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Direito do Trabalho

Atualizado 01/03/2017

TRT4. NULIDADE DO PROCESSO. CITAÇÃO INVÁLIDA

Carlos Stoever

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TRT4. NULIDADE DO PROCESSO. CITAÇÃO INVÁLIDA
Identificação

PROCESSOnº 0020427-11.2016.5.04.0005 (RO)RECORRENTE: —–RECORRIDO: —–RELATOR: HERBERT PAULO BECK

EMENTA
NULIDADE DO PROCESSO. CITAÇÃO INVÁLIDA. A citaçãoé pressuposto de validade do processo (art. 239, caput, do CPC/2015). Diante disso, uma vez evidenciado que a notificaçãoinicial não foi recebida pela reclamada, pois enviada para endereço onde não residia à época, está caracterizado o vício nacitação inicial. Em consequência, impõe-se o reconhecimento da nulidade do processo, a partir da notificação inicial.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 11ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA paradecretar a nulidade do processo, a partir da notificação inicial da parte ré, e determinar o retorno dos autos à origem parao regular processamento do feito, ficando prejudicado o exame das demais insurgências recursais da demandada, bem como dorecurso ordinário da reclamante.

Intime-se.

Porto Alegre, 16 de fevereiro de 2017 (quinta-feira).

Cabeçalho do acórdão
Acórdão
RELATÓRIO
Inconformadas com a sentença de parcial procedência da ação (IDc6f840d), proferida pelo Exmo. Juiz do Trabalho Substituto Eduardo Vianna Xavier, as partes recorrem.

A reclamante pretende a modificação do decisum quanto àsmatérias a seguir: dispensa discriminatória, indenização por danos morais e honorários assistenciais (ID 90ba72b).

A reclamada argui, inicialmente, a nulidade do processo por invalidadeda citação inicial e, no mérito, a reforma do julgado quanto à reintegração ao emprego e aos intervalos intrajornada (ID 48c0db9).

Com contrarrazões pela reclamante (ID 2706f6d), sobem os autos aeste Tribunal para julgamento.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO
RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA

NULIDADE DO PROCESSO. CITAÇÃO INICIALINVÁLIDA. Matéria prejudicial

A reclamada argui a nulidade do processo a partir da citação inicial,alegando a ocorrência de vício insanável, a partir da audiência em que decretada a sua revelia e confissão ficta, por nãoter comparecido à solenidade. Sustenta que a certidão de devolução de mandado é clara ao certificar que há fortes indíciosnos autos no sentido de que ela jamais recebeu a notificação inicial e de que a autora nunca exerceu atividades no endereçoinformado na petição inicial. Aduz que foi isso que efetivamente ocorreu. Alega que jamais recebeu a notificação para audiênciainicial juntada sob ID b2c4119, recebido pelo Sr. Luis Azevedo. Indica que esse indivíduo, por ocasião da presença da Oficialde Justiça no local, para reintegração da demandante, informa que ela não reside no local há cerca de dois anos (id 3865556).Afirma que não recebeu as notificações juntadas sob IDs b2c4119 e c7594cf, porque não reside mais no local ao qual elas foramdirigidas há mais de cinco anos, apesar da impressão do Sr. Luis Azevedo de que faz cerca de dois anos. Menciona que a própriademandante indicou à Oficial de Justiça que trabalhou na Rua Hilário Ribeiro, nº 21/702. Argumenta que, em razão do não recebimentoda notificação inicial, é evidente a nulidade processual desde a citação inicial, pois prejudicada a formação da relação jurídico-processual.Colaciona jurisprudência. Pondera que é ônus da parte autora informar com exatidão o endereço correto da reclamada, permitindo,assim, a formação do polo passivo e ao empregador o estabelecimento do contraditório e da ampla defesa. Diz que, no caso dosautos, a demandante informou o endereço correto somente no momento do cumprimento do mandado de reintegração. Invoca o dispostono art. 239 do CPC/2015 e no art. 794 da CLT. Conclui que deve ser decretada a nulidade do processo desde a citação inicial,com o retorno dos autos à origem para seu regular processamento. Pede o provimento do apelo.

Decido.

A presente ação foi ajuizada contra FABIOLA MARCHETT CARLIN, em31/3/2016. Na petição inicial, a reclamante indica, como endereço da ré, Rua Tenente Coronel Fabricio Pillar, nº 179,apto 602, bairro Mont”Serrat, Porto Alegre/RS (ID a1df3da). Na ocasião, a autora colaciona cópia de sua CTPS, cuja anotaçãodo contrato de trabalho, assinada pela demandada em 02/5/2012, apresenta o endereço supramencionado (ID 2743ba0, p. 4).

