Petição
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL DO ESTADO DO $[processo_estado]
$[parte_autor_qualificacao_completa], por seus procuradores eletronicamente assinados (cujo instrumento procuratório segue anexo) e endereço profissional constante à rua $[advogado_endereco], e endereço eletrônico: $[advogado_email], nos moldes do novo CPC, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, propor, observando o artigo 319 do Código de Processo Civil, a presente
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO com pedido de TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA
em face do ESTADO DO $[parte_reu_razao_social], pessoa jurídica de direito público interno, inscrito no CNPJ $[parte_reu_cnpj], podendo ser citado em endereço através da Procuradoria-Geral do Estado, com sede na $[parte_reu_endereco_completo], ou por meio eletrônico (na forma do artigo 246, V, §§1°, 2° c/c 270, § único ), pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos:
I – PRELIMINARES
1. DA JUSTIÇA GRATUITA
O autor não pode suportar os ônus do processo por ser pessoa desprovida de recursos financeiros, conforme declaração inclusa, razão pela qual, requer que se digne Vossa Excelência de deferir-lhe os benefícios da Justiça Gratuita.
2. DO PEDIDO DE DISPENSA DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO PREVISTA NO NOVO CPC
Com vistas a obter maior celeridade processual, garantindo o efetivo contraditório e evitando diligências inúteis e/ou que não tragam qualquer resultado útil ao processo, o autor pleiteia a Vossa Excelência que dispense a audiência de conciliação prevista no novo CPC.
3. JUNTADA DE DOCUMENTOS E ANÁLISE DO QUANTUM A SOFRER REPETIÇÃO DE INDÉBITO APENAS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA
Ainda antes de adentrarmos na análise das questões de mérito da demanda, imperioso se faz destacar que a presente ação versa sobre a declaração judicial de um direito a ser reconhecido ao postulante (o de que a cobrança do ICMS sobre alguns dos custos apontados nas contas de energia elétrica é ilegal, conforme será melhor analisado nos próximos pontos).
O que está em jogo, Excelência, é o reconhecimento ou não do direito que a parte autora sustenta possuir, no sentido de lhe ser deferido o pleito de ver extinta a cobrança do imposto em questão e, apenas em um segundo momento, o de ver devolvidos os pagamentos indevidamente realizados. Por óbvio, a discussão acerca do direito independe da juntada de contas e comprovantes para apuração do valor a ser corrigido em caso de procedência da ação: sendo o quantum apurado em R$ 100,00, R$ 1.000,00, R$ 5.000,00, ou R$ 50.000,00, o direito pleiteado é o mesmo em qualquer caso.
Por este motivo, não se faz necessário perder tempo, neste momento processual, com a discussão e impugnação de cálculos realizados unilateralmente pelo requerente: até mesmo por celeridade processual, é imperativa a concentração dos atos judiciais no sentido de declarar a possibilidade ou impossibilidade do direito pleiteado, de maneira que, apenas posteriormente – já em sede de liquidação de sentença – caberia a análise quanto aos valores a serem reclamados em repetição de indébito em caso de procedência.
