TRT4. ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA.
Atualizado 07/07/2017
9 min. de leitura

PROCESSOnº 0000355-04.2014.5.04.0771 (AP)AGRAVANTE: FRANCIANE RAMOS PERES, IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS SAAGRAVADO: FRANCIANE RAMOS PERES, IMPORTADORA E EXPORTADORA DE CEREAIS SARELATOR: REJANE SOUZA PEDRA
ACORDAM os Magistrados integrantes da Seção Especializadaem Execução do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE PETIÇÃO DA EXECUTADApara excluir a multa de 20% por ato atentatório à dignidade da Justiça. Por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE PETIÇÃODA EXEQUENTE.
Intime-se.
Porto Alegre, 27 de junho de 2017 (terça-feira).
Busca a reforma da sentença quanto ao pagamento de multa de 20%sobre o valor de R$ 2.646,47, por ato atentatório à dignidade da justiça.
A exequente não apresenta contraminuta. Todavia, recorre adesivamente(id. 902deda – Pág. 32-34). Requer seja aplicada nova multa por ato atentatório à dignidade da Justiça.
Apresentadas contraminuta ao recurso adesivo (id. 902deda – Pág.40-42), os autos são encaminhados a este Tribunal.
É o relatório.
ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA
A executada insurge-se contra a multa de 20% sobre o valor de R$2.646,47, por ato atentatório à dignidade da justiça. Aduz que não agiu de má-fé quando retificou a conta apresentada em faceda impugnação da exequente. Após, em face da divergência das partes, os cálculos foram elaborados pelo contador ad hoc.Refere que o fato de ter cometido erro e(ou) não ter respondido toda a impugnação da exequente, por si só não autoriza talcominação. Sustenta que a decisão constitui afronta ao art. 5º, II e LV, da CF.
A exequente objetiva em seu recurso adesivo a cominação de novamulta por ato atentatório à dignidade da Justiça, sob o fundamento de que a executada tenta induzir em erro o Juízo, ao afirmarque o cálculo homologado é inferior ao por ela apresentado.
Analiso.
O art. 774 e seus incisos, do Novo CPC, considera como ato atentatórioà dignidade da Justiça o ato do executado que:
I – frauda a execução;
II – se opõe maliciosamenteà execução, empregando ardis e meios artificiosos;
III – dificulta ou embaraçaa realização da penhora;
IV – resiste injustificadamenteàs ordens judiciais;
V – intimado, não indicaao juiz quais são e onde estão os bens sujeitos à penhora e os respectivos valores, nem exibe prova de sua propriedade e,se for o caso, certidão negativa de ônus.
Parágrafo único. Nos casosprevistos neste artigo, o juiz fixará multa em montante não superior a vinte por cento do valor atualizado do débito em execução,a qual será revertida em proveito do exequente, exigível nos próprios autos do processo, sem prejuízo de outras sanções denatureza processual ou material.
Para melhor compreensão da matéria faço um pequeno resumo.Transitada em julgado a sentença, o Juízo determinou que as partes apresentassem cálculos de liquidação, tendo a executadaelaborado os cálculos do id. 967c75b – Págs. 44 e seguintes. A exequente impugnou os cálculos (id. 6e34d38 – Pág. 22 e seguintes),tendo o Juízo determinado que a executada revisasse seus cálculos e (ou) prestasse os esclarecimentos sobre os critérios adotadosna conta (id. 6e34d38 – Pág. 32-33). Em atendimento a determinação do Juízo da liquidação, a executada retificou em partea conta no id. 6e34d38 – Págs. 39 e seguintes. O exequente apresentou nova impugnação (id. 0649b56 – Págs. 13 e seguintes),tendo o Juízo proferido a seguinte decisão:
“Vistos.
A reclamada foi notificadapara revisar seus cálculos e proceder, desde logo, às alterações que entendesse cabíveis, bem como para, no caso de não concordarcom a impugnação da autora, esclarecer os critérios adotados na conta em relação a cada item objeto de divergência. A reclamadaapresentou a manifestação e os cálculos das fls. 204/212. Notificada acerca dos cálculos, a reclamante novamente os impugna.Alega a existência de várias incorreções.
