Direito do Trabalho

TRT4. ACIDENTE DO TRABALHO. DANOS MATERIAIS E MORAIS

Atualizado 21/04/2016

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TRT4. ACIDENTE DO TRABALHO. DANOS MATERIAIS E MORAIS
Identificação

PROCESSOnº 0020129-21.2014.5.04.0512 (RO)RECORRENTE: ALCEU OLIVEIRA DO NASCIMENTO, RINALDI SA-INDUSTRIA DE PNEUMATICOSRECORRIDO: ALCEU OLIVEIRA DO NASCIMENTO, RINALDI SA-INDUSTRIA DE PNEUMATICOSRELATOR: JOSE FELIPE LEDUR

EMENTA

ACIDENTE DO TRABALHO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. Hipótese na qual tem-se caracterizada a responsabilidadeda empregadora, decorrente da aplicação da teoria do risco da atividade, que prevê a responsabilidade civil objetiva comoforma de obrigação de garantia no desempenho de atividade econômica empresarial, dissociada de um comportamento culposo oudoloso. A teoria do risco da atividade parte do pressuposto de que quem obtém o bônus arca também com o ônus. O parágrafoúnico do art. 927 do CCB/02 recepcionou tal teoria em nossa legislação. Recurso da reclamada desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

ACORDAM os Magistrados integrantes da 6ª Turma do TribunalRegional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA RECLAMADA. Pormaioria de votos, vencido em parte o Desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSODO RECLAMANTE para condenar a reclamada ao pagamento de uma indenização substitutiva da reintegração no emprego,no valor correspondente a salários, férias com 1/3, gratificação natalina e FGTS com 40% do período de um ano a partir dadespedida inválida. Valor da condenação que se majora para R$ 20.000,00, custas de R$ 400,00.

Intime-se.

Porto Alegre, 13 de abril de 2016 (quarta-feira).

Cabeçalho do acórdão
Acórdão
RELATÓRIO

Inconformados com a sentença de parcial procedência da ação (id 33c2b85), as partes recorrem ordinariamente.

O reclamante apresenta recurso ordinário sob id 0fd5fea, postulandoa reforma da sentença em relação à garantia de emprego e a majoração da indenização por danos morais.

A reclamada apresenta suas razões recursais sob id f66a550, pormeio das quais requer a reforma do julgado no que tange à doença ocupacional, danos morais, danos materiais e honorários periciais.

Com contrarrazões da reclamada (id 8e688f2), os autos são encaminhadosa este Tribunal para julgamento.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA

1 ACIDENTE DE TRABALHO

A sentença de origem, acolhendo as conclusões do laudopericial, reconheceu a existência de nexo de concausalidade entre a lesão no ombro esquerdo e o acidente de trabalho sofrido.Registrou que o empregador não tomou as medidas necessárias para evitar o acidente e o desenvolvimento de doença ocupacional,o que configura ato culposo. Entendeu presentes os pressupostos da obrigação de indenizar, uma vez que evidenciada a culpada reclamada. Assim, declarou a responsabilidade da reclamada pela indenização devida ao reclamante em decorrência do acidentede trabalho e da doença ocupacional.

A reclamada não se conforma. Alega que a perita não considerou elementosimportantes, como o labor do reclamante para outras empresas antes do contrato com a reclamada, nas quais realizou serviçosque desencadearam tal patologia. Afirma que as atividades desempenhadas pelo reclamante na recorrente não apresentam riscos.Entende que o exame clínico é insuficiente para reconhecer a concausa, sendo necessário exame de imagem. Salienta que a doençaapresentada pelo autor é degenerativa, constando no laudo pericial a informação quanto a dificuldade de determinar suas causas.Argumenta que a culpa pelo acidente foi exclusiva da vítima, pois nunca orientou o demandante a puxar o "talão" com força.Aduz que inexiste responsabilidade da recorrente, por não haver nexo de causa e culpa da empregadora. Cita julgados. Diz quenão pode responder na forma dos arts. 186 e 927 do CC. Invoca o art. 7, XXVII, da CF. Refere o art. 19 da Lei 8.213/91. Requera improcedência da ação. Assevera que o caso dos autos deve ser analisado com base nos arts. 944 e 945 do CC. Informa queo reclamante sempre foi considerado apto para o trabalho durante a vigência do pacto laboral. Destaca a realização de treinamentose o fornecimento de EPIs. Afirma que o ônus de comprovar o nexo de causalidade é do reclamante, o qual não se desincumbiu,uma vez que lhe foi aplicada a pena de confissão. Sucessivamente, requer o reconhecimento da culpa concorrente a fim de reduziro valor das condenações fixadas.

