Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DA $[PROCESSO_VARA] VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
$[parte_autor_nome_completo],$[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], portador do $[parte_autor_rg] e inscrito no $[parte_autor_cpf], residente e domiciliado na $[parte_autor_endereco_completo], vem, mui respeitosamente perante V. Exa. através dos procuradores in fine assinados, ingressar, com fulcro nos artigos 19, I; 300 e seguintes, bem como no Artigo 319, todos do Código de Processo Civil, como também em observância ao Artigo 2° da Lei 12.153/2009,
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE TRIBUTO COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA FUNDAMENTADA EM EVIDÊNCIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO
em face da $[parte_reu_razao_social], inscrita no CNPJ sob o nº $[parte_reu_cnpj], com sede na $[parte_reu_endereco_completo], pelos fatos e fundamentos a seguir expostos.
PRELIMINARMENTE
DA CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA
O Requerente declara sob as penas da lei que não dispõe de condições financeiras de arcar com custas e despesas processuais sem prejuízo do seu sustento e o de sua própria família, motivo pela qual requer os benefícios da justiça gratuita nos termos do artigo 4º da Lei nº 1.060/50, bem como artigo 99 do Código de Processo Civil.
Insta ressaltar que entender de outra forma seria impedir o acesso à Justiça, garantia maior dos cidadãos no Estado Democrático de Direito.
DA COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DO DOMICÍLIO DA REQUERENTE
De forma preventiva e de maneira a facilitar o conhecimento por este Juízo e pela celeridade processual, faz necessário expor algumas considerações a respeito da competência para julgar a presente demanda, visando afastar eventuais alegações no sentido da incompetência deste Juízo na peça contestatória. Assim sendo, a Requerente fixa, desde já, as teses de que o presente Juízo é competente para julgar esta ação.
A presente ação é proposta no Juízo do domicílio da Requerente, inexistindo no ordenamento jurídico qualquer previsão de foro privilegiado para causas em que for demandado um Estado-membro. O novo Código de Processo Civil, nesse ponto, cuidou de exterminar qualquer possibilidade de questionamento da possibilidade de processamento da ação no foro do domicílio do autor ou até mesmo do local do fato, conforme nota-se de simples leitura do parágrafo único do artigo 52:
Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal.
Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado.
Nesse sentido, a insurgência contra a cobrança indevida de ICMS sobre os custos adjacentes ao consumo de energia elétrica deve, necessariamente, ser processada na comarca onde reside o responsável pela unidade consumidora, sob pena de indevidamente dificultar o acesso ao Poder Judiciário.
O tema em questão já era pacífico antes mesmo da vigência do novo Código de Processo Civil, conforme pode ser extraído do contido tanto do REsp 67.186-8/SP (Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, julgado em 19 de junho de 1995) quanto do REsp 80.842/MG (Relator Ministro José de Jesus Filho, julgado em 22 de fevereiro de 1996), ambos em anexo. Mais recentemente, a Ministra Denise Arruda esclareceu, no Conflito de Competência 55270/PA que:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. Ação de Indenização De Danos Morais e Materiais. Denunciação da Lide ao Estado do Pará. Regra Definidora de Competência do Art. 100, V, A, do CPC, que prevalece sobre as demais, genéricas. Ausência de foro privilegiado para Estado-Membro. Súmula 206/STJ. Competência do Juízo do local do Ato ou Fato que originou o dano. [...] (STJ - CC: 55270 PA 2005/0154591-8, Relator: Ministra DENISE ARRUDA, Data de Julgamento: 28/03/2007, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJ 30.04.2007 p. 261)
Além disso, o artigo 2° da Lei nº 12.153/2009 disciplina que “é de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública processar, conciliar e julgar causas cíveis de interesse dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, até o valor de 60 (sessenta) salários mínimos”. O tema sob discussão neste momento não atrai qualquer das exceções previstas no § 1° do mesmo dispositivo, restando então suficientemente delimitada a competência da Vara da Fazenda Pública desta comarca para conhecer, processar e julgar esta demanda.