A solução da controvérsianão envolve simples definição de um critério, visto que estão sendo apontados equívocos no levantamento de diferenças de horasextras.
Assim, a melhor soluçãoestá na remessa dos autos a um profissional de confiança do Juízo. Determino, portanto, a elaboração da conta de liquidaçãopelo auxiliar do Juízo referido no despacho da fl. 166, mantido o prazo de vinte dias para apresentação da conta. Deverá ocontador “ad hoc” proceder à dedução dos valores liberados à parte autora mediante alvarás das fls. 197/198.
O requerimento da autora(fls. 216/217) de aplicação de penalidade à reclamada, será apreciado por ocasião da homologação da conta de liquidação.
Ciência às partes.
Intime-se o contador “adhoc”.
“
Elaborado o cálculo de liquidação pelo contador do Juízo (id. 0649b56- Págs. 21 e seguintes), este foi homologado no id. 5e31b67 – Págs. 4-5, sem que tenha sido examinado o pedido de aplicaçãode multa por ato atentatório à dignidade de Justiça. Notifica a executada para efetuar o pagamento (id. 5e31b67 – Pág. 8),esta requereu a dedução do depósito recursal e, após, efetuou o pagamento da dívida apurada, conforme id. 5e31b67 – Págs.19-21. Após levantamento dos alvarás pela exequente, esta requereu o exame do pedido de ato atentatório à dignidade da Justiça,tendo o Juízo da execução proferido a seguinte decisão (id. 5e31b67 – Pág. 31-32):
“Vistos.
Requer a reclamante, àfl. 252, a aplicação de penalidade à reclamada por suposto ato atentatório à dignidade da Justiça, conforme alega em suasrazões da fl. 216.
Diante do requerido, cabedefinir o que segue:
I – Aplicação incorretado FACDT: Diferentemente do alegado pela autora, a reclamada, em seus cálculos retificados, aplicou o FACDT de 977,84596 paraatualização dos créditos. Equivoca-se a autora neste aspecto. Observe-se que às fls. 208, 209 e 210, a reclamada apura o “totaldevido” em cada mês, divide pelo FACDT da época e atualiza o valor multiplicando-o pelo FACDT de 977,84596, referido no cabeçalhoda coluna “TOTAL ATUALIZADO 977,84596”. Neste particular, improcede a inconformidade do autor.
II – Não consideraçãoda hora reduzida noturna: a reclamada, em sua manifestação das fls. 204/205, justificou seu procedimento alegando não havercondenação para pagamento de horas noturnas, nem mesmo diferenças destas. Assim, não silenciou sobre a matéria. Trata-se deinterpretação equivocada da reclamada sobre o comando condenatório, na medida em que a redução ficta da hora noturna não necessitade previsão na sentença para ser implementada. Não se pode, contudo, que este aspecto configure ato atentatório à dignidadeda Justiça.
III – Erro na soma: nesteaspecto, verifica-se que a reclamada não computou os 15 minutos diários no período de 22/04/2013 a 21/05/2013, no total de3 horas extras, apurados no demonstrativo das fls. 180/180-v. Computou somente as horas extras com adicional de 50% (15h44min).Mesmo alertada pela autora sobre o equívoco, a reclamada, nos cálculos complementares, silenciou a respeito e não fez a retificaçãocabível. Configura-se, aí, ato atentatório à dignidade da Justiça.
IV – Não utilização daremuneração completa: a reclamante apontou, à fl. 192, item “4”, equívoco no cálculo das horas extras por não ter sido computadoo adicional de quebra de caixa. Da mesma forma que no item “3”, acima, a reclamada não se manifestou sobre este aspecto, tampoucofez a retificação cabível. A sentença, em seus fundamentos, determina que “as horas extras acolhidas deverão ser calculadascom base em todas as parcelas salariais mensais recebidas com habitualidade (Súmula de nº 264 do TST)”. Diante da inobservânciado comando e do silêncio quando da apresentação dos cálculos complementares, configura-se mais uma vez o ato atentatório àdignidade da Justiça.
