Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ESTADO
Nome Completo, nacionalidade, estado civil, profissão, portador do Inserir RG e inscrito no Inserir CPF, residente e domiciliado na Inserir Endereço, por intermédio de seu advogado e bastante procurador (procuração em anexo - doc. 01), com escritório profissional sito à Endereço do Advogado, onde recebe notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência requerer
DESAFORAMENTO
para a comarca de Informação Omitida, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.
DOS FATOS
O Requerente é réu nos autos da Ação Penal movida pela Justiça Pública, por infração do art. 121, §2º, incisos I, III e IV do Código Penal, sendo vítima Informação Omitida filha de Informação Omitida, homem de família tradicional e muito conhecido tanto na sede quanto na zona rural do município da Comarca de CIDADE.
A vítima era também muito conhecida na cidade, haja visto ter lecionado por vários anos nas escolas da região, o que permitiu seu contado com grande número familiares de alunos e demais integrantes dos quadros do magistério da localidade.
DO DIREITO
Ab initio, o presente pleito se ampara no artigo 424/CPP que dispõe, verbis:
Art. 424 - Se o interesse da ordem pública o reclamar, ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou sobre a segurança pessoal do réu, o Tribunal de Apelação, a requerimento de qualquer das partes ou mediante representação do juiz, e ouvido sempre o procurador-geral, poderá desaforar o julgamento para comarca ou termo próximo, onde não subsistam aqueles motivos, após informação do juiz, se a medida não tiver sido solicitada, de ofício, por ele próprio.
Este dispositivo reflete, rigorosamente, a preocupação do legislador pátrio com a imparcialidade dos julgados emanados pelos Tribunais do Júri em cristalina consagração do Princípio da Ampla Defesa acolhido pela Constituição Federal em seu artigo 5º inciso XXXVIII alínea "a". Há de ser feita a ampla e eficiente defesa, por se constituir interesse superior da justiça e garantia fundamental num País democrático.
Permitir o julgamento por órgão jurisdicional sobre cuja imparcialidade pairem severas dúvidas, como ocorre no caso em tela, enseja escandalosa afronta à garantia constitucional da ampla defesa. É que quaisquer razões suscitadas em favor do réu não se verão acolhidas pelo Conselho de Sentença, ainda que veementemente amparadas pelo ordenamento jurídico, ante a consideração de fatos externos, alheios às provas dos autos.
O momento de decisão não pode dispensar o de meditação. Por isto mesmo já proclamava Arnaldo Vasconcellos: "A base da norma é o fato, sem dúvida, mas o fato axiologicamente dimensionado. Essa apreciação que se dá quando do surgimento da norma, renova-se todas as vezes que ela é aplicada: Os fatos e os valores originais são trazidos à compatibilização com os fatos e valores do momentos presente. Esse processo evidencia o dinamismo do direito e responde por sua vitalidade.
Há de ter o jurista bem presente esses aspectos da normatividade do direito, porque, na verdade, o que se aplica é a interpretação normativa e nunca a norma em seu presumível e problemático significado original" (Súmula de Uma Teoria da Norma Jurídica, 'in' Revista do Curso de Direito, UFC, 1982, vol. 23).
Inicialmente questiona-se a imparcialidade do julgamento pela simples aferição da existência, nas listas do júri, de grande número de professores ou familiares destes, os quais tendem ao julgamento parcial, isto é, ao julgamento que reflita seus sentimentos de repulsa àquele que agrediu um de seus pares, no momento em que exercia a aclamada profissão, e não ao julgamento segundo a prova carreada aos autos.
No livro "Teoria e Prática do Júri", de Adriano Marrey, diz em seu capítulo sobre desaforamento :
"A competência para julgamento é, em regra, determinada pelo lugar em que consumada a infração... É regra fundamental, especialmente ponderável em se cogitando de crime doloso contra a vida, em que o júri é formado pelos pares do acusado - seus concidadãos".
Através desse notório jurista e seu relato sobre o desaforamento, o mesmo quer dizer com a palavra concidadão o mesmo que se encontra no dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira: Concidadão é o "indivíduo que, em relação ao outro, é da mesma cidade"; mas, quem é o réu perante seus concidadãos: o indivíduo, o negro assassino que matou a "pobre Informação Omitida", filha do seuInformação Omitida. Com relação a palavra pares, a sociologia explica muito bem: "pares são os indivíduos que se identificam e por isso vivem em sociedade". O réu, além de não ser identificado, é uma pessoa completamente desconhecida perante a sociedade da cidade.
Impõe-se preservar a função do Tribunal Popular, que é fazer justiça, vedando-lhe a simples possibilidade de ser utilizado na satisfação de vinganças pessoais.
E não se proclame a possibilidade de o jurado julgar além do direito ou realidade fática exposta, por razões não apreendidas na denúncia, pronúncia, libelo, mas colocadas como possíveis no proposição do quesito em comento (participação genérica), pela singela razão de não motivar a sua decisão.
Segundo alguns, estaria autorizado a alcançar formas de condutas não descritas nos autos, desde que convencido da responsabilidade do agente no fato. Afora o risco já referido de condenação de fato atípico, por si só suficiente para fazer desfalecer a tese, o direito é o sustentário de qualquer decisão.
Imperioso se faz o respeito ao estado de direito e à ordem constitucional para garantir julgamento justo, isto é, tão somente em face dos elementos dos autos. Mesmo que não pretenda reduzir a tese ao confronto axiológico, é de ver que o 'status libertatis' é bem jurídico próprio da dignidade humana, de direito natural, enquanto que a pretensão condenatória é a manifestação da censura social e oficial. Por isto que o sacrifício daquele, em nome da harmonia do grupo humano, deve ser cercado das mais significativas razões morais, mas sempre e sempre dentro do direito.
Este é, afinal, a ciência que trata das relações humanas e suas circunstâncias. É a sistematização da vontade das pessoas, mesmo que as submeta contra sua vontade, acolhida ao longo do estudo da vontade do homem e sua convivência harmoniosa, que se expressa, especialmente, através das leis.
Nesse sentido leciona o insígne mestre Júlio Fabrini Mirabete:
"Estará a imparcialidade comprometida quando o crime, apaixonando a opinião pública, gera no meio social animosidade, antipatia e ódio ao réu, por vezes provocando manifestação de pessoas que, eventualmente, podem vir a compor o Conselho de Sentença".
(In Processo Penal, Ed. Atlas, pág. 496)
A isto soma-se o fato de ser o acusado pessoa desconhecida pela sociedade de CIDADE; sua cor - negra -; seu "status" social - reconhecidamente miserável -; sua rusticidade, decorrente de toda uma vida dedicada ao labor diário no meio rural e com o fito, único, de obter os mínimos meios destinados ao sustento próprio e da família; seu analfabetismo - também obstaculizador do conhecimento doutros civilizados meios protetivos de sua dignidade, inclusive contra as agressões continuamente perpetradas pela vítima e que redundaram no fatídico evento.
Em contrapartida, ao verificarmos as "qualidades" da vítima, constatamos ser ela pessoa do sexo feminino - culturalmente reconhecidas por sua "fragilidade"; de cor branca - tal como a ampla maioria da população do município, também descendentes de imigrantes europeus; seu bom "status" social, resultante de uma também regular situação financeira pessoal, familiar e intelectual.
Desta singela contraposição de características do réu e da vítima, se evidencia o concreto prejuízo à imparcialidade do veredicto proferido pelo Tribunal do Júri da Comarca de CIDADE. Não se trata de …