Analisa-se.

Inicialmente, registra-se que, diferentemente do alegado nas razõesrecursais da reclamada, não houve a aplicação de pena de confissão ao reclamante no caso dos autos.

O reclamante foi contratado pela reclamada em 25-8-04 para desempenhara função de confeccionador de pneus, passando a confeccionador de talões a partir de 01-8-07 (contrato de trabalho de id 7568703).

É incontroversa a ocorrência de acidente de trabalho em 27-11-13,constando no CAT (id a3a3997) a seguinte descrição:

o funcionário relatou na enfermaria que ao retirar um talão do tamborda confeccionadora de talão nº 09001 deu um mal jeito no ombro esquerdo. Refere forte dor e formigamento nas extremidades.Encaminhado ao Hospital Tacchini para melhor avaliação.

O prontuário médico apresentado pela reclamada (id 923e3fa)demonstra que, após o acidente, o reclamante intercalou dias de trabalho com dias de afastamento por atestado médico, o quealiás é confirmado pela folha ponto (id 7404c57 – pág. 51). Não houve encaminhamento ao INSS. No dia 09-12-13, foi solicitadoque o autor não realizasse atividades de carregamento de peso excessivo e movimento repetitivos por 30 dias e, no dia 14-01-14,acabou sendo despedido sem justa causa (TRCT de id 529fc88).

O laudo médico de id c76e3f1, apresentado por perita nomeada pelojuízo, consigna que o reclamante desempenhava as seguintes atividades na reclamada quando do exercício da função de confeccionadorde talões:

[…] rodava as bobinas de arame de aço, encaixava nos eixos (tinha umatalha para levantar), limpava a extrussora, passava os fios de aço na extrussora e começava a trabalhar. Programava e ligavaa máquina, puxava o talão e apertava com um alicate (três vezes cada talão). Eram confeccionados em torno de 5000 talões pornoite por cada funcionário (trabalhavam em dois na noite).

A perita concluiu que, em consequência ao acidente sofrido, o autordesenvolveu um quadro de Capsulite Adesiva. Referiu que a patologia foi tratada cirurgicamente em fevereiro de 2015, encontrando-seem recuperação quando da confecção do laudo. Registrou que o autor apresenta incapacidade parcial e temporária, tendo o traumasofrido (AT) atuado como concausa em relação à patologia.

A ré limitou-se a impugnar o laudo (id cba5267), alegando, em síntese,que a doença apresentada pelo reclamante é degenerativa e sem nexo de causalidade com o trauma sofrido, bem como que o acidentedecorreu de negligência e imprudência do reclamante.

Apesar da Capsulite Adesiva ser uma doença relacionada a fatoresgenéticos, não se conhece ainda exatamente como ela é originada. Entretanto, como bem esclareceu a expert, é reconhecidaa tipificação de Capsulite Adesiva Secundária, associada diretamente com alguma lesão sofrida pelo indivíduo. Ademais, o fatode a patologia ter sido constatada em menos de dois meses após a lesão fortifica o nexo de concausalidade. Assim, ainda queo trauma sofrido não tenha sido a única causa da patologia desenvolvida, certamente contribuiu para o seu surgimento.

De outro lado, em princípio, a lesão proveniente de acidente nolocal de trabalho resulta de ação ou omissão, ainda que remota, por parte da empregadora. Trata-se de culpa presumida decorrenteda assunção dos riscos da atividade e da obrigação de promover a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normasde saúde, higiene e segurança;" (art. 7º, XXII, da Constituição Federal). Portanto, não é ônus do empregado provar a culpada empregadora. Cabe à empregadora provar que não concorreu com culpa para o evento danoso. Entretanto, a reclamada não sedesincumbiu do ônus da prova. Assim, mantém-se o dever de indenizar.

Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.

2 INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS

O juízo de origem condenou a reclamada ao pagamento deindenização por danos materiais, decorrentes da perda temporária da capacidade de trabalho. Fixou o período de déficit funcionalem 18 meses e arbitrou em 9,375% a redução da capacidade laboral (75% de 12,5%). Arbitrou a indenização por danos materiaisem R$ 3.500,00.

A reclamada se insurge. Destaca a afimação da perita no sentidode que não existe perda permanente da capacidade, inexistindo valores para fixação de indenização pela tabela DPVAT. Entendeque, independente da manutenção da responsabilidade da reclamada, é inviável a fixação de indenização por danos materiais,porquanto não há perda permanente da capacidade. Refere que o magistrado, embora tenha reconhecido e diminuído o percentualde perda em razão da doença degenerativa, atribuiu à recorrente a responsabilidade pela totalidade da suposta perda ocupacional.Defende que o laudo pericial reconheceu apenas a concausa, sendo devido a redução do percentual de responsabilidade da recorrente.Informa que ao arbitrar o período de 18 meses, o juiz desconsiderou que em 30-6-14 o autor já estava trabalhando em outraempresa. Requer a redução do prazo estipulado, pois não há fundamento para a adoção do prazo máximo previsto nas Diretrizesde Apoio á Decisão Médico-pericial em Ortopedia e Traumatologia.

Examina-se.

Reconhecido o acidente de trabalho, assim como o nexo de concausalidadeentre o trauma e a patologia identificada no autor, deve a reclamada indenizá-lo pelos danos materiais sofridos.

A perita médica considerou que o empregado sofreu incapacidade parciale temporária para o trabalho, necessitando de período de recuperação após a cirurgia realizada em 18-02-15. Tendo em vistao tempo decorrido desde o procedimento cirúrgico e a não finalização do tratamento, observou, em resposta ao quesito 4, quenão existem sequelas consolidadas no momento.

Dessa forma, na data do laudo não foi possível identificar sequelas,pois tratamento pós-operatório estava em andamento. Porém, ainda que parcial e temporária, houve redução da capacidade laborativa,situação que autoriza o reconhecimento de indenização por danos materiais.

Considera-se razoável o valor fixado em primeiro grau para a indenizaçãopor danos materiais (R$ 3.500,00). Tal valor leva em conta o salário recebido na ré (última remuneração de R$ 2.064,82, conformeconsta no id 4e0ec29, fl. 149), a existência de concausa (contribuição do acidente de trabalho em 75% para a incapacidadelaboral do autor) e o tempo estimado para a recuperação integral (18 meses de acordo com as Diretrizes constantes no Manualde Procedimentos em Benefícios por Incapacidade, editado pelo Ministério da Previdência Social – pág. 9 da sentença).

Ressalta-se, por fim, que a doença do autor foi identificada menosde dois meses após o acidente de trabalho sofrido na demandada, em data anterior ao início do trabalho do reclamante em outraempresa. Ademais, mesmo com novo contrato de trabalho vigente, encontrou-se o reclamante afastado de suas atividades laboraisem decorrência das lesões ocasionadas pelo trauma sofrido enquanto empregado da ré. E não há nenhuma segurança quanto ao restabelecimentopleno quando do início de novo vínculo de emprego, tanto que o autor realizou cirurgia em fevereiro de 2015. A data de iníciodo novo contrato acaba por ser irrelevante para a fixação do termo final da quantificação da indenização devida.

Desse modo, nega-se provimento ao recurso.

3 HONORÁRIOS PERICIAIS

O magistrado de primeiro grau fixou os honorários periciaisem R$ 2.000,00, haja visto a complexidade do trabalho e o zelo da perita na confecção do laudo. Imputou à reclamada o pagamentodos honorários periciais, uma vez que sucumbente na pretensão objeto da perícia.

