Petição
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz da $[processo_vara] Vara do Trabalho de $[processo_comarca], Estado do $[processo_estado]
$[parte_autor_qualificacao_completa], por intermédio de seus procuradores, $[advogado_nome_completo] regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil sob $[advogado_oab], $[advogado_nome_completo], advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil sob $[advogado_oab], com endereço profissional na $[advogado_endereco], vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 840 da Consolidação das Leis do Trabalho, apresentar
RECLAMAÇÃO TRABALHISTA
em face de $[parte_reu_qualificacao_completa], de acordo com os seguintes argumentos de fato e de direito elencados.
1 Dos Fatos
Do Contrato de Trabalho
A reclamante foi admitida na data de 01 de março de 2019, pela reclamada, para o exercício da função de arrecadadora, de segundas a sextas-feiras, no horário de 13:50 horas, às 22:20 horas.
Referida função era desempenhada nas cabines de cobrança de tarifa de pedágio existentes na praça de pedágio do $[geral_informacao_generica].
Pela natureza do local de trabalho, a reclamante estava exposta à ruídos intermitentes provenientes e gases tóxicos (especialmente os gases CO – monóxido de carbono e CO2 – dióxido de carbono) provenientes dos veículos utilizadores da via, ambos elementos poluidores acima do nível permitido pelas normas regulamentares do Ministério do Trabalho e Emprego, cujo qual os EPI’s fornecidos eram insuficientes para neutralizar os agentes poluidores.
O contrato de trabalho teve fim em 17 fevereiro de 2022, em virtude do despedimento de responsabilidade da reclamada, causado pelo término da concessão pública de pedágio, fato que é notório.
A reclamante percebia a remuneração bruta de R$ 1.519,04 (um mil, quinhentos e dezenove reais, e quatro centavos), conforme holerites em anexo.
Em função da atividade repetitiva desempenhada pela reclamante – esforço repetitivo de estender o braço esquerdo para fora da cabine de pedágio, para recolher dinheiro dos utilizadores da via – esta apresentou um quadro de Tenossinovite Estiloide Radial (de Quervain), diagnosticada em 23/11/2021, pelo médico $[geral_informacao_generica], após exame de imagem feito em 08/11/2021, pelo médico $[geral_informacao_generica].
Referida doença ocupacional trata de uma inflamação comprometedora das bainhas tendíneas e dos tendões de passagens por regiões onde há mudança na direção da aplicação da força .
Conforme documentos e exames em anexo, a reclamante ficou ausente de suas funções laborativas, a partir do dia 24/11/2021, por 45 (quarenta e cinco dias), fazendo jus ao auxílio-doença.
Muito embora a reclamante se encontrasse em gozo do direito de estabilidade provisória, por conta do retorno de auxílio-doença decorrente de doença ocupacional, a reclamada a despediu sem qualquer contraprestação.
Das Horas Extras In Itinere
Durante o transcurso do contrato de trabalho, a reclamante iniciava suas atividades às 13h50min, porém, como não havia transporte até o local da prestação de serviço, se despendia de sua residência todos os dias com trinta minutos de antecedência do seu início de trabalho (13h20min), para pegar um ônibus que a reclamada dispunha aos funcionários, a fim de que fosse possível a locomoção até o posto de trabalho, uma vez que a praça de pedágio era distante.
Após uma longa jornada diária, que tinha encerramento às 22h20min da noite, a reclamante se deslocava novamente até sua residência, com um tempo médio de retorno de meia hora; nestes termos, descia do ônibus da empresa reclamada às 22h50min da noite.
Da Doença Ocupacional Desenvolvida
Como sua função consistia na cobrança de ticket de pedágio, a reclamante trabalhava com movimentos repetitivos constantemente, uma vez que as cabines de cobranças, de praxe, são mais altas que os veículos.
Desta forma, a reclamante precisava pender para o lado esquerdo o seu corpo, em direção à abertura da cabine, esticando seu braço esquerdo o máximo para fora desta estrutura, para efetuar as arrecadações. Observe-se da imagem ilustrativa a seguir, exemplo de operação de arrecadação de valores que costumeira e habitualmente a reclamante realizava em favor da reclamada:
$[geral_informacao_generica]
A reclamante não possui os dados concretos, mas estima-se que esta realizava a operação de arrecadação, durante sua jornada de trabalho de 8 horas, no mínimo por 200 vezes.
