Princípio da Anterioridade Tributária
Atualizado 14/03/2024
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O princípio da anterioridade tributária é um relevante preceito constitucional de direito tributário, que confere segurança jurídica para todos os contribuintes.
É sabido que o Estado é sustentado pelos contribuintes, sendo sua estrutura administrativa custeada pelos inúmeros tributos que são cobrados.
Basicamente - salvo raras exceções - toda e qualquer atividade do cidadão é tributada.
E mais: inexiste pessoa que, direta ou indiretamente, não pague um tributo - afinal, tudo aquilo que consumimos, do café à energia elétrica, é tributado.
O tema é tão relevante que ganhou uma ampla regulamentação na Constituição Federal de 1988, ampliando as normas constitucionais que já existiam nas Cartas Magnas anteriores.
Neste artigo, vamos entender melhor como funciona o princípio da anterioridade tributária, e suas aplicações na advocacia.
Boa leitura! Caso siga com dúvida em algum item, mande um e-mail para gente!
O que é o princípio da anterioridade tributária?
O princípio da anterioridade tributária é um preceito de direito tributário que determina que não pode ocorrer a cobrança de um tributo no mesmo exercício financeiro em que ele foi criado.
Ou seja: quando o Poder Público cria um tributo, ele só será exigível no exercício financeiro seguinte ao de sua criação.
Trata-se de um princípio de direito tributário que confere segurança jurídica e estabilidade nas relações do Estado com os contribuintes, pois evita surpresas na cobrança de tributos, permitindo uma dinâmica de preços com certa previsibilidade.
A seguir, vamos entender melhor os tipos de anterioridade tributária, e suas diferenças com outros institutos jurídicos, como a vacatio legis.
Quais são os tipos de anterioridade tributária?
Existem dois tipos de anterioridade tributária: anual e nonagesimal.
Vamos entender a seguir o conceito de cada um deles.
O que é a anterioridade anual ou do exercício?
A anterioridade anual ou anterioridade do exercício indica que os tributos só podem ser exigidos no exercício financeiro seguinte ao que foi publicada a lei que os instituiu ou aumentou.
Como vimos acima, este prazo é de grande importância para os contribuintes, que podem ser organizar e preparar para arcar com os novos valores - bem como para efetuar eventual ajuste nos valores de seus produtos e serviços.
Qual a previsão legal do princípio da anterioridade anual?
A anterioridade anual ou do exercício está prevista no Artigo 150 inciso III alínea "b" da Constituição Federal de 1988:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
...
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
O que é a anterioridade nonagesimal?
Por sua vez, a anterioridade nonagesimal significa que os tributos só podem ser exigido após 90 dias da publicação da lei que os instituiu ou aumentou.
Qual a previsão legal do princípio da anterioridade nonagesimal?
A anterioridade nonagesimal está prevista no Artigo 150 inciso III alínea "c" da Constituição Federal de 1988:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
...
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;
Anterioridade Anual x Anterioridade Nonagesimal
Os tipos de anterioridade tributária funcionam de forma conjunta - prevalecendo o prazo mais longo
Ou seja, uma vez instituído o tributo, ele só pode ser exigido:
-
No exercício financeiro seguinte ao que foi criado;
-
Após 90 dias da lei que os instituiu ou aumentou;
Vamos analisar dois exemplos para ficar mais clara essa dinâmica.
-
Tributo criado em 1º/03/2023 - pela anterioridade anual, ele só pode entrar em vigor em 1º/01/2024, já pela anterioridade nonagesimal, ele só pode entrar em vigor em 1º/04/2023 - prevalece, então, a data mais longa, de 1º/01/2024, quando ele já terá cumprido com os dois prazos.
-
Tributo criado em 1º/12/2023 - pela anterioridade anual, ele poderá entrar em vigor em 1º/01/2024, porém, como não terão transcorridos ainda os 90 dias da anterioridade nonagesimal, ele só entrará em vigor em 1º/03/2024.
Exceções ao princípio da anterioridade tributária
Existem importantes exceções ao princípio da anterioridade tributária, nas quais os prazos não são aplicados.
Como tal princípio tem expressa previsão na Constituição Federal, somente a própria Constituição pode prever suas exceções - sendo justamente o que ocorre com os seguintes tributos: Imposto de Guerra Externa, Imposto de Importação e Imposto de Exportação, Imposto sobre Produtos Industrializados e Imposto Territorial Rural.