Sobre a possibilidade de restringir a discussão da lide à questão de direito com a posterior juntada de extratos e comprovantes em sede de cumprimento do julgado, tem decidido pacificamente toda a jurisprudência pátria em casos semelhantes, in verbis:
APELAÇÃO CÍVEL - EXPURGOS DA INFLAÇÃO - PRELIMINARES E PREJUDICIAL DE MÉRITO ARGUIDAS EM CONTRARRAZÕES AFASTADAS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA TITULARIDADE DA CONTA-POUPANÇA À ÉPOCA DA IMPLANTAÇÃO DOS PLANOS ECONÔMICOS DE GOVERNO - POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - EXISTÊNCIA DA POUPANÇA COMPROVADA - JUNTADA DE EXTRATOS EM LIQUIDAÇÃO - RECURSO PROVIDO. (TJ-MS - AC: 403 MS 2010.000403-0, Relator: Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso, Data de Julgamento: 29/04/2010, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 07/05/2010)
AÇÃO DE COBRANÇA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. JUNTADA DOS EXTRATOS. FASE DE LIQUIDAÇÃO. A juntada dos extratos não é necessária ao reconhecimento do direito do poupador aos expurgos inflacionários, mas, tão somente, à apuração das diferenças reclamadas e devidas. E, os valores certos e líquidos decorrentes dos expurgos inflacionários desconsiderados pela Instituição Financeira poderão ser apurados em sede de liquidação de sentença, sendo despicienda a juntada dos extratos ou comprovantes até tal fase. (TJ-MG 104330721757410011 MG 1.0433.07.217574-1/001(1), Relator: MARCOS LINCOLN, Data de Julgamento: 27/01/2010, Data de Publicação: 22/02/2010)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. POUPANÇA. JUNTADA DOS EXTRATOS ANALÍTICOS. MOMENTO PROCESSUAL. DISPENSABILIDADE. FASE DE LIQUIDAÇÃO. MULTA IMPOSTA. AFASTAMENTO. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PREJUDICADO. 1 - Cuida-se de agravo de instrumento interposto pela Caixa Econômica Federal - CEF, com requerimento de efeito suspensivo, contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 4a Vara Federal Cível de Vitória, na ação de rito ordinário, em face de Ivan de Oliveira. 2 - A decisão agravada determinou que a agravante apresentasse, no prazo de 15 (quinze) dias, os extratos das contas de poupança de titularidade do autor, sob pena de multa diária correspondente a R$ 100,00 (cem reais). 3 - Considerando o ofício nº ES-OFI-2010/02119, de 23/09/2010, remetido pelo Juízo da 4a Vara Federal Cível de Vitória, Seção Judiciária do Estado do Espírito Santo, verifica-se que a decisão agravada foi revogada. O referido ofício foi recebido por este Relator quando já incluído o processo na pauta de julgamento. 4 - A questão abordada através do presente recurso encontra-se superada, ficando o mesmo prejudicado pela perda de objeto. 5 - Agravo de instrumento prejudicado. (TRF-2 - AG: 201002010066021 RJ 2010.02.01.006602-1, Relator: Desembargador Federal GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, Data de Julgamento: 27/09/2010, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: E-DJF2R - Data::11/10/2010 - Página::332/333)
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. CHEQUE ESPECIAL. PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DOS EXTRATOS DE TODO O PERÍODO DE CONTRATUALIDADE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL À PROPOSITURA DA AÇÃO. DISCUSSÃO QUE CINGE-SE ÀS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. POSSIBILIDADE DE JUNTADA ULTERIOR, NO MOMENTO DA LIQUIDAÇÃO DO DÉBITO. PRELIMINAR INACOLHIDA. (...). (TJ-SC - AC: 170105 SC 2008.017010-5, Relator: Altamiro de Oliveira, Data de Julgamento: 14/06/2011, Quarta Câmara de Direito Comercial, Data de Publicação: Apelação Cível n. , de Pomerode)
