Petição
MERITÍSSIMO JUÍZO DA $[processo_vara] VARA FEDERAL DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE $[processo_comarca]/$[processo_uf]
$[parte_autor_nome_completo], $[parte_autor_nacionalidade], $[parte_autor_maioridade], $[parte_autor_estado_civil], $[parte_autor_profissao], inscrito no CPF sob o nº $[parte_autor_cpf], RG nº $[parte_autor_rg], residente e domiciliado $[parte_autor_endereco_completo], já cadastrada eletronicamente, vem, com o devido respeito, por meio de sua procuradora, perante Vossa Excelência, propor
AÇÃO DE REVISÃO DO FGTS
em face da $[parte_reu_razao_social], pelos seguintes fundamentos fáticos e jurídicos:
I - DOS FATOS:
A parte Autora é optante do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, possuindo algumas contas vinculadas ao FGTS ao longo de sua vida laboral, conforme cópias das Carteiras de Trabalho e Previdência Social em anexo.
Nesse contexto, a Caixa Econômica Federal vem lesando o Demandante desde 1991, ao aplicar ao saldo das contas de FGTS, como índice de correção monetária, a Taxa Referencial (TR).
Nesse sentido, a Lei nº 8.036/90, que rege o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, prevê que a Caixa Econômica Federal deve depositar nas contas de FGTS a correção monetária e os juros devidos. E a Lei 8.177/91 prevê que, a partir de fevereiro de 1991, o FGTS deve ser remunerado pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança e pelas taxas de juros previstas na legislação do FGTS em vigor, sendo essas taxas de juros, consideradas como adicionais à remuneração pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança.
Ocorre que, a taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança desde 1991 é a Taxa Referencial - TR, que, conforme já decidido pelo STF, não é índice de correção monetária (ao passo que não reflete a inflação do período).
Dessa forma, desde 1991 a Caixa Econômica Federal deixou de aplicar índice de correção monetária as contas de FGTS, aplicando apenas os juros remuneratórios consistentes na taxa referencial acrescida dos juros legais previstos na legislação do FGTS.
De outro lado, tendo em vista que a TR não reflete a inflação, e que desde 1999 se encontra progressivamente abaixo dos índices inflacionários, com diferença de até 6% ao ano, a utilização dos índices da TR como índice de correção monetária vem causando sérios prejuízos ao trabalhador.
Por esse motivo a parte Autora ingressa com a presente demanda.
II - DO DIREITO
DO FGTS
A Constituição Federal garante ao trabalhador, no tópico referente aos direitos sociais a formação de um Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS (art. 7, inciso III).
Ou seja, o FGTS foi criado para proteger o trabalhador, com a garantia de que terá uma reserva financeira em casos de necessidade, como no desemprego involuntário, ou para facilitar a aquisição de imóvel ou ainda para garantir melhores condições na velhice ou em caso de doença, como ocorre na hipótese de aposentadoria. Dessa forma, para que se efetive o intuito de proteger o trabalhador é imperioso que os depósitos em conta de FGTS sejam atualizados por índice de correção monetária que garanta a recuperação do valor da moeda frente ao processo inflacionário ocorrido durante o período em que o dinheiro trabalhador permaneceu aplicado na conta de FGTS.
Conforme pacificado pelo E. Tribunal Superior do Trabalho, sob o enfoque do vínculo trabalhador-empregador, “os referidos depósitos (de FGTS) constituem salário diferido, pois ostentam condição de única proteção conferida ao obreiro em face da dispensa arbitrária ou sem justo motivo, nos termos dos artigos 7º, I, da Constituição Federal e 10, I, do ADCT. Isso porque, ao trabalhador subordinado que se vê abruptamente privado de sua fonte de sustento, a Lei n° 8.036/90, regulamentando os dispositivos constitucionais citados, garante o levantamento dos aludidos depósitos, acrescidos de uma indenização de 40%”.[1]
Nesse sentido, é incontestável que o FGTS é crédito trabalhista, advindo da imposição estatal da poupança forçada, a fim de amparar o trabalhador em situações excepcionais, como a despedida arbitrária, por exemplo.
Diante disto, ao ser depositado na sua conta de FGTS, o valor passa a integrar o patrimônio do trabalhador. Tal situação não poderia ter outra interpretação, na medida que com o falecimento do mesmo o eventual saldo não é restituído à empresa, mas repassado aos dependentes previdenciários, ou na falta destes, aos seus sucessores (art. 20, IV, da Lei Federal nº 8.036/90).
