Direito Processual Civil

Esbulho Possessório, Turbação e Ações Possessórias

Atualizado 14/05/2025

5 min. de leitura

esbulho possessório é o nome dado quando o possuidor sofrer qualquer interrupção forçada e indevida em sua posse - ou seja, quando um terceiro, de forma ilegal, tentar subtrair para si a posse do bem.

Esse instituto jurídico dá origem a diversas ações possessórias, propostas pelo legítimo possuidor, com o fim de pôr termo ao esbulho possessório.

A seguir, vamos explorar o conceito de esbulho possessório e as principais medidas previstas no direito civil brasileiro para enfrentá-lo.

  

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O que é esbulho possessório?

Esbulho possessório é a situação em que alguém, de modo irregular, apropria-se indevidamente do bem pertencente ao possuidor, configurando usurpação de seus direitos de posse.

Na prática, manifesta-se como invasão de propriedade privada, realizada contra a vontade e sem a autorização do legítimo possuidor.

Qual a previsão legal do esbulho possessório?

A previsão legal sobre o esbulho possessório está no Artigo 1.210 do Código Civil, que assim dispõe:

Art. 1.210. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado.

§1º O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

§2º Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.

Além disso, o esbulho possessório também possui reflexos no direito penal, previsto no Artigo 161 inciso II do Código Penal:

Art. 161 - Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:

...

II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório.

§ 2º - Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada.

§ 3º - Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

  

Posse e Propriedade

Para aprofundar o entendimento do esbulho, vale distinguir posse e propriedade.

A posse refere-se ao domínio fático sobre o bem — seu uso, ocupação e exploração — enquanto a propriedade é o direito real inscrito no registro de imóveis.

Dessa forma, o proprietário pode não deter a posse do imóvel, pois esta pode ser transferida a terceiro por meio de contrato de locação ou de arrendamento.

Entretanto, qualquer que seja o prazo ou a modalidade de cessão, o proprietário conserva sempre o direito de posse sobre seu imóvel.

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Quais os tipos de esbulho possessório no direito brasileiro?

Os principais tipos de esbulho possessório no direito brasileiro são:

  • Disputa de terras: conflito limítrofe entre possuidores de imóveis rurais vizinhos, que reivindicam área comum.

  • Despejo irregular: retirada do locatário sem observância das regras processuais e formais exigidas pela lei.

  • Invasão de propriedade: ocupação não autorizada do imóvel, bastante frequente em contextos de ocupações urbanas e movimentos sociais.

  • Abuso contratual: permanência indevida na posse após o término de contrato de locação ou arrendamento.

Em todas essas situações, a perda da posse se dá de modo irregular, geralmente por meio de violência, clandestinidade ou precariedade.

  

Quais os requisitos do esbulho possessório?

Os requisitos para comprovar a ocorrência do esbulho possessório estão previstos no Artigo 561 do Código de Processo Civil, sendo basicamente a prova da posse legítima do bem e a comprovação do ato abusivo que caracterize o esbulho possessório.

Vejamos o teor do Art. 561 do Código de Processo Civil:

Art. 561. Incumbe ao autor provar:

I - a sua posse;

II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;

III - a data da turbação ou do esbulho;

IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração.

Com tais requisitos comprovados, bem como a data do esbulho, será possível ingressar com a ação de reintegração de posse, desde que proposta em até 1 ano e 1 dia do fato gerador.

Como provar o esbulho possessório?

O esbulho possessório pode ser demonstrado por meio de fotografias, depoimentos testemunhais e gravações em vídeo.

Recomenda-se, ainda, que, com essas evidências em mãos, se proceda à lavratura de ata notarial ou à formalização de boletim de ocorrência, conferindo maior solidez às provas obtidas.

  

O que fazer quando ocorre o esbulho possessório?

Assim que ocorrer o esbulho possessório, reúna o máximo de comprovações — fotos, vídeos e depoimentos — e registre um boletim de ocorrência na Polícia Civil.

Paralelamente, providencie uma ata notarial, em que o tabelião, com fé pública, certifica as circunstâncias da invasão diretamente no imóvel.

