Petição
AO D. JUÍZO DA VARA DE $[processo_vara] JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA REGIONAL DA $[processo_comarca] - $[processo_uf]
$[parte_autor_qualificacao_completa], vem por sua advogada (procuração em doc. 1), respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fundamento na Lei n° 9.099/95, Lei n° 14.034/20 e Lei nº 14.174/21, propor a presente
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
em face de $[parte_reu_qualificacao_completa], e $[parte_reu_qualificacao_completa], pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
I. DOS FATOS
A Autora adquiriu passagens áreas, no valor de R$ 3.200,57 através do site da primeira Ré, com bilhetes emitidos na companhia área da 2ª Ré, com itinerário nº 7516864301708. O voo partiria de Berlim no dia 15/06/2020, com escala em Londres, e destino final no Rio de Janeiro. O retorno estava previsto para o dia 26/08/2020, também com escala em Londres e destino final em Berlin – tudo provado através do bilhete de embarque (Doc.5)
É importante ressaltar que a Autora adquiriu essa viagem para sua mãe, $[geral_informacao_generica], conforme consta no bilhete, a fim de que ela pudesse visitá-la no Brasil, uma vez que reside em outro país.
Ocorre, Excelência, que no dia 08/06/2020, a Autora recebeu a notícia da 1ª Ré que o voo precisou ser cancelado devido as restrições da Covid-19 impostas pelo Governo Federal (protocolo nº S-209452087).
Diante dessa situação, a Autora questionou a empresa aérea sobre o reembolso e foi informada de que seria realizado integralmente em até 12 meses, (protocolo nº S-209484370)
Passado mais de 1 (um) ano da promessa de reembolso, a Autora verificou que não recebeu o valor pago. Por essa razão, ligou para o atendimento da 1ª Ré nos dias 02/08/2021 e 16/08/2021, sendo informada de que seria verificado internamente sobre o reembolso.
Em novo contato telefônico – registrado através do n° de protocolo docS#92681205 -, a Autora explicou a situação e solicitou respostas. Na ocasião, a primeira Ré informou que a segunda Ré havia informado que o reembolso já havia sido realizado e, portanto, solicitou à empresa aérea o comprovante para encaminhar à autora.
Sem novo contato, a Autora realizou nova ligação a 1ª Ré nos dias 25 e 27 de agosto e 04/10/2021 com protocolos subsequentes de nº S#92681205, S#92836839 e S#95500765. Mais uma vez, a informação fornecida foi a mesma: a primeira Ré estava aguardando o envio do comprovante de reembolso que supostamente a segunda Ré havia realizado.
No dia 06/10/2021, a primeira Ré entrou em contato e informou em ligação para o marido da autora que a segunda Ré esclareceu que havia realizado o reembolso, mas sem enviar qualquer comprovante. A Autora confirmou que não havia recebido o dinheiro em conta, com protocolo n S#95669085 e S#95685455.
Em 02/11/2021, a Autora esclareceu a 1ª Ré que a compra foi realizada no cartão de débito e não havia recebido qualquer estorno. A empresa informou que o reembolso foi feito no dia 08/06/2020, data em que a Autora solicitou o reembolso, porém sem nenhum comprovante apresentado.
Nos dias 14/03/2021, 12/07/2022 e 01/12/2022, com protocolos nº S#108417623 S#120263667, S#134391187, a Autora, já exausta com a situação, realizou diversos contatos para que ambas rés procedessem com o reembolso. No entanto, não foi realizado até presente data.
Deste modo, a parte Autora a todo momento tentava contato com as Rés no intuito de buscar uma solução amigável para a solução de seu caso, porém sem lograr êxito no seu intento, não restando alternativa, senão a propositura da presente ação.
II- DOS FUNDAMENTOS
II.I – DA CARACTERIZAÇÃO DA RELAÇÃO CONSUMERISTA
A Lei nº 8.078/90 trouxe o conceito de Consumidor nos seguintes termos:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Assim, uma vez reconhecida a Autora como destinatária final dos serviços contratados, e demonstrada hipossuficiência, tem-se configurada uma relação de consumo.
Consequentemente devem ser concedidos os benefícios processuais do Código de Defesa do Consumidor, em especial a inversão do ônus da prova, trazida ao art. 6º do inc. VIII:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
II.II - DO DIREITO AO REEMBOLSO DA PASSAGEM AÉREA – DO CANCELAMENTO REALIZADO PELA EMPRESA AÉREA
No presente caso, o serviço foi devidamente pago e não usufruído, não sendo admissível aceitar que ambas Rés recebam por um serviço não prestado, mesmo que por força contratual.
O cancelamento do voo foi realizado pela 1ª Ré, sendo de sua responsabilidade a garantia ao consumidor de seu dinheiro de volta. Conforme relatado, a Autora aguardou mais de 1 (um) ano e ainda, precisou entrar em contato com a empresa inúmeras vezes, sem sucesso.