A reclamada recorre. Alega que uma vez modificada a sentença emrelação à culpa do empregador, inviável a atribuição do pagamento à reclamada. Acrescenta que não foi sucumbente no que dizrespeito á perícia, visto que o julgador aplicou a responsabilidade objetiva. Entende que é do reclamante o ônus com o pagamentoda perícia. Sucessivamente requer a redução dos honorários periciais para R$ 1.000,00 ou em valores a serem fixados pelo juízode de segundo grau.

Analisa-se.

Mantida a condenação da reclamada em relação à indenização por acidentede trabalho, a ela cabe arcar com os horários periciais.

Levando-se em conta a complexidade da questão em tela e a realizaçãode inspeção em única oportunidade, bem como os valores normalmente praticados nesta Justiça especializada, tem-se por adequadoo valor arbitrado pela sentença.

Recurso desprovido.

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE E DA RECLAMADA.MATÉRIA COMUM. ANÁLISE CONJUNTA

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

O magistrado de primeiro grau condenou a reclamada ao pagamentode indenização por danos morais arbitrada em R$ 5.000,00. Fundamentou o arbitramento no nexo de concausalidade, na existênciade limitação da abdução do ombro e em cicatriz de 7cm no ombro esquerdo. Referiu que o valor da indenização deve atender àsnecessidades do ofendido e aos recursos do ofensor.

O reclamante não se resigna. Alega que o valor fixado é insuficientepara reparar o sofrimento sofrido. Refere a ocorrência de acidente de trabalho do qual resultou sérias lesões. Acrescentaque, posteriormente, em razão das condições inadequadas de trabalho, o reclamante desenvolveu capsulite adesiva no ombro.Informa que para o tratamento da referida doença teve de se submeter a dois procedimentos cirúrgicos, encontrando-se atualmenteafastado em razão da última cirurgia. Afirma que experimentou a ocorrência de danos morais por dois eventos distintos: o acidentede trabalho e a doença ocupacional subsequente. Requer o deferimento de uma indenização por dano moral para cada evento. Dizque o valor deferido também é insuficiente para conferir caráter pedagógico-punitivo à condenação. Sugere o arbitramento de,pelo menos, R$ 10.000,00 para cada um dos eventos danosos.

A reclamada se insurge. Discorre sobre os pressupostos da indenizaçãopor dano moral. Cita julgado. Alega que no caso dos autos os requisitos da indenização não foram preenchidos. Afirma que aindenização foi fixada em valor extremamente elevado, não condizendo com as circunstâncias do presente feito, tais como: fornecimentode treinamentos, CIPA atuante, fiscalização das atividades, uso de EPIs, ausência de periculosidade, manuseio indevido e imprudentede produtos. Destaca o caráter degenerativo da doença e o labor em outra empresa na data de 30-6-14. Entende que o trabalhadoragiu de forma imprudente. Colaciona julgados. Argumenta que a extensão dos danos não foi considerada para a fixação da indenização.Requer a redução do valor arbitrado a título de danos morais.

Analisa-se.

O acidente sofrido produz dor na esfera íntima do trabalhador. Aprova do dano moral é plenamente presumida em decorrência da lesão provocada ou agravada pela empresa. A indenização pelosofrimento interno gerado pela empresa ré em seu empregado é de difícil mensuração. Para a fixação do quantum indenizatório,é importante que se levantem certos parâmetros, visto que inexiste critério previsto no ordenamento jurídico. Primeiramente,a condenação em reparação de dano moral deve ser fixada considerando-se a dimensão do dano ocorrido. E para surtir um efeitopedagógico e econômico, o valor fixado deve representar um acréscimo considerável nas despesas da empresa, desestimulandoa reincidência, mas que preserve a sua saúde econômica.

No caso dos autos, o dano físico causado ao autor pelo acidentede trabalho acarretou sofrimento íntimo expressivo, especialmente se considerado o tempo em que ele teve ou terá de convivercom a moléstia. Deve ser levada em consideração a necessidade de realização de cirurgia, o que já ocorreu, conforme informadopela perita, e o capital social da demandada de R$ 14.000.000,00 (id 6f09e5b, pág. 1). De outro lado, não se pode ignorarque o trauma sofrido no trabalho configurou concausa para o surgimento da doença, e não a sua causa única, bem como que, emprincípio, não há sequelas.

