Petição
AO JUÍZO DA$[processo_vara]VARA CÍVEL DA COMARCA $[processo_comarca]
$[parte_autor_razao_social]., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o n.$[parte_autor_cnpj], estabelecida na cidade de $[parte_autor_endereco_completo] e $[parte_autor_nome_completo],$[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], sócia-administradora da sociedade empresária acima nominada, residente $[parte_autor_endereco_completo], por seus advogados signatários (procuração anexa), e-mail: contato@talmasartori.com.br, vêm à presença de V. Exa., em litisconsórcio ativo facultativo propor
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL E COMPENSAÇÃO POR DESVIO PRODUTIVO
contra CIELO S.A., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 01.027.058/0001-91, estabelecida na Alameda Xingu, n. 512 – Andar 21 ao 31, Alphaville Industrial, Barueri – SP, CEP: 06.455-030, em conformidade com os fundamentos de fato e de direito abaixo expostos.
Publicações
Requer-se que todas as publicações relacionadas ao presente processo sejam efetivadas em nome do patrono da demandante, $[advogado_nome_completo], inscrito na $[advogado_oab], com escritório profissional nesta cidade, no endereço declinado no preâmbulo desta peça, sob pena de nulidade.
Fatos
Em $[geral_data_generica], a$[parte_autor_razao_social] realizou uma venda de produtos a $[geral_informacao_generica], no valor de $[geral_informacao_generica], que foi paga através do cartão de crédito de final $[geral_informacao_generica], pelo terminal $[geral_informacao_generica].
Embora os produtos tenham sido efetivamente entregues à compradora pela transportadora $[geral_informacao_generica], conforme declaração de recebimento lançada no $[geral_informacao_generica], referida venda foi contestada em $[geral_data_generica] pela compradora, gerando o chargeback n. $[geral_informacao_generica]
Em $[geral_data_generica], às $[geral_informacao_generica], a $[parte_autor_razao_social] enviou e-mail à $[parte_reu_nome_fantasia], solicitando o número do chargeback, de modo a analisar o ocorrido, se orientar sobre como proceder e determinar as providências que tomaria para solucionar a situação.
No mesmo dia, às 17h12m, foi enviado novo e-mail à $[parte_reu_razao_social], solicitando o número do chargeback, bem como instruções sobre como proceder.
No dia $[geral_data_generica], às $[geral_informacao_generica], a $[parte_autor_razao_social] recebeu um e-mail da $[parte_reu_razao_social], em que esta informa o número do chargeback e afirma que solicitou a documentação de defesa de acordo com a carta anexa, contudo, sem retorno da $[parte_autor_razao_social], e que por este motivo não haveria mais prazo para defesa, já que, esse prazo supostamente teria expirado em $[geral_data_generica].
Entretanto, conforme consta no sistema da$[parte_autor_razao_social], a contestação da venda ocorreu em $[geral_data_generica]. Assim, como poderia a $[parte_autor_razao_social] enviar a documentação de defesa exigida pela $[parte_reu_razao_social]até $[geral_data_generica], se a informação da contestação da venda se deu em $[geral_informacao_generica]!?
Nesse cenário, não há que se falar em expiração do prazo para defesa, conforme insistiu a $[parte_reu_razao_social]no e-mail enviado à $[parte_autor_razao_social] em $[geral_data_generica]
Pois bem.
Diante dessa situação, a $[parte_autor_razao_social] enviou à $[parte_reu_razao_social]uma notificação extrajudicial, questionando-a sobre o seu direito de defesa em razão da compra contestada pela cliente, a qual foi devidamente recebida pela $[parte_reu_razao_social]em $[geral_data_generica], de acordo com o A.R. de registro BR $[geral_informacao_generica], tendo concedido à então notificada o prazo de 15 (quinze) dias para que esclarecesse, por escrito, à $[parte_autor_razao_social]o seguinte:
- Por que o prazo para envio de documentação de defesa foi fixado em $[geral_data_generica], se a contestação da venda foi informada em $[geral_data_generica]?;
- Qual foi a data do recebimento da documentação enviada pela $[parte_autor_razao_social]?;
- Sendo constatada a inconsistência entre a data da contestação $[geral_data_generica] e a data para defesa, fixada pela $[parte_reu_razao_social] $[geral_data_generica]), o prazo para defesa será reaberto à $[parte_autor_razao_social]?
