TRT4. DOENÇA OCUPACIONAL. HÉRNIA INGUINAL.
Atualizado 13/04/2016
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PROCESSOnº 0020457-39.2014.5.04.0030 (RO)RECORRENTE: ADELARE VIEIRARECORRIDO: MADRINER CONSTRUCOES LTDA – EPPRELATOR: CARMEN IZABEL CENTENA GONZALEZ
DOENÇA OCUPACIONAL. HÉRNIA INGUINAL. Indicando a perícia médica, não desconstituída, no aspecto,que a patologia que acomete o trabalhador não guarda relação com o trabalho desenvolvido em favor do empregador, decorrendo,antes, de condições pessoais e com caráter congênito, não se configura hipótese de responsabilização civil do empregador nopagamento de indenizações por danos morais e materiais.
Vistos, relatados e discutidos os autos.
ACORDAM os Magistrados integrantes da 7ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, NEGAR PROVIMENTO ao recurso do reclamante.
Intime-se.
Porto Alegre, 06 de abril de 2016 (quarta-feira).
O reclamante interpõe recurso ordinário (Id Num. 32d3282), inconformado com a sentença (IdNum. a4ca033) que julgou a ação improcedente. Insiste em obter a responsabilização da reclamada pela doença que afirma ternatureza ocupacional, com reconhecimento da garantia provisória de emprego e pagamento de indenizações por danos materiaise morais.
Com contrarrazões pela reclamada (Id Num. 384ec6d),são distribuídos na forma regimental.
É o relatório.
DOENÇA OCUPACIONAL – HÉRNIA INGUINAL
O magistrado de origem julga a ação improcedente, entendendoque o laudo médico é esclarecedor e conclusivo quanto à ausência de nexo entre as atividades do reclamante e a doença porele apresentada (hérnia inguinal).
Inconformado, o reclamante insiste no reconhecimento de nexo causal- ou, pelo menos, concausal – entre a lesão que apresenta (hérnia inguinal) e suas atividades em favor da reclamada. Sustentaque "o juízo a quo não levou em consideração a realidade dos fatos e simplesmente ignorou o fato do reclamante ter sofridoACIDENTE DE TRABALHO, sendo que tal situação fez com que adquirisse grave problema de saúde que permanece até os dias de hoje".Diz, ainda, que "está claramente comprovado o nexo de causalidade entre as condições de trabalho suportadas peloreclamante e a doença adquirida, visto que o mesmo iniciou o contrato de trabalho em plenas condições de saúde, e, após arealização das atividades do emprego, desenvolveu a referida doença". E conclui, por fim, que "se o reclamante foiadmitido em condições saudáveis e como resultado do esforço empregado à reclamada é dispensado doente, torna-se evidente queo reclamante sofreu acidente de trabalho típico da construção civil".
Analiso.
O autor foi contratado em 02/05/2012, para exercer a função de serventee teve sua rescisão contratual em 24/05/2012. Afirma que adquiriu uma hérnia inguinal unilateral ou não especificada, semobstrução ou gangrena, sob o CID K 40.9, em virtude das atividades que exerceu para a reclamada. Sustenta que a moléstia é"resultado de levantar muito peso em seu ambiente de trabalho e da realização de esforços repetitivos", bem comoque "descobriu seu problema foi quando foi levantar um elevador, dias que antecederam sua dispensa imotivada (24/05/2012)e ao levantar também suas peças, sendo pesado, pesava cerca de 120 quilos, carregava de 80 a 100 metros de distância dentroda obra" (Id Num. 2249310 – Pág. 2).
Com a petição inicial vem atestado fornecido por médico da SecretariaMunicipal da Saúde de Minas do Leão atestando que o autor é "portador de hérnia inguinal à direita" (Id2249400) e laudo de ecografia realizada na região inguinal direita em 20.8.2012 que aponta "hérnia inguinal encarcerada"(Id 2249388, fl. 4).
De outra parte, em resposta a ofício cuja expedição foi determinadapelo julgador a quo, o INSS encaminha prontuário do reclamante (Id 2986659), do qual se extraemas seguintes informações:
– concessão de benefício 'auxilio doença previdenciário', Espécie'31', em 13.6.2012, ainda ativo em 01.3.2013;
– exame físico (perícia) em 21.6.2012, indicando hérnia inguinalà direita, sem sinais de complicação, sem elementos que jurifiquem agravamento de patologia pré existente;
– exame físico (perícia) em 27.8.2012, indicando hérnia inguinalà direita que, segundo periciado, "faz tempo" que tem; em 'considerações', o perito do INSS consigna que, "considerandoo exame pericial realizado não há elementos para reconsiderar resultado anterior" indicando, no campo inferior esquerdodo prontuário, não se tratar de acidente do trabalho e inexistir incapacidade laborativa.