Portanto, sendo propriedade do trabalhador, incide a proteção constitucional do direito de propriedade (art. 5º, XXI, CF).
Diante desta perspectiva, ao impor a poupança forçada do seu patrimônio, os valores depositados em contas do FGTS, evidentemente, devem receber correção monetária, a fim de garantir a própria subsistência do direito de propriedade.
Acrescente-se a isso as singularidades do FGTS: cuida-se de um pecúlio constitucional obrigatório, não portável e com prazo indefinido. Ou seja, não há possibilidade do trabalhador titular de transferir seus recursos para aplicações mais rentáveis, mais bem geridas ou mais seguras. Logo, é do núcleo essencial do art. 7º, III, da CF/1988 que o Fundo de Garantia seja preservado, ao menos, da inflação.
Nessa perspectiva, o ministro Gilmar Mendes ao discorrer sobre o direito de propriedade e a questão monetária:
Constitui autêntico truísmo ressaltar que, hodiernamente, coexistem, lado a lado, o valor da moeda, conferido pelo Estado, e o seu valor de troca interno e externo. Enquanto o valor nominal da moeda se mostra inalterável, salvo decisão em contrário do próprio Estado, o seu valor de troca sofre alterações intrínsecas em virtude do processo inflacionário ou de outros fatores que influem na sua relação com outros padrões monetários. [...]
A amplitude conferida modernamente ao conceito constitucional de propriedade e a idéia de que os valores de índole patrimonial, inclusive depósitos bancários e outros direitos análogos, são abrangidos por essa garantia estão a exigir, efetivamente, que eventual alteração do padrão monetário seja contemplada, igualmente, como problema concernente à garantia constitucional da propriedade.[2]
Corroborando os argumentos acima expostos, o voto do Ministro Ayres Britto na ADI nº 4425/DF:
17. Insurgência, a meu ver, que é de ser acolhida quanto à utilização do “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança” para a atualização monetária dos débitos inscritos em precatório. É que a correção monetária, consoante já defendi em artigo doutrinário, é instituto jurídico-constitucional, porque tema específico ou a própria matéria de algumas normas figurantes do nosso Magno Texto, tracejadoras de um peculiar regime jurídico para ela. Instituto que tem o pagamento em dinheiro como fato-condição de sua incidência e, como objeto, a agravação quantitativa desse mesmo pagamento. Agravação, porém, que não corresponde a uma sobrepaga, no sentido de constituir obrigação nova que se adiciona à primeira, com o fito de favorecer uma das partes da relação jurídica e desfavorecer a outra. Não é isso. Ao menos no plano dos fins a que visa a Constituição, na matéria, ninguém enriquece e ninguém empobrece por efeito de correção monetária, porque a dívida que tem o seu valor nominal atualizado ainda é a mesma dívida. Sendo assim, impõe-se a compreensão de que, com a correção monetária, a Constituição manda que as coisas mudem..., para que nada mude; quero dizer: o objetivo constitucional é mudar o valor nominal de uma dada obrigação de pagamento em dinheiro, para que essa mesma obrigação de pagamento em dinheiro não mude quanto ao seu valor real. É ainda inferir: a correção monetária é instrumento de preservação do valor real de um determinado bem, constitucionalmente protegido e redutível a pecúnia. Valor real a preservar que é sinônimo de poder de compra ou “poder aquisitivo”, tal como se vê na redação do inciso IV do art. 7º da C.F., atinente ao instituto do salário mínimo. E se se coloca assim na aplainada tela da Constituição a imagem de um poder aquisitivo a resguardar, é porque a expressão financeira do bem juridicamente protegido passa a experimentar, com o tempo, uma deterioração ou perda de substância, por efeito, obviamente, do fato econômico genérico a que se dá o nome de “inflação”. Daí porque deixar de assegurar a continuidade desse valor real é, no fim das contas, desequilibrar a equação econômico-financeira entre devedor e credor de uma dada obrigação de pagamento, em desfavor do último.
