Direito do Trabalho

TRT4. DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DANO MORAL.

Atualizado 16/03/2016

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TRT4. DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DANO MORAL.
Identificação

PROCESSOnº 0020472-08.2014.5.04.0030 (RO)RECORRENTE: CONTAX S.A.RECORRIDO: KATY DA SILVA OLIVEIRARELATOR: RICARDO CARVALHO FRAGA

EMENTA

DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DANO MORAL. Reconhecida a doença ocupacional, impõe-seo dever de indenizar.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário da reclamada.

Intime-se.

Porto Alegre, 08 de março de 2016 (terça-feira).

Cabeçalho do acórdão
Acórdão
RELATÓRIO

Ajuizada a ação trabalhista em face do contrato de trabalho apontado na inicial no período de 18.11.2009a 18.04.2013, foi proferida sentença.

A reclamada recorre, buscando a reforma da sentença quanto à doençado trabalho reconhecida na sentença, com a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, estabilidade provisória,FGTS e honorários advocatícios.

A reclamante apresenta contrarrazões.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA.

1. ESTABILIDADE. DOENÇA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.

O juízo de origem condenou a reclamadaao pagamento de:

a) Indenização por danos morais no montante de R$ 15.000,00 (quinze milreais); b) Indenização pela estabilidade provisória correspondente ao período em que esteve injustamente afastada do trabalho- de 18.04.2013 a 10.03.2014 – que corresponde aos salários do período, com reflexos em férias com 1/3, 13º salários, aviso-prévioe FGTS com 40%; c) FGTS relativamente ao período de afastamento previdenciário;

Recorre a reclamada, buscando ser absolvida da condenação.Aduz que não pode ser mantida a decisão que reconheceu o nexo causal entre a moléstia da reclamante (Transtorno do pânico,)e as atividades desenvolvidas na empresa, sob fundamento de que a prova médica apurou que a lesão está relacionada ao trabalho(concausa) e que foi corroborada pela prova oral produzida. Em suma, a reclamada afirma que não existe nexo causal entre amoléstia da reclamante e as atividades desempenhadas no contrato com a reclamada. Mantida a condenação em danos morais, buscaredução para R$ 5.000,00.

A reclamante era operadora de telemarketing. Dizque fazia o atendimento de clientes da NET do Rio Janeiro. Os atendimentos eram focados na área técnico-financeirana maioria e também em vendas e trocas de pacote.

Na inicial, disse a reclamante que trabalhou para a reclamada, como"Atendente Net I", no período de 18.11.2009 a 18.04.2013, quando foi despedida sem justa causa. Alega que, ao executar suastarefas, sofreu pressão psicológica, vez que a empresa exigia o cumprimento de metas sem oferecer meios para que os funcionáriospudessem atingi-las. Relata que as cobranças foram inúmeras, culminando em síndrome do pânico e depressão CID F41.0 (Outrostranstornos ansiosos), Transtorno de personalidade com instabilidade emocional (CID F60.3). Sinala que não houve emissão deCAT e também que permanece realizando tratamento psiquiátrico para a moléstia adquirida em decorrência do contrato de trabalhoe requer o pagamento de indenização pela estabilidade provisória, danos morais e FGTS do período de afastamento previdenciário.

A reclamante juntou alguns atestados médicos que confirmam o tratamentopara depressão, inclusive com medicamentos controlados (Id 2343415). Também restou comprovada a fruição de benefício previdenciáriopor 'Transtorno do Pânico', no período de 30.06.2011 a 10.03.2013 (ofício do INSS de Id

2989675).

O perito que examinou a trabalhadora afirmou que ela apresenta

"quadro clínico compatível com a CID 10 F41.0 – Transtorno do pânico,atualmente em remissão e CID 10 F60.3 – Transtorno de personalidade emocionalmente instável." (Id 6ff9765).Concluiu ainda que "existiu incapacidade laborativa para a sua função", mas que:

"Não há relação de nexocausal do quadro psiquiátrico com o trabalho exercido na reclamada. A presença de nexo concausal entre o transtorno do pânicoe o trabalho na reclamada depende de prova judicial."

