Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO $[processo_vara] JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA de $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
TUTELA PROVISÓRIA
GRATUIDADE DE JUSTIÇA
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], $[parte_autor_rg], $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado $[parte_autor_endereco_completo], por seus advogados in fine subscritos – procuração anexa, vem, respeitosamente, perante V. Exa., com fulcro dos artigos 319 et seq, todos do Código de Processo Civil, combinados com o art. 300 do mesmo Código propor a presente:
AÇÃO DE ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO E INDENIZAÇÃ DE PERDA E DANOS, COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA
Em face de $[parte_réu_nome_completo], $[parte_reu_nacionalidade], $[parte_reu_estado_civil], $[parte_reu_profissao], $[parte_reu_rg], $[parte_reu_cpf], residente e domiciliado$[parte_reu_endereco_completo], pelos fatos e fundamentos doravante aduzidos:
I. DOS FATOS
Em março de 2020, visando quitar financiamento, celebrado com o banco réu (contrato n° $[geral_informacao_generica]) para aquisição de veículo que se encontrava em vias de alienar, o requerente entrou em contato com o número disposto no carnê (anexo) e ao atendente solicitou geração de boleto para pagamento do saldo devedor remanescente.
Em seguida, o suposto atendente do corréu $[parte_reu_razao_social] fez contato com o autor, por meio do WhatsApp, cuja conversa se encontra exportada em anexo, remetendo-lhe o boleto solicitado, expedido pelo banco BS2:
$[geral_informacao_generica]
De acordo com o interlocutor da conversa, a expedição da carta de quitação e baixa no gravame se daria em 48h úteis, contadas do pagamento.
Por ser pessoa extremamente simples, com pouco conhecimento acerca das ferramentas bancárias digitais contemporâneas e baixa instrução, acabou o autor convencido da lisura da operação e pagou o boleto, no valor de R$ 2.249,69, conforme comprovante a seguir colacionado:
$[geral_informacao_generica]
Logo depois, porém, foi o autor surpreendido com cobranças das parcelas remanescentes pelo banco réu e da recusa deste em outorgar a quitação do contrato.
Somente então constatou o autor que havia sido vítima de uma fraude.
Desde então, tentou, por diversas vezes, negociar com o banco réu a aceitação do pagamento feito a credor putativo. O réu, porém, mostrou-se inexorável.
Por não divisar solução diversa, vem o autor, perante este D. Juízo, reclamar o que de direito, conforme segue.
II. DO DIREITO
DA TUTELA CAUTELAR DE URGÊNCIA
Nos termos do art. 300, § 3º, do CPC:
“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”
No caso em apreço, a verossimilhança do direito se consubstancia nos documentos acostados e se colhe dos próprios fatos narrados, do que se nota que a requerente foi vítima de um golpe.
Como se vê dos documentos anexos, o estelionatário se passou pelo banco-réu, oferecendo, em seu nome, boleto para quitação do financiamento que o autor havia contratado. Após pagamento, o banco informou que não era responsável pelo boleto e o autor devia arcar com o prejuízo.
À evidência, considerando que o boleto foi expedido por terceiro, com intenção de induzir o autor a pagar a pessoa errada, a fraude é incontroversa.
O perigo na demora consiste na necessidade de se agir o quanto antes para evitar que o golpista movimente os valores depositados pelo autor ou apague seus rastros, dificultando sua identificação, localização e responsabilização.
A) DO SEQUESTRO
De início, faz-se forçoso o sequestro de eventuais quantias existentes nas contas bancárias abertas em nome do réu.
A conta onde depositado o valor da alienação é a seguinte:
Banco $[geral_informacao_generica]
Agência: $[geral_informacao_generica]
Conta/código: $[geral_informacao_generica]
Titular: $[geral_informacao_generica]
CPF: $[geral_informacao_generica]
Nada obstante, o sequestro – cautelar – de valores não deve ser limitar ao saldo de tal conta, haja vista os indícios verossímeis de que o réu participou ou se beneficiou da fraude e a possibilidade de que, a fim de ocultar os proventos do golpe, pode tê-los movimentado para outras aplicações bancárias.
