Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo],$[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], portador do $[parte_autor_rg] e inscrito no $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado na $[parte_autor_endereco_completo], vem, mui respeitosamente perante V. Exa. através dos procuradores in fine assinados, propor a presente
AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR
contra o MUNICÍPIO DE $[parte_reu_razao_social], pelas razões de fato e de direito que passa a expor:
Dos Fatos
O Autor é servidor público municipal (doc. 02), sempre tendo norteado suas atividades profissionais e particulares para a promoção da defesa dos interesses de crianças e adolescentes.
Ao candidatar-se para a função de Conselheiro Tutelar, foi eleito em 22 de junho de 2007 para o desempenho do mandato de 03 (três) anos, compreendido entre 05 de julho de 2007 e 04 de julho de 2007 (doc. 03).
Para tanto, deverá ser afastado das atividades públicas que exerce, posto a incompatibilidade de horários e conseqüente inviabilidade de execução simultânea de ambas as funções.
Tendo solicitado licença sem remuneração ao Município em 25 de junho de 2007 (doc. 04), recebeu somente hoje, 03 de julho de 2007 (doc. 05) resposta oficial do Município, que ponderou pela não concessão de qualquer licença ao Autor, o que, na verdade, demonstra-se completamente desarrazoado.
Argüiu sob o fundamento da necessidade de seus préstimos, fato que não prospera por se encontrar afastado há 02 (dois) meses em licença-prêmio, estando dispensado pelo Município de comparecer durante a corrente semana até que encontrem melhor lugar para locá-lo.
Onde está a necessidade? Não há! É somente birra política ou sabe-se lá quais outras razões, que de desprezível maneira impedem o Autor de exercer tão nobre encargo, que atende aos anseios da comunidade que para o seu desempenho o elegeu, superando tantos outros candidatos – certo que por demonstrar-se o mais apto técnica e moralmente.
Ante a toda a problemática, põe-se compelido a recorrer à via judicial para ter albergado seu direito, uma vez que já lhe foi informado que tal pedido será negado.
Ademais, há dúvida acerca de qual licença deverá ser concedida, já tendo o Autor por diversas oportunidades tentado encontrar uma solução junto ao Município, não obtendo resposta alguma aos pareceres exarados pela Procuradoria Municipal, que apenas tangenciou o tema sem conceder específica resposta (docs. 06), porém frisando sempre pela negativa, sem detalhar as razões.
Ademais, cisma em não manifestar acerca da inconstitucionalidade de legislação municipal, sem, no entanto, haver qualquer manifestação judicial em tal sentido, deixando-nos como única opção encarar como uma opinião pessoal, desprovida de maiores substratos técnico-jurídicos – o que, aliás, deveria ser demonstrado em demanda própria.
Encara-se, assim, sua exoneração como única forma de assumir a função para a qual foi eleito – o que se reputa da mais grosseira ilegalidade, vez que a legislação municipal vigente admite sua opção, à esteira de normas de outros municípios, como $[geral_informacao_generica] e $[geral_informacao_generica].
Sabido que qualquer servidor pode solicitar seu licenciamento para ocupar funções temporárias de elevado relevo público, como as de Secretariado ou de Vereança, não sendo admissível tão restrita interpretação que, a contraiu sensu, sonega do Autor direito que fundadamente lhe assiste.
Qual outra poderia ser o interesse do Município senão o de ter um servidor seu representando a comunidade no Conselho Tutelar, demonstrando possuir todos os requisitos morais para tanto, razão de orgulho em qualquer outro ente da Administração Pública.
Estando a posse marcada para o dia 04 de julho de 2007, às 17:00 horas, exigi-se a urgente intervenção judicial, para garantir ao Autor o direito que a seguir passa-se a demonstrar.
Do Direito
A questão aborda dupla análise jurídica, peculiar e de grande complexidade, quais sejam, (a) o direito do servidor público à licença, e (b) qual modalidade de licença tem direito.
Não se pode falar em discricionariedade, uma vez estar o servidor solicitando licença não para cuidar de assuntos particulares mas, sim, para prestar honroso serviço à sociedade, auxiliando no amparo à criança e ao adolescente, função para a qual teve a confiança depositada diretamente pela população.
Licença, aliás, que uma vez concedida em nada irá onerar o erário, pois se clama por sua não remuneração, optando-se, conforme Lei Municipal n°. 3.426/92, pela remuneração da função de Conselheiro Tutelar.
A seguir, melhor se explanará tais questões, sempre atentando para a celeridade com que se necessita da prestação jurisdicional, tendo-se em conta a proximidade da data de posse, marcada para 04 de julho de 2007, às 17:00 horas.