Disse o perito que "O transtorno do pânico não temnexo causal com o trabalho por que suas causas principais são genéticas/hereditárias. Entretanto, o transtorno do pânico podeter sido desencadeado pelo trabalho na reclamada. Deixo a critério desse Juízo, através maneira que achar mais pertinente(prova testemunhal ou outra), avaliar se o relato da autora quanto ao assédio moral sofrido ocorreu da forma descrita no laudopericial. Sendo dessa forma, pode-se afirmar que o transtorno do pânico foi desencadeado pelo trabalho. Casocontrário, o estresse no trabalho é somente um sintoma da doença e a doença seria secundária as suas interpretações" (grifoatual).

A testemunha trazida pela autora afirmou:

"que foi colega de trabalho da reclamante; que a depoente era supervisorade atendimento e a reclamante era operadora de telemarketing; que trabalharam juntas por quase um ano; que a reclamante seafastou por depressão, crise de pânico, recebendo benefício previdenciário; que não foi supervisora da reclamante; que antesde ser supervisora a depoente era auxiliar e nesta função ajudou muito a reclamante; que a depoente se aproximou da reclamantequando este teve uma crise na reclamada; que a supervisora da reclamante na época era Michele; que o trabalho na reclamadaestressava os operadores e os supervisores; que havia choque de P.A´s, ou seja mais de um operador disputando a mesma base;quehavia metas a serem cumpridas tanto de aderência, abscenteísmo, tempo médio de operações;que a cobrança das metas dos operadoresera feita pelo supervisores; que a cobrança era feita na maioria das vezes em frente a todos os empregados; que o supervisorcobrava diretamente o operador; que a depoente fazia este tipo de cobrança aos operadores; que quando a depoente conheceua reclamante ela era bem tranquila; que uma das crises da reclamante foi quando houve troca de supervisor; que a reclamantenão queria trabalhar com esta nova supervisora pela maneira como ela fazia as cobranças; que os clientes também xingavam osoperadores, que era comum este tipo de atitude do cliente principalmente na Região do Rio de Janeiro, de onde eram os clientesque atendiam; que a reclamante seguiu trabalhando até que não tinha mais condições, por falta de equilíbrio emocional; quea depoente soube do motivo do afastamento da reclamante por ser "bem ligada" à reclamante em razão da função de assistente;que a dava para perceber que a reclamante tinha problemas; que às vezes ela colocava atestado; "

A única testemunha trazida pela empresa limitou-se a acompanhara tese da defesa, negando qualquer tipo de assédio moral ou ambiente hostil, e o assistente técnico da empresa também concluiupela ausência de nexo causal .

O juízo de origem considerou, pelos elementos dosautos, que a origem dos problemas psiquiátricos da autora é essencialmente genética, conforme bem explicado no laudo. Entretanto,a exagerada cobrança de metas por parte da empresa serviu como potencial agravante de seus problemas emocionais,conforme demonstrou a única testemunha trazida pela autora, depoimento antes transcrito. Assim constaram os fundamentos dasentença:

Nesse contexto, entendo que o ambiente laboral que era oferecido pelareclamada somente lhe prejudicou emocionalmente. Note-se que o INSS, ainda que não tenha concedido o benefício acidentário,registrou seus relatos acerca do assédio moral praticado pela ré (Id 2989675).

A avaliação pericial éconclusiva, e foi devidamente corroborada pela prova oral, conferindo-se o nexo de concausa.

(…)

Não há dúvidas de quea autora estava executando ordens da empregadora quando foi atingida na sua integridade física, sem que tenha contribuídode qualquer modo para os danos ocasionados, restando clara a relação com o labor executado. Nesse diapasão, pelas provas carreadas,reconheço a responsabilidade da ré pelos danos ocasionados, restando evidenciado o dever de indenizar.

(grifo original).

Quanto ao nexo causal, nos termos do art. 20 da Lei nº8.213/91, equiparam-se a acidente de trabalho a doença profissional e a doença do trabalho, assim entendidas, respectivamente,a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar à determinada atividade e constante da respectiva relaçãoelaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, e a adquirida ou desencadeada em função de condições especiaisem que o labor é realizado e que com ele se relacione diretamente. Em todos os casos, para que seja equiparada ao acidentede trabalho, a doença deve ter relação de causa e efeito com a atividade laboral desenvolvida.

