Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA CÍVEL DA COMARCA DE $[processo_comarca] - $[processo_uf]
Justiça Gratuita
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_maioridade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], inscrito no CPF sob o nº $[parte_autor_cpf], RG nº $[parte_autor_rg], residente e domiciliado $[parte_autor_endereco_completo], por seu procurador que esta subscreve, nos termos do incluso instrumento particular de mandato, ao propor a presente
AÇÃO DECLARATORIA DE NULIDADE DE CLAUSULAS CONTRATUAIS - Com pedidos Liminares
em desfavor de $[parte_reu_razao_social], pessoa jurídica de direito privado, com sede na $[parte_reu_endereco_completo]. C.N.P.J. $[parte_reu_cnpj], vem perante V.Excia., dizer e requerer o que segue:
A parte Autora em SETEMBRO DE 2013, adquiriu um veículo tendo tomado mútuo através do contrato de EMPRESTIMO PESSOAL, nascido justamente da intenção de aquisição de dito bem, ou seja, por não possuir o valor global de R$ $[geral_informacao_generica] resolveu aceitar tomar o empréstimo que de forma insistente era oferecido.
O negócio que em um primeiro momento pareceu atrativo e correto revelou-se, com o passar da execução, em uma grande mentira. Sob a promessa de taxas e encargos baixos e facilidades de pagamentos, o Réu iludiu o demandante e fez com que firmasse a proposta EM BRANCO.
Atualmente observa que foi ludibriado, eis que o contrato, considerando os valores envolvidos na negociação, certamente está revestido de cláusulas abusivas e por força de Lei ilegais, no que tornam necessárias as suas revisões a fim de buscar o restabelecimento e o equilíbrio na relação contratual, uma vez que o valor global do saldo devedor R$ $[geral_informacao_generica] em nada condizem com as realidades apresentadas quando da contratação.
O valor global do saldo devedor, caso permaneçam imodificáveis as cláusulas, representará um prejuízo demasiado e um lucro excessivo e ilegal ao demandado.
Note V.Excia., Absolutamente fora da realidade atual da economia Brasileira, quando o momento é de total estabilidade do mercado econômico.
O saldo final só alçou os numerários do contrato pela implementação de cláusulas tidas pela legislação que integra a relação negocial, como ilegais, de conteúdo maciço e pré-dispostas.
PRETENDE com a presente demanda, revisar as cláusulas contratuais e toda a relação negocial mantida com o Réu, com o objetivo de expurgar as cobranças abusivas e ilegais, através de provimento declaratório de nulidade das cláusulas contratuais que as prevejam, reconhecendo-os como indevidos os valores pagos sob tais rubricas.
DO SPREAD BANCÁRIO E A DEDUÇÃO DA INADIMPLÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA
Em 1992, há 20 anos, a Revista Exame (1992, p. 56), sob o sugestivo título "O Melhor Negócio do Mundo" dizia: “Quer fazer um bom negócio no Brasil? Abra um banco. A economia vai mal, as empresas há muito tempo sofrem e gemem - e os bancos lucram, lucram, lucram.“
A única coisa que mudou nestes 18 anos é que o Poder Judiciário, quando provocado, vem bem decidindo: '... Daí porque andou na trilha correta a digna Juíza sentenciante ao considerar nulas as cláusulas contratuais que permitiram "spread" superior a 20% da taxa de captação dos CDB's pelo banco apelante e à cobrança de juros capitalizados, de onde advieram lucros arbitrários, excessivos e fixados de modo unilateral' (1º TACIV/SP - 11ª CÂM., Apelação nº 737.410-7, j. em 08 de junho de 1998, rel. Juiz MAIA DA CUNHA).
O spread bancário (pronuncia-se spréd) é a diferença entre os juros cobrados pelos bancos nos empréstimos a pessoas físicas e jurídicas e as taxas pagas pelos bancos aos investidores que colocam seu dinheiro em aplicações do banco.
Quanto maior o spread bancário, maior é o lucro que os bancos têm nas operações de crédito. É por conta disso que o spread bancário brasileiro, um dos mais altos do mundo, é criticado por economistas independentes, líderes sindicais, empresários e pelo governo – o dinheiro que poderia estar movimentando a economia é “engolido” pelos bancos.
A Lei que regula como os mercados devem interagir com a sociedade, diz que é “... infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados... aumentar arbitrariamente os lucros” (Lei n.º 8.884/94, art. 20, inc. III).
A Lei n.º 4.595/64, que regula o Sistema Financeiro Nacional, não diz o que é aumento arbitrário dos lucros. Assim, por força do art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil (LICC), sabendo-se que o Juiz não pode deixar de decidir de acordo com o artigo 126 do Código de Processo Civil, e o deve fazer fundamentadamente, em consonância com o artigo 93, IX da Constituição Federal c/c artigo 165 do Código de Processo Civil, determina-se que quando a Lei for omissa será utilizada a analogia, podendo ser procurado o conceito de “aumento arbitrário do lucro'’ em outra Lei.