Do Direito à Licença
Inicialmente, cumpre conferir o notório interesse público existente ao desempenho das funções de Conselheiro Tutelar, constando ao art. 135 da Lei n°. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente o seguinte:
“Art. 135. O exercício efetivo da função de conselheiro constituirá serviço público relevante, estabelecerá presunção de idoneidade moral e assegurará prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento definitivo.”
Não há outro interesse superior ao bem estar da criança e do adolescente, preceito basilar insculpido aos arts. 226 e ss. da Constituição Federal de 1988, cujo notório teor já é de pleno conhecimento deste juízo.
Ademais, adentrando-se à natureza jurídica da licença, mister trazer-se à voga bem galgado entendimento de nosso Superior Tribunal de Justiça, que assim entendeu:
“ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA. LICENÇA PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE NO EXTERIOR. ARTIGO 84 DA LEI 8.112/90. PODER-DEVER DA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO, FACE A AUSÊNCIA DE REMUNERAÇÃO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS A LICENÇA DEVE SER CONCEDIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
I - ...
II - Ônus algum recai sobre o Erário, vez que o parágrafo 1º do dispositivo em discussão prevê a ausência de remuneração durante todo o período da licença. Assim, a interpretação dada ao art. 84 da Lei nº 8.112/90 não deve ser a mesma do art. 36 do Estatuto.
III - Ademais, o art. 84 do Estatuto dos Servidores está situado em seu Título III, qual seja "Dos Direitos e Vantagens". A norma contida em todos os demais dispositivos que se encontram nesse mesmo título diz respeito a direitos dos servidores, sobre os quais a Administração possui pouco ou nenhum poder discricionário. O legislador, pelo menos no capítulo em que tratou de concessão de licenças, quando quis empregar caráter discricionário, o fez expressamente, como no art. 91 do mesmo Diploma Legal.
IV - ...
V - Recurso especial conhecido e desprovido.
(REsp 422.437/MG, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 15.03.2005, DJ 04.04.2005 p. 335)
Demonstra-se lógico o entendimento exposto, constando claramente que é direito do servidor a concessão da licença que, uma vez fazendo jus, não se submete à discricionariedade do Poder Público.
O caso acima transcrito, originário do estado de Minas Gerais, examina idêntica situação fática que ocorre à Lei Municipal n°. 3.326/91 – Regime Jurídico Único dos Servidores do Município de Santa Maria-RS, que assim situa em sua organização o instituto das licenças:
“TÍTULO V - DOS DIREITOS E VANTAGENS 13
CAPÍTULO I - DO VENCIMENTO E DA REMUNERAÇÃO 13
CAPÍTULO II - DAS VANTAGENS 14
SEÇÃO I - DAS INDENIZAÇÕES 15
SEÇÃO II - DOS ADICIONAIS 16
SEÇÃO III - DAS GRATIFICAÇÕES 18
SEÇÃO IV - DOS AUXÍLIOS 19
CAPÍTULO III - DAS FÉRIAS 19
CAPÍTULO IV - DAS LICENÇAS 20
SEÇÃO I - DISPOSIÇÕES GERAIS 21
SEÇÃO II - DA LICENÇA PARA TRATAMENTO DE SAÚDE 21
SEÇÃO III - DA LICENÇA POR ACIDENTE EM SERVIÇO 21
SEÇÃO IV - DA LICENÇA À GESTANTE, ADOTANTE E PATERNIDADE 22
SEÇÃO V - DA LICENÇA POR MOTIVO DE DOENÇA EM PESSOA DA FAMÍLIA 22
SEÇÃO VI - DA LICENÇA PARA O SERVIDOR MILITAR 23
SEÇÃO VII - DA LICENÇA PARA CONCORRER A CARGO ELETIVO 23
SEÇÃO VIII - DA LICENÇA PARA O DESEMPENHO DE MANDATO CLASSISTA 23
SEÇÃO IX - DA LICENÇA PARA ATENDIMENTO A FILHO EXCEPCIONAL 23
SEÇÃO X - DA LICENÇA PARA PARTICIPAR DE CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO, ESPECIALIZAÇÃO OU CAPACITAÇÃO TÉCNICA E PROFISSIONAL 24
SEÇÃO XI - DA LICENÇA PARA SERVIDOR ESTUDANTE 25
SEÇÃO XII - DA LICENÇA PARA TRATAR DE INTERESSES PARTICULARES 26
SEÇÃO XIII - DA LICENÇA-PRÊMIO 26”
A organização acima demonstrada permite que tenhamos a plena noção pretendida pelo legislador, qual seja, de que as licenças são direitos do servidor, podendo este livremente usufruí-las, dependendo tão somente de seus próprios interesses para tanto.