Diante do exposto, considerandoo definido nos itens “3” e “4”, acima, declaro que a reclamada cometeu ato atentatório à dignidade da Justiça quando da apresentaçãode sua manifestação e dos cálculos complementares das fls. 204/212, nos termos do art. 774, II, do CPC. Com amparo no dispostono art. 774, parágrafo único, do CPC, fixo multa no montante de 20% sobre o valor de R$2.646,47, apurado pelo contador “adhoc” nos cálculos de liquidação como total líquido a ser pago à reclamante, atualizado até 31.03.2016 (fl. 228-verso). Calculea Secretaria o valor atualizado e notifique-se a reclamada, na pessoa de seu procurador, para proceder ao pagamento no prazode quinze dias, sob pena de prosseguimento na execução. […].”
Notificada a executada a proceder o pagamento da multa,esta depositou o valor apurado e protocolou embargos à execução (id. 902deda – Págs. 1-6).
O Magistrado da execução assim decidiu os embargos à execução (id.902deda – Pág. 15-16):
“[…] Prima facie, destaco que a decisão de fls. 253 e verso, que condenoua embargante à multa por ato atentatório à dignidade da justiça, não desafia hipótese de embargos à execução.
Todavia, a fim de evitarfutura arguição de negativa de prestação jurisdicional, passo à análise meritória.
No caso sob apreço, nadecisão de fl. 253, a embargante foi condenada ao pagamento de multa de 20% sobre o valor de R$2,646,47, em razão de ato atentatórioà dignidade da justiça.
A decisão atacada é mantidapor seus próprios fundamentos, porquanto, conforme já explicitado, a embargante cometeu erro no cômputo das horas extraordináriasdeferidas, além de não ter utilizado a remuneração completa da exequente para fins de base de cálculo das parcelas deferidas,não havendo, sob tal aspecto, manifestação ou retificação pertinente, o que configura, conforme fundamentos já lançados nadecisão de fl. 253, ato atentatório à dignidade da justiça, nos termos do art. 774 do CPC.”
Não comungo do mesmo entendimento do Julgador de origem.A existência de erro ou equívoco no cálculo apresentado pela executada e sua retificação parcial, por si só não constituiconduta ou prática dolosa de ato ilícito processual. Verifico, ainda, que em face da divergência das partes, o Juízo determinoua elaboração dos cálculos por contador ad hoc e, após a sua homologação, a executada efetuou o pronto pagamento.Logo, não verifico que a executada tenha utilizado de meios artificiosos ou se oposto à execução, tampouco tenha resistidoinjustificadamente às ordens judiciais. Não se extrai, assim, intuito procrastinatório na conduta da agravante tanto na faseanterior a decisão impugnada, tampouco nas razões de seu apelo. Ao contrário do sustentado pela exequente, a divergência devalores quanto ao valor líquido apurado pela executada e pelo contador, não caracteriza ato passível de aplicação da penalidadepostulada.
A litigância de má-fé ou a prática de ato atentatório à dignidadeda Justiça vincula-se ao comportamento processual inadequado, ao agir temerário do litigante, causando prejuízo à parte adversae deliberada afronta à justiça, o que não se verifica no presente caso.
Na realidade, a executada apenas exerce seu direito constitucionalà ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).
Assim, nego provimento ao agravo de petição da exequente e dou provimentoao apelo da executada para excluir a condenação ao pagamento de multa por ato atentatório à dignidade da Justiça.
/vhmo
REJANE SOUZA PEDRA
Relator
PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:
DESEMBARGADORA REJANE SOUZA PEDRA (RELATORA)
JUIZ CONVOCADO MANUEL CID JARDON (REVISOR)
DESEMBARGADOR JOÃO ALFREDO BORGES ANTUNES DE MIRANDA
DESEMBARGADORA CLEUSA REGINA HALFEN
DESEMBARGADORA VANIA MATTOS
DESEMBARGADORA LUCIA EHRENBRINK
DESEMBARGADOR JOÃO BATISTA DE MATOS DANDA