Assim, de rigor sejam bloqueados os saldos das contas bancárias abertas em nome do réu.
A medida se justifica porque necessária para assegurar o resultado útil do processo. Com efeito, os valores bloqueados ficarão à disposição do juízo, aguardando cognição exauriente da responsabilidade civil.
Todavia, se não procedido o bloqueio, significativa é a chance de que, quando do julgamento do feito, não mais se localizem bens em nome do réu. Afinal, o intuito de cometimento da fraude é absolutamente incontroverso e dele decorre, ipso facto, o óbvio desígnio de ocultar os proventos do esquema.
E, claro, se a medida não for procedida inaudita altera pars, maiores serão as chances de que o réu remova os montantes do sistema financeiro, inviabilizando o êxito da constrição, que é absolutamente indispensável para assegurar o resultado útil do processo.
Com efeito, a possibilidade de sequestro encontra-se prevista no art. 301 do Código de Processo Civil e é a medida assecuratória adequada para impedir movimentação da quantia depositada na conta bancária utilizada pelo golpista.
Considerando a gravidade dos fatos narrados e a proporção dos danos causados ao autor, dúvida não há de que a medida é imprescindível e inadiável, já que possibilitará, se bem sucedida, recompor os prejuízos causados, auxiliando significativamente no deslinde da causa.
Por outro lado, considerando que a conta foi indicada pelo próprio estelionatário e lá, comprovadamente, foi depositado o provento da fraude, também nítido é que a constrição há de tê-la por objeto, a fim assegurar a recuperação dos valores espoliados da autora.
DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
Dispõem os artigos 2° e 3° do Código de Defesa do Consumidor que é consumidor a pessoa física que utilize produto ou serviço como destinatário final, e fornecedor, pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, que desenvolva, entre outras, atividade de comercialização de produtos e prestação de serviços.
E, de fato, in casu, dúvida não há de que devidamente caracterizados o consumidor e o fornecedor, bem como a relação consumerista, fundada na vulnerabilidade, que atrai o microssistema protetivo.
Primeiro, porque o requerente, na condição de pessoa física e de consumidor final, contratou serviço de financiamento, atividade própria de instituição financeira, exercida por pessoa jurídica que o presta de forma profissional e organizada..
Segundo, porque, a teor do art. 4°, I, do CDC, a vulnerabilidade é evidente.
Com efeito, a vulnerabilidade é conceito que, a um só tempo, caracteriza e justifica a relação de consumo, legitimando a aplicação do CDC.
No caso em apreço, nítido é que a relação mantida entre o autor, pessoa física, e o réu não é paritária.
Isso porque é o autor técnica, econômica e juridicamente vulnerável, e disso faz prova os contratos de adesão a que está sujeito, sua reduzida autonomia de vontade na consolidação dos termos contratuais e sua sujeição econômica ao fornecedor, que dispõe de poderio econômico para impor à relação os termos que lhe convêm, em detrimento do consumidor.
Assim, de rigor o reconhecimento da relação de consumo.
Além disso, em atenção à regra do art. 6°, VIII, do CDC, forçoso o reconhecimento da hipossuficiência do requerente e da verossimilhança de suas alegações para efeito de inversão do ônus da prova.
Afinal, não bastasse a vulnerabilidade que caracteriza a própria relação, certo é que a distribuição estática do ônus da prova acarretaria grave prejuízo à defesa dos direitos da requerente.
E, como cediço, não é outra a mens legis do art. 6, VIII, do CDC: garantir a defesa dos direitos do consumidor, reequilibrando a relação processual por meio da inversão do ônus da prova, se, no caso concreto, não tem condições de produzir as provas deles constitutivas.
Deste modo, requer-se o reconhecimento da relação de consumo e a aplicação da regra da inversão do ônus da prova, forte no art. 6°, VIII, do CDC.