Em 11/4/2016, é expedida notificação de audiência inicial à ré,para o endereço informado pela autora (ID b2c4119). O comprovante de entrega – CI, oriundo dos Correios, retornou cumpridopositivo em 15/4/2016, contendo assinatura de “Luis Azevedo” (ID 7b02dac).

É realizada audiência, à qual a demandada não comparece, sendo consideradapelo Juízo singular revel e fictamente confessa (ID c1373c3). Ato contínuo, é encerrada a instrução processual e proferidasentença de parcial procedência da ação (ID c6f840d).

A notificação da sentença é expedida para o endereço acima destacado,retornando cumprida positivo, com recebimento dado, novamente, por “Luis Azevedo” (ID c7594cf).

Por ter sido determinada, na sentença, a reintegração ao empregoda autora, é expedido mandado para cumprimento da ordem judicial, igualmente no endereço da Rua Tenente-Coronel Fabricio Pilar(ID 340cee7). A Oficial de Justiça que tentou cumprir a diligência expede certidão de devolução do mandado, nos seguintestermos (ID 3865556):

CERTIFICO que, em cumprimento ao MANDADO DE REINTEGRAÇÃO, com endereçoindicado na Rua Ten.-Cel. Fabrício Pillar, nº 179, ap. 602, Bairro Moinhos de Vento, N/C, nesta data, recebi contato telefônicoda autora, através da Central de Mandados, apresentando-se para a Reintegração eindicando como sendo endereço em que efetivamente trabalhou, Rua Hilário Ribeiro, nº 21, Bairro Moinhos de Vento. Declarou,ainda, desconhecer o endereço em que determinada a reintegração, Rua Ten.- Cel. Fabrício Pillar, nº 179, ap. 602, salientando,inclusive, que sequer saberia como chegar até lá. Insistiu, inicialmente,no sentido de que o mandado fosse cumprido junto ao endereço em que alegou ter trabalhado. Todavia, realizei consultaàs peças processuais, apurando que em nenhum momento há menção ao local indicado pela reclamante. A própria petição inicialfaz referência ao endereço expressamente consignado na ordem judicial. CERTIFICO,então, que me dirigi ao endereço indicado no Mandado, Rua Ten.-Cel. Fabrício Pillar, nº 179, ap. 602, Bairro Moinhos de Vento,sendo recebida pelo porteiro do Cond. Ed. Lincoln Suítes, Sr. Luís Antônio Cândido de Azevedo, que foi, inclusive,que assinou o AR relativo à notificação da reclamada no presente processo. OSr. Luiz Antônio informou que a destinatária, FABÍOLA MARCHETT CARLIN, é a proprietária do apartamento 602, entretantonão reside no apartamento, que está alugado há cerca de dois anos para a Sra. Nicole Salton, ausente no momento da diligência.CERTIFICO, por fim, que a reclamante, bastante contrafeita, acabou dirigindo-se ao local, questionando o motivo de estar emendereço diverso do qual trabalhou. Todavia, diante da ausência da destinatária, do fato que a reclamante jamais exerceu suasatividades ali, bem como de que há indícios no sentido de que a reclamada jamais recebeu a notificação inicial, deixei dedar cumprimento à reintegração, submetendo os fatos à apreciação do MM. Juízo e solicitando orientações. DOU FÉ.

(Grifei)

Ante o conteúdo da certidão supra, o Juízo a quo determinaa intimação da parte ré “para ciência da ação, da sentença e do mandado de reintegração“, no endereço informado pelaserventuária, a saber, Rua Hilário Ribeiro, 21, Bairro Moinhos de Vento, Porto Alegre/RS (ID 3098539).

Em 10/8/2016, o mandado é cumprido, na pessoa do cônjuge da reclamada,conforme certidão autuada sob ID 4303e7b.

Em manifestação apresentada em 15/8/2016, a autora informa o “endereçoatualizado” da reclamada, no local supramencionado, requerendo a expedição de novo mandado de reintegração ao emprego (IDe28b6be).

A demandada, em 16/8/2016, interpõe recurso ordinário, arguindoa nulidade do processo, por invalidade da citação inicial realizada, consoante as razões anteriormente relatadas (ID 48c0db9).

E, no particular, tenho que razão lhe assiste, senão vejamos.

A Constituição Federal garante a todos, indistintamente, o exercícioda ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV), que constituem a base do devido processo legal, também assegurado constitucionalmente(art. 5º, LIV).

A citação é pressuposto de validade do processo, a teor do dispostono caput do art. 239 do CPC/2015. Desse modo, a ausência de citação válida implica a nulidade absoluta do feito,por ofender aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, bem como do devido processo legal.