Por causa desse movimento repetitivo, durante o período em que a reclamante trabalhou para a reclamada, desenvolveu doença ocupacional: Tenossinovite Estiloide Radial (de Quervain), descrita no CID M65.4, que se trata de uma inflamação da bainha do abdutor longo e extensor curto do polegar, no primeiro compartimento dorsal do punho.
Em consequência da doença ocupacional desenvolvida pela reclamante, esta teve de se afastar temporariamente do trabalho para a qual foi contratada para exercer, no período de 23/11/2021 a 07/01/2022.
Este afastamento manteve-se pelo tempo de 45 dias, conforme se verifica dos atestados médicos em anexo.
Em decorrência desta incapacidade, a reclamante fez jus ao auxílio-doença, concedido pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), uma vez que cumpriu os requisitos para esse benefício.
A reclamante ainda sente fortes dores em seu punho, decorrentes da referida doença ocupacional.
Da Insalubridade
Por se tratar de um local de intenso movimento, com um fluxo elevado de automotores, tanto os ruídos e gases de monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2) eram constantes, deixando o ambiente de trabalho extenuante e insalubre.
Para este risco ocupacional, gerador que é de insalubridade, a reclamada não oferecia nenhum EPI.
A reclamada apenas concedeu EPI para ruído (protetor auricular), mas nunca fiscalizou o seu uso. Ademais, esse EPI não era ergonômico, causando intensos incômodos quando usado, o que fazia com que os funcionários não o utilizassem. Situação convenientemente aceita pela reclamada, que se omitiu em fiscalizar o uso do protetor auricular e em substituí-lo por EPI que não causasse o incômodo.
2 Dos Argumentos Jurídicos
Os desvios a seguir tratados em subtópicos separados, ocorriam habitualmente na relação de trabalho.
Por esta razão, e por conta de suas ínsitas naturezas salariais, devem passar a integrar o salário contratual da reclamante, gerando reflexos no FGTS, INSS e nas verbas rescisórias, bem como na indenização substitutiva da estabilidade provisória, o que desde já requer.
Do Adicional de Insalubridade
A função que a reclamante desempenhava era voltada de forma exclusiva à cobrança de tarifas de pedágio, pela utilização, pelos usuários, da Rodovia Federal $[geral_informacao_generica], em razão do contrato de concessão de pedágio que a reclamada mantinha com o Estado do Paraná, de conhecimento notório.
A reclamante trabalhava em uma cabine de cobrança, exposta a ruídos constantes e incessantes, bem como a gases tóxicos (especialmente os gases dióxido de carbono [CO2] e monóxido de carbono [CO]), ambos provenientes dos motores à combustão dos veículos que passavam nas cancelas da praça de pedágio, e isto, note-se, durante todo o período de trabalho.
Sobre os ruídos, inquestionavelmente, praças de pedágio são locais com grande fluxo de veículos automotores, o que atrai por si só níveis intoleráveis de ruídos provenientes do funcionamento dos veículos.
A reclamada disponibilizou o EPI contra ruído, porém, este era ineficiente e sem ergonomia; seu uso nunca foi efetivamente fiscalizado.
Ademais, os ruídos possuíam tons e acústicas elevadas, que os equipamentos, mesmo se usados (se ergonômicos fossem), não conseguiam suprimir. Não somente os veículos que permaneciam em funcionamento, mas aguardavam em filas, para chegar na cabine de arrecadação, emitiam ruídos superiores ao limite tolerável, mas também e principalmente, os ruídos intoleráveis e mais altos provinham dos automóveis e caminhões que utilizavam a faixa sem parar.
Nesta faixa de fluxo rápido os automotores passam incessantemente ao lado das cabines de arrecadação, sem parar, sempre na velocidade média de 40 km/h, emitindo ruídos muito superiores ao limite estabelecido nas normas do Ministério do Trabalho.
Esta circunstância pontual do trabalho demonstra à evidência, já que fato notório, que a reclamante, de fato, estava exposta à ruídos superiores ao permitido, de maneira habitual e sem proteção suficiente.
A reclamante diversas vezes solicitou melhorias ergonômicas referente ao equipamento para a reclamada, sem sucesso, contudo.
