Petição
DOUTO JUÍZO DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA DO TRABALHO DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_maioridade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], inscrito no CPF sob o nº $[parte_autor_cpf], RG nº $[parte_autor_rg], residente e domiciliado $[parte_autor_endereco_completo], vem perante V. Exa. por seu advogado que ao final subscreve, para propor a presente
RECLAMAÇÃO TRABALHISTA
contra a XX, inscrita no CNPJ sob o nº XX, com sede à Quadra xx, o que faz com arrimo nos artigos 319 do CPC, em combinação com o art. 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, pelas razões de fato e de direito expostas, a seguir.
1. DA JUSTIÇA GRATUITA
A Reclamante, para não se privar dos recursos indispensáveis ao próprio sustento e de sua família, não pode prover as despesas do processo, momento em que requer o deferimento dos benefícios da Justiça Gratuita, nos termos dos artigos 14, da Lei 5.584/70 c/c artigos 2º e 3º, da Lei 1.060/50.
A prova da insuficiência de recursos financeiros para pagamento das custas e despesas processuais está, em anexo, pela Declaração da Reclamante.
Assim, requer desde já o deferimento da justiça gratuita, conforme art. 790, § 3°, da CLT e OJ 331, do TST.
2. DOS FATOS E FUNDAMENTOS
A reclamante é empregada da $[geral_informacao_generica], admitida em $[geral_informacao_generica], no cargo de $[geral_informacao_generica], com jornada de trabalho de 6 horas diárias e 30 horas semanais.
Em $[geral_data_generica], nasceu seu filho $[geral_informacao_generica]. Em $[geral_data_generica], este foi diagnosticado, por médico neurologista, com Transtorno do Espectro Autista- F.84.0 (anexo):
A criança realiza acompanhamento multidisciplinar para o desenvolvimento cognitivo, conforme documentos anexos, desde o mês de $[geral_data_generica], consistente em estimulação fonoaudiológica PROMT, terapia comportamental baseada na análise do Comportamento- Modelo Denver de Estimulação Precoce, e reabilitação neuropsicopedagógica.
Todos esses atendimentos devem ser realizados através de diversas sessões durante a semana, sendo que a terapia sob o Modelo Denver, voltado especificamente para as crianças com autismo, é realizada todos os dias.
Assim se consubstancia a rotina semanal de atendimento à criança:
A mãe, ora reclamante, acompanha seu filho em todos esses tratamentos, já que a criança tem apenas 4 (quatro) anos de idade, os quais, por vezes, coincidem com seu horário de trabalho.
Cumpre ressaltar que o Autismo é um transtorno de desenvolvimento, que afeta o sistema nervoso, e que prejudica a capacidade de se comunicar e interagir.
O tratamento consiste em terapias comportamentais, educacionais e familiares, que podem reduzir os sintomas e oferecem um pilar de apoio ao desenvolvimento e aprendizagem.
O filho da reclamante é acompanhado por diversos profissionais, os quais demandam muito tempo, atenção e cuidados dos pais.
Diante disso, para o acompanhamento é necessário que a reclamante disponha de mais tempo, sendo necessário uma diminuição de sua carga horária de trabalho.
Além dos cuidados próprios de qualquer criança em sua faixa etária, tem-se despendido, diariamente, muito mais tempo em atividades de estimulação, consultas, terapias, sessões de atendimento multidisciplinar, além do tempo de deslocamento entre sua residência até as clínicas.
Um cuidado integral e articulado possibilitará a conquista de uma maior funcionalidade e desenvolvimento da criança, permitindo assim um futuro mais autônomo e inclusivo.
Desse modo, resta caracterizada a imperiosa necessidade da redução da carga horária de labor da reclamante em 50%.
Em requerimento administrativo perante o banco empregador, a obreira não obteve resposta satisfatória, sob a justificativa de que a reclamada não possui normativo interno que disponha sobre a redução da jornada de trabalho para empregado com dependente em condições de deficiência (segue correspondência em anexo).
Para tanto, há imperiosa necessidade de redução da jornada de trabalho da reclamante, em virtude desse cenário apontado, inclusive em sede de antecipação de tutela de urgência, pelos fundamentos jurídicos que passará a expor.
Cumpre ainda destacar que a reclamante está atualmente de férias, devendo retornar ao trabalho no dia $[geral_data_generica], momento em que restará comprometida a manutenção do tratamento do filho, já que sua carga horária não permite que acompanhe a criança em todos os atendimentos.
3. DA REDUÇÃO DA JORNADA
Nos moldes do artigo 2º da Lei 13.146, de 6 de julho de 2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da pessoa com deficiência) é considerado pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual, ou sensorial, a qual em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
No caso do filho da requerente, por ser autista, sofre de um transtorno no desenvolvimento, com impedimento de longo prazo, de natureza física e intelectual, com comprometimento de sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições obstruída.