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA. CADERNETA DE POUPANÇA. PROVA DA TITULARIDADE DA CONTA. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL À PROPOSITURA DA AÇÃO. PRELIMINAR DE PRESSUPOSTO PROCESSUAL ACOLHIDA. DEMAIS PRELIMINARES E MÉRITO PREJUDICADOS. EXTINÇÃO DO FEITO SEM EXAME DO MÉRITO. ART. 267, IV E VI, DO CPC. - A jurisprudência pátria, capitaneada pelo e. STJ, vem entendendo ser dispensável, à época da propositura da demanda, a juntada aos autos dos extratos das contas de poupança, sendo necessário, apenas, a prova da titularidade da conta no período requerido. - A teor do art. 333, I, do CPC, é da parte autora o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito. E, mesmo que se considere como sendo de consumo a relação em discussão, a ser amparada pelo Código de Defesa do Consumidor, o fato é que a inversão do ônus da prova em benefício do consumidor somente deve ser determinada, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele - o consumidor - hipossuficiente (art. 6º, VIII do CDC). - Inexistência de qualquer documento apto a provar a titularidade de conta poupança pela parte autora ou que a sua situação financeira tenha impedido o fornecimento pela instituição financeira de algum indício de prova material. - Situação que impõe a extinção do feito sem apreciação do mérito por falta de pressuposto processual - comprovação da existência de relação contratual entre as partes (titularidade de conta) - e, também, por ausência de uma das condições da ação, qual seja, o interesse de agir, nos moldes do art. 267, IV e VI, do CPC. - Exame das demais preliminares e do mérito prejudicado. - Deixa-se de condenar a parte autora em custas e honorários advocatícios por ser beneficiária da justiça gratuita. Preliminar de ausência de pressuposto processual acolhida. Apelação provida. Extinção do feito sem exame do mérito. (TRF-5 - AC: 438184 PE 2007.83.00.008583-8, Relator: Desembargador Federal José Maria Lucena, Data de Julgamento: 15/05/2008, Primeira Turma, Data de Publicação: Fonte: Diário da Justiça - Data: 18/08/2008 - Página: 747 - Nº: 158 - Ano: 2008)
O novo Código de Processo Civil, no capítulo em que trata da Liquidação de Sentença, expressa em seu artigo 510 a possibilidade de juntada de documentos elucidativos pelas partes apenas na fase de liquidação por arbitramento, amoldando-se a casos tais como a situação ora exposta.
Mostra-se relevante destacar, também, que consta do enunciado n° 32 do FONAJEF a previsão de que “a decisão que contenha os parâmetros de liquidação atende ao disposto no art. 38, parágrafo único, da Lei nº 9.099/95”. Logo, no caso dos autos, o pedido formulado pelo autor, mesmo não podendo ser quantificado imediatamente (sendo compreendido, então, como “pedido genérico”), certamente deverá ser considerado líquido, já que apresenta os parâmetros necessários a embasar uma eventual sentença de procedência pela revisão da base de cálculo do ICMS e repetição de indébito sobre os valores cobrados a maior.
Desta maneira, em sendo evidente o interesse de agir da parte autora – já que eventual declaração de ilegalidade a recair sobre a cobrança de ICMS sobre alguns dos custos apontados na conta de energia elétrica poderá gerar reflexos econômicos imediatos e futuros – e, ainda, restando cabalmente comprovada a titularidade de unidade consumidora pela parte postulante (conforme conta de energia em anexo), requer seja processada a presente ação sem os extratos demonstrativos dos valores já pagos, declarando-se a ilegalidade pleiteada para, apenas na sequência, na fase de execução da sentença, determinar a juntada dos documentos cabíveis de maneira a possibilitar os cálculos, que serão realizados oportunamente em liquidação.
4. DA JUNTADA DE DOCUMENTOS PELO RÉU
Para apurar o quanto é devido, a parte autora precisará de todas as contas de energia elétrica dos últimos 5 anos, a contar da data do ajuizamento da ação. Obviamente, ninguém guarda ou tem todos esses papéis.
Por outro lado, a parte ré tem registros de quanto a parte autora pagou neste período.
Vislumbrada a parte fática, cumpre lembrar o que diz o art. 396 do CPC:
Art. 396. O juiz pode ordenar que a parte exiba documento ou coisa que se encontre em seu poder.
Sendo assim, o autor pede que seja determinado que o réu apresente todos os documentos que demonstrem o valor pago pelo autor à título de ICMS sobre as taxas de distribuição (TUSD) e de transmissão (TUST).