Com a declaração da Pandemia pelo Covid-19, foi promulgada a Lei 14.034/2020, com alteração pela Lei 14.174/21 prevendo ISENÇÃO de penalidades contratuais para os casos de cancelamento do voo:
“Art. 3º (...) § 3º O consumidor que desistir de voo com data de início no período entre 19 de março de 2020 e 31 de dezembro de 2021 poderá optar por receber reembolso, na forma e no prazo previstos no caput deste artigo, sujeito ao pagamento de eventuais penalidades contratuais, ou por obter crédito, perante o transportador, de valor correspondente ao da passagem aérea, sem incidência de quaisquer penalidades contratuais, o qual poderá ser utilizado na forma do § 1º deste artigo.”
A lei é clara no que tange ao direito do consumidor de obter seu dinheiro de volta com atualização monetária com base no INPC, sem a obrigação de aceitar a utilização de créditos.
Nesse sentido segue a jurisprudência recente do nosso E. Tribunal, vejamos:
“Ação de conhecimento proposta por consumidoras em face de empresa área e agencia de viagens, objetivando indenização por danos material e moral com a alegação de que, ao solicitarem o cancelamento de passagens aéreas por motivo de força maior, não obtiveram o reembolso dos valores pagos. Sentença que julga procedente, em parte, o pedido para condenar as Rés ao reembolso do valor despendido com as passagens aéreas, observada a retenção da multa prevista, rejeitando o pedido de indenização por dano moral. Apelação das Autoras. Alegam as Apelantes que solicitaram o cancelamento das passagens aéreas da segunda Apelada (empresa aérea), por intermédio da primeira Apelada (agência de viagens), porque o evento de dança que a primeira Apelante participaria foi cancelado por motivo de força maior, qual seja, a decretação de estado de emergência, em Santigo, Chile, e que, por isso, fazem jus ao reembolso integral dos valores despendidos. Da análise do Contrato de Intermediação de Serviços de Turismo, especificamente nas Cláusulas 4 e 5, verifica-se a previsão de que eventual reembolso dos valores pagos por passagens aéreas deverá se sujeitar a multas contratualmente previstas. Ocorre que as Apelantes demonstraram que, quando das tratativas para devolução do valor pago, lhes foi assegurada a devolução integral, por preposta da agência de viagens, o que deve ser observado, ainda mais que a prova não foi impugnada. Rescisão do contrato por motivo de força maior, não tendo as Apeladas sequer se prontificado à restituição parcial do valor pago, ensejando a propositura da ação judicial. Dano moral configurado ante a repercussão extrapatrimonial dos fatos em discussão. Indenização arbitrada com moderação em R$2.500,00, adotando como parâmetro o valor do prejuízo material. Verba que deve ser corrigida monetariamente a contar da publicação do acórdão, ocasião em que foi arbitrada, e acrescida de juros de mora a partir da citação por se tratar de responsabilidade contratual. Reforma parcial da sentença que enseja a imposição às Apeladas, por inteiro, dos ônus da sucumbência. Provimento parcial da apelação.”
(0000281-58.2020.8.19.0063 - APELAÇÃO. Des(a). ANA MARIA PEREIRA DE OLIVEIRA - Julgamento: 02/06/2021 - VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL)
APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. CANCELAMENTO DE VOO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. VOO PROGRAMADO PARA PARTIDA ANTES DO PRAZO ESPECIFICADO NA LEGISLAÇÃO QUE TRATA DO REEMBOLSO PARA OS CANCELAMENTOS EM DECORRÊNCIA DA PANDEMIA DE COVID-19. OBRIGAÇÃO DE REEMBOLSO DAS PASSAGENS NO PRAZO DE 7 DIAS. AINDA QUE SE APLICASSE O PRAZO PREVISTO NA LEI Nº 14.034/20, O PRAZO, QUE ERA DE 12 MESES, JÁ HAVIA EXPIRADO QUANDO DA INTERPOSIÇÃO DA PRESENTE AÇÃO. VIOLAÇÃO POSITIVA DO CONTRATO. DANO MORAL CONFIGURADO E FIXADO DE FORMA MÓDICA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA QUE SE REJEITA. DESPROVIMENTO DOS RECURSOS.
