Petição
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA $[processo_vara] VARA CÍVEL ESPECIALIZADA EM FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE $[processo_comarca] - $[processo_uf]
Processo nº. $[processo_numero_cnj]
$[parte_autor_nome_completo], já devidamente qualificado aos autos em epígrafe, por seus procuradores infra assinados, ut instrumento procuratório em anexo (doc. 01), vem à presença de Vossa Excelência, propor a presente
CONTESTAÇÃO
em face dos fatos e fundamentos apresentados pelo $[parte_reu_razao_social] nos autos da Ação de Improbidade Administrativa proposta, pelas razões de fato e de direito que passa a expor.
Breve Relato dos Fatos
Em apertada síntese, o Ministério Público acusa o demandado por ato de improbidade administrativa pelo fato de ter firmado um contrato por dispensa de licitação com amparo do art. 24, inciso XIII da Lei 8.666/93, o qual se enquadraria no art. 10, inciso VIII da Lei 8.429/92.
No entanto, o que o Parquet faz é confundir o conceito jurídico do ato ímprobo - caracterizado pela conduta volitiva de beneficiar-se do cargo para fins alheios ao interesse público, locupletando-se indevidamente – tencionando vulgarizar a legislação, criando uma mens legis que inexiste.
Note, Excelência, que o arrazoado inicial é lacunoso, não identificando com precisão a conduta improba incutida de má fé atribuída ao demandado e, muito menos evidencia o prejuízo causado ao erário público, situação tida por essencial para incidência da Lei de Improbidade Administrativa.
Desta forma, passa-se ao mérito da contestação, para o fim de demonstrar o manifesto descabimento da Ação, em razão da (a) inaplicabilidade da Lei nº. 8.429/92; (b) ausência de provas, e; (c) ocorrência da prescrição.
I. Da Inaplicabilidade da Lei nº. 8.429/92 – Ausência de ato improbo
A Lei de improbidade administrativa nasceu com o intuito de combater atos que afetem a moralidade e dilapidem a coisa pública, atingindo o administrador público que pratique ato desonesto em detrimento ao erário público.
Nas palavras de Alexandre de Moraes:
“A Lei de Improbidade, portanto, não pune a mera ilegalidade, mas a conduta ilegal ou imoral do agente público e de todo aquele que o auxilie voltada para a corrupção. O ato de improbidade administrativa exige para a sua consumação um desvio de conduta do agente público que no exercício indevido de suas funções afasta-se dos padrões éticos morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas ou gerar prejuízos ao patrimônio público mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções...” (in Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional, São Paulo: Atlas, 2002, p.2611)
Portanto, os fatos narrados na peça inicial estão longe de configurar um ato de improbidade por parte do Réu, ora contestante, pois carecem de requisitos mínimos previstos na tipificação legal, pois: a) a contratação reveste-se de legalidade; b) não foi evidenciado qualquer prejuízo ao erário público e; c) não se verifica a existência de má fé na conduta do agente.
a) Da licitude da contratação
Conforme já relatado, a contratação em vergasto foi realizada com fulcro no artigo 24, inciso XIII da Lei 8.666/93, in verbis:
Art. 24. É dispensável a licitação:
(...)
XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos;
Pois bem, pelos documentos acostados à exordial, tem-se a comprovação da contratação de instituição com notória especialidade no escopo contratual pretendido – sendo estatutariamente incumbida do desenvolvimento institucional, conforme se alcança aos inúmeros atestado de capacidade técnica apresentados.
Todos, diga-se, com objeto semelhante ao contratado pelo Município de Santa Maria, qual seja, consultoria na gestão pública, dentre eles:
Governo do Estado do Rio Grande do Sul - 25/05/2000
Prefeitura Municipal de Porto Alegre - 16/11/2001
Ora, como contestar a idoneidade e a capacidade do IDORT, após ter prestado serviços de forma eficiente e satisfatória para o Governo do Estado do Rio Grande do Sul e da Prefeitura Municipal de Porto Alegre!
E mais: trata-se de instituição com notória reputação, conforme se denota do Decreto de 27 de maio de 1992, onde há o reconhecimento de sua utilidade pública federal.
Excelência, neste contexto deve-se atentar para o fato de que o próprio Estatuto do IDORT (fls. 182 ss. dos autos) traz em seu texto o caráter social, cientifico e sem fins lucrativos de sua constituição:
“Art. 1º - O Instituto de Organização Racional do Trabalho, abreviadamente IDORT, sociedade civil científica sem intuitos lucrativos, ...”