O conjunto da prova produzida nos autos autoriza concluir pela existênciade nexo causal.

Entende-se pela conduta culposa do reclamado, o qual não observouda forma devida as medidas de segurança e medicina do trabalho. Ressaltem-se as regras previstas na NR 17 da Portaria 3.214/78do Ministério do Trabalho e Emprego, relacionadas com normas de ergonomia, as quais não foram devidamente observadas pelademandada.

a) Indenização por dano moral.

Por conseguinte, o reclamado tem o dever de indenizar aautora pelos danos sofridos. Entende-se que a doença ocupacional acarretou-lhe problemas emocionais (transtorno do pânico),que lhe causaram insegurança, aflição, que resultam, logicamente, em abalo moral.

Quanto ao valor da indenização por dano moral, são oportunas algumasconsiderações. Dentro do quadro mais geral dos processos habitualmente em exame, se pode afirmar que a lesão em análise temalguma gravidade. A reclamada não é de pequeno porte. A duração do contrato é próxima a quatro anos. Sendo assim, nestesautos, fica-se com o valor de R$ 15.000,00 como o mais razoável para a indenização por dano moral, conforme deferido na sentença,não cabendo minorar seu valor.

b) Estabilidade provisória.

Acerca da estabilidade provisória, constou na sentençaque:

"o benefício previdenciário foi usufruído de 30.06.2011 a 10.03.2013.Em que pese o mesmo ter sido não ter sido da espécie acidentário, está sendo reconhecida nestes autos a relação – ainda queconcausal – com o labor. Assim, a reclamante era detentora de estabilidade, na forma do artigo 118 da Lei 8213/91. Ignorar-seesse fato constituiria uma afronta aos princípios básicos de proteção à saúde do trabalhador. Se o infortúnio por ela abarcadoteve origem/desencadeamento no serviço prestado à reclamada, não pode essas deixá-la ao desabrigo, esquivando-se de sua responsabilidade,e dos riscos a que está sujeita por força do seu empreendimento (art. 2º da CLT). Deixa de prosperar, nesse sentido, sua tesede que a demora no ajuizamento da demanda estaria revestida apenas da intenção de ser indenizada. Aplica-se ainda a Súmulanº 378 do TST,…".

Com efeito, no caso dos autos, aplicável oentendimento consubstanciado na Súmula 378, II, do TST, no sentido de que são pressupostos para a concessão da estabilidadeo afastamento superior a 15 dias e a consequente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida,doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. Embora a autora, durante a contratualidade,não tenha se afastado em auxílio-doença acidentário, entende-se que o fato de a reclamada permitir a realização de atividadesque acabam gerando doenças ocupacionais, atrai para si a responsabilidade de indenizar.

Cumpre referir o entendimento de não haver necessidade do gozo deauxílio-doença acidentário para se entender devida a garantia ao emprego prevista no art. 118 da Lei 8.213/91.

Assim constatada a doença ocupacional na época da despedida, tem-seque a reclamante era beneficiária de garantia no emprego. Considerando-se que a confirmação do nexo causal entre a doençae a atividade laboral ocorreu após a extinção do contrato de trabalho, entende-se preenchidos os requisitos da Súmula 378,II, do TST para a concessão da indenização substitutiva decorrente da estabilidade provisória a que tinha direito o reclamante,quando da despedida, prevista no art. 118 da Lei 8213/91.

Sentença mantida.

c) FGTS relativamente ao período deafastamento previdenciário.

Em decorrência, o juízo de origem entendeu devidos tambémos depósitos do FGTS relativamente ao período de afastamento previdenciário.

Lembra-se que o art. 20, item II, da Lei nº 8.213/91, equipara adoença ocupacional a acidente do trabalho. Assim, entende-se caber o recolhimento, conforme art. 15, § 5º, da Lei nº8.036/90, carecendo de relevância o fato de o reclamante ter percebido auxílio-doença previdenciário. São devidos os depósitoscorrespondentes ao FGTS do período, assim como considerado na sentença.