Com base nesses elementos, considera-se que o valor fixado pelasentença está adequado, sem necessidade majoração ou redução. Nesse aspecto, vale esclarecer que não se tratam de eventosdistintos o acidente e a doença, pois na verdade a doença é consequência do acidente, compondo o conjunto de consequênciasdo trauma sofrido.

Nega-se provimento ao recurso do reclamante e da reclamada.

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE

GARANTIA DE EMPREGO

O juiz de primeira instância indeferiu o pedido de garantiade emprego do reclamante, por não atendidos os requisitos do art. 118 da Lei 8.213/91 c/c a Súmula 378 do TST. Referiu queo autor não gozou de benefício previdenciário e nem restou afastado de suas atividades laborais por mais de 15 dias. Registrouque eventual gozo de benefício previdenciário após a extinção do contrato de trabalho (ocorrido em 14-01-2014) não se prestapara o fim colimado.

O reclamante recorre. Alega que sua doença iniciou durante o contratode trabalho, bem como que não estava apto para o trabalho na data de sua dispensa, pois em seguida teve de submeter-se à intervençãocirúrgica. Afirma que a simples emissão de atestado médico demissional consignando a aptidão do reclamante não é óbice parao reconhecimento de sua incapacidade. Diz que, conforme laudo pericial, afastou-se de suas atividades em 18-02-15 e em 16-3-15iniciaria sessões de fisioterapia. Conclui que, uma vez reconhecida a existência de doença ocupacional parcialmente incapacitante,deverá ser reformada a sentença a fim de reconhecer a estabilidade provisória do reclamante, pelo período de 12 meses apósa cessação do benefício e a condenação da reclamada ao pagamento dos salários correspondentes.

Examina-se.

Constatado que o autor foi acometido por doença derivada do acidentede trabalho sofrido, havendo nexo concausal entre a moléstia e o trauma, corolário disso é o direito à garantia no empregopelo prazo de 12 meses, conforme art. 118 da Lei 8213/91, que assim dispõe:

O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimode doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentementede percepção de auxílio-acidente

.

Há um dever objetivo do empregador, que consiste em possibilitarque o empregado readquira a capacidade na empresa, o que se coaduna com o Princípio do Estado Social e também com a funçãosocial do contrato. Por isso, em princípio, assegura-se ao empregado que sofre acidente do trabalho a garantia em questãopelo período de 12 meses após restaurada a capacidade laboral.

Salienta-se que o recebimento do auxílio-doença acidentário nãoé requisito essencial para o reconhecimento da estabilidade prevista no art. 118 da Lei 8.213/91. A omissão do empregadorem emitir a CAT ou o reconhecimento de doença profissional não afasta o direito à estabilidade provisória, aplicando-se aparte final do item II da Súmula 378 do TST.

São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superiora 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissionalque guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.

É importante frisar que a reclamada não tomou as providências devidasantes de despedir o autor, de modo a lhe assegurar o gozo de auxílio-doença acidentário. Portanto, na época da despedida oreclamante era beneficiário de garantia no emprego, reputando-se nula a despedida realizada pela ré. Conforme o laudo médicopericial (id c76e3f1), na época do respectivo exame, o reclamante já se encontrava empregado noutra empresa, não sendo razoáveldeterminar sua reintegração no emprego, o que acarretaria sua saída do emprego atual, além do constrangimento advindo de trabalharem empresa que demonstrou não querer mais contar com seus serviços. Ademais, o pedido do autor já limita-se à indenizaçãosubstitutiva.

Assim, dá-se provimento ao recurso ordinário do reclamante paracondenar a reclamada ao pagamento de uma indenização substitutiva à reintegração no emprego, no valor correspondente a salários,férias com 1/3, gratificação natalina e FGTS com 40% do período de um ano a partir da despedida inválida.

Assinatura

JOSE FELIPE LEDUR

Relator

VOTOS

DESEMBARGADOR RAUL ZORATTO SANVICENTE:

Acompanho o voto do Exmo. Desembargador Relator.