II- COMPETÊNCIA DA 11ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL DO ESTADO DO $[processo_estado]
Conforme preceitua o artigo 45, inciso II, da Lei de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro (Lei Estadual nº 6.956/15), compete aos juízes de direito em matéria de dívida ativa (e.g. 11ª Vara de Fazenda Pública) processar e julgar as ações que tenham por objeto matéria tributária.
O Novo Código de Processo Civil preceitua no artigo 52, parágrafo único que o Estado poderá ser demandado na Comarca da Capital:
Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal.
Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado.
Considerando que a Comarca da Capital tem apenas um único juízo de direito de dívida ativa estadual (11ª Vara de Fazenda Pública) e a presente demanda discute a incidência do ICMS sobre as tarifas de energia elétrica (matéria tributária estadual), não restam dúvidas de que a competência para tais feitos é do Juízo da 11ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital.
III – DA SÍNTESE FÁTICA
O autor é pessoa física possuidor de imóvel localizado neste Estado há mais de 5 anos e paga regularmente todos os seus tributos conforme os preceitos legais.
Desta forma, torna-se despiciente esclarecer que, por todos estes anos, utilizando deste imóvel, a idoneidade foi atributo indispensável da parte autora, de forma que sempre se preocupou em manter suas atividades alinhadas aos ditames legais, respeitando, portanto, todas as normas editadas e fiscalizadas pelo Estado Réu.
Vale destacar que a parte autora consome grande quantidade de energia elétrica.
Por tal razão, o autor averiguou que o réu está exigindo ICMS sobre base de cálculo superior àquela legal e constitucionalmente prevista, vez que o tributo não está sendo cobrado tão somente sobre o valor da mercadoria (energia elétrica), mas também, sobre as tarifas de uso do sistema de transmissão e distribuição de energia elétrica proveniente da rede básica de transmissão as chamadas TARIFAS DE USO DO SISTEMA ELÉTRICO DE TRANSMISSÃO TUST e TARIFA DE USO DO SISTMA ELÉTRICO DE DISTRIBUIÇÃO - TUSD) bem como qualquer outros ENCARGOS SETORIAIS que não representem efetivo fornecimento de consumo de energia.
Neste Estado, a base de cálculo para incidência do ICMS é REALIZADA somando-se os valores da TUST, aqui chamada somente de Transmissão, da TUSD, aqui chamada somente de Distribuição, e dos ENCARGOS, esses compreendidos como ENCARGOS SETORIAIS que estão muito bem explicados no sítio da ANEEL (http://www.aneel.gov.br/), e que, da mesma forma, não representam consumo efetivo de energia.
Deste modo, conforme as razões de fato e de direito a seguir explanadas, o autor pretende ver declarada a inexistência de relação jurídico-tributária que as obriguem a recolher o ICMS sobre quaisquer encargos de transmissão, distribuição e demais encargos setoriais, restringindo a respectiva base de cálculo, portanto, aos valores pagos a título de efetivo fornecimento e consumo de energia elétrica, consoante jurisprudência pacifica do Superior Tribunal de Justiça e do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com a consequente repetição do indébito do ICMS indevidamente recolhido nos últimos cinco anos.
IV - DA LEGITIMIDADE ATIVA DO AUTOR
No que tange à legitimidade do autor, na qualidade de consumidor da energia elétrica, para compor o polo ativo do litígio, a questão restou pacificada no âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial n° 1.299.303/5C, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos, reconhecendo a legitimidade do usuário para pleitear a restituição do ICMS incidente sobre energia elétrica.
Confira-se o teor da ementa do mencionado acórdão, proferido pelo colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
RECURSO ESPECIAL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. ENERGIA ELÉTRICA. INCIDÊNCIA DO ICMS SOBRE A DEMANDA "CONTRATADA E NÃO UTILIZADA". LEGITIMIDADE DO CONSUMIDOR PARA PROPOR AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
- Diante do que dispõe a legislação que disciplina as concessões de serviço público e da peculiar relação envolvendo o Estado-concedente, a concessionária e o consumidor, esse último tem legitimidade para propor ação declaratória c/c repetição de indébito na qual se busca afastar, no tocante ao fornecimento de energia elétrica, a incidência do ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada.