Nesse sentido, os seguintes acórdãos desta Turma: nº 0001486-89.2010.5.04.0662RO (TRT da 04ª Região, 3a. Turma, publicado em 05-08-2014, Des. Ricardo Carvalho Fraga – Relator. Participaram do julgamento:Des. Maria Madalena Telesca, Des. Gilberto Souza dos Santos); e 0000283-27.2012.5.04.0661 RO (TRT da 04ª Região, 3a. Turma,publicado em 11-12-2013, Juiz Convocado Marcos Fagundes Salomão – Relator. Participaram do julgamento: Des. Luiz Alberto deVargas, Des.ª Maria Madalena Telesca).

Sentença mantida.

2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

Alega a reclamada que ausentes os requisitos impostos pelalei, especificamente a credencial sindicaldeixa a reclamante de fazer jus a tal benefício.

A reclamante é pobre nos termos da lei, declarando-se como tal (Id2343406).

Entende-se que são devidos os honorários ao seu procurador, na basede 15% do montante da condenação, sendo cabível a aplicação da Lei 1.060/50, que regula, em geral, a assistência judiciáriagratuita, ainda que sem a juntada da credencial sindical. Medite-se que outra interpretação desta mesma Lei, com base na Lei5.584/70, implicaria em sustentar o monopólio sindical da defesa judicial dos trabalhadores, o que seria ineficiente paramuitos trabalhadores.

Recorde-se, ainda, que ao Estado incumbe a prestação de assistênciajudiciária aos necessitados, nos termos do art. 5º, LXXIV da Constituição, motivo pelo qual não se pode adotar o entendimentoexpresso em diversas manifestações jurisprudenciais do TST, inclusive a Súmula 219. Vale, ainda, salientar que a InstruçãoNormativa 27 do mesmo TST já admite o cabimento de honorários para as demais ações, sobre relações de "trabalho". Ademais,em setembro de 2005, o Pleno do TRT-RS cancelou sua anterior súmula 20 no sentido do descabimento dos honorários buscados.Ademais, recorde-se o art. 389 do Código Civil sobre a reparação integral.

Note-se que o art. 133 da Constituição Federal, apesar da sua relevância,não foi o exato embasamento legal desta atual decisão. De qualquer modo, é regra que não pode deixar de ser observada.

Hoje, nesta 4ª Região, nos julgamentostrazidos a esta 3ª Turma, percebe-se um número expressivo de trabalhadores, superior a metade, que vem a juízo sem a assistênciade seu sindicato.

Neste quadro estadual, que se acreditapossa ser superado, condicionar o reconhecimento ao direito de assistência judiciária à juntada de credencial sindical serialimitar tal beneficio a alguns poucos.

Mais ainda, nesta 4ª Região, é próximo a zero o número de processos ajuizados diretamente pela parte, por meio do jus postulandi.

Quanto à base de cálculo dos honorários advocatícios, estes devemser calculados sobre o valor total da condenação,excluídas as custas processuais. Logo, referidoshonorários devem ser calculados sobre o total devido à parte autora,antes dos cálculos das contribuições fiscais e parafiscais. O líquido deve ser interpretado como aquilo que é devido à parte.As contribuições previdenciárias e fiscais são devidas pela parte. Portanto, são retiradas do valor pago após o recebimento.Assim, não há como excluí-los para o cálculo dos honorários assistenciais.

Nesse sentido, a OJ 348 da SDI-I do TST e a Súmula 37 deste TRT.

Da mesma forma, a jurisprudência do TST, consubstanciada nos AcórdãosRR 1206/2001.0 – em que Relator o ministro João Oreste Dalazen – e RR – 29/2003-087-03-00, publicado no DJ – 05/11/2004, emque relator o Ministro LELIO BENTES CORRÊA, cuja ementa se transcreve:

"RECURSO DE REVISTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. O artigo11, § 1º, da Lei nº 1.060 dispõe que os honorários de advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinzepor cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença, ou seja, sobre o valor total do principal, sem qualquer dedução.Recurso de revista conhecido e provido".

Sentença mantida.

Assinatura

RICARDO CARVALHO FRAGA

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR RICARDO CARVALHO FRAGA (RELATOR)

DESEMBARGADOR CLÁUDIO ANTÔNIO CASSOU BARBOSA

DESEMBARGADORA MARIA MADALENA TELESCA

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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