Direito do Trabalho

TRT4. DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE.

Atualizado 06/05/2017

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TRT4. DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE.
Identificação

PROCESSOnº 0020089-77.2016.5.04.0121 (RO)RECORRENTE: —–RECORRIDO: —–RELATOR: CLAUDIO ANTONIO CASSOU BARBOSA

EMENTA
DOENÇA OCUPACIONAL. ESTABILIDADE. Tendo sido constatadoque o trabalho agiu, ainda que não de forma exclusiva, para o desencadeamento da doença, caracterizada está a doença ocupacionalequiparada ao acidente do trabalho. Entretanto, não havendo o preenchimento dos requisitos, não é o trabalhador detentor daestabilidade de que trata o art. 118 da Lei 8.213/91 ou da indenização equivalente.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 3ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, dar parcial provimento ao recurso ordinário do reclamante parareconhecer o nexo concausal entre a lesão na coluna e as atividades desenvolvidas em favor da reclamada. Honorários periciaisrevertidos à reclamada, mantido o valor arbitrado na origem. Custas pela reclamada, a serem calculadas sobre o valor atribuídoà causa, nos termos do art. 789, III, da CLT.

Intime-se.

Porto Alegre, 25 de abril de 2017 (terça-feira).

Cabeçalho do acórdão
Acórdão
RELATÓRIO
Inconformada com a decisão que julgou improcedentes os pedidos,a parte autora interpõe recurso ordinário. Postula a reforma da decisão em relação à doença ocupacional e honorários advocatícios.

Sem contrarrazões, vêm os autos para julgamento.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO
RECURSO DO RECLAMANTE

1. DOENÇA OCUPACIONAL. RESPONSABILIDADE DA RECLAMADA

Inconformado com a decisão que indeferiu a pretensão dereconhecimento de doença ocupacional e, consequentemente, do pleito indenizatório, o reclamante recorre. Assevera que nãoobstante o perito médico tenha reconhecido que a patologia tem origem degenerativa, as atividades laborais atuaram, ao menos,como concausa para as lesões na coluna lhe acometem. Postula a reforma da sentença, com o consequente reconhecimento da doençaocupacional.

Na inicial o autor alegou que no desempenho de suas funções desenvolveudoença ocupacional equiparada ao acidente de trabalho. Relata que em novembro de 2014 começou a sentir dores na coluna e pescoço,ocasião em que foi diagnosticado apenas um torcicolo (boletim 199194, CID M436). Esclarece que em 12 de fevereiro de 2015,foi emitido o resultado da ressonância magnética da coluna lombossacra e detectada a degeneração do disco invertebral L5-Si,apresentando pequena protrusão focal mediana com ruptura do anel fibroso e pequena protrusão discal mediana e de base amplaem L4-L5. Sustenta fazer jus à estabilidade provisória no emprego ou indenização.

A reclamada defendeu-se negando a existência de nexo causal entrea patologia e o labor. Aduz tratar-se de condição genética.

A magistrada de origem acolheu o laudo pericial, concluindo pelainexistência de nexo causal entre a patologia do autor e as tarefas desempenhadas junto à reclamada.

Por ocasião da sentença, o Juízo de origem assim se pronunciou (Id.0e9999b):

O autor impugnou o laudo pericial, ao argumento de que o expert considerouque o labor junto à empresa ré se desenvolveu por poucos meses, quando, em verdade, se deu por dois anos e dois meses.

Inicialmente, a insurgênciada parte autora não se harmoniza com a informação do perito. A referência do perito não foi ao tempo de serviço do reclamante,mas sim ao curto período decorrido entre o início da prestação de serviços e o surgimento dos primeiros sintomas da doença.Diz o perito: “Reclamante laborou pouco tempo na Reclamada, até apresentar os primeiros sintomas álgicos, aproximadamente8 a 9 meses”. Não verifico, assim, a disparidade invocada pela parte autora no laudo pericial.

Considerando, no entanto,que a conclusão do perito é embasada no fato de se tratar de uma doença degenerativa, de ordem constitucional, sem qualquernexo de causa com as atividades desenvolvidas na empresa, a impugnação do autor não tem qualquer relevância para o deslindedo feito. Os documentos anexados corroboram às conclusões do perito. A CAT anexada neste feito se refere a enfermidade diversa(Id. 836c976, contusão de dedos com lesão de unha), com causa de pedir distinta, e que sequer gerou afastamento. Não há elementosde prova nos autos hábeis a demonstrar conclusão distinta daquela apresentada no laudo médico.