Já que o EPI contra ruído não era ergonômico, era melhor sequer utilizá-lo, o que era aceito pela reclamada ao omitir-se na fiscalização. Situação amplamente conhecida por todos os demais funcionários desta, e que prova testemunhal demonstrará.
Sobre os gases, apesar de menos densos que o ar atmosférico, são inflamáveis e extremamente perigosos, pois asfixiantes e podem levar a intoxicação humana.
A principal via de intoxicação desse gás é pela via respiratória, fazendo assim, com que o gás chegue aos pulmões e cause danos variados à saúde.
A reclamante fazia a respiração desses gases todos os dias, durante o seu labor.
A intoxicação por estes gases se dá de forma crônica, justamente pela respiração de doses reduzidas (a exposição intensa é inclusive causa de óbito), podendo causar vários problemas de saúde que prejudicam o trabalhador e trazem consequências muito graves.
Nessas condições, fácil concluir que o trabalho praticado era insalubre.
A Consolidação das Leis do Trabalho determina que:
Art. 166 - A empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, equipamento de proteção individual adequado ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento, sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados.
Com efeito, a reclamada era obrigada a fornecer para a reclamante EPI’s eficientes e ergonômicos para suprimir o risco de ruído e de gases tóxicos a qual estava exposta, o que, de fato, não ocorreu.
Sobre a prova da insalubridade, que precisa constatar os riscos em questão, nota-se que, atualmente, em decorrência do término dos contratos de concessão de pedágio, dentro do Estado do Paraná, toda a atividade de arrecadador de tarifa não é mais aqui praticada; se não no Estado do Paraná inteiro, no mínimo na praça de pedágio onde ocorria o labor.
Logo, quaisquer perícias que demandem a averiguação in loco da insalubridade restarão prejudicadas, pois a atividade não é mais exercida no antigo local da prestação de trabalho.
Até mesmo o fluxo de veículos nas praças de pedágio foi alterado por causa do término da concessão, já que as cancelas, desde o término concomitante do contrato de trabalho e do contrato de concessão pública do pedágio, estão 24 horas por dia abertas.
Os veículos, de então, não mais ficam retidos na praça de pedágio até o pagamento da tarifa, o que implica em alterações das próprias condições de risco ocupacional do local.
Enquanto o contrato de trabalho e de concessão estava ativo, havia concentração de veículos automotores parados nas praças de pedágio, o que incrementava o risco, além da própria passagem intermitente de veículos na faixa sem parar.
Agora, enquanto os pedágios estão inativados, esta concentração deixou de existir, o que altera o próprio risco.
Nesse contexto, exigir da reclamante a prova do risco é o mesmo que exigir prova diabólica, pois a atividade não é mais praticada, o que torna para a autora impossível de exonerar-se do ônus.
Conforme OJ – SBDI I – TST 278 a realização da perícia é obrigatória para a verificação da insalubridade, porém, quando não for possível sua realização, em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de prova.
ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PERÍCIA. LOCAL DE TRABALHO DESATIVADO (DJ 11.08.2003)
A realização de perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização, como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de prova.
Tem lugar de aplicação, então, a CLT em seu artigo 818, § 1º, a fim de inverter o ônus probatório e determinar à reclamada que prove que o ruído não era acima do limite permitido e que, se era, que forneceu e fiscalizou a utilização de EPI’s para ruído, eficientes:
Art. 818. O ônus da prova incumbe:
§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos deste artigo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
Acaso Vossa Excelência entenda que o ônus ainda é desta reclamante, pugna-se, ante as circunstâncias do litígio que impedem a produção da prova pericial, bem como pela vigência do entendimento constante na OJ 278 da SBDI 1 do c. TST,, pela redução do módulo da prova, a fim de que, apenas com a verossimilhança da prova testemunhal e da própria natureza da função exercida, alcance-se o patamar de prova necessário à concessão do adicional buscados.
Demonstrada a ocorrência da insalubridade, a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu Artigo 7º, inciso XXIII, determina a consequência da exposição às atividades insalubres:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social.
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;
A CLT, ademais, em seu artigo 189, define os critérios para avaliar a ocorrência ou não da exposição a agentes nocivos à saúde:
Art. 189 Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.
O adicional de insalubridade, então, surge como um meio de defender o empregado e fazer com que o empregador fique atento às normas e as condições de trabalho, sempre priorizando a redução de riscos inerentes ao labor, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (CRFB/88, artigo 7º, XXII).