DESEMBARGADOR FERNANDO LUIZ DE MOURACASSAL:

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE

GARANTIA DE EMPREGO

Peço vênia ao eminente Relator para apresentar divergência,quanto ao item em epígrafe, com base em precedente da minha lavra, a cujos fundamentos me reporto, na parte que aqui importa:

[…]

Quanto à reintegraçãoe parcelas decorrentes, a legislação previdenciária, em especial o art. 118 da Lei 8.213/91 ("O segurado que sofreu acidentedo trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessaçãodo auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente"), confere ao empregado, acidentado em serviçoou acometido de moléstia profissional, o direito à estabilidade provisória por doze meses a contar da alta do benefício previdenciárioacidentário, a fim de lhe garantir os meios necessários para seu sustento e de sua família até que recupere a plena capacidadelaborativa.

De tal dispositivo legal,depreende-se que são requisitos necessários aos direito à reintegração no emprego, ou à indenização, ter o empregado sofridoacidente de trabalho ou ser portador de doença laboral e usufruído de auxílio-doença acidentário.

Na hipótese sub judice,embora tenha havido o reconhecimento, por meio de decisão judicial, do nexo causal entre a doença do autor e o trabalho desempenhadona reclamada, não há nos autos notícias no sentido de que o reclamante esteve afastado do trabalho por mais de 15 dias, emgozo de auxílio-doença acidentário.

De qualquer modo, registroque a exceção disposta no item II da Súmula 378 do TST ("ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº8.213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. PRESSUPOSTOS […] II – São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superiora 15 dias e a consequente percepção do auxílio doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissionalque guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego"), é aplicável aos casos em que a alegada doença ocupacionalé constatada após a despedida do empregado, o que não é possível se extrair dos elementos de prova presentes nos autos. Veja-seque o fato de ter o autor obtido pela via judicial o reconhecimento da doença como de natureza ocupacional, não implica, automaticamente,a incidência da exceção disposta no respectivo verbete, sendo necessária a prova de que os sintomas da doença surgiram efetivamenteapós a rescisão contratual, o que não se verifica. Pelo contrário, os exames médicos constantes nos autos conduzem à presunçãode que a patologia era preexistente à rescisão contratual.

Diante do exposto, entendoque o reclamante não implementou os requisitos objetivos fixados no art. 118 da Lei 8.213/91 para fazer jus à garantia provisóriano emprego, pois, como já referido, não gozou de auxílio-doença acidentário. Isso porque a referida lei, a meu ver, não permiteoutra interpretação, impondo-se a conclusão de que a ausência do requisito à estabilidade prevista no art. 118 da Lei 8.213/91constitui óbice intransponível ao direito pretendido pelo autor na petição inicial […].

(TRT da 4ª Região, 8ª Turma, 0021031-28.2014.5.04.0203 RO, em 11/12/2015,Desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal)

Ante o exposto, comungo com o entendimento adotado pelo Juízo deprimeiro grau em sentença:

[…]

ACIDENTEDE TRABALHO. NULIDADE DA DISPENSA. GARANTIA NO EMPREGO

O conceito de acidentedo trabalho é abrangente e possibilita classificá-lo em três espécies distintas: a) acidente-tipo; b) doenças ocupacionais;e c) acidentes por equiparação.

O empregado que sofreuacidente de trabalho tem assegurado o direito de permanência no emprego, pelo prazo mínimo de doze meses após a cessação doauxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente (Lei 8.213/91, art. 118).

São requisitos para aconfiguração da estabilidade provisória decorrente de acidente do trabalho, o afastamento superior a quinze dias e a percepçãode auxílio doença acidentário (independentemente da percepção de auxílio-acidente), salvo se restar comprovado, após a terminaçãodo contrato, doença profissional que guarde relação de causalidade com o liame empregatício. Adoto a Súmula 378 do TST.

No entanto, esta, seguramente,não é a hipótese dos autos.

No caso, observo que nãohouve afastamento por período superior a 15 dias e tampouco percepção de benefício previdenciário durante o período de vigênciado contrato de trabalho.