Destaque-se que em pesquisarealizada com base de dados de afastamento no Estado de São Paulo no ano de 2014, por exemplo, constatou-se que os problemasde coluna aparecem como a segunda maior causa de afastamentos em geral na previdência social do Estado, passando a primeirolugar se considerada a capital paulista isoladamente. Estendendo a pesquisa ao país inteiro, no Brasil a dor lombar, nas costase transtornos de discos invertebrais somente perdem o primeiro lugar para o t u m o r d e ú t e r o (http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/09/1520341-veja-as-doencas-que-mais-dao-afastamento-no-inss.acessadoem 7.11.2016). Isto demonstra que a enfermidade que ora se discute não é prevalecente somente no âmbito da empresa ré, sendodoença que acomete a todos indistintamente, sejam estes trabalhadores ou até desempregados, pois, como mencionado no laudo,trata-se de enfermidade de origem degenerativa com causa constitucional, não sendo difícil encontrar quem, em um círculo deamigos mais aberto, não conheça alguém que após os 30 anos não apresente queixas desta natureza, independente da profissão,ou antes mesmo desta idade.

Sendo assim, não havendoprovas hábeis a afastar as conclusões do laudo, acolho o referido parecer, e, com base nos fundamentos nele contidos, julgoimprocedente o pedido da letra E da inicial (Id. a9c788f – pag. 7).

Após exame físico e análise de exames apresentados, o perito concluiuda seguinte forma (Id. 25c3e44):

O RECLAMANTE, A PARTIR DO ANO DE 2014, PASSOU A APRESENTAR QUADRO ÁLGICOAO NÍVEL DA COLUNA VERTEBRAL LOMBOSSACRA;

BUSCOU ATENDIMENTO MÉDICO,AVALIADO COM EXAMES COMPLEMENTARES DE IMAGEM, COM DIAGNÓSTICO DE DISCOPATIA DEGENERATIVA, TRATADO CONSERVADORAMENTE, COM OBTENÇÃODE RESULTADOS TERAPÊUTICOS EXITOSOS;

O EXAME FÍSICO DA PARTERECLAMANTE DEMONSTROU A INEXISTÊNCIA DE DÉFICITS FUNCIONAIS OU ESTÉTICOS.

NÃO OCORREU EMISSÃO DACOMUNICAÇÃO DE ACIDENTE DO TRABALHO – CAT;

NÃO HOUVE ENCAMINHAMENTOAO ÓRGÃO PREVIDENCIÁRIO DEVIDO À INCAPACIDADE LABORATIVA;

O RECLAMANTE É PORTADORDE LESÕES CRÔNICO/DEGENERATIVAS, AO NÍVEL DA COLUNA VERTEBRAL LOMBOSSACRA, SEM POSSÍVEL CORRELAÇÃO COM FATORES OCUPACIONAIS

O NEXO TÉCNICO CAUSALOU CONCAUSAL NÃO RESTOU ESTABELECIDO;

INEXISTE NECESSIDADE DEACOMPANHAMENTO MÉDICO/FISIOTERÁPICO OU DE NOVOS TRATAMENTOS;

A PARTE RECLAMANTE NÃOÉ PORTADORA DE DOENÇA OCUPACIONAL;

INEXISTEM DÉFICITS FUNCIONAISPARA QUANTIFICAÇÃO JUNTO À TABELA SUSEP/DPVAT;

O AUTOR ENCONTRA-SE APTOPARA TRABALHAR;

INEXISTEMPREJUÍZOS ÀS SUAS ATIVIDADES PESSOAIS;

NÃO FORAM CONSTATADOSDANOS DE NATUREZA ESTÉTICA.

Ao revés da posição da origem, não acolho a conclusão pericial,no caso em apreço.

De plano, destaco que o juízo não está adstrito ao laudo pericial.Nos termos do artigo 479 do NCPC, o juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando nasentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o métodoutilizado pelo perito.

O reclamante trabalhou na reclamada no período de 20 dedezembro de 2013 a 12 de agosto de 2015. Exerceu a função de Montador de Tubulação, consoante FRE de Id. 1e9485f.