- Há possibilidade de resolução extrajudicial do imbróglio com retorno do crédito para a conta da $[parte_autor_razao_social]?
Tudo isso, conforme esclarecido na referida notificação extrajudicial serviu para que as partes evitassem eventual discussão judicial sobre a legitimidade do chargeback em questão. No entanto, a $[parte_reu_razao_social]jamais respondeu à notificação enviada pela $[parte_autor_razao_social], e por isso não restou outra via às autoras para buscarem o direito que entendem titularizar.
Findando este tópico, vale registrar que a presença da segunda autora - Srª $[geral_informacao_generica], sócia-administradora da $[parte_autor_razao_social] - no polo ativo da ação tem fundamento na Teoria do Desvio Produtivo, conforme será juridicamente fundamentado em tópico próprio, já que, para tentar obter esclarecimentos da $[parte_reu_razao_social]sobre a não concessão de direito de defesa em relação ao chargeback ocorrido, precisou desperdiçar seu tempo, desviando-se de outras atividades necessárias para se dedicar, de forma infrutífera, à resolução de uma demanda à qual não deu causa.
Fundamentos de Direito
A pretensão autoral possui fundamento jurídico no inciso LV do art. 5º da Constituição[1] e nos arts. 186[2] e 927[3] do Código Civil.
A atitude da requerida, ao não permitir à primeira autora se defender e, consequentemente, promover a apuração do motivo do cancelamento da compra pela Srª Leiliane, ofende o seu direito constitucional fundamental à ampla defesa e ao contraditório, que são pilares do Estado Democrático de Direito.
A primeira autora não desconhece que, nas relações envolvendo comerciantes e administradoras de cartão de crédito, a possibilidade de ocorrência de chargeback é real, e integra o risco do negócio. O que não significa dizer, entretanto, que, ocorrendo chargeback, deverá a administradora do cartão de titularidade do consumidor que contestou a compra promover a devida apuração do fato, demodo a se concluir se a contestação é legítima ou não, bem como esclarecer ao comerciante sobre o que motivou o cancelamento.
A respeito da cláusula de chargeback, Josiane Osório nos informa o motivo que leva essa prática a ser uma “dor de cabeça” que assola o e-commerce:
"O chargeback é um dos grandes fantasmas para os proprietários de lojas virtuais e responsável por um bom número de fechamentos dessas lojas. O problema é muito maior do que as pessoas imaginam e não ganha a devida publicidade porque não interessa às administradoras de cartões de crédito fazer qualquer tipo de divulgação sobre o volume de fraudes que ocorrem na utilização de seus cartões porque isso afugentaria clientes e exporia a fragilidade desses sistemas de cobrança.
(...)
A verdade é que nenhuma administradora de cartão de crédito garante transação alguma nas vendas efetuadas pela Internet, ficando a cargo do lojista todos os riscos inerentes à operação e também, é claro, o risco do chargeback. Esse posicionamento expõem o vendedor a todo tipo de golpes que vão desde a fraude com cartões de crédito roubados/clonados até a má-fé de alguns usuários que simplesmente alegam não reconhecer compras legítimas. É uma verdadeira Roleta Russa que pode levar a empresa à falência.
(...)
Quem lê e entende o contrato de credenciamento de uma administradora de cartão de crédito, em sã consciência, não assina. As cláusulas são leoninas e em muitos casos totalmente subjetivas. Resumindo as relações de responsabilidades descritas na maioria dos contratos, as administradoras têm todos os direitos e os lojistas arcam com todas as obrigações.
