Direito Civil

Boa fé objetiva e subjetiva: princípios fundamentais no direito brasileiro

Atualizado 21/05/2024

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Boa fé objetiva e subjetiva: princípios fundamentais no direito brasileiro

No intrincado universo jurídico, onde leis se entrelaçam e relações se constroem, a Boa Fé surge como um farol, iluminando o caminho para a conduta ética, a construção de parcerias duradouras e a resolução de conflitos de forma harmônica. Mais do que um mero princípio moral, a Boa Fé se consagra como um pilar fundamental do ordenamento jurídico brasileiro, permeando diversos ramos do direito, com ênfase especial no âmbito contratual e nas relações interpessoais.

Essência de um princípio fundamental

A Boa Fé, consagrada no art. 422 do Código Civil Brasileiro, estabelece que os contratantes, tanto na fase de celebração quanto na execução do contrato, devem agir com probidade e boa-fé. Essa norma imperativa impõe às partes um dever de conduta leal, cooperativa e diligente, visando à proteção do interesse mútuo e à construção de um ambiente negocial harmonioso.

O Princípio da Boa Fé transcende os limites do direito contratual, permeando diversos ramos do direito brasileiro, inclusive como princípio geral do direito. Nessa perspectiva, ele serve como fundamento para a interpretação e aplicação de normas jurídicas, orientando a atuação do juiz e das partes em situações não previstas expressamente na lei.

Em outras palavras, a Boa Fé serve como um parâmetro ético e moral que o magistrado deve considerar ao analisar casos concretos, buscando soluções justas e equitativas que atendam aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da justiça social.

Boa fé objetiva e subjetiva

Para compreendermos a amplitude da Boa Fé, é fundamental distinguir suas duas vertentes: objetiva e subjetiva.

A Boa Fé Objetiva concentra-se no comportamento externo do agente, exigindo que este atue com diligência, prudência e com o devido cuidado na condução dos negócios. Em outras palavras, a boa fé objetiva impõe que as partes se comportem de maneira idônea, evitando condutas que possam causar prejuízo à contraparte, ainda que sem intenção maliciosa.

Exemplo: Uma empresa que anuncia um produto como sendo de alta qualidade, mas que na verdade apresenta vícios ocultos, viola o princípio da boa fé objetiva, pois induz o consumidor em erro e causa-lhe prejuízo.

A Boa Fé Subjetiva dedica-se ao estado psicológico do agente, exigindo que este atue com lealdade, honestidade e confiança. A boa fé subjetiva vai além da mera abstenção de atos lesivos, exigindo que as partes cooperem ativamente entre si, compartilhando informações relevantes e buscando soluções conjuntas para eventuais conflitos.

Exemplo: Uma empresa que se recusa a fornecer informações relevantes ao seu parceiro comercial sobre um contrato em andamento viola o princípio da boa fé subjetiva, pois demonstra falta de cooperação e transparência.

Aplicações concretas nas relações jurídicas

A aplicação da Boa Fé não se limita a um conjunto de regras rígidas, mas sim a um norteador flexível, adaptável às peculiaridades de cada caso concreto. Sua aplicação abrange diversos aspectos das relações jurídicas, desde a fase pré-contratual até a execução e o pós-título do contrato.

Fase Pré-Contratual

A Boa Fé, tanto objetiva quanto subjetiva, desempenha um papel crucial na fase pré-contratual, momento em que as partes iniciam as negociações e lançam as bases do futuro acordo.

  • Boa Fé Objetiva: Nesta fase, a boa fé objetiva exige que as partes ajam com transparência, fornecendo informações completas e verídicas sobre o objeto do contrato, seus riscos e potenciais entraves. A omissão de informações relevantes configura violação à boa fé objetiva e pode gerar responsabilização da parte omissa.

  • Exemplo: Uma imobiliária que omite a existência de problemas estruturais em um imóvel viola a boa-fé objetiva na fase pré-contratual, pois induz o comprador a erro e o impede de tomar uma decisão consciente sobre a aquisição do bem.