- O acórdão proferido no REsp 903.394/AL (repetitivo), da Primeira Seção, Ministro Luiz Fux, DJe de 26.4.2010, dizendo respeito a distribuidores de bebidas, não se aplica ao casos de fornecimento de energia elétrica.
Recurso especial improvido. Acórdão proferido sob o rito do art.
543-C do Código de Processo Civil.
(REsp 1299303/SC, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/08/2012, DJe 14/08/2012)
Assim, é certo que o usuário, no caso o autor, tem legitimidade para propor demanda objetivando a declaração de inexistência de relação jurídica que lhe obrigue a recolher ICMS.
A concessionária de serviço público como bem acentuado pelo E. STJ, apenas repassa os valores a serem pagos para os contribuintes, não lhe sendo interessante demandar contra o Estado, que é o titular do serviço público, para buscar a declaração de ilegalidade de determinadas cobranças.
Isto posto, resta demonstrada a legitimidade do autor para propor a presente demanda.
V- DO DIREITO
1. DA NATUREZA JURÍDICA DA TUST E TUSD – REMUNERAÇÃO A DISPONIBILIZAÇÃO DO USO DOS SISTEMAS DE TRANSMISSÃO, E NÃO A COMERCIALIZAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA
Antes de adentrar no mérito do direito pleiteado nesta demanda, convém antes, esclarecer alguns pontos relacionados às tarifas denominadas TUST e TUSD.
A Tarifa de Uso dos Sistemas Elétricos de Distribuição (TUSD) é um encargo legal do setor elétrico brasileiro que incide sobre os consumidores conectados aos sistemas elétricos das concessionárias de distribuição. A TUSD é um dos componentes do preço nos contratos de energia elétrica de grandes consumidores de energia elétrica (eletro-intensivos), especificamente no que diz respeito ao transporte desta energia no Sistema Interligado Nacional e foi criada pelo §6º do artigo 15 da Lei nº 9.074/95.
§6º - É assegurado aos fornecedores e respectivos consumidores livre acesso aos sistemas de distribuição e transmissão de concessionário e permissionário de serviço público, mediante ressarcimento do custo de transporte envolvido, calculado com base em critérios fixados pelo poder concedente.
A própria ANEEL, define a TUSD, como valor criado e utilizado para custear os sistemas de distribuição da energia elétrica, consoante abaixo transcrito:
As tarifas de uso do sistema de distribuição – TUSD possuem a função precípua de recuperar a receita definida pela ANEEL, e devem fornecer sinal econômico adequado para utilização racional dos sistemas de distribuição.
Atualmente a TUSD é utilizada para os seguintes fins:
Faturamento de encargos de uso dos sistemas de distribuição de consumidores livres; faturamento de encargos de uso dos sistemas de distribuição de unidades geradoras conectadas ao sistema de distribuição; faturamento de encargos de uso dos sistemas de distribuição de distribuidoras que acessam os sistemas de distribuição de outra distribuidora; abertura das tarifas de fornecimento dos consumidores cativos para fins de realinhamento tarifário, conforme o disposto no Decreto 4.667/2003.
O sistema de distribuição é composto por postes, cruzetas, isoladores, fios, transformadores e demais equipamentos (não pertencentes à rede básica) que operam em tensões baixas, de propriedade das distribuidoras, e cujo acesso também é livre a todos. A sua utilização, no caso da contratação no mercado livre, se dá mediante celebração de contrato de uso dos sistemas de distribuição (CUSD) ou, no mercado cativo, mediante contratação do fornecimento de energia elétrica, em ambos os casos se remunerando o uso da rede mediante recolhimento Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição (TUSD).