18. Com efeito, neste ponto de intelecção das coisas, nota-se que a correção monetária se caracteriza, operacionalmente, pela citada aptidão para manter um equilíbrio econômico-financeiro entre sujeitos jurídicos. E falar de equilíbrio econômico-financeiro entre partes jurídicas é, simplesmente, manter as respectivas pretensões ou os respectivos interesses no estado em que primitivamente se encontravam. Pois não se trata de favorecer ou beneficiar ninguém. O de que se cuida é impedir que a perda do poder aquisitivo da moeda redunde no empobrecimento do credor e no correlato enriquecimento do devedor de uma dada obrigação de pagamento em dinheiro. Pelo que já se pode compreender melhor que a agravação no “quantum” devido pelo sujeito passivo da relação jurídica não é propriamente qualitativa, mas tão-somente quantitativa. A finalidade da correção monetária, enquanto instituto de Direito Constitucional, não é deixar mais rico o beneficiário, nem mais pobre o sujeito passivo de uma dada obrigação de pagamento. É deixá-los tal como qualitativamente se encontravam, no momento em que se formou a relação obrigacional. Daí me parecer correto ajuizar que a correção monetária constitui verdadeiro direito subjetivo do credor, seja ele público, ou, então, privado. Não, porém, uma nova categoria de direito subjetivo, superposta àquele de receber uma prestação obrigacional em dinheiro. O direito mesmo à percepção da originária paga é que só existe em plenitude, se monetariamente corrigido. Donde a correção monetária constituir-se em elemento do direito subjetivo à percepção de uma determinada paga (integral) em dinheiro. Não há dois direitos, portanto, mas um único direito de receber, corrigidamente, um valor em dinheiro. Pois que, sem a correção, o titular do direito só o recebe mutilada ou parcialmente. Enquanto o sujeito passivo da obrigação, correlatamente, dessa obrigação apenas se desincumbe de modo reduzido.
19. Convém insistir no raciocínio. Se há um direito subjetivo à correção monetária de determinado crédito, direito que, como visto, não difere do crédito originário, fica evidente que o reajuste há de corresponder ao preciso índice de desvalorização da moeda, ao cabo de um certo período; quer dizer, conhecido que seja o índice de depreciação do valor real da moeda – a cada período legalmente estabelecido para a respectiva medição – , é ele que por inteiro vai recair sobre a expressão financeira do instituto jurídico protegido com a cláusula de permanente atualização monetária. É o mesmo que dizer: medido que seja o tamanho da inflação num dado período, tem-se, naturalmente, o percentual de defasagem ou de efetiva perda de poder aquisitivo da moeda que vai servir de critério matemático para a necessária preservação do valor real do bem ou direito constitucionalmente protegido.
Nessa esteira, a não aplicação de correção monetária idônea a refletir o processo inflacionário acaba por ferir de morte o direito de propriedade do trabalhador, tendo em vista que seus depósitos na conta de FGTS não podem ser sacados a qualquer momento, acarretando em enriquecimento ilícito da Caixa Econômica Federal, que no final das contas irá lucrar com o empobrecimento do trabalhador.
Aliás, o FGTS foi criado para proteger o trabalhador, com a garantia de que terá uma reserva financeira em casos de necessidade. Ora, se o trabalhador não possui livre disposição da sua reserva financeira, somente podendo dispor dela em momento posterior, a não incidência de correção monetária capaz de refletir a inflação obviamente acarreta em prejuízo flagrante do seu direito de propriedade.
Dessa forma, para que se efetive o intuito de proteger o trabalhador é imperioso que os depósitos em conta de FGTS sejam atualizados por índice de correção monetária que garanta a recuperação do valor da moeda frente ao processo inflacionário ocorrido durante o período em que o dinheiro trabalhador permaneceu aplicado na conta de FGTS.
DA INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA
No caso do FGTS, a matéria é disciplinada no art. 13 da Lei 8.036/90 e no art. 17 da Lei 8.177/91:
Lei Federal nº 8.036/1990:
Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de (três) por cento ao ano.
(...)
Lei Federal nº 8.177/1991
Art. 17. A partir de fevereiro de 1991, os saldos das contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) passam a ser remunerados pela taxa aplicável à remuneração básica dos depósitos de poupança com data de aniversário no dia 1°, observada a periodicidade mensal para remuneração.
Parágrafo único. (...) (grifado)
Em suma, os saldos das contas de FGTS são sujeitos a dois índices:
a) O primeiro é o índice de 3% ao ano, referente a capitalização de juros, prevista no final do caput art. 13 da Lei 8.036/90; e
b) O segundo índice, que deveria ser o responsável pela atualização monetária, é aquele equivalente aos “parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança” (caput art. 13 da Lei 8.036/90), o qual, desde a edição do art. 17, caput, da Lei Federal nº 8.177/1991, é a Taxa Referencial (TR).