§ 1º Não se incluem na competência do Juizado Especial da Fazenda Pública:
I – As ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;
II – As causas sobre bens imóveis dos Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios, autarquias e fundações públicas a eles vinculadas;
III – As causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão imposta a servidores públicos civis ou sanções disciplinares aplicadas a militares.
Conforme exposto, não se enquadrando no rol do §1º citado juntamente com o valor da causa abaixo de 60 salários mínimos, a competência do Juizado Especial da Fazenda Pública é absoluta, conforme entendimento do Tribunal de Justiça de Rondônia.
AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. NÃO SEGUIMENTO A AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. 1. Não havendo prova inconteste a demonstrar a verossimilhança das alegações, não se pode afirmar incorreta decisão que nega seguimento a agravo de instrumento em razão da sua marcada improcedência. 2. A competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é absoluta, cabendo-lhe o julgamento de causa com valor inferior a sessenta salários mínimos e cuja matéria discutida não esteja entre aquelas excluídas de sua apreciação, sendo defeso ao Juízo da Vara da Fazenda Pública conhecer da ação sob pena de nulidade. 3. Não há complexidade em causa que trata de matéria unicamente de direito e que não demanda extensa dilação probatória, mormente quando a pretensão é deduzível até mesmo em mandado de segurança. 4. Agravo não provido. (TJ-RO - AGV: 00103299720148220000 RO 0010329-97.2014.822.0000, Relator: Desembargador Gilberto Barbosa, Data de Julgamento: 20/11/2014, 1ª Câmara Especial, Data de Publicação: Processo publicado no Diário Oficial em 01/12/2014.)
Ainda a respeito da competência do Juizado Especial da Fazenda Pública para realizar julgamentos sobre a questão do ICMS tem-se os seguintes julgados, que realizaram análises com relação a complexidade de casos semelhantes que envolveram a devolução do ICMS, e concluíram pelo reconhecimento da competência do JEFP diante da inexistência da complexidade.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO ORDINÁRIA C/C REPETIÇÃO DO INDÉDITO E DANOS MORAIS. PRETENSÃO DE DEVOLUÇÃO DA COBRANÇA INDEVIDA DE ICMS NA CONTAS DE ENERGIA ELÉTRICA. FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. Tratando-se de ação ajuizada após a instalação do Juizado Especial da Fazenda Pública, processo de competência absoluta por força do artigo 2º, § 4º, da Lei nº 12.153/2009, compete ao Juizado Especial da Fazenda Pública o processo e julgamento da causa. Não há vedação na Lei nº 12.153/2009 quando a hipótese for de litisconsórcio passivo necessário com concessionária de energia elétrica, ainda que seja suscitada a aplicação subsidiária do art. 8º, "caput", da Lei nº 9.099/95, tendo em vista o Enunciado nº 21 do FONAJEF "As pessoas físicas, jurídicas, de direito privado ou de direito público estadual ou municipal podem figurar no pólo passivo, no caso de litisconsórcio necessário", orientação mais compatível com o princípio da economia processual. O Estado do Rio Grande do Sul é quem detém legitimidade passiva para a ação objetivando afastar a incidência de ICMS sobre energia elétrica, com pedido de repetição de indébito do tributo, e não a concessionária, que apenas efetua a cobrança do tributo. Precedentes do TJRGS e STJ. Conflito de competência acolhido liminarmente, declarando-se a competência da Juíza de Direito suscitada. (Conflito de Competência Nº 70064995525, Vigésima Segunda Câmara Cível,... Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Julgado em 27/05/2015). (TJ-RS - CC: 70064995525 RS, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Data de Julgamento: 27/05/2015, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 29/05/2015)