Em apertada síntese, o IDORT preenche os requisitos exigidos à legislação específica, tendo total consonância com o serviço então contratado pelo Município – na exata doutrina de Joel Menezes Niebuhr:
“Em primeiro lugar, se a dispensa é para entidades dedicadas à pesquisa, ao ensino, ao desenvolvimento institucional ou à recuperação do preso, evidentemente que o contrato a ser celebrado precisa guardar pertinência a tais finalidades.” (in Licitação Pública e Contrato Administrativo. pg. 573)
Ora, aos diversos atestados de capacidade técnica apresentados, resta clara a expertise do IDORT nos serviços contratados – diagnóstico da situação atual (estrutura organizacional e modelo de gestão):
Prefeitura Municipal de Porto Alegre-RS (fl. 64):
o Treinamento em metodologia para montagem de definições estratégicas;
o Implementação do sistema de indicadores de qualidade, produtividade e confiabilidade;
o Assessoria no mapeamento e redesenho dos processos de trabalho;
o ...
o Assessorar o aprimoramento do modelo de gestão de desenvolvimento da SMT acompanhando as atividades do comitê estratégico, assim como a atualização do sistema de desenvolvimento.
Prefeitura Municipal de Cotiá-SP (fl. 73):
o Consultoria na elaboração do Plano Municipal de Educação;
o Assessoria na realização de Diagnóstico Sócio Cultural dos Professores da rede de Ensino Fundamental;
Estado do Rio Grande do Sul (fl. 078):
o Capacidade técnica nas áreas de formação profissional, assessoria e treinamento;
Além disso, a ideia que se forma é justamente no desenvolvimento de instituições, conforme leciona Marçal Justen Filho ao disciplinar sobre o art. 24, inciso XIII:
“19.3.2) Atividade de desenvolvimento institucional
(...)
Ali se indicam as instituições que promovem o desenvolvimento de outras instituições.” (in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 11ª ed. pg. 253)
E não há exemplo melhor do que o contrato em tela, uma vez que foram empenhadas verbas públicas no desenvolvimento institucional, no caso, da estrutura administrativa do Município de Santa Maria.
Sopesados todos estes fatores, tem-se a incidência do permissivo tratado ao art. 24 inc. XIII da Lei nº. 8.666/93.
E não só em razão do programa oferecido, mas, principalmente, pela maior carga horária – 200 horas a mais do que os outros institutos.
Assim, seja pelos objetivos sociais do IDORT, seja pela notória expertise demonstrada pelo incontestável número de atestados de capacidade técnica relevantes, pertinentes e compatíveis com o contrato executado, seja, enfim, pelo melhor preço apresentado, constata-se que foi adequada e pertinente a dispensa de licitação empregada.
Já quanto ao aspecto do valor contratado, nota-se que foi apresentada proposta ímpar de trabalho, muito superior à metodologia apresentada pelos demais institutos consultados, não havendo condições de prestarem serviços de igual complexidade.
Portanto, perfeitamente lícita a contratação em vergasto.
Assim, não se fere nem a legalidade, nem a moralidade que devem revestir toda e qualquer avença com o Poder Público, desconstituindo qualquer possibilidade de enquadramento à Lei de improbidade administrativa.
Mauro Gomes de Mattos ao leciona sobre a tipicidade prevista no art. 10 da referida lei, destaca:
“Conduta dolosa ou culposa do agente, capaz de tipificar ato de improbidade narrado no art. 10, é aquela que não exige apenas uma vontade livre e consciente em realizar quaisquer condutas descritas, responsabilizando-se também aquele que viola a prudência, tornando-se imprudente e negligente com a coisa pública, lesando, via de consequência o erário público. Essa conduta deverá ser ilícita, contrapondo-se à legalidade, para a obtenção de um fim vedado pela norma legal. Ou, em outras palavras, a conduta dolosa do agente público que for lícita, mas ocasionar lesão ou perda patrimonial ao erário, não se sujeita à responsabilização por ato de improbidade administrativa. Deverá o ato do agente público estar contaminado pela ilicitude.” (in op. cit. pg. 264)
Portanto, meras suposições baseadas em relatos midiáticos não constituem provas cabais para evidenciar alguma ilicitude na contratação em comento, sendo descabida a aplicação da lei de improbidade administrativa.
b) Da ausência de prejuízo ao erário público
O dispositivo legal em que o Ministério Público enquadrou o réu foi o artigo 10, inciso XIII da lei de improbidade administrativa, in verbis:
Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
(...)
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
Ou seja, conforme trazido à exordial, o ato administrativo, supostamente ilegal, estaria enquadrado como ato de improbidade que cause prejuízo ao erário
Ao comentar este dispositivo legal, Mauro Roberto Gomes de Mattos elucida sobre os limites de sua aplicação:
“O caput do art. 10 da Lei nº 8.429/92 afirma que constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no artigo inaugural da Lei nº 8.429/92. Assim, para que haja a subsunção na hipótese em tela, a conduta do agente público, ainda que seja omissa, dolosa ou culposa, deverá acarretar prejuízo para o erário, causando-lhe lesão. (....) A simples dispensa do processo de licitação, por si só não é motivo para a subsunção na presente Lei de Improbidade Administrativa, pois é necessário o binômio ilegalidade com prejuízo ao erário.” (in O Limite da Improbidade Administrativa – Comentários á Lei nº 8.429/92. 5ª ed., pg. 264 - 306)
No entanto, o Ministério Público não trouxe uma linha sequer sobre qual seria o prejuízo ao erário público! Deixou de demonstrar a existência de qualquer superfaturamento ou que os serviços prestados estariam fora do preço de mercado.