Com esses elementos em mãos, consulte um advogado para ajuizar a ação judicial cabível (manutenção ou reintegração de posse), tanto para recuperar a posse quanto para buscar eventual indenização por perdas e danos.

Lembre-se de que a ação de reintegração pode ser proposta também contra terceiro adquirente que tenha obtido o imóvel de forma irregular; nesse caso, esse terceiro poderá ser condenado a indenizar o possuidor, nos termos do art. 1.212 do CPC:

Art. 1.212. O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era.

Esta indenização compreenderá não apenas a limitação na posse, mas também pelos lucros cessantes decorrentes da não exploração do bem, além de eventuais danos morais.

Ressaltamos que há uma divergência jurisprudencial acerca da incidência ou não de danos morais pelo simples fato do esbulho possessório em si.

Muitos precedentes indicam que os danos morais precisam ser comprovados, não decorrendo da mera quebra contratual ou invasão da propriedade - vejamos:

CONTRATO ESTIMATÓRIO. AÇÃO COM PRECEITOS DESCONSTITUTIVO E CONDENATÓRIO.

Sentença de parcial procedência dos pedidos mantida. Partes que firmaram contrato estimatório. Réu que não devolveu o veículo ao autor. Esbulho possessório praticado pelo réu e reconhecido na sentença. Fato incontroverso. Autor que alega que seu nome foi negativado, o que justificaria a condenação do réu em danos morais. Ausência de provas.

Ademais, o mero inadimplemento do contrato não autoriza a condenação por danos morais. Autor que não se desincumbiu do ônus contido no art. 373, I, do CPC/2015. RECURSO NÃO PROVIDO.  (TJSP;  Apelação Cível 1012139-26.2022.8.26.0606; Relator (a): Alfredo Attié; Órgão Julgador: 27ª Câmara de Direito Privado; Foro de Suzano - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/02/2024; Data de Registro: 20/02/2024)

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Qual a diferença entre esbulho possessório, turbação e ameaça?

Embora todos se refiram à usurpação da posse, esbulho possessório, turbação e ameaça são institutos distintos e merecem tratamento individualizado.

  • Esbulho possessório ocorre quando o possuidor é privado do bem de forma violenta, clandestina ou ilegal — como na invasão de propriedade rural, por exemplo.
  • Turbação caracteriza-se pela perturbação da posse, sem sua perda total, mas com embaraços causados por terceiros — como o trânsito indevido de pessoas no imóvel ou o corte do fornecimento de água às terras.
  • Ameaça configura-se na intenção de usurpar a posse antes de sua consumação, manifestada por aviso prévio de invasão ou pelo acampamento de grupos ao redor do imóvel.

  

Qual a relação entre usucapião e esbulho?

Sabemos que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade pelo decurso do tempo na posse do imóvel.

Esta posse, porém, pode se dar a partir de um esbulho, o que afasta a boa-fé, um dos requisitos de alguns tipos de usucapião.

Se a posse se iniciar pelo esbulho, e houver uma ação judicia por parte do legítimos possuidor ou do proprietário, o prazo da usucapião não começa a fluir.

Porém, se não houver qualquer oposição, já estará fluindo o prazo de 15 (quinze), o qual, conforme prevê o Art. 1.238 do Código Civil, independe de boa-fé:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Lembrando que é possível alegar

AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSSE (BENS IMÓVEIS). AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. EXCEÇÃO DE USUCAPIÃO. REQUISITOS AUTORIZADORES À REINTEGRAÇÃO DE POSSE NÃO PREENCHIDOS. DECISÃO RECORRIDA REFORMADA.

1. EM SEDE DE AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE DE BENS IMÓVEIS, É CABÍVEL O DEFERIMENTO DO PEDIDO LIMINAR DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE QUANDO ATENDIDOS OS REQUISITOS DO ART. 561 DO CPC.

2. CASO CONCRETO EM QUE A AUTORA-AGRAVADA NÃO LOGROU COMPROVAR A SUA POSSE ANTERIOR, TAMPOUCO A DATA DO ALEGADO ESBULHO POSSESSÓRIO. QUESTÃO RELATIVA À POSE DO IMÓVEL EM DISCUSSÃO É ABSOLUTAMENTE CONTROVERTIDA E DEMANDA MAIOR PRODUÇÃO PROBATÓRIA, INVIABILIZANDO A CONCESSÃO DA LIMINAR PRETENDIDA, POIS NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 561 DO CPC.AUSENTES OS REQUISITOS DO ART. 561 DO CPC PARA O DEFERIMENTO DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE, É DE SER PROVIDO O RECURSO E REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA. RECURSO PROVIDO.