(TJ-RJ - APL: 00266183920218190002, Relator: Des(a). PAULO SÉRGIO PRESTES DOS SANTOS, Data de Julgamento: 13/06/2022, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/06/2022)
APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA (INDEX 269) QUE JULGOU PROCEDENTES OS PEDIDOS PARA CONDENAR A RÉ A: (I) PROCEDER AO REEMBOLSO AOS AUTORES DOS VALORES DESPENDIDOS NA COMPRA DAS PASSAGENS AÉREAS, ACRESCIDOS DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA A CONTAR DO DESEMBOLSO; (II) PAGAR AOS RECLAMANTES R$20.000,00 PARA COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS, ACRESCIDOS DE JUROS DE 1% A PARTIR DA CITAÇÃO, COM ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA CONFORME AS SÚMULAS 97 DO TJERJ E 362 DO STJ. RECURSO DA RÉ AO QUAL SE DÁ PROVIMENTO PARCIAL PARA REDUZIR O VALOR DO QUANTUM COMPENSATÓRIO DO DANO MORAL PARA R$10.000,00 (DEZ MIL REAIS), R$5.000,00 (CINCO MIL REAIS) PARA CADA AUTOR. Narraram os Requerentes que adquiriram passagens aéreas para o trecho Porto Seguro/BA e Rio de Janeiro/RJ, em 13/11/2020, no valor de R$2.024,19, com embarque programado para o dia 27/01/2021. Asseveraram que a Reclamada cancelou o voo, em virtude da pandemia da Sars-Cov-2 (Covid-19), não conseguindo a devolução dos valores pagos, razão por que propuseram a demanda em busca de indenização por danos materiais e morais. Pleitearam a tutela jurisdicional com vistas à devolução integral do valor das passagens pagas, bem como a compensação por dano extrapatrimonial. No caso sob análise, cumpre assinalar que a relação existente entre os litigantes é de caráter consumerista, devendo, pois, a controvérsia ser dirimida sob as diretrizes estabelecidas no Código de Proteção e de Defesa do Consumidor. Como o serviço de transporte se enquadra nas disposições contidas no artigo 3º, § 2º, da Lei 8.078/1990, o fornecedor somente não responderá pelos danos sofridos pelo consumidor se demonstrar que inexistiu o defeito do serviço, ou que houve fato exclusivo do consumidor ou de terceiros (artigo 14, § 3º, da lei consumerista), o que não ocorreu. A alteração do voo por falha das companhias aéreas é inerente à atividade empresarial, encerrando fortuito interno, não possuindo o condão de afastar o dever de indenizar. Da análise, verifica-se que o voo cancelado estava com embarque previsto para 27/01/2021, no valor pago de R$ 2.024,19, cabendo a devolução da quantia. Na espécie, restou incontroverso que os Suplicantes não embarcaram no voo contratado, tampouco obtiveram a devolução dos valores despendidos. Sem embargo da plausibilidade da justificativa para cancelamento do voo, posto que, de fato, em razão da pandemia da Sars-Cov-2 (COVID-19), as Companhias Aéreas precisaram se ajustar à nova realidade e ao necessário remanejamento da malha aérea, incumbia-lhe devolver aos Requerentes os valores pagos. Neste sentido, restou demonstrada a falha do serviço, impondo-se a reparação dos danos materiais e compensação dos danos morais, que restaram caracterizados. Assim, deve a Suplicada restituir o valor gasto pelos Reclamantes com as passagens aéreas, no total de R$ 2.024,19. No que toca aos danos morais, o quantum compensatório deve ser fixado de acordo com os parâmetros impostos pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, observando os critérios que balizam seu arbitramento, como a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor e da vítima, sem olvidar o caráter preventivo-pedagógico-punitivo. No que toca aos danos morais, o quantum compensatório deve ser fixado de acordo com os parâmetros impostos pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, observando os critérios que balizam seu arbitramento, como a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor e da vítima, sem olvidar o caráter preventivo-pedagógico-punitivo. Desta forma, levando-se em conta as circunstâncias do caso concreto, apresenta-se razoável e proporcional o valor, de R$ 10.000,00, para compensação dos danos morais, na proporção de R$5.000,00 para cada Autor. Precedente.
(TJ-RJ - APL: 00001024720218190045, Relator: Des(a). ARTHUR NARCISO DE OLIVEIRA NETO, Data de Julgamento: 24/03/2022, VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 25/03/2022)
Caso contrário, tem por demonstrado o enriquecimento sem causa dos Réus, uma vez que a Autora pagou os valores devidos e sua mãe, passageira do voo, não usufruiu de qualquer serviço, devendo ser ressarcida, nos termos do Código Civil:
“Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.”
Ampla doutrina reforça a importância da proibição ao enriquecimento sem causa, para fins da efetiva preservação da boa-fé nas relações jurídicas:
"O repúdio ao enriquecimento indevido estriba-se no princípio maior da equidade, que não permite o ganho de um, em detrimento de outro, sem uma causa que o justifique. (...) A tese, hoje, preferida pela doutrina brasileira é a da admissão do princípio genérico de repulsa ao enriquecimento sem causa indevido. Essa a opinião de que participo." (RODRIGUES, Silvio. Direito civil: parte geral das obrigações. 24 ed. São Paulo: Saraiva, p. 159.)
Com …