Conforme consta do laudo pericial médico, no exercício de suas atividadeso reclamante executava montagem de estruturas de navios e outras atividades afins. Recebeu os seguintes EPIs: Luvas de couro;Óculos de segurança; Calça; Camisa/Camiseta; Calçado de segurança; Protetores auditivos; cinto de segurança (Id. 25c3e44-Pág. 3).

O resultado de exame ressonância magnética da coluna lombossacra,datado de 12 de fevereiro de 2015 (Id. aed5e2d) e o laudo médico pericial não deixam dúvidas quanto ao fato de que o reclamanteapresenta uma lesão na coluna lombar, consistente na degeneração do disco intervertebral L5-S1, apresentando pequena protrusãofocal mediana com ruptura do anel fibroso e pequena protrusão discal mediana e de base ampla em L4-L5 (CID – M51.1) (Id.ID. 25c3e44 – Pág. 7).

O Atestado de Saúde Ocupacional Admissional (ID 836c976 – Pág. 4)revela que na admissão o reclamante não contava com qualquer moléstia, estando apto para o trabalho.

Outrossim, a atividade da reclamada, ambiente no qual o reclamanteprestou serviços, está enquadrada na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE sob o código 3011-3/01 – Construçãode Embarcações e Estruturas Flutuantes. Conforme tabela anexa ao Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99),atualizado pelo Decreto nº 6.957/2009, verifica-se que o intervalo CID 10 M51.0 – Transtornos de discos lombares e de outrosdiscos intervertebrais com radiculopatia, guarda relação com o CNAE da empresa demandada. Ou seja, existe Nexo Técnico EpidemiológicoPrevidenciário – NTEP) entre a patologia apresentada pelo reclamante e as atividades desempenhadas na reclamada, nos termosdo art. 21-A da Lei nº 8.213/91.

Destaco que a reclamada possui grau de risco 3 (elevado) para acidentesdo trabalho, conforme Relação de Atividades Preponderantes e Correspondentes Graus de Risco pela Classificação Nacional deAtividades Econômicas, constante do Anexo V do citado Regulamento, previsto ainda no inc. II do art. 22 da Lei nº 8.212/91,que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio, e dá outras providências.

Importa referir que a indicação de NTEP está embasada em estudoscientíficos alinhados com os fundamentos da estatística e epidemiologia e aponta a existência de uma relação entre a lesãoou o agravo e a atividade desenvolvida pelo trabalhador.

De acordo com o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP – afunção do autor compreende o desenvolvimento das seguintes atividades: interpretar desenhos de montagem; executar trabalhosdiretos à produção; operar máquinas, ferramentas e equipamentos de fácil manuseio; executar serviços de fabricação, montagem,ponteamento, e limpeza do material; preparar peças e superfícies para solda, moldagem e pintura; promover a preservação dalimpeza e organização do local ade trabalho, equipamentos e materiais a fim de manter boas condições de uso; acondicionaros resíduos gerados nas atividades em recipientes e locais apropriados, preservando os aspectos de segurança, higiene, qualidadee proteção ao meio ambiente; executar os serviços dentro das normas locais pertinentes; cumprir as exigências e padrões desegurança industrial; executar os serviços dentro das normas locais pertinentes; cumprir as exigências e padrões de segurançaindustrial; possuir conhecimento técnico básico relativo à atividade, normas de segurança do trabalho e EPIs.

No caso, apesar de o perito afastar o nexo de causalidade/concausalidade,não há como deixar de observar que a natureza da atividade realizada pelo reclamante (Montador de Tubulação), por si só, demandarisco ergonômico, pois exige flexão do tronco/coluna e movimentação de membros superiores, situações que certamente acarretamsobrecarga da coluna lombar.

Resta evidenciado, pois, que o trabalho realizado em benefício dareclamada contribuiu para o surgimento ou agravamento da moléstia da parte autora, ainda que possam coexistir, eventualmente,outras causas decorrentes de situações específicas ou de ordem pessoal.