Além do famoso contrato, são criados aditivos e novas regras que beneficiam exclusivamente as administradoras, deixando em situação cada vez mais fragilizada o lojista. Não bastasse o prejuízo pelo não recebimento pelas vendas efetuadas, o lojista ainda pode ser surpreendido pela bizarra situação de passar da posição de lesado para a de devedor da administradora. Suponhamos a situação em que o lojista efetua várias vendas e muitas delas são recusadas pela administradora. Independentemente das outras transações serem legítimas ou não, elas respondem pelo valor das transações fraudadas e portanto, devem ser usadas para reposição de valores que tenham sido sacados pelo lojista antes da negativação da compra. É justamente nessa situação que muitas lojas virtuais encerram suas atividades. Como o fluxo de vendas é interrompido, mas não o fluxo de negativação de compras já efetuadas, o resultado é um saldo devedor na conta do lojista afiliado." ((h!p://www.cursodeecommerce.com.br/blog/chargeback/)
Também é importante destacar que a cláusula de chargeback jamais pode ser invocada quando o consumidor simplesmente se arrepende da compra realizada. Nesse sentido, a doutrina assim esclarece:
“De comum, o chargeback e o direito de arrependimento só possuem uma característica: a devolução, ao consumidor, de valores por ele despendidos. A semelhança para por aí.
(...)
Resumindo, pode-se dizer que o chargeback exige relevante motivo de direito para que seja legítimo, pois, do contrário, poderá resultar em abuso de direito por parte do consumidor ou da própria administradora de cartões de crédito. Em suma, é pressuposto para o chargeback a ocorrência de alguma ou ambas as situações acima descritas.
Por sua vez, o direito de arrependimento conferido ao consumidor pela regra do art. 49 do CDC é um direito potestativo, isto é, exercido livremente pelo consumidor, dentro de um prazo que, no caso, é o chamado prazo de reflexão. São sete dias conferidos ao consumidor, contados da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do produto ou serviço, e ao qual o fornecedor estará obrigatoriamente sujeito, independentemente da ocorrência de alguma causa.
Sendo assim, a razão de existência das normas, ou, em outras palavras, a ratio essendi das normas é diversa.
No chargeback, o cancelamento da venda, com o consequente estorno de valores, seja ao consumidor ou à administradora de cartões (a depender da causa que motiva o ato) ocorre mediante relevante razão de direito. Por parte do consumidor, pode ocorrer quando terceiro se apoderar do número e da senha de seu cartão (fraude, furto ou roubo do cartão etc.), e então passar a realizar compras em nome daquele. Como não foi o consumidor quem realizou a transação, poderá, legitimamente, contestá-la, devendo obter o ressarcimento do que lhe for eventualmente cobrado, inclusive valendo-se da regra do parágrafo único do art. 42 do CDC, que lhe confere o direito à repetição do indébito, “por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. (https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista56/revista56_235.pdf)
Em casos como o dos autos, o TJSP assim tem se manifestado:
APELAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CONTRATO DE GESTÃO DE PAGAMENTOS. Sentença de procedência. Inconformismo das requeridas. Requeridas que não comprovaram a correta invocação da cláusula chargeback. Não houve demonstração da justa causa para os estorno dos valores contestados pelo cliente, tais como fraude na utilização do cartão de crédito, furto ou roubo. Entrega das mercadorias comprovadas pela autora-apelada. Responsabilidade objetiva decorrente do risco da atividade. A requerida dispõe de mecanismos de segurança para garantir a eficácia das operações realizadas mediante o uso de cartão de crédito. Sentença mantida. Recursos desprovidos. (TJSP; Apelação Cível 1005770-67.2021.8.26.0568; Relator (a): Régis Rodrigues Bonvicino; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro de São João da Boa Vista - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/07/2022; Data de Registro: 22/07/2022) [destacou-se]
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRANSAÇÕES COMERCIAIS VIA CARTÃO DE CRÉDITO. COMPRAS CONTESTADAS. REPASSES NÃO REALIZADOS AO VENDEDOR. ALEGAÇÃO DE RESPONSABILIDADE DO VENDEDOR. Autorização de venda pela recorrente. Exclusão de responsabilidade que não se aplica, porque abusiva, uma vez que imputa responsabilidade exclusiva ao vendedor pelas ações decorrentes de seus compradores, no que tange à suspeita de fraude na utilização de cartão de crédito. Responsabilidade da requerida em razão do risco inerente ao próprio negócio. Ônus da prova, ademais, do qual não se desincumbiu a operadora (CPC, art. 373, II). Recurso não provido. (TJSP; Apelação Cível 1004224-66.2021.8.26.0506; Relator (a): Roberto Mac Cracken; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ribeirão Preto - 6ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/04/2022; Data de Registro: 20/04/2022) No mesmo sentido, veja-se: TJSP; Apelação Cível 1004224-66.2021.8.26.0506; Relator (a): Roberto Mac Cracken; Órgão Julgador: 22ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ribeirão Preto - 6ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/04/2022; Data de Registro: 20/04/2022.
