Petição
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA CÍVEL ESPECIALIZADA EM FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE $[processo_comarca] - $[processo_uf]
Processo nº. $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já devidamente qualificado aos autos em epígrafe, por seus procuradores infra assinados, ut instrumento procuratório em anexo (doc. 01), vem à presença de Vossa Excelência, apresentar os presentes
MEMORIAIS FINAIS
à ação de improbidade administrativa proposta, pelas razões de fato e de direito que passa a expor.
Breve Relato da Lide
Em apertada síntese, o Ministério Público acusa o demandado por ato de improbidade administrativa pelo fato de ter firmado um contrato por dispensa de licitação com amparo do art. 24, inciso XIII da Lei 8.666/93, o qual se enquadraria no art. 10, inciso VIII da Lei 8.429/92.
No entanto, o que o Parquet faz é confundir o conceito jurídico do ato ímprobo - caracterizado pela conduta volitiva de beneficiar-se do cargo para fins alheios ao interesse público, locupletando-se indevidamente – tencionando vulgarizar a legislação, criando uma mens legis que inexiste.
Note, Excelência, que o arrazoado inicial é lacunoso, não identificando com precisão a conduta improba incutida de má fé atribuída ao demandado e, muito menos evidencia o prejuízo causado ao erário público, situação tida por essencial para incidência da Lei de Improbidade Administrativa.
I. Da Ausência de provas
Discorrendo os autos da ação de improbidade proposta, verifica-se que as investigações foram concebidas unicamente em razão da falaciosa reportagem veiculada à Revista Época de 14/abril/2008, sem maiores investigações.
Porém, nada foi levado adiante.
Tanto que o ilustre promotor de justiça João Marcos Adede y Castro determinou o arquivamento do inquérito civil – que somente posteriormente converteu-se na presente ação de improbidade administrativa.
Fato é que de forma leviana instaurou-se a presente ação de improbidade, desprovida de provas cabais a demonstrar a desonestidade do agente público na condução de suas atividades, consubstanciadas unicamente em indícios jornalísticos que maculam a finalidade da ação de improbidade traçada na Lei 8.429/92.
E durante todo o iter processual, nada de novo foi trazido pelo Ministério Público, a não ser a verdade já conhecida e arguida à contestação: O CONTRATO FOI INTEGRALMENTE CUMPRIDO, tendo sido firmado dentro da legalidade.
Ora, incumbia ao Parquet provar todo o alegado, ônus que não logrou completar, deixando a lide a mercê de argumentos vazios, já bem enfrentados à contestação.
É neste sentido, aliás, que alicerça a doutrina de Mauro Roberto Gomes de Mattos, ao alertar sobre a fragilidade da ação quando carente de provas:
“Não deve a ação de improbidade administrativa ser manejada sem que haja o mínimo de plausividade jurídica, embasada pela prova. Nesse contexto, a matéria jornalística que noticia suposta prática de ato de improbidade administrativa por parte do agente político não se presta para a finalidade de embasar o ajuizamento da ação correspondente. Isso porque, a notícia veiculada não possui compromisso com a verdade, eis que é editada com a finalidade de possibilitar a leitura pelo maior número de pessoas.” (op. cit. pg. 556)
A Lei nº 8.429/92 tratou de estabelecer em seu artigo 17, §6º condições mínimas para a interposição da referida ação, vejamos:
Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.
(...)
§ 6o A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil.
No entanto, os autos carecem de provas cabais que demonstrem a existência de qualquer ato desonesto por parte do Réu, que pudessem evidenciar a ocorrência de prejuízo ao erário ou mesmo ato doloso na condução do ato.
Ausente, portanto, qualquer lastro probatório do envolvimento da existência de prejuízo ao erário público bem como a má fé na constituição do ato administrativo, incabível qualquer condenação por improbidade administrativa.