Enquanto a TUSD se refere aos custos relativos ao uso do sistema de distribuição, a TUST se refere aos custos inerentes ao uso do sistema de transmissão, como serviço de transporte de grandes quantias de energia elétrica por longas distancias, o qual, no Brasil, é feito utilizando-se de rede de linhas de transmissão e subestações em tensão igual ou superior a 230 kV, denominada Rede Básica.
Explicação gráfica sobre duas subcomponentes tarifárias (TUSD e TUST) :
Fixadas tais premissas, o que se busca repelir através dessa ação é afastar a exigência do ICMS, sobre a TUSD e TUST, repassada ao autor, paga em razão da utilização do sistema de distribuição, pela absoluta falta de previsão expressa na Lei Complementar nº 87 de 1996, da EXCLUSÃO das mencionadas tarifas na base de cálculo da exação Estadual, o que afronta de modo claro e inaceitável o artigo 150, I, do Texto Constitucional e art. 97, IV do Código Tributário Nacional.
2. ICMS INCIDE SOBRE O FORNECIMENTO/CONSUMO DE ENERGIA – MONTANTES DE USO NÃO REFLETEM O CONSUMO, E SIM A DISPONIBILIZAÇÃO DO USO DA REDE
Como relatado anteriormente, as cobranças ora questionadas se referem à conjeturada responsabilidade do autor pelo recolhimento do ICMS sobre as tarifas (TUST/TUSD) pagas em razão do uso do sistema de distribuição e do sistema de transmissão na entrada de energia elétrica em seus estabelecimentos localizados neste Estado.
A par de sua singularidade, para fins jurídico-tributários, a energia elétrica sempre foi considerada como mercadoria, sujeita, portanto, à incidência do ICMS. Quanto à energia elétrica disse o Superior Tribunal de Justiça que “é produzida para ser alienada (operação de mercancia), sem impeço para ser identificada como mercadoria, conceituação privada, admitida pela lei tributária” (Resp 38344/PR – 1ª turma, DJ de 31/10/1994).
Ao definir as hipóteses de incidência do ICMS, a lei complementar 87/96 cuidou de abranger, conforme o previsto no artigo 155, inciso II da CF, tão somente as operações relativas à circulação de mercadorias. Esta é a expressa determinação do artigo 2º da referida Lei Complementar, conforme abaixo:
Art. 2º - o imposto incide sobre: I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares; (...)
Art. 155 – Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; (...)
No entanto, em decorrência de sua natureza e características, a energia elétrica encontra-se em constante movimento nos fios de transmissão da concessionária, sendo que ela somente será individualizada, ou seja, só terá caracterizado e definido seu usuário, no momento em que for utilizada, pois, até então, consiste numa massa única de energia passível de utilização por qualquer um que dela necessite.
Por conseguinte, o fato gerador do imposto só pode ocorrer, in caso, pela entrega da energia ao consumidor, não sendo outra a disposição constante do art. 12, inciso I da Lei Complementar nº 87/96:
Art. 12 – ocorre o fato gerador do imposto no momento:
I – da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular.
Assim, da leitura do dispositivo retro transcrito, nota-se que o fato gerador do imposto estadual ocorre no momento da efetiva entrega da energia elétrica ao consumidor, que se completa com a “entrada” da energia no seu estabelecimento.
No que tange ao momento em que ocorre a transferência da mercadoria (energia elétrica) para o consumidor, a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, partilha deste entendimento, esboçado em sua Resolução nº 414/2010, esclarecendo, para fins de responsabilidade, in verbis:
Art. 14. O ponto de entrega é a conexão do sistema elétrico da distribuição com a unidade consumidora e situa-se no limite da via pública com a propriedade onde esteja localizada a unidade consumidora, exceto quando:
Art. 15. A distribuidora deve adotar todas as providências com vistas a viabilizar o fornecimento, operar e manter …