
Termos em que
Pede e espera deferimento
CIDADE, Data.
Nome do Advogado
Número da OAB
RAZÕES DE APELAÇÃO
Autos nº: Número do Processo
Recorrente: Nome Completo
Recorrido: Razão Social
Egrégio Tribunal
Colenda Câmara
Doutos Julgadores
I. DOS FATOS:
1. O banco réu alega que a parte autora, quando contratou empréstimo com desconto automático em seu benefício previdenciário, na modalidade conhecida como empréstimo consignado, concordou em aderir e contratou cartão de crédito. No entanto, em atitude de má-fé e ao arrepio da lei, o que se revela é que o banco impôs a chamada reserva de margem consignada (RMC), com a imposição clara de venda casada de um cartão de crédito. Ademais, não solicitou o referido serviço e que, em razão disso, todos os meses lhe são descontados indevidamente valores de seu benefício, causando prejuízos.
2. Postula o autor a declaração de nulidade da contratação de reserva de margem consignada e a reparação de danos morais, no importe de R$ 15.000,00. O réu foi citado e apresentou contestação, sobrevindo sentença de improcedência da demanda, ora apelante.
II. PRELIMINARMENTE:
IIA – TEMPESTIVIDADE:
3. Ab ovo, é consabido que o prazo legal para oposição da Apelação é de 15 [quinze] dias.
IIB – CERCEAMENTO DE DEFESA:
4. Ínclitos Desembargadores, data venia, é com estranheza que se verifica a publicação da v. sentença de mérito proferida pelo d. juízo a quo antes mesmo que o autor tenha sido intimado para apresentar réplica, regra esta expressamente prevista no art. 350 e 351 do CPC. A manutenção desse vício acarretará em nulidade absoluta da r. sentença de mérito, acaso não acolhidos a presente preliminar.
5. Não obstante, a respeitável sentença toma como verdade a existência de contrato entre as partes, alegação unilateral do réu. frise-se, não há nos presentes autos o referido instrumento juntado.
6. Nesses termos equivocados aduz a respeitável sentença:
Tem-se, em resumo, que a parte autora nega a contratação do cartão de crédito consignado e sustenta que o réu indevidamente bloqueou parte da margem consignável junto ao seu benefício previdenciário.
Pois bem.
A existência da relação jurídica obrigacional entre as partes está devidamente comprovada nos autos, conforme se depreende do contrato de cartão de crédito consignado juntado com a contestação, devidamente assinado pela parte autor.
7. Antes que seja vergastado à saciedade esse crasso equívoco processual, mister evidenciar que a v. sentença de mérito flagrantemente tolheu os direitos à ampla defesa e ao contraditório da ora apelante.
8. Neste diapasão convém reiterar que o autor expressamente nega ter contratado cartão de crédito e que a informação de que existe juntada de contrato nos autos não condiz com a realidade.
9. O art. 5º da Constituição Federal prescreve em seu inciso “LV”, ex legis:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
10. Decorre que a respeitável sentença considera uma INVERDADE pronunciada de maneira unilateral pelo réu como se VERDADE. Essa é apenas a transcrição do que disposto no artigo 350 CPC, ex legis:
Art. 350. Se o réu alegar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, este será ouvido no prazo de 15 (quinze) dias, permitindo-lhe o juiz a produção de prova.
11. Por isso, fez-se necessário aviar a presente preliminar para que seja sanado esse erro material, pelo flagrante desrespeito aos princípios basilares do Estado Democrático de Direito [em especial contraditório e ampla defesa], bem como às regras previstas no CPC e na Constituição Federal.
12. Contudo, muito embora o dispositivo legal prescreva a obrigatoriedade do Contraditório e da Ampla Defesa, quando verificados os requisitos da petição inicial [CPC, arts. 319 e 334], infere-se do caderno processual que d. juízo a quo reconhecidamente saltou a etapa prévia do processo, data venia.
13. Nesse sentido o Egrégio TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no ponto:
ACÓRDÃO Responsabilidade Civil servidão sociedade de economia mista ausência de processo formal expropriatório julgamento prematuro da lide antes que facultado pronunciamento sobre o teor da contestação e cerceamento de prova fatos relevantes a influírem no julgamento da causa - processo anulado - recurso de apelação provido para assegurar direito à réplica e produção de prova. Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1005715-68.2015.8.26.0361, da Comarca de Mogi das Cruzes, em que é apelante BENEDITO SANTOS DE MELO, é apelado PETROLEO BRASILEIRO S/A PETROBRAS. ACORDAM, em 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso de apelação para anular o processo a partir do momento em que autor deveria oferecer réplica à contestação e para reabertura da instrução. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (Presidente sem voto), FLORA MARIA NESI TOSSI SILVA E FERRAZ DE ARRUDA. São Paulo, 22 de novembro de 2017. SOUZA MEIRELLES RELATOR. (grifamos)
14. Pelo que tudo exposto alhures, deve ser reconhecida a preliminar apresentada para sanar o erro material constatado no v. decisum.