III. RESPONSABILIDADE CIVIL DO CORRÉU $[parte_reu_nome]
DA NATUREZA JURÍDICA DA FRAUDE NO ÂMBITO CÍVEL E SUAS REPERCUSSÕES: VÍCIO DO NEGÓCIO JURÍDICO E ENRIQUECIMENTO ILÍCITO
No âmbito penal, fraudes como a presente são facilmente identificáveis com os delitos de estelionato e falsidade ideológica.
Transplantada a análise para a esfera cível, porém, a fraude impende ser deslinda à luz da teoria do negócio jurídico e da responsabilidade civil, que justificam os pleitos in fine vertidos.
Malgrado não seja entendimento pacífico, há suficientes elementos, sob o lume da teoria ponteana, para concluir que a fraude se trata de negócio jurídico existente, porém inválido e ineficaz.
Isso porque o plano da existência é meramente substantivo e, in casu, tem-se por presentes as partes, o objeto, a vontade e a forma.
No plano da validade, todavia, nota-se que há vício na parte (error in persona), no objeto (error in corpora) e na vontade, a caracterizar, a um só tempo, dolo e erro, vícios que induzem anulação do negócio.
O dolo é, nas palavras de Tartuce, a arma dos estelionatários. Pode ser definido como o ardil, simulacro de negócio jurídico, empregado para induzir ou manter alguém em erro, a fim de obter vantagem, normalmente o enriquecimento sem causa.
O Código Civil não conceitua o instituto, mas prescreve que são anuláveis os negócios jurídicos por dolo, quando for este sua causa (art. 145).
No caso em testilha, o dolo é assaz evidente, afinal, o réu, passando-se por representante do banco corréu, ofereceu a autor falsa oportunidade de quitação do financiamento, que pagou, acreditando saldar seu débito com o credor, locupletando-se o requerido do valor da operação, que acabou destinado, em verdade, ao seu patrimônio pessoal, embora não tivesse qualquer relação com o contrato que pensava o autor estar quitando.
O ardil, portanto, é a própria falsificação do negócio que, embora existente (porque provido de partes, objeto, vontade e forma), é inválido e ineficaz, porque o autor foi levado a crer que negociava com parte diversa da que contatava, externando vontade – viciada - de firmar negócio de cujo objeto a contraparte não dispunha.
Noutro giro, a contraparte assim agiu com o inequívoco desígnio de ludibriar o autor e enriquecer ilicitamente a suas expensas. Não há dúvidas, pois, de que o dolo é essencial, isto é, é causa do negócio; afinal, todos os elementos do negócio foram articulados no único intuito de induzir o autor a erro e leva-lo a pagar por obrigações que nunca seriam satisfeitas. É dizer, o propósito do negócio jurídico era, inequivocamente, enriquecer ilicitamente.
Há, nisso, também o vício de erro, sobretudo, quanto à pessoa, já que o golpista se apresentava como funcionário do réu Aymoré (error in persona) e quanto ao objeto, porque o autor acreditava que quitava obrigação ínsita ao contrato de financiamento (error in corpora e error in negotia).
Disso decorre, ipso facto, a anulabilidade do negócio.
Consequentemente, tem-se por caracterizado o enriquecimento sem causa, a necessidade de restabelecimento do status quo ante e a responsabilidade civil, a justificar a restituição dos valores pagos e a indenização dos danos morais e patrimoniais.
Quanto à anulação do negócio, dispõe o art. 182 do Código Civil que, tão logo procedida, “restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam”.
Com efeito, no caso a recomposição do status quo ante é a restituição dos valores pagos.
Quanto ao enriquecimento ilícito, dispõe o Código Civil o seguinte:
Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido.
Art. 885. A restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.
Assim, a restituição dos valores pagos é devida não somente pela lógica do restabelecimento do status quo ante, consequência da anulação do negócio jurídico, como também por força da caracterização do enriquecimento sem causa, que é, sem dúvidas, o próprio propósito do negócio jurídico.