AGRAVO INTERNO - DECISÃO MONOCRÁTICA - JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA - COMPETÊNCIA. 1. A competência do Juizado Especial da Fazenda Pública (JEFP) é absoluta, embora ainda passível de limitação pelos Tribunais estaduais até jun./2015 (Lei federal nº 12.153/2009). 2. Nos termos da Resolução nº 641/2010, alterada pela Resolução nº 700/2012, ambas do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), é de competência dos JEFP as ações sobre ICMS, cujo conteúdo econômico seja inferior a 40 (quarenta salários mínimos). 3. A necessidade de prova técnica não é incompatível com o rito do JEFP, em vista da previsão legal de realização de exame técnico, com formalidades simplificadas. 4. Podem figurar no polo ativo das ações de competência do JEFP as microempresas e empresas de pequeno porte definidas na Lei complementar nº 123/2006. (TJ-MG - AGT: 10024080781172002 MG, Relator: Oliveira Firmo, Data de Julgamento: 10/06/2014, Câmaras Cíveis / 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 16/06/2014)
PROCESSO CIVIL.AGRAVO DE INSTRUMENTO. FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. LEI 12.153/2009. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO ANTECIPATÓRIA DE TUTELA QUE DETERMINOU AO RÉU QUE SE ABSTENHA DE EXIGIR CRÉDITO TRIBUTÁRIO DECORRENTE DE ICMS INCIDENTE SOBRE DIFERENÇA DE ALÍQUOTA. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA MATERIAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS PARA APRECIAR RELAÇÃO TRIBUTÁRIA ENTRE CONTRIBUINTE E FISCO. COMPETÊNCIA FIRMADA, TENDO EM VISTA QUE AS MATÉRIAS ELENCADAS NO § 1º DO ART. 2º DA LEI 12.153/09 TEM ROL TAXATIVO. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. TUTELA ANTECIPADA DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. ASTREINTES. POSSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1) Com a interpretação dos dispositivos contidos na Lei Federal nº 12.153/2009, bem como na Lei 9.099/1999, extrai-se que o critério de fixação de competência dos Juizados Especiais de Fazenda Pública é dúplice, devendo ser analisado o valor e a complexidade da causa. 2) Demandas de grande complexidade e que exigem maior dilação probatória não atraem a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para seu processamento e julgamento. Observa-se que não é o caso em comento, tendo em vista que o valor da causa não supera o teto de 60 (sessenta) salários mínimos, tampouco se trata de matéria complexa. Ademais, aplicando-se o princípio da especialidade, as matérias excluídas da apreciação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, elencadas no § 1º do art. 2º da Lei 12.153/09 tem rol taxativo, do qual não faz parte a matéria discutida nos autos. 3) A pena acessória de multa, para o caso de descumprimento de obrigação de fazer, tem natureza cominatória, de sorte que o seu objetivo principal é compelir o devedor a cumprir a obrigação. Portanto, uma vez imposta uma obrigação de fazer, o magistrado se encontra autorizado a fixar multa para o caso de descumprimento do preceito judicial, de acordo com o disposto no § 4º do art. 461 do CPC, inclusive majorando-a se necessário. 4) Recurso conhecido e não provido. (TJ-AP 00000025520128039001 AP, Relator: JOSÉ LUCIANO DE ASSIS, Data de Julgamento: 11/04/2012, TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS)
A fim de esclarecer a questão da complexidade da presente causa pode ser resumida nos seguintes itens:
1) A base de cálculo do ICMS está sendo sobre a soma dos valores sobre o qual se aplica a alíquota do imposto englobando a Tarifa de Uso dos Sistemas de Transmissão - TUST (taxa de transmissão) e a Tarifa de Uso dos Sistemas de Distribuição – TUSD (taxa de distribuição).
2) A TUST e a TUSD não constituem venda de energia, logo, não são fato gerador do ICMS.
3) O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decidido e sumulado (Súmulas do STJ nº 166 e nº 391), de forma reiterada, pela não inclusão dos valores referentes à TUST e à TUSD na base de cálculo do ICMS.
4) Conforme os precedentes, o ICMS somente incide nas operações que envolvem a comercialização (consumo) de energia elétrica para o consumidor final. Não é o caso da TUST e TUSD.