15. Deveria, o ilustre magistrado de piso, ter reconhecido o erro material da respeitável sentença em sede de embargos declaratórios, assim como ensinam FREDIE SOUZA DIDIER JÚNIOR e LEONARDO CARNEIRO DA CUNHA :
(...)Tradicionalmente, o Superior Tribunal de Justiça entende que se considera erro material a adoção de premissa equivocada na decisão judicial. Nesse caso, cabem embargos de declaração para corrigir a decisão e, até mesmo, modificá-la, eliminando a premissa equivocada.
Quando, enfim, a decisão parte de premissa equivocada, decorrente de erro de fato, são cabíveis embargos de declaração para correção de tal equívoco.
Com efeito, cabem embargos de declaração, quando o julgado embargado decida a demanda orientado por premissa fática equivocada (...)
16. Nesse sentido o Pretório TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESE DE ERRO DE PREMISSA FÁTICA. CONFIGURAÇÃO. REPERCUSSÃO NA CONCLUSÃO ALCANÇADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITO INFRINGENTE. Como se sabe, os embargos de declaração constituem recurso de âmbito discursivo restrito à expurgação de erro material, omissão, obscuridade ou contradição na decisão, conforme artigos 1.022 e 1.023 do CPC/15. Não verificada a existência de qualquer omissão, obscuridade ou contradição na decisão embargada, porém constatada a ocorrência de erros materiais e/ou utilização de premissas equivocadas que repercutem na conclusão, impõe-se o acolhimento do recurso para expurgação dos vícios detectados. [TJMG, Embargos de Declaração-Cv 1.0000.18.131888-2/003, Relator(a): Des.(a) Otávio Portes, 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 20/05/2020, publicação da súmula em 21/05/2020]
17. Por fim, considerando a preliminar aduzida, mister seja a respeitável sentença anulada e a ora apelante intimada para manifestar-se nos autos em réplica acerca das INVERDADES alegadas pelo BANCO RÉU.
III. PAPEL SOCIAL DO CONTRATO:
18. A função social está prevista na Constituição Federal, em seu art. 5º XXIII, vinculado a outros dispositivos constitucionais.
19. A Constituição nos diz que a propriedade é vinculada à sua função social. Mais afrente entenderemos que se descumprida essa função, os impostos podem aumentar progressivamente (IPTU), chegando ao extremo de ser decretada a desapropriação em função de interesse público ou social.
20. Especificamente em contratos, nós temos também a presença do princípio da função social, estampada inclusive no art. 421 do Código Civil, que nos diz o seguinte: “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.
21. A função social é basicamente a um princípio legal, advindo da preocupação maior do legislador e da jurisprudência em preservar o equilíbrio das relações contratuais e de posse e propriedade dos bens e o meio esterno.
22. No conceito de meio esterno nós podemos destacar o interesse do cidadão, ou seja, da coletividade e o interesse ambiental. De modo geral, a função social protege os direitos coletivos e difusos, frente às relações privadas, inclusive as relações de posse e propriedade.
23. Tatando-se de relação entre a parte ré é HIPERSUFICIENTE, que conta com robusta estrutura jurídica, administrativa, comercial, ao ponto de introduzir suas propostas comerciais em veículos de comunicação de massa. E, de outro lado, a parte autora HIPOSSUFICIENTE, com baixa informação e instrução, idoso em plena Pandemia, sendo lesado em seus módicos vencimentos de aposentadoria, há de se reconhecer notório desequilíbrio na relação comercial.
24. O contrato RMC não cumpre papel social.
25. De início, ainda que o autor tenha reajustes no valor da prestação mínima, por reajustes nos proventos, que normalmente não são altos, o saldo devedor se manterá elevado.
26. Nessa perspectiva, a dívida dificilmente será um dia liquidada pela metodologia em vigor.
27. São verdadeiros grilhões de ferro que prendem a demandante praticamente de modo perpétuo à dívida, que favorece sobremaneira o BANCO, em prejuízo do consumidor HIPOSSUFICIENTE.
28. Os grilhões de ferro prendem também a aposentadoria do autor, que pela margem consignável, não consegue obter outro financiamento, em condições de juros mais favoráveis, como os dos créditos consignados comuns, onde pode obter juros até quase 60% inferiores aos cobrados pelo BANCO RÉU (1,44% - Informação Omitida). E bem melhor, com prestações fixas e parcelas delimitadas no tempo.