Tendo em vista sua deficiência, deve lhe ser tutelada proteção em todos os âmbitos, em especial nos tratamentos necessários ao seu desenvolvimento e no cuidado pelos pais. Nesse sentido:
O acolhimento e o cuidado dispendido a essas crianças (crianças deficientes) e a suas famílias são essenciais para que se conquiste o maior ganho funcional possível nos primeiros anos de vida, fase em que a formação de habilidades primordiais e a plasticidade neural estão fortemente presentes, proporcionando amplitude e flexibilidade para progressão do desenvolvimento nas áreas motoras, cognitivas e da linguagem (RANGEL LINHARES, 2007).
O nível de estresse em mães de crianças com deficiências é crônico, permeado por angústias, expectativas, com pressão de ter o filho na situação de dependência, o que ocasiona dificuldades em manejar o próprio tempo.
Por estas razões, visando a proteção da pessoa com deficiência, foi aprovada a Lei 13.370 de 12 de dezembro de 2016, que alterou o § 3º do art. 98 da Lei nº 8.112/1990, para estender o direito a horário especial ao servidor público federal que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência de qualquer natureza e revoga a exigência de compensação de horário.
Assim, consta no seu art. 98, §2 e 3§:
Art. 98. Será concedido horário especial ao servidor estudante, quando comprovada a incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição, sem prejuízo do exercício do cargo.
§ 2º Também será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário.
§ 3º As disposições constantes do § 2º- são extensivas ao servidor que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência (Grifo nosso).
A finalidade alcançada por essa normatização garante a dignidade da criança, contribuindo para a plena inclusão social.
Em que pese a previsão legal, ora vigente, ser destinada aos servidores público federais, não há impedimento para aplicação aos empregados públicos, especificamente ao dependente, sob pena de se negar uma forma de adaptação razoável para que pessoas com tal diagnóstico sejam inseridos na sociedade, com igualdade de oportunidade.
Nesse sentido já julgou o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, ao reconhecer direito à redução da jornada a uma empregada pública com filho autista, procedendo à aplicação analógica das disposições dos servidores públicos civis da União aos empregados públicos:
RECURSO ORDINÁRIO. EMPREGADA PÚBLICA. FILHO PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA. REGIME CELETISTA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. DIREITO FUNDAMENTAL. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E ANALÓGICA. PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFETIVIDADE DAS NORMAS. OFENSA À LEGALIDADE ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. Consoante autoriza o ordenamento jurídico, com especial relevância ao artigo 8º da CLT, na falta de disposições legais ou contratuais, o juiz decidirá, "conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do Direito do Trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público". Portanto, o reconhecimento pelo Poder Judiciário de direito não regulado no regime celetista, mas amparado em normas constitucionais e infraconstitucionais, não implica violação ao princípio da legalidade, tampouco imersão na esfera de competência do legislador, guardando, isto sim, estreita observância com tais normas, porque encontra amparo na interpretação sistemática e analógica autorizada por lei. EMPREGADA PÚBLICA. FILHO COM AMAUROSE CONGÊNITA DE LEBER - ACL (doença congênita rara que lhe retira completamente a visão) E PORTADOR DE SINAIS DE TRANSTORNO AUTISTA. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA SEM COMPENSAÇÃO. ART. 98, §§ 2º E 3º, DA LEI 8.112/90. APLICAÇÃO ANALÓGICA. PRINCÍPIO DA ISONOMIA E DA PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E DO DIREITO SOCIAL. Consoante dispõe o artigo 98, § 2º, da Lei 8.112/1990, "será concedido horário especial ao servidor portador de deficiência, quando comprovada a necessidade por junta médica oficial, independentemente de compensação de horário". O referido benefício foi estendido no parágrafo 3º ao servidores que tenham cônjuge, filho ou dependente portador de deficiência física, "exigindo-se, porém, neste caso, compensação de horário". Esta exigência de compensação contém incoerência e incompatibilidade insuperável na interpretação sistêmica, ao exigir a compensação do horário de afastamento do trabalho utilizado em prol dos cuidados do dependente portador de necessidades especiais, porquanto não se trata de "uma concessão ao ócio", mas da exigência de assistência diuturna dos genitores para acompanhar o filho aos tratamentos médicos e terapêuticos indicados. Outrossim, há uma inviabilidade prática, porque a compensação deve se dar na mesma semana e não pode ultrapassar a jornada semanal, o que significa dizer que haveria extrapolamento de jornada em alguns dias, retirando da mãe o tempo necessário aos cuidados diários da criança, tornando inócua a medida de proteção. Hipótese em que a redução a jornada de trabalho, sem compensação, impõe-se pelo princípio da isonomia e como instrumento para a efetividade dos direitos fundamentais da criança e do adolescente portador de necessidades especiais, assim como dos direitos sociais assegurados na Constituição Federal, na Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência e na Lei 7.853/1989. Aplicação analógica das disposições dos servidores públicos civis da União aos empregados públicos. EMPREGADA PÚBLICA. FILHO PORTADOR DE NECESSIDADE ESPECIAL. REDUÇÃO DE CARGA HORÁRIA SEM REDUÇÃO DA REMUNERAÇÃO. LEGALIDADE. A autorização de redução da jornada de trabalho da genitora com redução proporcional da sua remuneração é incompatível com os princípios e garantias às pessoas portadores de necessidades especiais assegurados na Constituição Federal, na Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência e na Lei 7.853/1989, revelando-se prejudicial ao núcleo familiar encarregado de garantir ao necessitado as condições especiais à sua sobrevivência, assim como o acesso às terapias complementares indispensáveis ao seu desenvolvimento, muitas delas não cobertas pelo sistema público de saúde ou pelos planos de saúde. (TRT-10 - RO: 00016961120165100001 DF, Data de Julgamento: 07/02/2018, Data de Publicação: 15/02/2018) (Grifo nosso).