Realizada perícia médica para instrução do presente processo, operito nomeado pelo juízo apresenta as seguintes considerações (laudo Id Num. d438c88):
As hérnias inguinais podem ser de origem congênita ou adquirida. O termocongênito nas hérnias inguinais não significa que esta patologia já esteja presente no momento do parto, mas sim que há umapredisposição ao seu aparecimento determinada por uma alteração da anatomia da região inguinal já presente desde o nascimento.
Afalta de obliteração do processo peritônio-vaginal, após o processo de descida dos testículos, para o desenvolvimentode hérnias inguinais é o fator primário indiretas, o que explica a maior freqüência de casos desta hérniaem homens.
Prematuridade e baixopeso ao nascer são fatores de risco para o desenvolvimento de hérnias. Anormalidades congênitas, como deformidades pélvicasou extrofia de bexiga, que sejam capazes de causar deformidades no canal inguinal, predispõem ao surgimento de hérnias inguinais.
As hérnias inguinais diretassão atribuídas principalmente ao desgaste da musculatura abdominal de manter a tensão contínua submetida à cavidade abdominal(qualquer tipo de esforço durante toda a vida do individuo), que aumenta a tensão abdominal, provocam traumatismoe enfraquecimento da parede posterior do canal inguinal.
A redução no conteúdode hidroxiprolina (aminoácido presente no processo de formação do colágeno), comprometimento da atividade da lisil-oxidasee da hidroxilação (participam dos processos enzimáticos na formação do colágeno) e proliferação anormal de fibroblastos compõemcausas na formação de hérnias inguinais.
O tabagismo tem relaçãocomprovada com o surgimento de hérnias inguinais, pois estimulam a produção de determinadas enzimas (elastases neutrofílicas)que interferem na composição do colágeno, enfraquecendo a parede abdominal.
Grifei
Então, conclui o perito:
O Reclamante foi submetido a exame clínico-cirúrgico do qual,junto com os documentos médicos dos autos se chega às seguintes considerações:
É portador de hérnia inguino-escrotalà direita, devendo ser submetido a tratamento cirúrgico e com grandes chances de cura.
Não há incapacidade parao trabalho, entretanto, sob o ponto de vista médico, não é aconselhável que exerça atividades laborativas ou outras que obriguema realização de esforços físicos em demasia até a realização do tratamento adequado e sua recuperação.
Como já relatado no itemComentário, não é possível estabelecer relação de nexo causal entre o surgimentoda hérnia inguinal e a atividade laborativa do Autor.
Para o aparecimento dahérnia, há necessariamente que existir um defeito na parede abdominal na altura da região inguinal o qual se forma duranteou logo após o nascimento e a partir de então é que, com os sucessivos aumentos da pressão intra-abdominal os quais ocorremdurante a vida do indivíduo, surge a hérnia inguinal
(grifei).
Em resposta aos quesitos formulados, o perito reitera aseguinte conclusão:
Nãose trata de doença ocupacional ou de acidente de trabalho
. A etiologia da hérnia depende de um defeito congênito na altura da parede abdominal,ao nível da região inguinal e a partir de então é que, com os sucessivos aumentos da pressão intra-abdominal os quais ocorremdurante a vida do indivíduo, surge a hérnia inguinal.
Grifei
Por fim, em sua manifestação sobre o laudo, o autor refere que:
O laudo médico informa que existe a patologia de hérnia inguino-escrotalà direita redutível.
O perito médico reconheceque o reclamante encontra-se com problemas graves de saúde inclusive devendo ser submetido à cirurgia, no entanto, concluique não é possível estabelecer relação de nexo causal entre o surgimento da hérnia inguinal e a atividade laborativa do Autor.
O reclamante desde jávem impugnar a perícia médica realizada, eis que as conclusões médicas são totalmente contraditórias, em um momento reconhecea patologia do reclamante porém alega que não houve acidente de trabalho e como também doença ocupacional.
Ora, se o reclamante foiadmitido em condições saudáveis e como resultado do esforço empregado à reclamada é dispensado doente, torna-se evidente queo reclamante sofreu acidente de trabalho típico da construção civil.