Pertinente o entendimento de Sebastião Geraldo de Oliveira acercadas concausas “in” Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, 7ª ed., LTr, 2013, pp. 56-57:

Para o acidente do trabalho em sentido amplo, podem contribuir causasligadas à atividade profissional com outras extralaborais, sem qualquer vínculo com a função exercida pelo empregado

[…]

No entanto, a aceitaçãonormativa da etiologia multicausal não dispensa a existência de uma causa eficiente, decorrente da atividade laboral, que’haja contribuído diretamente’ para o acidente do trabalho ou situação equiparável. Em outras palavras, a concausa não dispensaa causa de origem ocupacional. Deve-se verificar se o trabalho atuou como fator contributivo do acidente ou doença ocupacional;se atuou como fator desencadeante ou agravante de doenças preexistentes ou, ainda, se provocou a precocidade de doenças comuns,mesmo daquelas de cunho degenerativo ou inerente a grupo etário.

As concausas podem ocorrerpor fatores preexistentes, supervenientes ou concomitantes com aquela causa que desencadeou o acidente ou a doença ocupacional.

A teor de tal ensinamento, e observado o conjunto probatório,especialmente a existência de Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) entre a patologia do reclamante e as atividadespor ele desempenhadas na reclamada, nos termos do art. 21-A da Lei nº 8.213/91, concluo pela existência de causa relacionadaao trabalho, ainda que não de forma exclusiva.

No tocante à culpabilidade da reclamada, saliento, ainda, que apesarde alegadamente haver tomado as devidas medidas de segurança, estas não têm o condão de eximi-la de responsabilidade, porquantonão se mostraram suficientes para impedir o desenvolvimento da doença ocupacional. Ressalto, nesse sentido, que é dever doempregador zelar pela integridade física e psíquica de seus empregados que têm o direito de trabalhar em ambientes segurose saudáveis (art. 157 da CLT).

Assim sendo, estão presentes no caso dos autos os requisitos necessáriosà responsabilização do empregador pelos danos decorrentes de doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho, na formado previsto nos arts. 186 e 927 do Código Civil e 7º, XXVIII, da Constituição Federal.

Contudo, cabe destacar que o reclamante não postula o pagamentode indenização por danos morais em razão da doença ocupacional adquirida, mas apenas o reconhecimento do direito à garantiade emprego e a indenização correspondente.

No aspecto, oportuno referir que o art. 118 da Lei 8.213/91 prevêque o segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contratode trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário. Por sua vez, de acordo com o entendimento contido naSúmula nº 378, II, do TST, são pressupostos para o reconhecimento da garantia de emprego: o afastamento por período superiora 15 dias e o recebimento do benefício de auxílio-doença acidentário.

Contudo, no caso dos autos não há notícia de que o reclamante tenhapermanecido afastado de suas atividades por período superior a 15 dias, bem como não restou comprovada a concessão de benefícioprevidenciário. Ademais, o perito médico constatou que o autor não sofre de qualquer incapacidade ou redução funcional. Aocontrário, encontra-se, atualmente, desempenhando função similar em outra empresa do mesmo ramo econômico da reclamada.

Nesse contexto, ainda que se reconheça a natureza ocupacional dalesão sofrida pelo autor, os requisitos para a concessão da estabilidade decorrente de acidente de trabalho ao reclamantenão estão preenchidos.

Diante de todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso ordináriodo reclamante para reconhecer o nexo concausal entre a lesão na coluna e as atividades desenvolvidas em favor da reclamada.

Sendo a parte recorrida sucumbente no objeto da perícia, deve estaarcar com os honorários periciais em reversão, nos termos do artigo 790-B da CLT.

2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Não havendo condenação, não há falar em honorários advocatícios.

Nego provimento.

3. PREQUESTIONAMENTO

Todos os dispositivos legais e entendimentos sumuladosinvocados pelas partes, ainda que não expressamente mencionados, foram enfrentados mediante a adoção de tese explícita sobreas matérias, restando, portanto, prequestionados, à luz e para os efeitos do disposto na Súmula nº 297 do TST e na OJ nº 118da SBDI-1 da mesma Corte.

Assinatura

CLAUDIO ANTONIO CASSOU BARBOSA

Relator

VOTOS

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR CLÁUDIO ANTÔNIO CASSOU BARBOSA (RELATOR)

DESEMBARGADORA MARIA MADALENA TELESCA

JUIZ CONVOCADO LUIS CARLOS PINTO GASTAL

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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