Sobre a alíquota do adicional, a Consolidação das Leis do Trabalho determina que o exercício do trabalho nas condições insalubres que tais, faz incidir o máximo do adicional, o que gera o direito à percepção deste de 40% (quarenta por cento). Veja-se o artigo 192 da CLT:
Art. 192 - O exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximos, médio e mínimo.
É certo que a verba de insalubridade deve ser fixada com base de cálculo no próprio valor da remuneração obtida pelo autor, como medida de justiça, o que requer.
Referido dispositivo – artigo 192 da CLT – deve ser afastado na parte em que fixa a base de cálculo da insalubridade com alicerce no salário mínimo, em vista do entendimento do e. STF e do c. TST de que este não serve como parâmetro.
Isto porque, no vácuo legislativo existente sobre o critério de definição da base de cálculo, a jurisprudência sedimentou que somente é aplicável o salário mínimo da região quando outra norma, com base na lei ou em acordo ou convenção coletiva, não se mostre aplicável.
A exposição a ruído e gases tóxicos ocorria no grau máximo, razão da incidência da alíquota de 40% (quarenta por cento).
Com efeito, nessas condições de exposição a riscos insalubres, base de cálculo e alíquota de incidência, o valor do adicional de insalubridade, sem juros e correção monetária devidos deste cada vencimento, totaliza o importe de R$ 17.986,20 (dezessete mil novecentos e oitenta e seis reais e vinte centavos) conforme prevê a Lei e a jurisprudência, motivo da condenação da reclamada ao pagamento, o que requer.
Princípio Da Vedação Ao Retrocesso Social E Inconstitucionalidade Da Reforma Trabalhista
O Trabalho é, na Constituição da República Federativa do Brasil, um dos fundamentos da nação reconstruída em 1988, conforme se vê do artigo 1º, inciso IV, da nossa Carta Magna:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
Tão importante para nossa jovem República o Trabalho, que este mereceu destaque não somente na fundação do Estado, mas também mereceu uma normatividade com maior concretude dentro do próprio texto constitucional.
É o que se vê do Capítulo II (dos Direitos Sociais), do Título II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais) de nossa Constituição, em especial, no artigo 7º desta.
Com efeito, nota-se que topograficamente, o Trabalho é tido pela Constituição como fazendo parte dos Direitos e Garantias Fundamentais.
Constitucionalmente, o Título II em questão – Dos Direitos e Garantias Fundamentais – trata de normas jurídicas de cunho obrigatório ao Estado.
São normas que impedem o arbítrio estatal e que geram prestações positivas e negativas aos cidadãos, de obrigação do Estado.
Os Direitos Sociais, previstos no artigo 7º da CRFB, impõe ao Estado um nível de exigência maior; mais do que respeitá-los, este deve promovê-los a partir de sua atuação positiva, quer normativa ou em outros âmbitos.
Por assim serem, os Direitos Sociais caracterizam-se como um aspecto dos Direitos Humanos.
E se assim o é, o Estado não pode simplesmente negá-los ou deixar de promovê-los; muito menos extingui-los.
O Princípio da Vedação ao Retrocesso Social funciona como um limite a esta sanha estatal de redução de Direitos.
Este princípio mostra-se como anteparo protetor daquele credor das prestações estatais, que as viu esvaziadas; que viu seus direitos serem minguados. Protege as pessoas contra a lei, por exemplo, que queira atingir de forma negativa algum direito já conquistado, para que tal direito não seja suprimido.
Águia de Haia já apontou em suas lições que não se pode tolerar retrocessos nos direitos fundamentais:
Não negueis jamais ao Erário, à Administração, à União os seus direitos, são tão invioláveis, como quaisquer outros. Mas o direito dos mais miseráveis dos homens, o direito do mendigo, do escravo, do criminoso, não é menos sagrado, perante a justiça, que o do mais alto dos poderes. Antes, com os mais miseráveis é que a justiça deve ser mais atenta, e redobrar de escrúpulo; porque são os mais mal defendidos, os que suscitam menos interesse, e os contra cujo direito conspiram a inferioridade na condição com a míngua nos recursos.
(BARBOZA, Rui, Oração aos Moços, 1999, p. 42-43.).
Não é possível permitir, por isso, que mudanças legislativas suprimam ou limitem direitos sociais que possuam fundamento no próprio valor do Trabalho. O Estado agir no sentido de limitar ou de suprimir esse direito já reconhecido e normatizado, nada mais é que violar a pessoa humana e seus direitos.
Todo direito já reconhecido e integrado na esfera do Trabalhador não pode sofrer limitação; as normas e garantias já existentes sempre devem ser aplicadas com efetividade e a tentativa de extirpá-las, mesmo que proveniente do Poder Legislativo, deve ser rechaçada pelo Poder Judiciário, até mesmo em Controle de Constitucionalidade Difuso, como se verá, é o caso.
A base é evitar o retrocesso de um direito conquistado pelo cidadão. O artigo 7º da Constituição Federal de 1988 abarca este Princípio, estabelecendo um patamar civilizatório alcançado pelos trabalhadores, o que, em tese, não pode sofrer nenhuma produção legislativa que retire do trabalhador qualquer direito ou garantia outrora conquistado.
A Reforma Trabalhista implementada pela Lei 13.467/2017 retirou da normatividade já octogenária da CLT o direito do trabalhador a contar como tempo de duração do trabalho as horas in itinere; isto é, aquelas que eram devidas pelo tempo à disposição do empregador, para o deslocamento até o local de trabalho.
Anteriormente à Reforma, a CLT previa, no artigo 58, § 2º, com Redação dada pela Lei 10.423/2001, o seguinte:
Art. 58 - A duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de 8 (oito) horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite.
§ 2o O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte público, o empregador fornecer a condução. (Parágrafo incluído pela Lei nº 10.243, de 19.6.2001)
Referida norma jurídica, que ainda possibilitava o pagamento das horas in itinere, foi revogada pela Lei 13467/2017; a Reforma Trabalhista, que, em seu lugar, trouxe a normatividade inconstitucional a seguir descrita, por limitar e afastar Direito Social:
§ 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
É possível notar com clareza que a CLT, por influxo da Lei 13.467/2017, teve reduzido seu espectro de aplicação nesse ponto, limitando ou afastando o direito social que existia até então.
Há a promoção, na Lei Trabalhista, de um evidente retrocesso social, pois a Classe Trabalhadora perdeu direitos outrora que lhes foram concedidos firme e pacificamente.
Toda Constituição que trata de Direitos Humanos, possui, na essência, a adoção do Princípio da Vedação do Retrocesso: este, por mais que não possua expressa adoção no texto constitucional, serve como uma liga de todos os direitos nela expressos.
Assim, a Reforma Trabalhista, no que concerne as horas in itinere, promovida pela Lei 13.467/2017, é inconstitucional e deve, assim, ser declarada por este r. Juízo do Trabalho por meio do Controle Difuso de Constitucionalidade.
Com a declaração de inconstitucionalidade, pelo qual reconhece-se a nulidade da norma, deve a redação anterior da norma do artigo 58, § 2º, da CLT, dada pela Lei 10.423/2001, retornar à vigência, concedendo-se efeito repristinatório a esta, a fim de considerar as horas in itinere como tempo de duração do trabalho.
Das Horas In Itinere – Tempo à Disposição Do Empregador
Como já explanado nos fatos, a reclamante se deslocava de sua residência, pouco mais de meia hora antes de começar o trabalho de fato, se colocando à disposição da reclamada, para adentrar ao meio de transporte que a levaria até o local da prestação de serviço.
Todos os dias, 30 (trinta) minutos de ida (do ponto em que subia no ônibus da reclamada até o trabalho) e 30 (trinta) minutos de volta (do trabalho até o ponto em que descia do ônibus), aproximadamente, ou seja, a reclamante despendia 01 (uma) hora do seu dia, todos os dias, à disposição do seu empregador.
No período noturno não há transporte público na localidade onde a reclamante efetuava a prestação de serviços, fato este que a fazia utilizar o transporte oferecido pela reclamada.
O caput do Artigo 4º da CLT demonstra que “Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada”. Em consequência, o § 2º do mesmo artigo nos demostra:
Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o limite de cinco minutos previsto no § 1º do art. 58 desta Consolidação, quando o empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras:
I- práticas religiosas; II- descanso; III- lazer; IV- estudo; V- alimentação; VI- atividades de relacionamento social; VII- higiene pessoal; VIII- troca de roupa ou uniforme, quando não houver …