Ressalte-se que o objeto social da requerida envolve transações realizadas em ambiente virtual, sendo certo que a formalização de negócios por meio de sítios eletrônicos favorece a ação de estelionatários e fraudadores, incluída, obviamente, a utilização de cartões de crédito.
Portanto, existe o dever jurídico da demandada de promover a segurança dessas operações, não somente para os usuários de cartão de crédito como também para o comerciante que a remunera, pagando-lhe uma quantia fixa mensal e também através do repasse de um percentual sobre cada venda realizada.
Nesse contexto, a requerida deve garantir a segurança das transações realizadas por meio do serviço que presta, especialmente por ser ela quem detém todas as informações e expertise necessárias à apuração de eventual fraude, ainda que se reconheça que tanto a autora como a demandada tenham sido vítimas de eventual fraude praticada por terceiro.
Pondere-se, ainda, que, exatamente pelo fato de a operação de venda online, através de sítios eletrônicos oferecer risco aos envolvidos, é que eventuais danos e prejuízos devem ser absorvidos pela demandada, pois, ainda que se caracterize como caso fortuito, envolve o chamado fortuito interno, isto é, relacionado à atividade que desempenha.
Por essa razão, eventual cláusula que tenha o objetivo de afastar a responsabilidade da requerida, tal como ocorre, deve ser considerada nula, pois o abuso de direito e a nulidade de cláusulas contratuais são institutos aplicáveis a todo ramo do Direito, e não somente nas relações de consumo, em que a vulnerabilidade do consumidor é presumida e as cláusulas contratuais abusivas são nulas de pleno direito, o que, todavia, não resulta na validade e ausência de abusividade de cláusula contratual em um contrato civil
Nesse sentido são os seguintes julgados do TJSP:
Responsabilidade Civil - Ação de cobrança - Contrato de prestação de serviços para recebimento de valores mediante cartão de crédito/débito – Retenção de quantias. A retenção de pagamentos pela administradora de cartões de crédito/débito, em razão de fraude nas respectivas transações, não pode ser admitida sob pena de transferência do risco da atividade do administrador dos equipamentos ao lojista, que recebeu autorização para conclusão da venda e tomou todas as cautelas recomendadas na operação. Ação procedente. Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1011524-37.2018.8.26.0554; Relator: Itamar Gaino; Órgão Julgador: 21ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santo André - 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/05/2019; Data de Registro: 30/05/2019).
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - Gestão de pagamentos (Redecard) - Venda de mercadorias por meio de cartão de crédito - Operações contestadas, sendo o valor estornado - Repasses não realizados ao vendedor, que autorizara a compra fiado nas informações transmitidas pela gestora - Exclusão de responsabilidade que não se aplica, porque abusiva, uma vez que imputa responsabilidade exclusiva ao vendedor pelas ações decorrentes de seus compradores, no que tange à suspeita de fraude na utilização de cartão de crédito - Responsabilidade da Redecard, por risco inerente ao próprio negócio - Ônus da prova, ademais, do qual não se desincumbiu a operadora - Precedente desta Corte – Sentença reformada - Recurso provido para se acolher o pedido inicial, invertendo-se os ônus sucumbenciais e se majorar a honorária para 15% sobre o valor da condenação (art. 85, §§ 2º e 11, do CPC).” (TJSP; Apelação Cível 1005456-57.2018.8.26.0009; Relator (a): Mendes Pereira; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Barueri - 5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 21/03/2019; Data de Registro: 21/03/2019).
Da incidência do Código de Defesa do Consumidor – Aplicação da Teoria Finalista Mitigada
Em casos como o dos autos, deve ainda ser aplicada a Teoria Finalista Mitigada, para se …