Vale dizer: a mera nãopercepção de benefício acidentário não constitui óbice intransponível ao reconhecimento da estabilidade provisória quandonos autos restar comprovado que o trabalhador fazia jus a tal benefício e só não o alcançou em razão de ato obstativo (dolosoou culposo) do seu empregador que, assim, impossibilitou que houvesse a caracterização prévia do acidente do trabalho latosensu pelo INSS.

Contudo, não há qualquercomprovação, ou mesmo alegação, de que o reclamante tenha usufruído, durante a vigência do contrato de trabalho, benefícioprevidenciário, ou mesmo que tenha se afastado por período superior a 15 dias e só não alcançou tal benefício, em razão deato obstativo do empregador. Em outras palavras, sequer há comprovação nos autos da presença dos pressupostos lógicos queorientaram o legislador pátrio na instituição da garantia de emprego, não havendo razão, por conseguinte, para reconhecê-la.

Ainda que a mera não percepçãode benefício acidentário não constitua óbice ao reconhecimento da garantia de emprego, é necessário que exista incapacidadelaboral por período superior a 15 (quinze) dias, sob pena de inexistir o suporte fático exigido pelo art. 118 da Lei 8.213/91.Eventual gozo de benefício previdenciário após a extinção do contrato de trabalho (ocorrido em 14/01/2014) não se presta parao fim colimado.

A finalidade do art. 118da Lei 8.213/91 é proteger o trabalhador que – após um período de inatividade em razão da incapacidade laboral advinda deum acidente ou de uma doença – retorna ao labor recém convalescido, com evidente fragilidade e comprometimento da sua produtividadehabitual.

Veja-se o que ensina SebastiãoGeraldo de Oliveira em sua obra "Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador", 5ª edição, 2010, LTr, p.234:

No entanto, o fundamentoteleológico dessa garantia de emprego não é o recebimento simplesmente do auxílio-doença acidentário; é o afastamento superiora 15 dias, ocorrido por causa do acidente. A lei não criou a estabilidade provisória porque o empregado recebeu auxílio-doençaacidentário, e sim porque houve um afastamento por período mais prolongado, indicando um acidente de maior gravidade. (…)Só não haverá a estabilidade do art. 118 em questão se o afastamento ocorrer por período inferior a 15 dias, ou seja, noscasos dos pequenos acidentes.

Vale dizer: de acordocom o art. 118 da Lei 8.213/91 e a Súmula 378 do TST, para a configuração do direito à garantia de emprego não basta, tãosomente, o posterior reconhecimento judicial da natureza ocupacional da patologia, sendo necessário, também, que o trabalhadortenha gozado de benefício previdenciário ou, ao menos, que tenha preenchido pressuposto básico para tanto, qual seja: comprovadanecessidade de afastamento do labor por mais de 15 dias. De acordo com a melhor interpretação que se extrai da norma instituidorada estabilidade provisória no emprego, é necessário que o agravo à saúde do trabalhador tenha repercussão e gravidade quedemandem a necessidade de afastamento por período mais prolongado, o que exclui, por conseguinte, os acidentes de pequenamonta e as doenças cujo afastamento do labor seja desnecessário ou inferior a 15 dias.

Dessa forma, não preenchidosos requisitos legais previstos no art. 118 da Lei 8.213/91 c/c a Súmula 378 do C. TST, não há falar em garantia provisóriano emprego e pagamento dos salários do período de afastamento, razão pela qual julgo improcedentes os pedidos contidos noitem "e" da inicial […].

(grifono original)

Por esses fundamentos, nego provimento ao recurso do autor, no tópico.

No mais, acompanho o voto condutor do julgamento.

PARTICIPARAM DO JULGAMENTO:

DESEMBARGADOR JOSÉ FELIPE LEDUR (RELATOR)

DESEMBARGADOR RAUL ZORATTO SANVICENTE

DESEMBARGADOR FERNANDO LUIZ DE MOURA CASSAL

Foto de Carlos Stoever

Carlos Stoever

(Advogado Especialista em Direito Público)

Advogado. Especialista em Direito Público pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e MBA em Gestão de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas. Consultor de Empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Palestrante na área de Licitações e Contratos Administrativos, em cursos abertos e in company. Consultor em Processos Licitatórios e na Gestão de Contratos Públicos.

@calos-stoever

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