(Agravo de Instrumento, Nº 53070856320238217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Amadeo Henrique Ramella Buttelli, Julgado em: 23-02-2024)

Qual o prazo para pedir reintegração de posse?

O prazo para pedir a reintegração de posse de posse é de 1 ano e 1 dia, à partir da data em que ocorreu o esbulho possessório.

Após este prazo, não é mais cabível a ação possessória, de rito abreviado, sendo possível apenas o ingresso de uma ação ordinária, de rito mais alongado - previsão esta contida no Art. 558 do Código de Processo Civil:

Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho afirmado na petição inicial.

Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput , será comum o procedimento, não perdendo, contudo, o caráter possessório.

  

Esbulho possessório no direito penal

O caso deesbulho possessório ocorre quando há a invasão de propriedade que retire a posse do legítimo possuidor - e também é tipificado como crime de esbulho possessório no Artigo 161 inciso II do Código Penal:

Art. 161 - Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:

...

II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório.

§ 2º - Se o agente usa de violência, incorre também na pena a esta cominada.

§ 3º - Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

Turbação ou Esbulho?

A posse de um bem é um instituto do direito civil que visa proteger aquele que exerce, de fato, a titularidade material do uso, mesmo sem deter o direito de propriedade.

Dentro desse contexto, o possuidor direto goza de segurança jurídica para exercer atos da posse de imóvel, e, embora a propriedade é um direito real, a mera posse também gera efeitos jurídicos relevantes, pois é um direito real adquirido - por meio dela, o possuidor busca reaver seus direitos sempre que violados, demonstrando como reaver o exercício pleno da posse.

Esbulho possessório é um termo que descreve a subtração violenta, clandestina ou precária da posse, e esbulho possessório ocorre quando alguém despoja o titular de fato, retirando-lhe a total da posse do bem.

Ao privar o legítimo possuidor dessa relação material, configura-se a posse perdida e esbulho possessório é uma violação do poder de fato sobre o bem, pois esbulho possessório é caracterizado pela retirada completa do dominus possidendi, e em situações extremas comete o crime de esbulho, previsto no Código Penal.

Qualquer ato que imponha essa subtração ilegítima transforma o prejudicado em vítima de esbulho possessório - e o direito abrange diferentes modos de invasão, sendo as formas de esbulho mais comuns a ocupação de imóvel com violência, a demolição de cercas sem autorização e a transferência clandestina de posse.

Em tais hipóteses, o possuidor direto se vê privado de sua área e sem possibilidade de exercer atos de domínio, enquanto o invasor consolida a ocupação. A vítima de esbulho possessório, ao sofrer esses atos, fica impedida de defender seu espaço de forma imediata e eficaz.

Diante dessas necessidades, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a ação de manutenção de posse, cabível sempre que há turbação sem esbulho, e a ação de reintegração de posse, própria para reaver a posse do bem após esbulho.

O autor da ação deverá comprovar a posse anterior e o evento perturbador ou expulsivo, a fim de que o Judiciário determine as medidas necessárias para reaver a posse, garantindo o restabelecimento da segurança possessória e a reparação dos atos ilícitos que afrontaram a posse de um bem.

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Conclusão

Com vimos, o esbulho possessório se configura pela apropriação forçada da posse, marcada pela violência, clandestinidade ou precariedade, assegurando ao possuidor legítimo o direito de pleitear a reintegração de posse por meio de ação própria.

Por isso, o advogado deve dominar as ações possessórias, distinguindo turbação de esbulho, a fim de utilizar corretamente os procedimentos judiciais e evitar equívocos processuais.

Vale destacar que esses processos raramente chegam ao Supremo Tribunal Federal, pois envolvem matérias predominantemente fáticas, exceto nos casos de desapropriação indireta promovida pela Administração Pública.

  

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Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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