5) Busca-se a aplicação destes precedentes a parte Autora pleiteando a restituição do ICMS pago indevidamente sobre TUST e TUSD, bem como abstenção da parte Ré em continuar cobrando o ICMS sobre a TUST e TUSD.
Diante do exposto, o presente juízo é competente para a analisar e julgar esta demanda.
DA LEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA
De forma preventiva e de maneira a facilitar o conhecimento por este Juízo, é relevante tecer algumas considerações sobre matérias que provavelmente serão alegadas pela requerida em sua peça contestatória sobre a possibilidade de ilegitimidade ativa ou passiva. Assim sendo, a Requerente fixa, desde já, as teses segundo as quais deverão ser afastadas eventuais alegações de ilegitimidade ativa ou passiva, conforme demonstrado a seguir.
Em casos análogos ao presente, tem sido costumeiro por parte dos Estados-membros alegarem a ilegitimidade ativa ad causam dos demandantes, aduzindo em linhas gerais que estes, como contribuintes de fato, não teriam legitimidade ativa para pleitear a restituição de ICMS pago indevidamente, sendo que apenas os contribuintes de direito é que possuiriam legitimidade para fazê-lo. Defendem que a relação jurídica tributária adjacente ao ICMS incidente sobre a energia elétrica é integrada pelas concessionárias dos respectivos serviços, de forma que estas deteriam exclusivamente a legitimidade ativa para discutir tais questões.
No entanto, a matéria objeto de comento já foi alvo de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça que firmou a orientação, sob o rito dos recursos repetitivos (REsp 1.299.303-SC, DJe 14/8/2012) que o consumidor final de energia elétrica tem legitimidade ativa para propor ação declaratória cumulada com repetição de indébito que tenha por escopo afastar a incidência de ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada de energia elétrica. Referido precedente se encontra em anexo.
Outro não poderia ser o entendimento emanado pelo STJ já que, considerando a parceria (e a subserviência) das concessionárias de energia elétrica com o Estado concedente e a completa inexistência de conflito de interesses entre ambos, a declaração de ilegitimidade do consumidor final teria o condão prático de impedir qualquer discussão de ilegalidade de cobrança de ICMS.
Há de se levar em conta, finalmente, que o artigo 166 do Código Tributário Nacional garante àquele que paga indevidamente o direito de pleitear por sua restituição.
Assim sendo, resta suficientemente delimitada a legitimidade ativa da parte demandante desta lide, sendo permitido eventual litisconsórcio para que figurem vários contribuintes no polo ativo por força do artigo 46, incisos II e IV do Código de Processo Civil.
É possível, adicionalmente, que o Estado demandando aduza em sua contestação a tese de ilegitimidade passiva, defendendo a legitimidade exclusiva da concessionária de energia elétrica para atuar no feito.
Inobstante, como é cediço, as concessionárias somente arrecadam e transferem os valores referentes ao tributo para o Estado concedente. Por isso, a legitimidade passiva é exclusiva do Estado federado. Precedentes nesse mesmo sentido: REsp 1.199.427/MT, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 16/09/2010; REsp 1185820/MT, Relator Ministro Castro Meira, julgado em 17/06/2010.
Logo, resta suficientemente delimitada a legitimidade passiva da parte demandada desta lide.
DA DISPENSA DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO E A INEXISTÊNCIA DA POSSIBILIDADE DE PRÁTICA DE AUTOCOMPOSIÇÃO
Com vistas a obter maior celeridade processual, garantindo o efetivo contraditório e evitando diligências inúteis e/ou que não tragam qualquer resultado útil ao processo, a Requerente pleiteia a este Juízo que dispense a audiência de conciliação normalmente designada em sede de Juizados Especiais.
O pedido acima formulado é realizado, conforme sobredito, diante da primazia pelo provimento jurisdicional satisfativo, de forma a suprimir uma fase processual que notadamente será inócua diante até mesmo de eventual incompetência dos procuradores da Fazenda Estadual demandada para reconhecerem a procedência do pedido – originando a completa impossibilidade de transação nos autos.