À respeito, prudente relembrar a lição do mestre Celso Antônio Bandeira de Mello, que ao tratar dos “Direitos e Vantagens os servidores públicos estatutários”, assim ensina:
“Múltiplas são as razões previstas em lei como ensejadoras de pedido de licença. Presentes as condições de sua outorga, constituem-se em direito do servidor...”
Ao caso em tela, melhor ainda se aplica a noção acima estreitada, ante ao fato de o Autor encontrar-se há 02 (dois) meses afastado, tendo sido liberado durante esta semana até verificar-se o deslinde de sua eleição e de qual lugar poderia vir a ser locado.
Tal situação poderá cabalmente restar demonstrada por ocasião de futuro depoimento pessoal do Autor e da oitiva de demais testemunhas que oportunamente serão arroladas.
O que não se pode é fazer imperar um falso interesse público, não bem especificado por ser árdua a tarefa de justificar o inexistente.
Ao contrário, frustram-se os interesses da sociedade, que confiou ao Autor o exercício das funções de Conselheiro Tutelar, na expectativa de que, com sua postura, conhecimento e idoneidade moral, viesse a desempenhar de forma brilhante tão nobre encargo.
Da Licença a ser Concedida
A licença que ora se pleiteia possui sui generis composição, posto necessitar, para sua plena compreensão, abordagem da Lei n°. 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente, reproduzido em parte pela Lei Municipal n°. 3.426/92, e também da Lei Municipal n°. 3.326/91 – Regime Jurídico Único dos Servidores do Município de Santa Maria-RS.
Ab initio, traz-se à baila o art. 22 da Lei Municipal n°. 3.426/92, que assim reza:
“Art. 22 – Todos os membros do Conselho tutelar deverão trabalhar em regime de dedicação exclusiva.”
Demonstra-se ser impossível a cumulação de cargos, uma vez que o regime laboral a ser exercido como Conselheiro Tutelar exige cumprimento de dupla jornada de trabalho, impossibilitando o exercício de suas funções junto à Prefeitura Municipal.
Sendo assim, mister que opte por uma das atividades – que desde frisa ser a de Conselheiro Tutelar – optando, consoante art. 23 da referida lei, por uma das remunerações:
“Art. 23 – Os Conselheiros terão remuneração equivalente à de assessor técnico do Quadro da Prefeitura, sendo que os recursos contarão da Lei Orçamentária do Município.
§ 1º - A remuneração fixada não gera relação empregatícia .
§ 2º - No caso de o Conselheiro ser funcionário público poderá optar pelo salário que mais lhe convier.” (grifo nosso)
Tendo-se em vista todo o acima disposto, o Autor encaminhou solicitação de licença sem remuneração de seu atual cargo, para que possa desempenhar suas funções como Conselheiro Tutelar, sem que, para tanto, onere de qualquer maneira o Município.
Nesta seara, o assunto passa omisso pelo Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos do Município de $[geral_informacao_generica], que em seu art. 116 assim dispõe:
“Art. 116 – Serão concedidas aos servidores públicos municipais as seguintes licenças:
I – para tratamento de saúde;
II – por acidente em serviço;
III – à gestante, adotante e paternidade;
IV – por motivo de doença em pessoa da família;
V – para o serviço militar;
VI – para concorrer a cargo eletivo;
VII – para o desempenho de mandato classista;
VIII – para atendimento a filho excepcional;
IX – para participar de cursos de pós-graduação, especialização ou capacitação técnica e profissional;
X – para servidor estudante;
XI – para tratar de interesses particulares;
XII – prêmio.”
Indaga-se sob qual pálio deve enquadrar-se a licença pretendida, posto não ser de interesse particular, assemelhando-se ao previsto ao inc. VI – para concorrer a cargo eletivo, porém não sendo inteiramente aplicável ante à não existência de vínculo partidário, ou pelo inc. XI – para tratar de interesses particulares, pela relevância social da função.
Complexa questão, uma vez que a legislação específica determina a opção por remuneração – o que implica na manutenção do vínculo, porém com a devida licença, para posterior retorno, com o término do mandato.
Não há de se esperar que queira cambiar a estabilidade proporcionada pelo vínculo público pelo exercício de um mandato eletivo, que, após o termino previamente determinado, deixa seu ocupante à mercê de melhor sorte.
Há, sem dúvidas, grave lacuna jurídica, que não jamais antes fora examinada por nossas cortes – em especial em nosso Tribunal de Justiça, que já se posicionou …