29. De fato, no caso em tela, o autor nega a intenção de contratar cartão de crédito. Pretendia, na realidade, a celebração de empréstimo consignado.
30. É nítida a abusividade do banco, que coloca a autora em posição de desvantagem exagerada, relacionando o empréstimo consignado à contratação de cartão de crédito, impondo, contra os interesses da consumidora, uma vantagem
31. A relação contratual discutida na hipótese, conclui pela necessidade de reformar a respeitável sentença proferida, que data venia endossa a irregular contratação e a forma de pagamento.
32. Deve-se entender pela nulidade do contrato de cartão de crédito com possibilidade de desconto da reserva de margem consignável RMC.
33. Evidente a falta de clareza e a confusão que causou à consumidora do serviço bancário em questão, uma vez que ele nunca almejou a sua contratação e apenas pensou estar contratando um empréstimo consignado para pagamento de forma parcelada.
34. Nesse sentido, afigura-se evidente a impossibilidade de quitação do “empréstimo” tomado a partir de saque realizado com o cartão de crédito, uma vez que a forma de pagamento somente à vista invariavelmente leva a inadimplência do contratante, fazendo incidir a aplicação de juros e a realização de descontos da RMC sobre o benefício mensal como se pagamento mínimo fosse, sem alcance e abatimento do valor principal da dívida, perpetuando os pagamentos via desconto.
35. Trata-se de DÍVIDA INFINITA.
36. O banco não apresentou “TERMO DE ADESÃO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO BANCO BMG E AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO”, sendo, portanto, contrato nulo porque imposto como condição para o fornecimento de empréstimo, verdadeira pretensão da apelante, considerado que não há prova da utilização do cartão e sequer de seu desbloqueio, daí a prova de vício de consentimento.
37. Nesse prisma, acrescenta-se a aplicação de taxa de juros efetiva mostra-se excessiva (3,69% ao mês, ou 55,33% ao ano - cláusula IV, item c - fl. 48) se comparada a taxa média de juros remuneratórios utilizada em operações de empréstimo consignado.
38. O contratante titular do benefício, pessoa de baixa renda, tornou-se inadimplente e passou a ser descontada vitaliciamente de RMC Reserva de Margem Consignável, sem alcançar o valor principal, resultando em uma dívida impagável que permanece indefinidamente.
39. Emerge a prática abusiva operada pelo BANCO RÉU, porquanto condiciona o empréstimo à contratação do cartão de crédito, aproveitando-se da fraqueza ou ignorância da consumidora, exigindo desta uma vantagem manifestamente excessiva (art. 39, I, IV e V, do CDC).
40. De se anotar a falta de clareza dos instrumentos em questão, notadamente no que tange à forma de pagamento e dificuldade de quitação que impõe, conforme exposto.
41. Nesse norte, conforme pondera com razão a autora, através de um saque monetário contrai-se uma dívida permanente e crescente.
42. Destarte, nunca haverá o abatimento do empréstimo, fazendo com que a parte autora permaneça recebendo descontos mensais em seu benefício eternamente.
43. A jurisprudência desta Corte, tirada de caso análogo envolvendo a mesma instituição financeira, não discrepa:
CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. Ação de obrigação de fazer cumulada com repetição de indébito e indenização por dano moral. Conexão reconhecida. Sentença de parcial procedência. Réu que não comprovou a contratação de cartão de crédito consignado, tampouco demonstrou que a autora tinha plena ciência de tais condições ou sua utilização. Constituição de RMC que somente poderá ocorrer após a solicitação formal firmada pelo titular do benefício. Não há nos autos qualquer documento a evidenciar solicitação ou autorização expressa da autora para descontos em reserva de margem consignável, conforme determina o artigo 5º da Resolução Normativa do INSS. Devolução dos valores na forma simples e não em dobro, permitida a compensação. Dano moral configurado ante os descontos em benefício previdenciário sem autorização da apelante. Valor arbitrado em R$ 10.000,00 somadas as duas ações. Redução. Descabimento. Razoabilidade e proporcionalidade. Apelação parcialmente provida. (TJSP; 18ª Câmara de Direito Privado; Apelação 1000635-85.2017.8.26.0060; Rel. Des. Jairo Oliveira Junior; j. 11/06/2018).
44. Por fim, por se considerar que os descontos mensais realizados são abusivos e ilegais, já que recaem sobre verba de natureza alimentar, forçoso o reconhecimento dos danos morais à autora, porquanto reflete no comprometimento de sua subsistência, gerando, assim, evidente angústia e exacerbada preocupação.
45. Doutrina e jurisprudência, com o passar dos anos, consentiram que a indenização devesse servir a um duplo propósito, sendo o primeiro compensatório ou lenitivo para o ofendido como forma de minorar o sofrimento a que foi submetido.