Destarte, requer seja o Requerido citado para oferecimento de contestação no prazo legal.
DOS FATOS
O Requerente é consumidor de energia elétrica, sendo responsável pela Unidade Consumidora n°. $[geral_informacao_generica] (Código do Cliente), conforme comprova as contas em seu nome em anexo (docs.).
É importante frisar que os valores apontados pela concessionária de energia, $[geral_informacao_generica], sempre foram integralmente pagos pela Requerente com base na boa-fé.
Nesta seara, busca a Requerente a tutela jurisdicional, na qualidade de contribuinte de fato, em face da exação tributária indevida, pugnando pelo reconhecimento da inexistência de relação jurídica obrigacional tributária, uma vez que a referida exação consiste em cobrança de ICMS sobre base de cálculo superior àquela legal e constitucionalmente prevista.
Enfatiza-se que a Requerente vem suportando a supramencionada tributação indevida no intervalo de tempo compreendido desde a data de Janeiro/2013 que se protrai no tempo até os dias atuais, uma vez que o consumo de energia elétrica é caracterizado como uma necessidade básica e de trato sucessivo, inferindo que as exações ocorreram e continuam a ocorrer.
A tributação referente ao ICMS vem vilipendiando os parâmetros legais e constitucionais ao integrar a sua base de cálculo valores indevidos, o que acarreta um encargo excessivamente oneroso ao contribuinte, que nem sequer integra a relação jurídica obrigacional tributária no que se refere aos valores inseridos no cálculo da base utilizada para exação do aludido tributo.
O cálculo do ICMS é referente a operações relativas à circulação de mercadorias e serviços, sendo que a energia elétrica sempre foi considerada mercadoria consumida pelo uso individual dos consumidores.
Portanto, o tributo não está sendo cobrado sobre o valor da mercadoria (energia elétrica), mas sim está incluindo as tarifas de uso do sistema de transmissão e distribuição de energia elétrica proveniente da rede básica de transmissão (as chamadas TUST/TUSD/EUSD), conforme faturas em anexo (docs.).
Entretanto, os valores cobrados a título de transmissão de energia elétrica por não serem atinentes ao conceito de mercadoria devem ser excluídos da cobrança do ICMS, fazendo com que o imposto seja calculado apenas sobre os valores referentes ao consumo efetivo da mercadoria juridicamente circulada e consumida.
À margem do princípio constitucional da legalidade tributária, tem a Requerente o direito de não mais ser compelida ao recolhimento do ICMS sobre os valores de transmissão e distribuição de energia elétrica, sob pena de configurar-se uma injustiça fiscal.
Com esteio, inclusive em assentado entendimento jurisprudencial, conforme será demonstrado a seguir, o fato gerador do mencionado imposto é a saída e circulação jurídica do bem consumido, qual seja, a energia elétrica, não sendo possível que as tarifas sobre uso do sistema e da rede básica sejam impostas ao contribuinte de fato.
Diante do exposto, a Requerente vem buscar a tutela jurisdicional com fundamento no seu direito fundamental ao acesso à justiça, com vistas a assegurar o seu direito como contribuinte de fato a uma exação dentro dos parâmetros constitucionais e legais, pleiteando que o Poder Judiciário tutele a situação aqui exposta.
A Requerente vem perquirir que o Poder Judiciário a desobrigue do recolhimento do ICMS sobre quaisquer encargos de transmissão e distribuição energia elétrica, restringindo-se à respectiva base de cálculo, concedendo-se a consequente repetição do indébito dos valores pagos indevidamente a título de ICMS incididos na fatura nos anos que constam dos documentos anexos (docs.).
DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS
DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUST/TUSD/EUSD)
Para melhor compreensão do que se busca através dessa ação, convém, antes, esclarecer alguns pontos relacionados ao sistema elétrico brasileiro.
A operação e administração da rede básica de energia elétrica, cujo acesso é livre a todos, é atribuição do Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS, que é a pessoa jurídica de direito privado autorizado pela União Federal a exercer tal função.