As inúmeras decisões neste sentido são frutos da constitucionalização do direito, especialmente no aspecto da supremacia da Constituição Federal e a efetividade em relação aos regimes jurídicos.
O Tribunal Superior do Trabalho, em recente julgamento, explicitou o entendimento favorável à redução em comento para empregado público, aduzindo os dispositivos legais capazes de guarnecer a matéria:
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA EBSERH. LEI 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. JORNADA DE TRABALHO. REDUÇÃO PARA CUIDADO DE FILHO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA (AUTISMO). EMPREGADO PÚBLICO. ANALOGIA. ART. 98, § 3º, DA LEI 8.112/90. 1. O Tribunal Regional deferiu ao reclamante, empregado público, redução de jornada (25%, para 30h), sem diminuição salarial e sem compensação "para que o autor acompanhe sua filha, com diagnóstico de Transtorno do Espectro do Autismo, nas atividades relacionadas com o respectivo tratamento", tudo nos termos da aplicação analógica do art. 98, §§ 2º e 3º, da Lei 8.112/90, com redação da Lei 13.370/2016. 2. No contexto do processo de constitucionalização do Direito Administrativo, a utilização da analogia a fim de realizar a integração da lacuna normativa do regime jurídico aplicável ao reclamante encontra amparo na leitura contemporânea do princípio da legalidade administrativa, à luz do primado da juridicidade, de modo a não vincular o administrador público exclusivamente às diretrizes oriundas do Poder Legislativo, mas também para balizar sua atividade pelos valores e princípios constitucionais. 3. O caso dos autos abrange a tutela de bens jurídicos destacados na ordem constitucional de 1988, notadamente, o direito da pessoa com deficiência, alçado à categoria de direito fundamental, sobretudo em face da internalização, com status de emenda constitucional (art. 5º, § 3º, da CF), da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência pelo Decreto 6.949/2009. 4. Desse modo, a aplicação analógica do art. 98, §§ 2º e 3º, da Lei 8.112/90 à situação dos autos, envolvendo empregado público, decorre da incidência de princípios oriundos dos arts. 1º, III, 5º, 6º, 7º, 227 da CF e 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), além da destacada Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, não se vislumbrando qualquer ofensa ao primado da legalidade ou aos demais princípios que regem a Administração Pública. Precedentes. Agravo não provido. (TST - Ag: 249276620195240003, Relator: Delaide Alves Miranda Arantes, Data de Julgamento: 14/12/2021, 8ª Turma, Data de Publicação: 17/12/2021).
A legislação pátria, analisada de forma ampla, preconiza que ao Estado deve garantir à pessoa deficiente, especialmente quando criança, a mais absoluta prioridade.
Diante disso, o que se busca nesse pleito, é justamente a defesa pelo interesse precípuo da criança.
Qualquer criança com deficiência necessita de cuidados especializados que lhe permitam desenvolver, ao máximo, suas capacidades físicas e habilidades mentais.
A norma visa a proteção da criança deficiente, para que ela, com os cuidados e acompanhamento dos pais, tenha garantido os seus direitos fundamentais de pleno desenvolvimento, além de saúde e inclusão social.
Sob esse contexto, a reclamante realizou requerimento interno para que reduzisse sua jornada de trabalho, através do qual não obteve êxito, sob a justificativa de que não há norma interna com previsão nesse sentido.
A postura patronal é desarrazoada, pois o ordenamento jurídico visa a proteção da criança.
Ademais, não há que se promover negativa de aplicação de diminuição de carga horária a pais celetistas, já que deve haver …