Na Justiça do Trabalho, a notificação deve ser feita pelo correio,por meio de registro postal com franquia, conforme prevê o art. 841, §1º, da CLT. Não vigora, pois, o princípio da pessoalidade.Assim sendo, presume-se válida a notificação entregue no endereço correto da parte reclamada, constituindo ônus do destinatárioa prova do seu não recebimento (Súmula nº 16 do TST).

A propósito, cito a lição de Mauro Schiavi, segundo o qual:

Na CLT, a citação não é pessoal, recebe o nome de notificação (art. 841da CLT) e é realizada pelo Diretor de Secretaria da Vara do Trabalho. Como regra geral, é realizada por meio do Correio comaviso de recebimento (AR ou SEED). Além disso, na notificação inicial, deve constar a advertência de que se o reclamado nãocomparecer à audiência será tido por revel e confesso, nos termos do art. 844 da CLT. Na execução, o comando do art. 880,§ 2o, da CLT, determina que a citação sobre a execução seja pessoal.

Por estar inserida norol do art. 337, I, e § 5o, do CPC, a nulidade da citação pode ser alegada a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição,inclusive reconhecida de ofício pelo juiz.

[…]

No Processo do Trabalho,antes do trânsito em julgado, a nulidade da citação pode ser arguida pelo reclamado a qualquer tempo. Após o trânsito em julgado,mostra-se discutível a aplicabilidade do art. 525, § 1o, I, do CPC. (in: Manual de direito processual dotrabalho, 9. ed., São Paulo: LTr, 2015, p. 605).

In casu, está nítido que as notificações endereçadaspara a Rua Tenente-Coronel Fabricio Pilar foram recebidas pelo porteiro do edifício (Sr. Luís Antonio), o qual atestou expressamenteà Oficial de Justiça que a ré ali não residia há, pelo menos, dois anos. Aliás, de se notar que a própria demandante informouà auxiliar do Juízo “desconhecer o endereço em que determinada a reintegração, Rua Ten.- Cel. Fabrício Pillar, nº 179,ap. 602“, admitindo nunca ter trabalhado ali, mas sim na Rua Hilário Ribeiro.

Sendo assim, o conjunto probatório trazido à colação evidencia,de forma clara, que o local informado pela autora na petição inicial não correspondia ao endereço da reclamada à época danotificação. E, em face da ausência de citação válida, a ré não tomou ciência dos termos da presente ação e não teve a oportunidadede defesa, sendo, inclusive, decretada a sua revelia e confissão ficta.

Diante disso, entendo caracterizada a afronta ao disposto no art.841 da CLT e nos arts. 256 e 257 do CPC/2015 e, consequentemente, do art. 5º, LV, da Constituição Federal. Impõe-se, pois,a decretação da nulidade do processo a partir da notificação inicial.

Nessa linha de entendimento, cito precedentes da 2ª Seção de DissídiosIndividuais deste Regional, em sede de ação rescisória, envolvendo a matéria em debate, consoante as ementas a seguir transcritas:

AÇÃO RESCISÓRIA. CITAÇÃO INICIAL. NULIDADE. Constatado que a notificaçãoinicial não foi recebida pelo reclamado, tendo sido encaminhada para endereço onde não mais residia, configura-se vício nacitação inicial e demais atos seguintes, declarando-se a nulidade do processo, por aplicação da previsão do artigo 794 daCLT.

(TRT da 4ª Região, 2ª Seçãode Dissídios Individuais, 0021359-19.2013.5.04.0000 AR, em 27/08/2014, Desembargador Marcal Henri dos Santos Figueiredo)

AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃOA LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. CITAÇÃO INVÁLIDA. A ausência de notificação válida do autor, ex-reclamado, para a audiênciainicial, viola a literalidade do art. 841 da CLT e do art. 214 do CPC de 1973 (art. 239 do CPC de 2015) e, consequentemente,do art. 5º, LV, da Constituição Federal, impondo-se a declaração da nulidade do processo. Incidência do art. 485, V, do CPCde 1973 (art. 966, V, do CPC de 2015). (TRT da 4ª Região, 2ª Seção de Dissídios Individuais, 0020143-52.2015.5.04.0000AR, em 08/07/2016, Desembargador Herbert Paulo Beck – Relator)

Por todo o exposto, dou provimento ao recurso da reclamada paradecretar a nulidade do processo, a partir da notificação inicial da parte ré, determinando-se o retorno dos autos à origempara o regular processamento do feito.

Em consequência, julgo prejudicado o exame das demais insurgênciasrecursais da demandada, bem como do recurso ordinário da reclamante.

Assinatura

HERBERT PAULO BECK

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR HERBERT PAULO BECK (RELATOR)

DESEMBARGADORA FLÁVIA LORENA PACHECO

DESEMBARGADOR RICARDO HOFMEISTER DE ALMEIDA MARTINSCOSTA

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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