  • Boa Fé Subjetiva: A boa fé subjetiva, por sua vez, impõe às partes o dever de cooperação e boa-fé nas negociações. Isso significa que ambas as partes devem buscar um acordo justo e equilibrado, evitando manobras ardilosas ou cláusulas contratuais abusivas.

  • Exemplo: Uma empresa que, durante a negociação de um contrato de fornecimento, tenta impor condições contratuais desproporcionalmente vantajosas para si, viola a boa fé subjetiva, pois demonstra falta de cooperação para a construção de um relacionamento comercial duradouro.

Execução do Contrato

Na fase de execução do contrato, a Boa Fé assume um papel preponderante, exigindo das partes o fiel cumprimento de suas obrigações.

  • Boa Fé Objetiva: A boa fé objetiva impõe às partes o dever de diligência e lealdade na execução do contrato. Isso significa que cada parte deve agir de forma eficiente e colaborativa para alcançar o objeto do contrato, respeitando os prazos, as condições e as demais cláusulas acordadas.

  • Exemplo: Uma construtora que atrasa injustificadamente a entrega de uma obra viola a boa fé objetiva na fase de execução, pois descumpre sua obrigação contratual e causa prejuízo ao contratante.

  • Boa Fé Subjetiva: A boa fé subjetiva, nesta fase, exige das partes a manutenção da confiança e da cooperação mútua. Isso significa que as partes devem buscar soluções consensuais para eventuais imprevistos e manter a outra parte informada sobre qualquer circunstância que possa afetar o cumprimento do contrato.

  • Exemplo: Uma empresa contratada para prestação de serviços de marketing digital que se recusa a realizar ajustes solicitados pelo cliente, desde que estejam de acordo com o contrato, viola a boa fé subjetiva, pois demonstra falta de flexibilidade e comprometimento com a satisfação do contratante.

Pós-Execução Contratual

O Princípio da Boa Fé não se esgota com a mera execução do contrato. Seus efeitos perdurarem por um tempo razoável após a finalização do negócio, influenciando a conduta das partes em situações posteriores.

  • Boa Fé Objetiva: A boa fé objetiva continua a ser relevante no pós-execução contratual, exigindo das partes que ajam com lealdade e correção, mesmo após o término do contrato. Por exemplo, a parte que detém informações confidenciais obtidas durante a vigência do contrato deve manter o sigilo dessas informações após o término do vínculo contratual.

  • Boa Fé Subjetiva: A boa fé subjetiva também pode influenciar as relações pós-contratuais. Por exemplo, se uma empresa encerra um contrato de fornecimento, mas age com boa-fé subjetiva ao auxiliar o antigo parceiro na transição para um novo fornecedor, demonstra postura ética e colaborativa, o que pode facilitar a celebração de futuros negócios.

Distinguindo boa fé da ausência de dolo

É importante diferenciar a Boa Fé da ausência de dolo. O dolo, previsto no art. 171 do Código Civil Brasileiro, configura a intenção de causar prejuízo à outra parte. A Boa Fé, por sua vez, vai além da mera ausência de dolo, exigindo um comportamento proativo, leal e cooperativo.

Imagine a seguinte situação: uma incorporadora celebra um contrato de compra e venda de imóvel com um cliente. Durante a celebração do contrato, a incorporadora omite a existência de uma ação judicial movida contra o empreendimento. Nessa situação:

  • Ausência de dolo: A incorporadora pode não ter tido a intenção deliberada de causar prejuízo ao cliente (dolo).

  • Violação da Boa Fé Objetiva: Ao omitir a existência da ação judicial, a incorporadora viola a Boa Fé Objetiva, pois agiu com falta de transparência e descumpriu o dever de informar o cliente sobre riscos relevantes relacionados ao imóvel.

Esse exemplo ilustra como a Boa Fé possui um alcance mais amplo que a ausência de dolo. A Boa Fé exige um comportamento ativo e preventivo, enquanto a ausência de dolo limita-se à não ocorrência de atos intencionalmente lesivos.

