Direito Constitucional

Direitos de Personalidade

Atualizado 14/03/2024

4 min. de leitura

Os direitos de personalidade são uma categoria de direitos fundamentais relacionados à proteção da integridade moral, como um todo, da pessoa humana.

Eles sustentam uma série de direitos e garantias dos cidadãos, permeando todo o ordenamento jurídico Brasileiro.

Neste artigo, vamos entender como funcionam os direitos da personalidade, e como eles podem ser utilizados no dia a dia da advocacia, compartilhando tudo o que descobrimos em mais de 20 anos de atuação.

Boa leitura!

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O que são direitos de personalidade?

Os direitos da personalidade são direitos fundamentais que sustentam a individualidade de cada cidadão.

Ou seja, eles são a base de uma série de programas de governo focados na preservação da integridade moral do ser humano - servindo, ainda, de norte para a interpretação e aplicação das normas jurídicas.

Em sua essência, os direitos da personalidade estão relacionados à características que definem cada indivíduo, como seres humanos sujeitos de autodeterminação, cujas a integridade das escolhas merece total proteção do sistema jurídico.

São, assim, um tipo relevante de direitos humanos, pois englobam aspectos materiais e imateriais do indivíduo - indo desde a proteção da sua honra e imagem, até sua integridade física.

Qual a previsão legal dos direitos de personalidade?

Os direitos de personalidade estão previstos no Artigo 5º da Constituição Federal de 1988, vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

...

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

O Código Civil de 2002 dedicou seu Capítulo II, à partir de seu Artigo 11º, para tratar dos direitos de personalidade - indicando serem eles irrenunciáveis:

Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.

A seguir, vamos entender a previsão legal de cada um dos direitos da personalidade existentes no direito brasileiro.

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Quais são os direitos da personalidade?

Os direitos da personalidade são os seguintes:

  • Direito à Honra;

  • Direito à Imagem;

  • Direito à Privacidade;

  • Direito à Intimidade;

  • Direito sobre o próprio Corpo;

  • Direito ao Nome.

Direito à Honra

O direito à honra é um dos mais conhecidos direitos da personalidade, estando previsto no Artigo 5º inc. X da CF/88.

Ele se destina à proteção da reputação de uma pessoa, refutando ofensas à sua dignidade - é à partir dele que surge, por exemplo, o conceito de dano moral indenizável, previsto no Art. 186 do Código Civil.

Além disso, temos a criminalização da ofensa à honra no Código Penal, especificamente na tipificação dos crimes de calúnia, difamação e injúria.

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Direito à Imagem

O direito à imagem, por sua vez, trata da proteção da imagem de qualquer pessoa, coibindo o uso indevido, sem sua autorização, por terceiros.

E aqui não se trata apenas da exposição a situações vexatórias, mas do uso indevido e não autorizada da imagem, com ou sem fins comerciais.

Assim, não é permitido o uso da imagem de alguém, para qualquer fim, sem seu expresso consentimento.

Sua proteção é feita no Art. 5º inc. X da CF/88, e também ao art. 20 do Código Civil:

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Parágrafo único. Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

Direito à Privacidade

O direito à privacidade é atualmente o direito da personalidade mais em voga, devido à Lei Geral de Proteção de Dados, que foca justamente no respeito à privacidade do cidadão, claramente em xeque pela forma como o uso da internet se dá atualmente.

Na prática, temos que terceiros não podem sequer ter conhecimento da vida privada das pessoas sem seu consentimento - sendo ainda mais inadmissível sua divulgação sem prévia autorização.

Vejamos o que diz o Artigo 1º da LGPD:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.

O Art. 21 do Código Civil, inclusive, já previa a proteção à vida privada do cidadão:

Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.

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Direito sobre o Próprio Corpo

O direito sobre o próprio corpo está previsto no Art. 13 e seguintes do Código Civil, que assim dispõe:

Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.

Art. 14. É válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.

Parágrafo único. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo.

Art. 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

É nele que estão baseados todos os crimes do Código Penal que envolvam lesões corporais.

Além disso, ele estabelece a proteção contra atos médicos não desejados, impondo a autodeterminação sobre intervenções médicas.

Direito à Intimidade

O direito à intimidade está bastante ligado à proteção da privacidade, estabelecendo a proteção de aspectos relacionados ao íntimo da dignidade da pessoa humana - como o lar, a família, a correspondência, finanças e dados laborais.

Por estas razões, por exemplo, que o prontuário médico só pode ser liberado ao seu titular - assim como ocorre com sua ficha laboral em uma empresa.

Direito ao Nome

O direito ao nome se inicia no direito a todo cidadão ter um nome, como elemento essencial da dignidade da pessoa humana.

Indo adiante, ele chega ao ponto da pessoa poder buscar seu reconhecimento pelo nome que lhe é atribuído - e não por aquele conferido por seus pais quando de seu nascimento.

