Petição
EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUÍZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA de $[PROCESSO_COMARCA] - $[PROCESSO_UF]
Processo n°: $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já qualificada nos autos do processo em epígrafe, por suas advogadas que abaixo subscrevem, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, manifestar-se acerca da Petição referente ao evento 15.
DOS FATOS E DO DIREITO
Trata-se de Mandado de Segurança no qual fora concedida liminar a fim de que fosse concedido a Agravada o direito de exercer o trabalho remoto tendo em vista a mesma ser a única cuidadora de sua filha deficiente mental (CID 10-Q93.5 laudo em anexo) que por sua vez é pessoa que integra o grupo de risco da Covid-19 (atestado em anexo). A Síndrome de Angelman é uma patologia neurogenética caracterizada por atraso mental grave e características disfórmicas faciais distintas.
O município aduz que no caso em tela não há previsão legal para afastamento de servidor em razão de possuir familiar pertencente ao grupo de risco para Covid-19, mas tão somente quando o próprio servidor estiver enquadrado como pertencente ao grupo de risco.
Ainda, alega que, ainda que fosse permitido o afastamento do servidor que tivesse membro da família em grupo de risco para Covid-19, no caso em tela, faltaria outro requisito, qual seja, a doença da filha da servidora não estaria prevista entre as hipóteses que permitem o afastamento, por serem consideradas do grupo de risco.
As alegações do Impetrado não merecem prosperar, vejamos:
O direito da Impetrante vem primordialmente amparado na Constituição Federal, em especial em seu Art.196 que assim dispõe:
“ A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação’.
O direito à vida e a saúde são direitos consagrados pela Constituição Federal em seus artigos 5º e 6º respectivamente.
Ainda, o direito a saúde é consagrado em toda seção II do capítulo II do título VIII, que se inicia com o artigo 196 da CF.
De acordo com este mandamento constitucional, o direito a saúde é garantido como “ direito de todos e dever do Estado”, visando a redução do risco da doença e o acesso as ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
No artigo 196, a Constituição reza que a saúde é direito de todos e dever do Estado. Esta norma não há de ser vislumbrada como apenas mais uma regra jurídica inócua e sem efetividade. A saúde é direito de todos, direito inalienável e subjetivo, sendo que, em paralelo, é dever do Estado; se este não age no amparo da diretriz traçada pela regra, o direito à saúde do cidadão não será, por isto, afetado.
No mesmo sentido, a Lei 8.080/90 dispõe em seu artigo 2º que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.
Ainda, nos termos daquilo que consta do art. 10 da Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), compete ao poder público garantir dignidade à pessoa com deficiência, por toda a sua vida, bem como em situações de risco ou estado de calamidade pública (como é o caso pelo qual todos estamos passando), será considerada vulnerável e o poder público deverá adotar as medidas para a sua proteção e segurança.
Artigo 10: “Compete ao poder público garantir a dignidade da pessoa com deficiência ao longo de toda a vida.
Parágrafo único. Em situações de risco, emergência ou estado de calamidade pública, a pessoa com deficiência será considerada vulnerável, devendo o poder público adotar medidas para sua proteção e segurança
De fato, no decreto municipal apenas os servidores em grupo de risco para Covid-19 devem realizar o trabalho remoto, todavia estão ocorrendo diversas decisões no sentido de que deve se valer-se da analogia nestes casos, estendendo-se o direito aos trabalhadores que coabitam com pessoas do grupo de risco.
Todavia, passamos a manifestar e demonstrar, mais uma vez, como de fato fora demonstrado em sede de medida liminar concedida no presente Mandado de Segurança, que a impetrante, merece receber do poder judiciário uma guarida para preservar, não só a si, mas sua família ao direito inalienável da saúde, do bem-estar e da felicidade.