Ocorre que a adoção da Taxa Referencial como critério de atualização monetária não é capaz atualmente de refletir idoneamente o fenômeno inflacionário. Um dos motivos se dá pela alteração que a TR foi sofrendo ao longo do tempo. Inicialmente, a TR foi criada para remunerar as cadernetas de poupança com a expectativa de inflação futura no período de aplicação, no lugar da inflação passada. Desindexava-se, assim, a caderneta de poupança (principal ativo financeiro na época) dos índices de inflação passada.
Ocorre que anteriormente à Lei nº 8.981/95, o imposto de renda incidente sobre as aplicações financeiras tinha como base de cálculo apenas o “rendimento real”, isto é, acima da inflação, e diversos foram os índices de correção monetária utilizados pelo Fisco (OTN, BTN, BTN-fiscal e, por fim, UFIR) para identificar o “rendimento real”. Todavia, com a edição da referida lei, passou-se a incidir o imposto de renda sobre a remuneração total das aplicações.
Nesse sentido, a fim de evitar uma transferência em massa de capitais investidos em títulos públicos e privados para a caderneta de poupança, alterou-se a metodologia de cálculo da TR (Resolução CMN 2.604, de 23/04/1999), desvinculando-se inclusive da inflação futura, foco inicial da TR.
Diante do exposto, pede-se vênia para expor o entendimento já exarado pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade no sentido de que a TR não mais reflete idoneamente o fenômeno inflacionário. Veja-se trecho do voto do Ministro Ayres Britto na ADI nº 4425:
20.O que determinou, no entanto, a Emenda Constitucional nº 62/2009? Que a atualização monetária dos valores inscritos em precatório, após sua expedição e até o efetivo pagamento, se dará pelo “índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança”. Índice que, segundo já assentou este Supremo Tribunal Federal na ADI 493, não reflete a perda de poder aquisitivo da moeda . 9 Cito passagem do minucioso voto do Ministro Moreira Alves:
“Como se vê, a TR é a taxa que resulta, com a utilização das complexas e sucessivas fórmulas contidas na Resolução nº 1085 do Conselho Monetário Nacional, do cálculo da taxa média ponderada da remuneração dos CDB/RDB das vinte instituições selecionadas, expurgada esta de dois por cento que representam genericamente o valor da tributação e da ‘taxa real histórica de juros da economia’ embutidos nessa remuneração. Seria a TR índice de correção monetária, e, portanto, índice de desvalorização da moeda, se inequivocamente essa taxa média ponderada da remuneração dos CDB/RDB com o expurgo de 2% fosse constituída apenas do valor correspondente à desvalorização esperada da moeda em virtude da inflação. Em se tratando, porém, de taxa de remuneração de títulos para efeito de captação de recursos por parte de entidades financeiras, isso não ocorre por causa dos diversos fatores que influem na fixação do custo do dinheiro a ser captado. (...) A variação dos valores das taxas desse custo prefixados por essas entidades decorre de fatores econômicos vários, inclusive peculiares a cada uma delas (assim, suas necessidades de liquidez) ou comuns a todas (como, por exemplo, a concorrência com outras fontes de captação de dinheiro, a política de juros adotada pelo Banco Central, a maior ou menor oferta de moeda), e fatores esses que nada têm que ver com o valor de troca da moeda, mas, sim – o que é diverso -, com o custo da captação desta.”
21.O que se conclui, portanto, é que o § 12 do art. 100 da Constituição acabou por artificializar o conceito de atualização monetária. Conceito que está ontologicamente associado à manutenção do valor real da moeda. Valor real que só se mantém pela aplicação de índice que reflita a desvalorização dessa moeda em determinado período. Ora, se a correção monetária dos valores inscritos em precatório deixa de corresponder à perda do poder aquisitivo da moeda, o direito reconhecido por sentença judicial transitada em julgado será satisfeito de forma excessiva ou, de revés, deficitária. Em ambas as hipóteses, com enriquecimento ilícito de uma das partes da relação jurídica. E não é difícil constatar que a parte prejudicada, no caso, será, quase que invariavelmente, o credor da Fazenda Pública. Basta ver que, nos últimos quinze anos (1996 a 2010), enquanto a TR (taxa de remuneração da poupança) foi de 55,77%, a inflação foi de 97,85%, de acordo com o IPCA.
22.Não há como, portanto, deixar de reconhecer a inconstitucionalidade da norma atacada, na medida em que a fixação da remuneração básica da …