Nesse mesmo sentido é o posicionamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao afirmar:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MUNICÍPIO DE SANTO ANTÔNIO DAS MISSÕES. EX-PREFEITO MUNICIPAL. IRREGULARIDADES NA CONTRATAÇÃO DE EMPRESA PARA CONSTRUÇÃO DE CAMADA ASFÁLTICA NAS RUAS DA CIDADE E RESTAURAÇÃO DO ASFALTO JÁ EXISTENTE. I – (...) - Para que se configure conduta ímproba, é necessária a perquirição do elemento volitivo do Agente Público e de terceiros (dolo, nos casos dos artigos 9º e 11 e, ao menos, culpa, nos casos do artigo 10), não sendo suficiente, para tanto, a irregularidade ou a ilegalidade do ato. VII - Ausência de comprovação de enriquecimento ilícito. Ademais, o Ministério Público não trouxe aos autos elemento que demonstrasse prejuízo aos cofres públicos por ser excessivo o valor pago ou por não ter ocorrido a devida prestação dos serviços contratados. Houve dispensa de licitação, sem prévio procedimento administrativo; porém, não se tem qualquer prova de prejuízo ao erário. Nesse contexto, não há falar em aplicação do art. 10 da Lei 8.429/92. A responsabilização com base no art. 11 da Lei nº 8.429/92 exige dolo, não configurado no caso sub judice. Precedentes do STJ e deste Tribunal. (...). (Apelação Cível Nº 70024283525, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 18/04/2012)
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO E VICE PREFEITO. LICITAÇÃO. DISPENSA. CURSO DE PINTURA. FRACIONAMENTO. DOLO. 1. (...). 3. A contratação direta em violação à Lei de Licitações não configura, por si só, ato de improbidade administrativa que causa dano erário. Hipótese em que não há prova de que os preços praticados estavam acima ao de mercado ou eram por demais onerosos aos cofres públicos. Precedentes do STJ. 4. Nem todo o ato administrativo ilegal é ato de improbidade administrativa. O ato de improbidade que atenta contra os princípios da Administração Pública só admite a forma dolosa. Art. 11 da Lei 8.429/92. Precedentes do STJ. 5. Ausente prova de que tenham o Prefeito e o Vice-Prefeito, dolosamente, dispensado a realização de licitação para celebração de contrato de prestação de serviços para ministrar curso de pintura em vidro e em tecido no clube de mães e para a comunidade, descabe condenação por ato de improbidade administrativa. Hipótese de inabilidade do administrador no planejamento de contratações, não havendo provas de sua desonestidade no trato da coisa pública. Recursos providos. (Apelação Cível Nº 70027551191, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 18/12/2008)
Repita-se, in fine, não ter o Ministério Público logrado indicar qualquer comprovação ou mínimo indício acerca das condutas ímprobas do Réu – nem de longe tangenciando o dano ao erário e o enriquecimento ilícito de sua parte.
Nas palavras de Mauro Roberto Gomes de Mattos, “A definição de improbidade administrativa não pode ser um ‘cheque em branco’ ou ato de prepotência do membro do Ministério Público, pois a segurança jurídica que permeia um Estado Democrático de Direito como o nosso não permite essa definição jurídica.” (op. cit. pg. 28).
E, assim agindo, o Ministério Público deixou sua argumentação exordial vazia, estando notoriamente descaracterizados os atos indicados como de improbidade administrativa – refletindo, portanto, na imediata extinção da ação.
II. Da Inaplicabilidade da Lei nº. 8.429/92 – Ausência de ato improbo
A Lei de improbidade administrativa nasceu com o intuito de combater atos que afetem a moralidade e dilapidem a coisa pública, atingindo o administrador público que pratique ato desonesto em detrimento ao erário público.
Nas palavras de Alexandre de Moraes:
“A Lei de Improbidade, portanto, não pune a mera ilegalidade, mas a conduta ilegal ou imoral do agente público e de todo aquele que o auxilie voltada para a corrupção. O ato de improbidade administrativa exige para a sua consumação um desvio de conduta do agente público que no exercício indevido de suas funções afasta-se dos padrões éticos morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas ou gerar prejuízos ao patrimônio público mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções...” (in Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, São Paulo: Atlas, 2002, p.2611)
Portanto, os fatos narrados na peça inicial estão longe de configurar um ato de improbidade por parte do Réu, ora contestante, pois carecem de requisitos mínimos previstos na tipificação legal, pois: a) a contratação reveste-se de legalidade; b) não foi evidenciado qualquer prejuízo ao erário público e; c) não se verifica a existência de má fé na conduta do agente.
a) Da licitude da contratação
Conforme já relatado, a contratação em vergasto foi realizada com fulcro no artigo 24, inciso XIII da Lei 8.666/93, in verbis:
Art. 24. É dispensável a licitação:
(...)
XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos;
Pois bem, pelos documentos acostados à exordial, tem-se a comprovação da contratação de instituição com notória especialidade no escopo contratual pretendido – sendo estatutariamente incumbida do desenvolvimento institucional, conforme se alcança aos inúmeros atestado de capacidade técnica apresentados.
Todos, diga-se, com objeto semelhante ao contratado pelo Município de Santa Maria, qual seja, consultoria na gestão pública, dentre eles:
Governo do Estado do Rio Grande do Sul - 25/05/2000
Prefeitura Municipal de Porto Alegre - 16/11/2001
Ora, como contestar a idoneidade e a capacidade do IDORT, após ter prestado serviços de forma eficiente e satisfatória para o Governo do Estado do $[processo_estado] e da Prefeitura Municipal de $[geral_informacao_generica]!
E mais: trata-se de instituição com notória reputação, conforme se denota do Decreto de 27 de maio de 1992, onde há o reconhecimento de sua utilidade pública federal.
Excelência, neste contexto deve-se atentar para o fato de que o próprio Estatuto do IDORT (fls. 182 ss. dos autos) traz em seu texto o caráter social, cientifico e sem fins lucrativos de sua constituição:
“Art. 1º - O Instituto de Organização Racional do Trabalho, abreviadamente IDORT, sociedade civil científica sem intuitos lucrativos, ...”