Jurisprudência Brasileira

A Boa Fé, tanto objetiva quanto subjetiva, tem sido amplamente aplicada pelos tribunações brasileiras, influenciando o desfecho de inúmeros casos. Vejamos alguns exemplos:

  • Direito do Consumidor: O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui diversos julgados que condenam fornecedores por práticas abusivas e má-fé nas relações de consumo. Nesses casos, a violação da Boa Fé Objetiva configura uma vantagem indevida para o fornecedor e um prejuízo ao consumidor.

  • Direito Civil: Um exemplo de violação da Boa Fé Subjetiva na esfera cível ocorre quando um sócio omite deliberadamente informações financeiras relevantes aos demais sócios da empresa. Tal conduta pode ensejar a anulação do contrato social ou indenização por perdas e danos.

  • Direito Empresarial: A Boa Fé Objetiva também se aplica nas relações contratuais entre empresas. Por exemplo, uma empresa que rompe injustificadamente um contrato de longa duração, sem considerar os investimentos e expectativas da outra parte, pode ser condenada por violação à boa-fé objetiva.

Esses são apenas alguns exemplos, e a jurisprudência brasileira é vasta em casos que analisam a aplicação da Boa Fé em diferentes ramos do direito.

Boa Fé nas Relações Jurídicas

O operador do direito, ciente da importância da Boa Fé no ordenamento jurídico, pode adotar estratégias para fortalecer sua atuação e defender os interesses de seu cliente:

  • Analisar o caso concreto à luz da Boa Fé: Houve conduta omissiva ou desleal por parte da parte contrária? Como essa violação afetou o seu cliente?

  • Fundamentar a argumentação jurídica em doutrina e jurisprudência: Utilize precedentes que demonstrem a aplicação da Boa Fé em casos semelhantes.

  • Priorizar a solução consensual: A Boa Fé também incentiva a busca de acordos que beneficiem ambas as partes e evitem a morosidade do processo.

  • Agir com ética e transparência em todas as fases do processo: A conduta do próprio advogado deve ser pautada pela Boa Fé, garantindo a lisura do processo e a credibilidade da advocacia.

Considerações finais

Navegar pelo complexo universo do direito contratual exige cautela, conhecimento e instrumentos jurídicos sólidos. O JusDocs oferece uma ampla variedade de documentos jurídicos prontos, elaborados por advogados renomados e constantemente atualizados com a doutrina e jurisprudência vigentes.

Com o JusDocs, você tem acesso a um vasto banco de modelos de petições testados e aprovados na prática, tais como:

  • Pedidos iniciais baseados em violação do Princípio da Boa Fé em diversas áreas do direito (contratual, consumerista, empresarial etc.);

  • Contestações que demonstram a conduta leal e ética do cliente;

  • Recursos que apontam a ausência de consideração da Boa-fé pela instância anterior.

Ao utilizar os documentos do JusDocs, você poupa tempo e recursos na hora de elaborar peças processuais fundamentadas na Boa Fé, e tem a garantia de estar amparado por instrumentos jurídicos sólidos e atualizados.

Além disso, o JusDocs oferece:

  • Artigos doutrinários sobre a aplicação da Boa Fé em diferentes ramos do direito, permitindo que você se aprofunde no tema e encontre embasamento teórico para sua argumentação.

  • Jurisprudência selecionada com julgados recentes dos tribunais brasileiros sobre casos relacionados à Boa Fé, mantendo você atualizado sobre as tendências jurisprudenciais.

Garanta a segurança jurídica que você precisa para atuar com excelência em casos que envolvem a aplicação da Boa Fé, seja objetiva ou subjetiva. Com o JusDocs, você tem a tranquilidade de saber que está amparado por instrumentos jurídicos sólidos e pela experiência de advogados renomados.

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Para saber ainda mais sobre a boa fé, acesse o guia completo do JusDocs.

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Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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