Diz a Lei 1.521/51, da qual apenas há de se retirar tal conceito, que é excessivo o “... lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida”. Se o banco capta por CDB e paga juros em 30 dias de 1% e, em contrapartida, aplica este dinheiro em um empréstimo (cheque especial) a seu cliente e, nesta ponta, cobra 10% ao mês, está presente uma rentabilidade, um lucro de 900% no mês.
A cada dia, mais conglomerados financeiros se formam, através de fusões gigantescas entre as instituições bancárias de maior rentabilidade, havendo um domínio praticamente pleno do mercado, das taxas cobradas, e dos serviços prestados. O consumidor, em se tratando de pessoas físicas, na grande maioria das vezes não vislumbra opções de escolha, tanto em relação a taxas de juros dos contratos, bem como de suas cláusulas, cabendo apenas o aceite ou recusa das opções praticamente a estes impostas.
O spread bancário cobrado de pessoas físicas é muito superior ao cobrado de pessoas jurídicas. Tal situação se deve a três fatos.
O primeiro deles é o fato de os custos por real emprestado tender a ser maior para pessoas físicas, como usualmente ocorre quando se comparam operações no varejo com operações no atacado. Em segundo, os índices de inadimplência são consideravelmente mais elevados com pessoas físicas em relação as pessoas jurídicas. Por ultimo, o mercado que atende as pessoas jurídicas detém maior concorrência e em decorrência do binômio oferta e procura, imprescindível se torna a apresentação de propostas mais atrativas a estes clientes mais concorridos
Entretanto, temos que não se deve apenas às instituições financeiras as altas taxas de juros repassadas aos consumidores. O spread bancário é constituído pelo lucro do banco, taxas referentes à inadimplência, tributos e outros encargos, restando que o spread não reflete diretamente o lucro obtido pelos bancos.
O Estado deve intervir de forma direta na formação das taxas de juros, sendo que a liberdade de contratar é limitada pelos ditames dos princípios balizadores dos interesses públicos.
As taxas de juros elevadas influenciam diretamente na economia do nosso país. Com o aumento da Selic pelo Banco Central as instituições financeiras elevam suas taxas cobradas aos clientes. Os consumidores, por sua vez, em decorrência do credito caro, não têm acesso facilitado ao dinheiro, deixando assim de consumir. Com a diminuição do consumo, as indústrias diminuem a produção, quedando o um resfriamento na economia nacional.
O nosso país detém o indigno título de país com a maior taxa de juros do mundo. O Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), órgão instituído em junho de 1996 para estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa de juros, em reunião em 17 de março do corrente ano, decidiu manter a taxa básica de juros (a Selic) em 8,75% ao ano.
Segundo a UPTrend Consultoria Econômica, com esta decisão, o Brasil voltou a ter a maior taxa real de juros do mundo, na projeção para os próximos 12 meses. Conforme tabela que segue, a elevação de projeções de inflação em alguns países, aliada a diversas quedas de juros mundo afora manteve a dinâmica do Ranking e assegurou ao Brasil o topo como o melhor pagador de juros do mundo.
A tabela acima demonstra de forma clara a situação caótica a qual enfrenta o nosso país em relação ao seu sistema financeiro. Em um país rico em matéria prima de diversas formas e áreas, com universidades e estudos conceituados em diversas áreas, reconhecidos até mesmo mundialmente, é inconcebível ostentar o posto mais elevado da cobrança de juros.
Especialistas do sistema financeiro relatam que a formação do spread bancário se dá em decorrência de um complexo sistema de taxas, impostos e custos, não cabendo aqui adentrar em matéria de cunho puramente econômico, porém chamando a atenção para o fato de não ser apenas papel das instituições financeiras as elevadas taxas repassadas aos consumidores.
José Roberto Afonso, em Evolução e Determinantes do Spread Bancário no Brasil, (2009, p 13), explica que no Brasil o BACEN decompõe o spread em cinco componentes: 1 - custo administrativo; 2 – inadimplência; 3 - custo do compulsório; 4 – tributos e taxas; 5 – resíduo.
Segundo o autor, o custo administrativo se trata dos custos com os insumos utilizados pela indústria bancária: capital físico, trabalho, recursos operacionais e depósitos.
Já a inadimplência equivale a 20% das provisões para devedores duvidosos, calculadas de acordo com as regras de provisionamento estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.
O custo Compulsório corresponde ao custo de oportunidade que os bancos incorrem em deixar parte dos depósitos à vista e a prazos depositados no BACEN, com rendimento inferior ao que obteriam caso pudessem emprestar os recursos. Tal custo é regulado pelo Banco Central.
Tributos e taxas, o nome fala por si. Tem-se por componentes principais IOF, PIS, COFINS e ISS, além do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Por derradeiro, o resíduo, o qual “corresponde à diferença entre o spread total e a soma dos quatro componentes anteriores. Pode ser utilizado como indicador da margem auferida pelo banco, embora inclua outros fatores, como erros de mensuração e, argumentam-se, subsídios cruzados, decorrentes da limitação de juros imposta nos empréstimos com recursos direcionados (como crédito rural e repasses do BNDES), que induziriam os bancos a recuperar o baixo lucro dessas operações com um lucro maior nas operações em segmentos livres.” (Afonso, 2009, p 14).