Além de situações específicas em relação a outros tributos, como o Imposto sobre a Renda.
Primeiro, os Empréstimos Compulsórios, tributos cobrados em casos de Guerra Externa ou em sua iminência, não obedecem à qualquer anterioridade tributária (nem anual, nem nonagesimal) - uma vez que tem sua natureza na urgência da situação que os enseja.
O mesmo ocorre em relação ao Imposto de Importação e ao Imposto de Exportação que, por terem uma natureza regulatória do mercado interno e externo, possuindo um caráter extrafiscal, não estão sujeitos à nenhum tipo de anterioridade tributária.
Já o Imposto Sobre Produtos Industrializados também não se sujeita à anterioridade tributária anual, eis que serve de incentivo ou desestímulo a determinados setores, possuindo uma função regulatório de mercado - porém, ele segue tendo que obedecer ao princípio da anterioridade tributária nonagesimal.
O Imposto sobre a Propriedade Rural também não se sujeita a qualquer tipo anualidade, assim como ocorre com eventuais impostos extraordinários instituídos de forma emergencial pela União.
Em relação ao Imposto de Renda, ele se sujeita apenas ao princípio da anterioridade tributária nonagesimal - ou seja, uma alteração no IR em 31/12/2024 pode começar a valer já em 1º/01/2025.
Por fim, temos o IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores) e o IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana), cuja base de cálculo se submete apenas à anterioridade anual, não se sujeitando à anterioridade nonagesimal.
O que é o exercício financeiro?
Para compreender o princípio da anterioridade tributária, é preciso ter claro o que é o exercício financeiro a que ela se refere.
O conceito de exercício financeiro está relacionado ao ano orçamentário, e não ao ano civil.
No entanto, a Lei Complementar nº. 4.320/64 indica em seu Artigo 34 que o exercício financeiro coincidirá com o ano civil, vejamos:
Art. 34. O exercício financeiro coincidirá com o ano civil.
Atenção: não vamos confundir anterioridade tributária com anualidade. A lei determina que o tributo só pode entrar em vigor no exercício financeiro seguinte ao que foi criado - porém, isso não quer dizer que haverá 1 ano civil de intervalo.
Com isso, um tributo criado em dezembro/2023 poderá entrar em vigor em março/2024 - respeitando apenas a anterioridade nonagesimal.
Qual a diferença entre anterioridade tributária e vacatio legis?
A anterioridade tributária é um princípio constitucional de direito tributário, e indica que a lei que instituiu ou aumentou algum tributo só poderá ter seus efeitos aplicados após um determinado período - no exercício financeiro seguinte ou após 90 dias.
Já a vacatio legis é um termo que indica o período entre a promulgação de uma lei e sua entrada em vigor.
Seu período é determinado pela própria lei, podendo ser imediato - ou seja, entrando em vigor no dia seguinte ao da publicação - ou mais longo, como ocorreu com o Novo Código Civil (1 ano).
O que diz o Supremo Tribunal Federal sobre o princípio da anterioridade tributária?
O Supremo Tribunal Federal possui duas súmulas em vigor sobre o princípio da anterioridade tributária, a saber, a Súmula 50 e a Súmula 669, que assim dispõem:
STF - Súmula Vinculante nº. 50: Norma legal que altera o prazo de recolhimento de obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.
STF - Súmula nº: 669: Norma legal que altera o prazo de recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.
Recentemente, o STF decidiu que o princípio da anterioridade tributária também é aplicável à revogação de benefícios fiscais, em razão de sua finalidade de garantir a segurança jurídica e a não surpresa:
DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ICMS. REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL. MAJORAÇÃO INDIRETA DE TRIBUTO. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE.
1. Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo interposto em face de decisão que, monocraticamente, conheceu do recurso e deu-lhe provimento. O acórdão do TJSP, reformado pelo relator, havia determinado que decreto estadual que revoga benefício fiscal de ICMS produza efeitos apenas a partir do ano seguinte a sua edição, respeitando a anterioridade anual e a noventena, por configurar aumento de carga tributária, nos termos da jurisprudência desta Corte.