É com base neste importante direito da personalidade que temos o direito de adicionar ou não o sobrenome do cônjuge após o casamento, alterar o nome em caso de mudança de sexo, bem como adotar apelidos pelos quais a pessoa seja notoriamente conhecida.

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O que é a personalidade jurídica?

Não se pode confundir os direitos da personalidade com a personalidade jurídica.

Enquanto a personalidade em si se refere à pessoa humana - e por consequência, a dignidade humana - a personalidade jurídica é uma ficção jurídica, criada para conferir direitos e deveres às sociedades e demais entidades que não sejam humanos, porém que de algum forma sejam sofram com a regulação estatal.

O exemplo mais notório são as empresas, pessoas jurídicas criadas por pessoas humanas para o desenvolvimento de negócios.

Fruto de tal ficção jurídica, a pessoa jurídica acaba detendo a personalidade jurídica - que, por sua vez, também possui direitos da personalidade protegidos, podendo, inclusive, sofrer danos morais.

A dignidade da pessoa humana como direito de personalidade

A dignidade da pessoa humana é a base dos direitos da personalidade, estando acima deles e norteando sua aplicação, na condição de princípio constitucional.

A dignidade da pessoa humana está prevista no texto constitucional, já em seu Art. 1º inc. III, sendo um dos pilares da República Federativa do Brasil.

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Quais os processos mais comuns envolvendo os direitos de personalidade?

Existem diversos processos judiciais envolvendo os direitos da personalidade - sendo os mais comuns aqueles ligados à proteção da privacidade e da honra (danos morais), e os direitos de nome, com a alteração em diversas situações (separação, transição de sexo).

Alguns casos clássicos chegaram ao Supremo Tribunal Federal, como o direito ao uso do banheiro destinado ao gênero com o qual a pessoa se identifica:

TRANSEXUAL. PROIBIÇÃO DE USO DE BANHEIRO FEMININO EM SHOPPING CENTER. ALEGADA VIOLAÇÃO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A DIREITOS DA PERSONALIDADE. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.

1. (...) 2. Constitui questão constitucional saber se uma pessoa pode ou não ser tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente, pois a identidade sexual está diretamente ligada à dignidade da pessoa humana e a direitos da personalidade 3. (...) (STF - RE 845779)

Outros casos relacionados aos direitos da personalidade são o reconhecimento da paternidade, imprescritível segundo o STF:

EMBARGOS INFRINGENTES NA AÇÃO RESCISÓRIA. DIREITO CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM PETIÇÃO DE HERANÇA. FILHO ADULTERINO. PATERNIDADE NÃO CONTESTADA PELO MARIDO. DIREITO DE TER O FILHO RECONHECIDO, A QUALQUER TEMPO, O SEU PAI BIOLÓGICO. PREVALÊNCIA DO DIREITO FUNDAMENTAL À BUSCA DA IDENTIDADE GENÉTICA COMO DIREITO DE PERSONALIDADE. PRECEDENTE. EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS. (STF - AR 1244 EI)

Um caso bastante interessante envolveu o questionamento do Estatuto da Guarda Municipal de Paulínia-SP, cujas regras de asseio foram questionadas à luz dos direitos da personalidade.

Na ocasião, o STF entendeu que a exigência de boa imagem e zelo com a aparência do agente estatal não colidem com os direitos da personalidade:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ESTATUTO DA GUARDA MUNICIPAL. REGRAS DE ASSEIO PESSOAL. INFRAÇÃO DISCIPLINAR DE NATUREZA LEVE. AFRONTA AO PACTO FEDERATIVO. INEXISTÊNCIA. DETERMINAÇÃO LEGAL CONDIZENTE COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE.

(...)

4. A determinação legal atende ao princípio da razoabilidade, pois a imposição de sanção de natureza leve revela-se adequada e proporcional à falha na conduta do servidor público. Tampouco há falar em violação a direitos de personalidade, ao direito à liberdade, à imagem, bem como à dignidade da pessoa humana, haja vista que o mínimo zelo com a aparência é o que se espera do agente estatal, especialmente daqueles que lidam diretamente com a população.

5. Agravo Interno a que se nega provimento. (STF - RE 1298758)

Fluxogramas dos principais procedimentos jurídicos.

Conclusão

A individualidade do ser humano é um bem jurídico tutelado pelo ordenamento jurídico Brasileiro, sendo os direitos da personalidade previstos já na Constituição Federal.

Com isso, sua aplicação pelos advogados deve ser feita sempre que possível - como vimos no caso dos Guardas Municipais - e, assim, aprimorar suas teses com uma camada jurídica que pode fazer o debate chegar até o STF, afinal, teremos sempre uma questão constitucional de fundo.

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Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever