Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_razao_social], pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ nº $[parte_autor_cnpj], com sede na $[parte_autor_endereco_completo], por sua procuradora com mandato anexo, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5°, inciso LXIX, da Constituição Federal de 1988, bem como na Lei n° 12.016/09, para impetrar
MANDADO DE SEGURANÇA
contra ato praticado pelo Ilmo. $[parte_reu_nome_completo], $[parte_reu_nacionalidade], $[parte_reu_estado_civil], $[parte_reu_profissao], inscrito no $[parte_reu_cpf] e $[parte_reu_rg], residente e domiciliado na $[parte_reu_endereco_completo], o que o faz com pelos motivos de fato e de direito a seguir expostos.
DA SÍNTESE FÁTICA
A empresa nunca mediu esforços para manter suas obrigações tributárias (principais e acessórias) em dia perante o órgão de fiscalização e arrecadação referente a débito de ICMS, todavia, apesar de todo o seu esforço, não pode se ver tolhida a recolher valores excedentes como os que são cobrados pelo Estado.
O referido imposto, conforme cediço, incide sobre operações de circulação de mercadorias (ou serviços de transporte intermunicipal, interestadual e comunicação), nos termos do artigo 155, inciso II da Constituição Federal, ou seja, sua hipótese de incidência está atrelada apenas a operações que envolvam atos de mercancia.
Neste sentido, o dispositivo supracitado somente autoriza a incidência do ICMS sobre operações mercantis de circulação de mercadorias, vale dizer, sobre o preço da mercadoria comercializada, sem a inclusão de valores absolutamente estranhos ao ato de venda, como os referentes aos recolhimentos da Contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS, incidentes sobre o faturamento/receita bruta das pessoas jurídicas.
Afinal, o ato de pagar as contribuições em questão é absolutamente estranho ao conceito de operação mercantil, tornando-se imperiosa a exclusão de tais contribuições (PIS e COFINS) da base de cálculo do ICMS, tal como indevidamente exige a AUTORIDADE IMPETRADA da contribuinte.
Assim, tem a IMPETRANTE o DIREITO LÍQUIDO E CERTO de não ser mais compelida ao recolhimento em debate, bem como de efetuar o recalculo e abatimento, inclusive por compensação (mediante creditamento) das respectivas quantias indevidamente pagas, limitadas aos (05) cinco últimos anos.
Desta forma, alternativa não restou a IMPETRANTE a não ser buscar o amparo jurisdicional.
DO DIREITO
DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO DA IMPETRANTE – DA BASE DE CÁLCULO DO ICMS
A Constituição Federal, em seu artigo 155, delimitou o exercício do poder de tributar dos Estados e do Distrito Federal atribuindo-lhes, dentre outras, competência para instituírem impostos sobre operações de circulação de mercadorias e de determinados serviços, nos seguintes termos:
“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(...)
II - Operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (Redação dada pela Emenda Constitucional no 3, de 1993)
(...)
§ 2o O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional no 3, de 1993)
I - Será́ não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;
(...)
XII - cabe à lei complementar: (...)
i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação do exterior de bem, mercadoria ou serviço.”
Portanto, e excetuando as prestações de serviços específicos como transporte intermunicipal ou interestadual e comunicações, a Constituição determina que o ICMS incida somente sobre operações de circulação de mercadorias (mercancia).
Neste sentido, cumpre destacar que mercadoria, nas palavras do abalizado doutrinador Roque Antônio Carrazza2.
˜Não é qualquer bem móvel que é mercadoria, mas tão-só aquele que se submete a mercancia3. Podemos, pois, dizer que toda mercadoria é bem móvel, mas nem todo bem móvel é mercadoria. Só́ o bem móvel que se destina à prática de operações mercantis é que assume a qualidade de mercadoria.
(...)
Mais além:
“Temos, portanto, que o conceito de mercadoria, no que diz com o ICMS, há de ser entendido como o era em Direito Comercial” 4
Vejamos, que, portanto, mercadoria é o bem móvel quando sujeito à circulação econômica, conceito este que não está sujeito a alterações ou significações diversas pela lei tributária5.
Sem prejuízo, a Constituição Federal ainda estabeleceu, em seu artigo 146, inciso III, alínea “a”, que à lei complementar cabe a “definição de tributos e de suas espécies, bem como, em2 ICMS, 8a ed. Malheiros : 2001, p. 17.
3 NR in CARRAZZA, Roque Antonio. ICMS, 8a ed. Malheiros : 2001, p. 37. “O bem móvel é gênero, do qual a mercadoria é a espécie. Só é mercadoria o bem móvel objeto de mercancia, isto é, integrada ao estoque da empresa, destina-se a revenda.”
4 ICMS, 8a ed. Malheiros : 2001, p. 38.
5 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes.
Já́ no âmbito infraconstitucional, estão definidas na legislação nacional do ICMS, a hipótese de incidência, o fato gerador e a base de cálculo do imposto, respectivamente nos artigos 2°,12 e 13, da Lei Complementar n° 87/96 (Lei Kandir), os quais instituem, a devida materialização e operacionalização do imposto.
E especificamente sobre a composição da base de cálculo do ICMS, veja-se a disposição do citado artigo 13, da LC n° 87/1996:
Art. 13. A base de cálculo do imposto é:
I - Na saída de mercadoria prevista nos incisos I, III e IV do art. 12, o valor da operação;
(...)
§ 1o Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo:
O montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;
O valor correspondente a: seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado.
Complementarmente, veja-se a legislação própria do Estado de São Paulo que regulamenta a cobrança do ICMS, cuja base de cálculo está prevista no artigo 10, I, da Lei Estadual n° Lei 10.297, de 26 de dezembro de 19966 e no artigo 9, I, c.c. art. 22 do RICMS/SC7:
“RICMS/SC
Art. 9° A base de cálculo do imposto nas operações com mercadorias é:
I - na saída de mercadoria prevista no art. 3°, I, III e IV, o valor da operação; (...)
Art. 22. Integra a base de cálculo do imposto:
- o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;
- o valor correspondente a:
seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição;
frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado.”
Nota-se, portanto, que a base de cálculo do ICMS nas vendas de mercadoria é o “valor da operação”, somando-se a ele os valores do próprio ICMS, seguros, frete e demais importâncias pagas, bem como os descontos concedidos exclusivamente sob condição.
A Lei Kandir nomeou exaustivamente quais tributos podem compor a base de cálculo do ICMS. Note-se que a referida Lei, refletindo as intenções legiferastes, desenhou o ICMS importação – por exemplo – que possui como fato gerador o desembaraço aduaneiro de mercadorias ou bens importados do exterior, sendo que sua base de cálculo é o valor da 6http://legislacao.sef.sc.gov.br/Consulta/Views/Publico/Frame.aspx?x=/Cabecalhos/frame_lei_10297.ht m em 16/10/2020 as 23:30:00h7 https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/textoricms.aspx#art037.aspx em 16/10/2020 as 23:32:29hmercadoria ou bem constante dos documentos de importação, observado o disposto no art. 141, somado ao imposto de importação, imposto sobre produtos industrializados, imposto sobre operações de câmbio, quaisquer despesas aduaneiras e quaisquer outros impostos, taxas e contribuições, conforme leitura sistemática do artigo 13, da LC n° 87/1996.
Dito de outra maneira, resta colidente com o texto constitucional toda e qualquer disposição que determine a inclusão de valores não atrelados à mercadoria (demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas), tal como as contribuições ao PIS e à COFINS, que nada mais são que receitas públicas (pertencentes ao Governo Federal) e, por tal razão, não podem ser consideradas operações mercantis.
Sobre tal afirmação não diverge José Eduardo Soares de Melo, ‘in verbis’.
“Somente deveriam integrar a base de cálculo os valores inerentes às mercadorias e aos preços dos serviços de transporte, e de comunicação, bem como os reajustes e acréscimos vinculados intrinsicamente vinculados a tais valores. nesse cálculo, não poderiam ser considerados elementos estranhos ao valor da operação ou preço, porquanto correspondem a verbas que tem natureza diversa de operações mercantis e prestações de serviços, não havendo fundamento para o ICMS incidir sobre meras entradas ou créditos8
Desta forma, imperioso reconhecer-se que a base de cálculo de qualquer imposto se relaciona intimamente ao seu fato gerador, incidindo, pois, de modo a tributar somente a capacidade contributiva revelada pelo contribuinte. Dito de outra maneira, resta evidente que o valor da operação de circulação de mercadorias, base de cálculo do ICMS, abrange tão somente o valor da mercadoria que culmina no ingresso de recursos próprios do contribuinte, vale dizer, aqueles que definitivamente integram seu patrimônio em razão do exercício da sua atividade mercantil.
ICMS – teoria e prática p. 237.
A contrário sensu, não há que se falar em inclusão na base de cálculo do aludido imposto das entradas que apenas transitam, em caráter temporário, pelo patrimônio do contribuinte, que tem a obrigação de repassá-las a terceiros, como é o caso do PIS e da COFINS, que são posteriormente recolhidos aos cofres do Governo Federal.
Afinal, os valores relativos às contribuições em questão, que se traduzem em receita pública (e não do contribuinte), não se inserem no contexto de operação mercantil posto pelo artigo 155, inciso II da Constituição Federal.
Não é demais ressaltar que o C. Supremo Tribunal Federal já́ afastou esta sobreposição de incidências tributárias (tributo sobre tributo) em outras ocasiões, como por exemplo no RE n° 240.785, no qual restou afastada a exigência do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, assim ementado:
TRIBUTO – BASE DE INCIDÊNCIA – CUMULAÇÃO – IMPROPRIEDADE.
Não bastasse a ordem natural das coisas, o arcabouço jurídico constitucional inviabiliza a tomada de valor alusivo a certo tributo como base de incidência de outro. COFINS – BASE DE INCIDÊNCIA – FATURAMENTO – ISS. O que relativo a título de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e a Prestação de Serviços não compõe a base de incidência da Confins, porque estranho ao conceito de faturamento.
Neste sentido, cumpre colacionar o seguinte trecho do voto condutor proferido pelo Ministro Marco Aurélio:
“... A base de cálculo da Confins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede à venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Confins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo. A conclusão a quechegou à Corte de origem, a partir de premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Confins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já́ agora da competência de unidade da Federação. No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á́, a prevalecer o que decidido, a incidência da Confins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre imposto, quando a própria Lei Complementar no 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir- se, na base de incidência da Confins, o valor devido a título de IPI. Difícil é conceber a existência de tributo sem que se tenha uma vantagem, ainda que mediata, para o contribuinte, o que se dirá́ quanto a um ônus, como é o ônus fiscal atinente ao ICMS. O valor correspondente a este último não tem a natureza de faturamento. Não pode, então, servir à incidência da Confins, pois não revela medida de riqueza apanhada pela expressão contida no …