DA AUTORIA DA FRAUDE PELO RÉU
Outrossim, pelo que se colhe dos elementos coligidos, não há dúvida de que o réu, ao menos, se beneficiou da fraude.
Afinal, o réu é apontado, nos comprovantes, como beneficiário final do pagamento e titular da conta aonde direcionados os valores do boleto.
Assim, o conjunto probatório disponível é conclusivo quanto à autoria da conduta e há de ser corroborado pelos elementos a serem produzidos por meio das liminares acima requeridas.
IV. SOBRE O CORRÉU $[geral_informacao_generica]
REGULAR QUITAÇÃO DO DÉBITO: EFEITO LIBERATÓRIO DO PAGAMENTO REALIZADO A CREDOR PUTATIVO
Como cediço, putativo é o credor aparente, suposto, isto é, que se apresenta ao devedor como se legítimo reivindicante ao crédito fosse.
O Código Civil, atento a esse não tão raro imbróglio pertinente ao pagamento de obrigações, ASSEGURA o efeito liberatório do pagamento, quando, de boa-fé, feito a credor putativo:
Art. 309. O pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, ainda provado depois que não era credor.
E inequívoca é a Lei no que se refere ao requisito da boa-fé. A doutrina, de outra ponta, acrescenta o requisito da verossimilhança.
No caso, porém, há que convir, de um lado, sobeja a boa-fé do autor, ao fazer o pagamento; afinal, jamais faria pagamento de quantia tão significativa para os seus padrões se não acreditasse na legitimidade do beneficiário.
Por outro lado, também não se pode negar a verossimilhança do credor putativo, a quem o autor chegou por, ao que tudo indica, falhas nos sistemas de comunicação do réu, que permitiu ao estelionatário contactar o autor, sabendo de seu débito e saldo devedor, oferecendo-lhe a quitação que este buscava junto ao banco.
Especificamente no que se refere a boletos falsos e credores putativos de contratos bancários, $[geral_informacao_generica], em obra publicada pela Escola da Magistratura deste Tribunal de Justiça , ressaltando as recorrentes falhas de seguranças dos bancos, preleciona:
“O sistema de informações evolui numa progressão geométrica e na mesma velocidade segue a indústria do crime, sendo, senão comum, frequente a emissão de boletos falsos enviados por correio ou por e-mail ao devedor que de boa-fé paga e depois constata que está inadimplente, porque pagou ao falso credor. Dificilmente isto é percebido pelo devedor e muitas vezes decorre de um defeito do serviço de bancos e instituições congêneres. Se a relação é de consumo, impõe-se ao credor provar que não houve defeito no seu serviço de cobrança e que o fato se deu por conduta exclusiva de terceiro, sem que tenha havido supressão de dados de suas operações diante das disposições do parágrafo terceiro, do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor.”
V. SUBSIDIARIAMENTE: DA RESPONSABILIDADE DO CORRÉU $[parte_reu_razao_social]
Dispõe o art. 6°, I, do Código de Defesa do Consumidor o seguinte:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
Como se vê, a segurança é elemento basilar na estrutura do mercado de consumo e, historicamente, motivou a construção epistêmica do direito consumerista.
Tanto o é que a ideia de segurança também elemento do direito à informação (art. 6°, III, CDC), preceito pelo qual se assegura ao consumidor a prestação de informação adequada e clara sobre o serviço, sobretudo sobre os riscos que apresentem.
A proteção do patrimônio do consumidor, por outro lado, é objeto do art. 6°, VI, do CDC, que assegura a efetiva prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais.
Muito embora seja de praxe associar tal dispositivo com a própria atividade jurisdicional, certo é que o grau de abstração do preceito permite estendê-lo aos fornecedores, a quem compete prevenir danos de tais naturezas.
E os serviços prestados pelo réu está indissociavelmente atrelados a riscos de fraude, em cuja consecução recorrentemente são utilizadas sua identidade.
Daí porque, se se dedicam a prestar os serviços, exigível lhes é que zelem pela segurança de suas plataformas e, quando possível e …