2. O ato normativo questionado pelo contribuinte extinguiu benefício fiscal que possibilitava a geração de créditos de ICMS ainda que a circulação de mercadorias fosse isenta. No entanto, seus efeitos começaram a ser produzidos quando da publicação. A anterioridade tributária visa a assegurar a previsibilidade da carga tributária, protegendo a segurança jurídica, a não surpresa e a confiança legítima. Por isso, também deve ser aplicada à revogação ou alteração de benefício fiscal, conforme já reconhecido por esta Corte.
3. Desse modo, divirjo do relator e dou provimento ao agravo interno para negar provimento ao recurso do Estado de São Paulo, a fim de manter o acórdão recorrido.
(ARE 1322395 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 21-02-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-055 DIVULG 22-03-2022 PUBLIC 23-03-2022)
Grifamos, por fim, que o STF já exarou reiteradas vezes que o princípio da anterioridade tributária é uma garantia de estabilidade jurídica ao cidadão, constituindo-se em cláusula pétrea da Constituição Federal.
Vejamos:
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA. LEI 4.454/2017 DO ESTADO DO AMAZONAS. INSTITUIÇÃO DE ADICIONAL NAS ALÍQUOTAS DO ICMS, DESTINADO À CRIAÇÃO DE FUNDO ESTADUAL DE COMBATE À POBREZA (ART. 82 DO ADCT). PERDA PARCIAL DO OBJETO. COBRANÇA DO TRIBUTO DENTRO DO MESMO EXERCÍCIO FINANCEIRO NO QUAL FOI PUBLICADA A LEI QUE O INSTITUIU. CARACTERIZAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA (ART. 150, III, “B”, DA CF).
1. A revogação expressa de alguns dos dispositivos da norma impugnada enseja a perda parcial do objeto da ação.
2. O Princípio da Anterioridade (art. 150, III, “b”, da CF), por configurar uma das maiores garantias tributárias do cidadão em face do Estado/Fisco, é consagrado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL como cláusula pétrea, nos termos do art. 60, § 4º, IV, da CF (ADI 939, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, DJ de 18/03/1994). Além de constituir garantia individual, assegura a possibilidade de o contribuinte programar-se contra a ingerência estatal em sua propriedade, preservando-se, pois, a segurança jurídica.
3. A instituição do adicional de alíquota de ICMS, facultada pelo art. 82, § 1º, do ADCT, não configura hipótese de relativização do referido princípio.
4. Ação Direta julgada procedente, na parte em que conhecida, para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do artigo 5º da Lei 4.454/2017 do Estado do Amazonas, restringindo-se a censura aos fatos geradores ocorridos entre a data de vigência da norma (1º de julho de 2017) e 31 de dezembro de 2017.
(ADI 5733, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 20-09-2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-215 DIVULG 02-10-2019 PUBLIC 03-10-2019)
Quais são os princípios de direito tributário na Constituição Federal?
A Constituição Federal de 1988 avançou muito na regulamentação do sistema tributário, prevendo uma série de princípios que se aplicam - de forma geral ou específica, à criação e cobrança de tributos, vejamos:
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Princípio da Legalidade (Artigo 150 inciso II);
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Princípio da Isonomia ou da Igualdade Tributária (Artigo 150 inciso II);
-
Princípio da Capacidade Contributiva (Artigo 145 §1º);
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Princípio do Não Confisco (Art. 150 inciso IV);
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Princípio da Liberdade de Tráfego (Art. 150 inc. V);
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Princípio da Anterioridade Tributária (Art. 150 inciso III alínea "b" e alínea "c");
-
Princípio da Seletividade e da Não Cumulatividade (Art. 155 §2º inciso II e inciso III e Art. 153 §3º inc. I);
-
Princípio da Uniformidade Geográfica (Art. 151 inc. I):
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Princípio da Proibição de Tributos entre os Entes Federativos (Art. 151, inc. II);
Conclusão
A área de consultoria empresarial sempre foi uma das mais exploradas em nossos escritórios, tendo incentivado a cada advogado a ir além de suas atividades, dando um suporte no processo decisório da empresa.
E notamos que um dos cambos onde o advogado pode ter grande destaque é no planejamento financeiro da empresa, o que envolve diretamente na tributação das atividades empresariais, o que permite que o advogado atue de uma forma direta na matéria tributária e no mercado financeiro - gerando lucro para o cliente e honorários para o seu escritório.
Com isso, é de extrema importância o domínio dos princípios de direito tributário pelo advogado que deseja atuar no direito empresarial.
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