A rede básica de energia elétrica, segundo definição da ANEEL, é constituída por todas as subestações e linhas de transmissão em tensões de 230 kV ou superior, integrantes de concessões de serviços públicos de energia elétrica, devidamente outorgadas pelo Poder Concedente. É, em outras palavras, o sistema composto por torres, cabos, isoladores, subestações de transmissão e outros equipamentos que operam em tensões médias, altas e ultra altas.
Sendo assim básico de transmissão administrado pelo ONS, a sua utilização, por concessionários, permissionários e autorizados depende da contratação de acesso ao sistema, conforme se depreende dos artigos 1º e 2ª da Resolução ANEEL nº. 281/1999:
“Art. 1º. Estabelece, na forma que se segue, as condições gerais para contratação do acesso, compreendo o uso e a conexão, aos sistemas de transmissão de energia elétrica.
Art. 2º. As disposições desta aplicam-se à contratação do acesso aos sistemas de transmissão pelos concessionários, permissionários e autorizados de serviços de energia elétrica, bem como pelos consumidores de que tratam os arts. 15 e 16 da Lei nº. 9.074, de 7 de julho de 1995, e aqueles definidos no ª 5º do art. 26 da Lei nº. 9.427, de 26 de dezembro de 1996, com redação dada pela Lei nº. 9.648, de 27 de maio de 1998. ”
Em razão da contratação de acesso à rede básica, o usuário remunera a ONS mediante recolhimento da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST), na forma da Resolução ANEEL nº. 281/1999.
Essa tarifa é, em qualquer caso, suportada por aqueles que utilizam a rede de transmissão, seja a geradora da energia elétrica, o consumidor livre diretamente conectado à rede básica, ou mesmo os consumidores cativos que pagam as tarifas em suas contas.
O sistema de distribuição, por sua vez, é aquele composto por postes, cruzetas, isoladores, fios, transformadores e demais equipamentos (não pertencentes à rede básica) que operam em tensões baixas, de propriedade das distribuidoras, e cujo acesso também é livre a todos.
A sua utilização, no caso da contratação no mercado livre, se dá mediante celebração de contrato de uso dos sistemas de distribuição (CUSD) ou, no mercado cativo, mediante contratação do fornecimento de energia elétrica, em ambos os casos se remunerando o uso da rede mediante recolhimento Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD).
No mercado cativo o valor da tarifa/preço da energia é definido após minuciosa análise da agência reguladora responsável, no caso a ANEEL. Nesse processo, vários custos estão incluídos no cálculo, tais como investimentos, encargos, gastos para manutenção da rede, tributos etc. Para esses consumidores, a TUSD/TUST é repassada na conta paga à Concessionária responsável pelo fornecimento de energia.
Por seu turno, no mercado livre, os consumidores podem negociar a aquisição de energia elétrica livremente com quaisquer fornecedores que atuem no mercado, negociando preços e prazos, de acordo com o perfil de consumo. As negociações neste caso são firmadas através de contratos bilaterais, nos quais a intervenção do governo é mínima.
Para os Consumidores Livres, ou seja, aqueles que adquirem carga igual ou superior a 3.000kW, na forma disposta pela Lei 9.074/1995, a remuneração da TUSD/TUST/EUSD pode ocorrer tanto pela cobrança na fatura do fornecimento do energético, quanto mediante a celebração de contrato próprio com a distribuidora responsável pela rede básica.
Delimitado os conceitos, o que se repudia através dessa ação é exigência do ICMS não apenas sobre o valor da mercadoria efetivamente fornecida, mas, também, sobre (I) a TUST repassada a Requerente – muito embora sem a devida descriminação nas faturas – e (II) TUSD, paga em razão da utilização do sistema de distribuição.
Assim é que, na forma do que se passará a demonstrar, deve ser reconhecida a inexistência de obrigação jurídico tributária que obrigue a Requerente ao recolhimento do ICMS sobre as parcelas referentes a quaisquer encargos de transmissão e distribuição.