Pelo contrário Excelência, o ilustre representante do parquet verificou que o escopo contratual foi DEVIDAMENTE CUMPRIDO, apondo à fl. 04 dos autos que:
“Ao que se sabe o contrato foi cumprido.”
Ou seja, a inicial deixou bem claro que os serviços foram rigorosamente prestados e apenas supõe que existiriam empresas que prestariam os mesmos serviços por preços inferiores, mas, NÃO CITA NENHUMA!
Exordial, diga-se, de leves argumentos, uma vez que em momento algum tem-se a comprovação de superfaturamento que imponha enriquecimento ilícito ao Requerido ou oneração aos cofres públicos.
Ora, se eventualmente deixou-se de proceder com algum procedimento prévio obrigatório, tal ato, de per si, não enseja qualquer degradante ao erário público passível de punição.
E tal se dá unicamente por não se configurar presente a mens legis da Lei de Improbidade Administrativa – que busca unicamente punir o gestor inescrupuloso e vil, e não aquele que comete falhas sem repercussão ao erário público e ao bom funcionamento da Administração Pública.
Tal conceito, diga-se, já é assente ao Superior Tribunal de Justiça há anos, permanecendo da mais pretérita à mais recente jurisprudência:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA IRREGULAR DE LICITAÇÃO. ART. 10, II, XI E XII DA LEI 8.429/92. INDISPENSABILIDADE DE COMPROVAÇÃO DO EFETIVO PREJUÍZO AO ERÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DESPROVIDO.
1. Trata-se de Ação de Improbidade ajuizada em face dos ora agravados com fundamento na irregularidade no pagamento decorrente da prestação de serviço de transporte escolar na região de Águas do Miranda/MS sem a realização do correspondente procedimento licitatório, tendo a conduta sido tipificada no art. 10, II, XI e XII da Lei 8.429/92.
2. As Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte já firmaram a orientação de que a configuração dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa exige a presença do efetivo dano ao erário. Contudo, as instâncias de origem não esmeraram a demonstração da ocorrência de prejuízo ao Tesouro Municipal.
3. Agravo Regimental do Ministério Público Federal desprovido.
(AgRg no REsp 1330664/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 22/05/2013)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10 DA LEI N. 8.429/92. NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS. SANEAMENTO DAS CONTAS PÚBLICAS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE SUBSUNÇÃO DO ATO REPUTADO ÍMPROBO AO TIPO PREVISTO INDIGITADO DISPOSITIVO. 1. A configuração dos atos de improbidade administrativa previstos no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa (atos de Improbidade Administrativa que causam prejuízo ao erário), à luz da atual jurisprudência do STJ, exige a presença do efetivo dano ao erário (critério objetivo) e, ao menos, culpa. Precedentes: AgRg no Ag 1.386.249/RJ, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13/4/2012; EREsp 479.812/SP, Relator Ministro Teori Albino Zvascki, Primeira Seção, DJe 27/09/2010; e AgRg no AREsp 21.662/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 15/2/2012.
2. (...)
5. Recurso especial provido.
(REsp 1206741/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2012, DJe 23/05/2012)
ADMINISTRATIVO. SIMULAÇÃO DE LICITAÇÃO. TIPIFICAÇÃO COMO ATO DE IMPROBIDADE QUE CAUSA PREJUÍZO AO ERÁRIO (ARTIGO 10 DA LEI 9.429/92). AUSÊNCIA DE PROVA DO DANO. PRECEDENTES DO STJ. ATO DE IMPROBIDADE QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CARACTERIZAÇÃO. SANÇÕES PREVISTAS NO ARTIGO 12, INCISO III, DA LEI 8.429/92. ANÁLISE DA GRAVIDADE DO FATO. SÚMULA 7/STJ. APLICAÇÃO. 1. O enquadramento do ato de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente na categoria de improbidade administrativa ensejadora de prejuízo ao Erário (inciso VIII do art. 10 da Lei 8.429/92) reclama a comprovação do efetivo dano ao patrimônio público, cuja preservação configura o objeto da tutela normativa (Precedentes do STJ). (...). 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido (REsp. 1.169.153/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 24.8.2011).
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirma este entendimento:
APELAÇÃO CÍVEL / REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. CONTRATAÇÃO PARA OS SERVIÇOS DE VIGILÂNCIA NA ÉPOCA DO CARNAVAL. INEXISTÊNCIA DE LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. O art. 12, parágrafo único, da Lei n. 8.429/92, fundado no princípio da proporcionalidade, determina que a sanção por ato de improbidade seja fixada com base na extensão do dano causado, bem como no proveito patrimonial obtido pelo agente. Conforme a prova recolhida na instrução, não houve a ocorrência de superfaturamento nos contratos realizados, sem licitação, havendo comprovação da efetiva prestação dos serviços. Inexistência de dano ao erário. Ademais, não se verifica a existência de dolo na conduta imputada ao Ex-Secretário Municipal, o que a torna atípica. Apelação desprovida. Sentença mantida em reexame necessário. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70053432860, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 03/04/2013)
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