Em apertada síntese, o IDORT preenche os requisitos exigidos à legislação específica, tendo total consonância com o serviço então contratado pelo Município – na exata doutrina de Joel Menezes Niebuhr:
“Em primeiro lugar, se a dispensa é para entidades dedicadas à pesquisa, ao ensino, ao desenvolvimento institucional ou à recuperação do preso, evidentemente que o contrato a ser celebrado precisa guardar pertinência a tais finalidades.” (in Licitação Pública e Contrato Administrativo. pg. 573)
Ora, aos diversos atestados de capacidade técnica apresentados, resta clara a expertise do IDORT nos serviços contratados – diagnóstico da situação atual (estrutura organizacional e modelo de gestão):
Prefeitura Municipal de Porto Alegre-RS (fl. 64):
o Treinamento em metodologia para montagem de definições estratégicas;
o Implementação do sistema de indicadores de qualidade, produtividade e confiabilidade;
o Assessoria no mapeamento e redesenho dos processos de trabalho;
o ...
o Assessorar o aprimoramento do modelo de gestão de desenvolvimento da SMT acompanhando as atividades do comitê estratégico, assim como a atualização do sistema de desenvolvimento.
Prefeitura Municipal de Cotiá-SP (fl. 73):
o Consultoria na elaboração do Plano Municipal de Educação;
o Assessoria na realização de Diagnóstico Sócio Cultural dos Professores da rede de Ensino Fundamental;
Estado do Rio Grande do Sul (fl. 078):
o Capacidade técnica nas áreas de formação profissional, assessoria e treinamento;
Além disso, a ideia que se forma é justamente no desenvolvimento de instituições, conforme leciona Marçal Justen Filho ao disciplinar sobre o art. 24, inciso XIII:
“19.3.2) Atividade de desenvolvimento institucional
(...)
Ali se indicam as instituições que promovem o desenvolvimento de outras instituições.” (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11ª ed. pg. 253)
E não há exemplo melhor do que o contrato em tela, uma vez que foram empenhadas verbas públicas no desenvolvimento institucional, no caso, da estrutura administrativa do Município de Santa Maria.
Sopesados todos estes fatores, tem-se a incidência do permissivo tratado ao art. 24 inc. XIII da Lei nº. 8.666/93.
E não só em razão do programa oferecido, mas, principalmente, pela maior carga horária – 200 horas a mais do que os outros institutos.
Assim, seja pelos objetivos sociais do IDORT, seja pela notória expertise demonstrada pelo incontestável número de atestados de capacidade técnica relevantes, pertinentes e compatíveis com o contrato executado, seja, enfim, pelo melhor preço apresentado, constata-se que foi adequada e pertinente a dispensa de licitação empregada.
Já quanto ao aspecto do valor contratado, nota-se que foi apresentada proposta ímpar de trabalho, muito superior à metodologia apresentada pelos demais institutos consultados, não havendo condições de prestarem serviços de igual complexidade.
Portanto, perfeitamente lícita a contratação em vergasto.
Assim, não se fere nem a legalidade, nem a moralidade que devem revestir toda e qualquer avença com o Poder Público, desconstituindo qualquer possibilidade de enquadramento à Lei de improbidade administrativa.
Mauro Gomes de Mattos ao leciona sobre a tipicidade prevista no art. 10 da referida lei, destaca:
“Conduta dolosa ou culposa do agente, capaz de tipificar ato de improbidade narrado no art. 10, é aquela que não exige apenas uma vontade livre e consciente em realizar quaisquer condutas descritas, responsabilizando-se também aquele que viola a prudência, tornando-se imprudente e negligente com a coisa pública, lesando, via de consequência o erário público. Essa conduta deverá ser ilícita, contrapondo-se à legalidade, para a obtenção de um fim vedado pela norma legal. Ou, em outras palavras, a conduta dolosa do agente público que for lícita, mas ocasionar lesão ou perda patrimonial ao erário, não se sujeita à responsabilização por ato de improbidade administrativa. Deverá o ato do agente público estar contaminado pela ilicitude.” (in op. cit. pg. 264)
Portanto, meras suposições baseadas em relatos midiáticos não constituem provas cabais para evidenciar alguma ilicitude na contratação em comento, sendo descabida a aplicação da lei de improbidade administrativa.
b) Da ausência de prejuízo ao erário público
O dispositivo legal em que o Ministério Público enquadrou o réu foi o artigo 10, inciso XIII da lei de improbidade administrativa, in verbis:
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
Ou seja, conforme trazido à exordial, o ato administrativo, supostamente ilegal, estaria enquadrado como ato de improbidade que cause prejuízo ao erário
Ao comentar este dispositivo legal, Mauro Roberto Gomes de Mattos elucida sobre os limites de sua aplicação:
“O caput do art. 10 da Lei nº 8.429/92 afirma que constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no artigo inaugural da Lei nº 8.429/92. Assim, …