DA INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA OBRIGACIONAL TRIBUTÁRIA – DA NÃO INCIDÊNCIA
Como relatado anteriormente, as cobranças ora discutidas se referem à suposta responsabilidade da Requerente pelo recolhimento do ICMS sobre as tarifas pagas em razão da conexão e do uso do sistema de transmissão na entrada de energia elétrica.
Segundo suas características próprias, para fins jurídico-tributários, a energia elétrica sempre foi considerada como mercadoria, sujeita, portanto, à incidência do ICMS. Na dicção da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a energia deve ser assim considerada porque:
“é objeto de comércio; é mercadoria, bem apropriável pelo homem, bem no mercado, inclusive para fins tributários [art. 155, § 2o,” b”, da CB/88 e art. 34, § 9o, do ADCT].”
Por sua vez, ao definir as hipóteses de incidência do ICMS, a Lei Complementar nº 87/96 cuidou e abranger, conforme o previsto no art. 155, inciso II da Constituição Federal, tão somente as operações relativas à circulação de mercadorias. Esta é a expressa determinação do artigo 2º da referida Lei Complementar, conforme abaixo:
“Art. 2º – O imposto incide sobre:
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares; (…) ”
Porém, em decorrência das suas especificidades e características, a energia elétrica encontra-se em permanente circulação nos fios de transmissão da concessionária, sendo que ela somente será individualizada, ou seja, só terá caracterizado e definido seu usuário no momento em que for utilizada, pois, até então, consiste numa massa única de energia passível de utilização por qualquer um que dela necessite.
Consequentemente, o fato gerador do imposto só pode ocorrer, in casu, pela entrega da energia ao consumidor, não sendo outra a disposição constante do art. 12, inciso I da Lei Complementar nº 87/96:
“Art. 12 – Ocorre o fato gerador do imposto no momento:
I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular. ”
Assim, da leitura do dispositivo acima transcrito, nota-se que o fato gerador do imposto estadual ocorre no momento da efetiva entrega da energia elétrica ao consumidor, que se perfaz com a “entrada” da energia no seu estabelecimento ou em sua residência.
A própria Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL comunga deste entendimento, esboçado em sua Resolução nº 414/2010, esclarecendo, para fins de responsabilidade, o momento em que ocorre a transferência da mercadoria (energia elétrica) para o consumidor, senão confira-se:
“Art. 14. O ponto de entrega é a conexão do sistema elétrico da distribuidora com a unidade consumidora e situa-se no limite da via pública com a propriedade onde esteja localizada a unidade consumidora, exceto quando:
Art. 15. A distribuidora deve adotar todas as providências com vistas a viabilizar o fornecimento, operar e manter o seu sistema elétrico até o ponto de entrega, caracterizado como o limite de sua responsabilidade, observadas as condições estabelecidas na legislação e regulamentos aplicáveis. ”
O ponto de entrega de energia elétrica é o relógio medidor, razão pela qual a energia só será individualizada ao consumidor, caracterizando sua circulação e dando ensejo à cobrança do imposto – pois só a partir daí é determinado o sujeito passivo da obrigação tributária –, no momento em que passar por este relógio, e ingressar no estabelecimento da empresa, vindo a ser efetivamente consumida.
Com efeito, exigir o ICMS sobre as tarifas que remuneram a transmissão e a distribuição da energia elétrica é fazer incidir o tributo sobre fato gerador não previsto pela legislação regente (notadamente Constituição Federal e Lei Complementar nº 87/96), o que viola frontalmente o princípio constitucional da reserva legal previsto no art. 150, inciso, I da Constituição Federal, segundo o qual é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça.
Exatamente por isso o próprio Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ - enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 352/02, que, através da sugestão de inclusão da letra ‘c’ no § 1º do artigo 13 da Lei Complementar nº 87/96, pretendeu incluir na base de cálculo do ICMS “todos os encargos cobrados do adquirente no fornecimento da energia elétrica”.