Porém, a inadimplência, principal componente formador do spread bancário, é deduzida pelas instituições financeiras do imposto de renda, com supedâneo no artigo 9º da lei 9.430 de 27 de dezembro de 1996:
Art. 9º As perdas no recebimento de créditos decorrentes das atividades da pessoa jurídica poderão ser deduzidas como despesas, para determinação do lucro real, observado o disposto neste artigo.
§ 1º Poderão ser registrados como perda os créditos:
(...)
III - com garantia, vencidos há mais de dois anos, desde que iniciados e mantidos os procedimentos judiciais para o seu recebimento ou o arresto das garantias;
(...)
§ 3º Para os fins desta Lei, considera-se crédito garantido o proveniente de vendas com reserva de domínio, de alienação fiduciária em garantia ou de operações com outras garantias reais.
(...)
Diante de tal fato, mostra-se como real absurdo repassar ao consumidor altos spreads bancários calcados nos riscos de operação, bem como na inadimplência, sendo uma vez esta deduzida do imposto de renda. Tal pratica além de notoriamente abusiva e imoral, é totalmente ilegal, em decorrência dos mais comezinhos princípios balizadores da defesa dos interesses da coletividade, mormente no que tange aos consumidores.
Porém, muito embora as taxas de juros cobradas aos consumidores sejam elevadas por diversos valores, sendo algum destes alheios as instituições financeiras, temos que o ônus pelos serviços contratados é daquele que os contrata, ou seja, não cabe ao banco repassar ao consumidor taxas as quais não sejam pertinentes ao objeto da relação jurídica. Tal preceito não é obedecido no momento em que são transmitidos custos operacionais diretamente aos consumidores, ocasionando uma onerosidade excessiva ao consumidor.
Importante referir que o CDC define uma série de parâmetros os quais devem ser observados para que não ocorra o reconhecimento de cláusulas contratuais abusivas, principalmente no disposto no art. 51 do referido diploma.
Esses parâmetros são exemplificativos, conforme prevê o próprio inciso XV do art. 51, o qual diz são nulas as cláusulas contratuais que “estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor”, ou seja, tornou ilimitado o número das previsões de nulidades.
Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV – Estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
Além disso, o CDC possibilita a modificação ou a revisão de cláusulas do contrato no intuito de adequá-las à realidade social em que estão inseridas. O referido diploma tem o condão de adequar a sociedade atual, bem como as peculiaridades oriundas das hodiernas relações jurídicas envolvendo o binômio consumidor-fornecedor, na tentativa de atingir o grau de igualdade entre tais partes as quais são desiguais por excelência.
Assim estabelece o art. 6º, inciso V, do CDC:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
V – a modificação das cláusulas contratuais que estabelecem prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.
Destaca-se que, para que ensejar uma ação com o cunho de modificar as cláusulas de um contrato de adesão prescinde a necessidade de existir fato superveniente ao pacto, estando em consonância com o disposto no art. 6º, V do CDC, não sendo assim necessária a imprevisibilidade de um fato para que o consumidor possa pleitear seus direitos, basta apenas a demonstração objetiva da excessiva onerosidade advinda para o consumidor.
Para Claudia Lima Marques o inciso IV do art. 51 é “sem dúvida o principal dispositivo legal relativo à nulidade de cláusulas contratuais em relações de consumo“. (MARQUES, 2009, p 300) entendimento este cujo qual me filio.
Ainda acerca do mesmo dispositivo legal a eminente doutrinadora pontua: ”em decorrência do principio do equilíbrio econômico do contrato, veda-se cláusula que imponha desvantagem exagerada ao consumidor. Embora o contrato seja legitimo instrumento de obtenção de lucros e satisfação de interesses empresariais, busca-se a justiça contratual, vedando-se abusos na fixação das obrigações do consumidor, inclusive as relativas à determinação do preço.” (MARQUES, 2009, p 301)
Com base nos conceitos e princípios trazidos pelo referido diploma, possível e necessária a revisão das cláusulas contratuais abusivas, visando à equidade, equilíbrio e concretização da função social na relação firmada, objetivando-se, assim, o bem comum a erradicação da pobreza, objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, nos termos do art. 3º, III e IV, de nossa Constituição Federal.
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Ademais, diz a Constituição Federal (art. 173, § 4º) que '... a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise ... ao aumento arbitrário dos lucros'.
Por esta fundamentação, devemos atentar ao caso concreto, momento este em que o Estado tem o dever de agir, modo a coibir as práticas abusivas e ilegais presentes de forma transparente no contrato revisando.
Deve-se ater a análise das três funções da boa-fé objetiva, quais sejam: o critério hermenêutico, a criação de deveres anexos e a limitação do exercício de direitos. Diante destas se deve …