Ainda que me incline pela adoção da teoria do risco e daresponsabilidade objetiva, em se tratando de acidente do trabalho, a jurisprudência hodierna tem primado pela adoção da teoriada responsabilidade civil subjetiva do empregador por danos sofridos por seu empregado decorrentes de acidente do trabalho,nos termos do art. 7º, XXVIII, da Constituição Federal, do art. 186 do novo Código Civil e da Súmula nº 229 do STF, exigindoa presença de culpa ou dolo na conduta do empregador. Basta, entretanto, a presença de culpa levíssima para a responsabilizaçãodo empregador. É que, em se tratando de observância das normas de proteção e segurança do trabalho, o ônus da prova é invertido,cometendo-se ao empregador, deste modo, a demonstração de que não apenas alcançou ao trabalhador os equipamentos necessáriose eficazes à sua proteção/segurança, como igualmente fiscalizou e forneceu as orientações e treinamento técnico necessários.
No caso concreto, no entanto, ainda que as atividades do autor envolvessemcerto risco ergonômico, não resultou evidenciada nos autos a culpa da reclamada para a instalação ou agravamento das lesõesdo autor. Ao contrário, o laudo pericial médico é taxativo ao afirmar que as lesões apresentadas pelo autor são decorrentesde fatores congênitos e hereditários, sem qualquer relação com o trabalho realizado em favor da reclamada.
Cabe ressaltar, ainda, a referência feita pelo magistrado de origemde que "o próprio autor já se mostrava sabedor da remota origem de suas lesões. Veja-se que ele declarou ao perito doINSS que "faz tempo" que possuía a hérnia inguinal. Isso em perícia realizada no dia 27.08.2012, ou seja,apenas 2 meses do término do contrato de trabalho com a ré, e 3 meses depois do seu inicio. (Id2986659, grifei)".
Do contexto probatório resta evidente que a lesão que o autor apresentapossui origem preponderantemente congênita, não havendo qualquer elemento a indicar que suas atividades teriam agravado oupotencializado o surgimento de tais lesões.
A prova oral não socorre a tese do autor, e nem se presta a infirmaras conclusões do perito.
A testemunha Claudemir Oliveira da Silva, convidada a depor peloreclamante, relata que "o reclamante trabalhou por cerca de 04 meses na reclamada; que sabe disso por morar perto do reclamante(…) apresenta sua CTPS neste ato, havendo registro de trabalho na reclamada no período de 02/05/2012 a 30/07/2012; que odepoente afirma que saiu antes da empresa do que o reclamante", o que vai absolutamente de encontro ao período contratualdeclinado pelo próprio reclamante na inicial (de 02/05/2012 a 24/05/2012, ou seja, por 22 dias).
Já a testemunha Severino Lanes Moreira, convidada pela reclamadaa depor, diz que "trabalhou com o reclamante mas não lembra muito porque foi por poucos dias (…) viu o reclamante nocanteiro, mas não prestou serviço diretamente ao depoente".
De forma específica, no que se refere à hérnia inguinal, o esforçofísico e levantamento de peso, exigidos nas atividades do autor, também foram descartadas como causa, ou mesmo concausa parao aparecimento da lesão. Saliento a informação do expert no sentido de que a patologia do autor possui característicaspróprias e decorre de uma condição pessoal do indivíduo, independente do trabalho por ele realizado.
Assim, não há nos autos elementos capazes de infirmar as conclusõesapresentadas pelo perito médico, não havendo como se estabelecer qualquer nexo entre a hérnia inguinal que o autor apresentoucom as atividades realizadas na reclamada.
Não reconheço a responsabilidade civil da empregadora pelos danosà saúde do reclamante, não havendo, assim, em falar em estabilidade no emprego ou em dever de indenizar o empregado, querpor danos morais quer por danos materiais.
Mantida a sentença de improcedência, não há falar em honoráriosassistenciais.
A presente decisão não viola nenhum dos dispositivos legais e/ouconstitucionais invocados, os quais tenho por prequestionados para todos os efeitos, inclusive para o disposto na Súmula 297do TST.
CARMEN IZABEL CENTENA GONZALEZ
Relator
PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:
DESEMBARGADORA CARMEN GONZALEZ (RELATORA)
DESEMBARGADOR EMÍLIO PAPALÉO ZIN
DESEMBARGADORA DENISE PACHECO