Ao tentar reparar a nítida impossibilidade de incidência da exação estadual sobre operações claramente diversas daquelas que se identificam com o respectivo fato gerador, até mesmo porque todas as hipóteses que contemplaram a inclusão de encargos semelhantes tiveram previsões específicas autorizando (incisos I e II do mesmo § 1º), restou evidente que, até o presente momento, não existe a autorização para tal incidência, resultando no reconhecimento indubitável sobre a improcedência da cobrança discutida.
Esta inexistência de relação jurídico-obrigacional tributária, como não poderia distinto ser, já foi sabiamente observada por nossos Tribunais, conforme pacífico entendimento esposado por ambas as turmas do Egrégio STJ, in verbis:
“TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. LEGITIMIDADEATIVA DO CONTRIBUINTE DE FATO. UTILIZAÇÃO DE LINHA DE TRANSMISSÃO EDE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. ICMS SOBRE TARIFA DE USO DOSSISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO (TUSD). IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DEOPERAÇÃO MERCANTIL. 1. O ICMS sobre energia elétrica tem como fato gerador a circulação da mercadoria, e não do serviço de transporte de transmissão e distribuição de energia elétrica, incidindo, in casu, a Súmula166/STJ. Dentre os precedentes mais recentes: AgRg nos EDcl no REsp1267162/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe24/08/2012.2. A Primeira Seção/STJ, ao apreciar o REsp 1.299.303/SC, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJe de 14.8.2012, na sistemática prevista no art. 543-C do CPC, pacificou entendimento no sentido de que o usuário do serviço de energia elétrica (consumidor em operação interna), na condição de contribuinte de fato, é parte legítima para discutir a incidência do ICMS sobre a demanda contratada de energia elétrica ou para pleitear a repetição do tributo mencionado, não sendo aplicável à hipótese a orientação firmada no julgamento do REsp 903.394/AL (1ªSeção, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 26.4.2010 – recurso submetido à sistemática prevista no art. 543-C do CPC). 3. No ponto, não há falar em ofensa à cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal), tampouco em infringência da Súmula Vinculante nº 10, considerando que o STJ, o apreciar o REsp 1.299.303/SC, interpretou a legislação ordinária (art. 4º da Lei Complementar nº 87/96). 4. Agravo regimental não provido.” (STJ, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 07/02/2013, T1 – PRIMEIRA TURMA)
Ainda neste sentido:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO DEENERGIA ELÉTRICA. SÚMULA 166/STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O ICMS sobre energia elétrica tem como fato gerador a circulação da mercadoria, e não do serviço de transporte de transmissão e distribuição de energia elétrica. Desse modo, incide a Súmula166/STJ. 2. Ademais, o STJ possui entendimento no sentido de que a Taxa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica – TUST e a Taxa de Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica – TUSD não faz em parte da base de cálculo do ICMS. 3. A discussão sobre o montante arbitrado a título de verba honorária está, em regra, indissociável do contexto fático probatório dos autos, o que obsta o revolvimento do quantum adotado nas instâncias ordinárias pelo STJ, por força do disposto em sua Súmula 7. 4. Ressalto que tratam os autos de Ação Declaratória em que a autora pleiteia somente o direito de não pagar tributo. Desse modo, os honorários advocatícios fixados estão condizentes com o valor da causa estabelecido pela própria empresa. 5. Conforme orientação pacífica no STJ, excepcionalmente se admite o exame de questão afeta à verba honorária para adequar, em Recurso Especial, a quantia ajustada na instância ordinária ao critério de equidade estipulado na lei, quando o valor indicado for exorbitante ou irrisório. 6. A agravante reitera, em seus memoriais, as razões do Agravo Regimental, não apresentando nenhum argumento novo.7. Agravos Regimentais do Estado de Minas Gerais e da empresa não providos.” (STJ – AgRg nos EDcl no REsp: 1267162 MG 2011/0111028-4, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 16/08/2012, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/08/2012)
Ainda para corroborar, o que já está sendo exaustivamente ilustrado:
“PROCESSO CIVIL – TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – COBRANÇA DE ICMS COM …