Vejamos o que diz a jurisprudência acerca do assunto:
AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO ORDINÁRIA SERVIDORA ESTADUAL TELETRABALHO Pretensão de servidora de ser posta em teletrabalho, com manutenção da carga horária. Alegações de que sua filha, de 3 anos, é do grupo de risco por padecer de sequelas da Síndrome de Guillan Barre. Decisão agravada que deferiu a tutela de urgência. TUTELA DE URGÊNCIA - Artigo 300, do CPC/15 Necessidade de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo Condição excepcional verificada Documentos médicos que comprovam a situação de saúde da filha da autora que a enquadram no grupo de risco Aplicação analógica do Decreto Estadual nº 64.864/20 e Resolução SAP nº 43/2020 - Presença de fumus boni iuris e periculum in mora. Decisão mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 3005103-39.2020.8.26.0000; Relator (a): Leonel Costa; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Público; Foro de Araçatuba - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 28/09/2020; Data de Registro: 28/09/2020)
Vejamos um trecho da decisão:
“A autora pretende ser colocada em regime de teletrabalho em razão de sua filha 03 anos ser de grupo de risco, por padecer de sequelas decorrentes da Síndrome de Guillan Barre. Verifica-se, portanto, tratar de questão de saúde, que possibilita a concessão de tutela a assegurar desde já o direito, que será melhor analisado após o trâmite da lide, contraditório e produção de prova. Destaca-se que dos documentos médicos colacionados constam elementos a comprovar as sequelas da filha da autora, que a enquadram no grupo de risco à COVID-19. Com efeito, bem destacou a decisão agravada: “Embora a parte autora não integre grupo de risco previsto no Decreto Estadual 64.864/20 e Resolução SAP nº 43, de 24/03/2020, que não prevê teletrabalho para servidor em razão de pessoa da família no grupo de risco, se mostra viável a invocação da analogia com situações não previstas na legislação, notadamente as regras protetivas do Estatuto da Criança e do Adolescente, constando como direito fundamental o direito à vida, expressamente estabelecido concorrer o poder público em assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida e à saúde (ar.4°)”. Assim, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, de rigor a concessão da tutela de urgência. Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso, mantendo a decisão agravada que concedeu a tutela de urgência.”
Como podemos depreender do caso análogo acima, é fundamental que a impetrante tenha reconhecida a necessidade de sua filha estar em grupo de risco, nossos tribunais trazem entendido que ainda que não houvesse previsão expressa, deveria se fazer presente as regras protetivas estabelecidas no Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como no Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Ainda no sentido da proteção do menor, observe o que nossos tribunais contêm o entendimento ora mencionado, conforme excerto do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
AGRAVO INTERNO Deferimento de efeito ativo ao recurso de agravo de instrumento Ação para redução de carga horária Servidora pública do Município de Jundiaí Antecipação da tutela recursal para se compelir o Município a deferir à servidora o teletrabalho previsto no Decreto Municipal nº 28.970/2020 Admissibilidade Probabilidade de êxito evidenciada Norma regulamentar que determina o regime de teletrabalho no período de pandemia do COVID-19 a servidor que tenha como dependente menor com deficiência, nos termos da Lei Filho da agravada que não possui deficiência, porém se trata de criança acometida de grave doença, considerada no grupo de risco para o COVID-19 e que depende diretamente de auxílio da mãe no tratamento de saúde - Ausência de qualquer demonstração de prejuízo concreto ao serviço público ou impossibilidade da agravada exercer suas funções remotamente Não provimento do recurso. (TJSP; Agravo Interno Cível 2149689-89.2020.8.26.0000; Relator (a): Maria Olívia Alves; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Público; Foro de Jundiaí - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 20/10/2020; Data de Registro: 20/10/2020).
Por outro giro, vejamos outra decisão nesse sentido, qual seja, do Desembargador Grijalbo Fernandes Coutinho no processo nº$[geral_informacao_generica]:
“(...) Nesse contexto, mostra-se louvável a medida interna da impetrante, no sentido de concretizar um "Plano de Ação Geral", com o escopo principal de implantar imediatamente o regime de trabalho remoto para aqueles que se encontram no grupo de risco descrito pela OMS, bem como para os empregados que coabitam com pessoas qualificadas no mesmo grupo de risco, inclusive os que possuam filhos em idade escolar ou inferior, e que necessitem da assistência de um dos pais. Todavia, não se mostra razoável o retrocesso e a convocação de empregados, in casu, dos trabalhadores em convívio com grupo de risco ou com filhos que necessitam de assistência dos pais, quando inexistem diretrizes científicas de que tais pessoas, na labuta normal, não ofereça…